terça-feira, 30 de novembro de 2004

Novo Director da Revista do Ministério Público

A Direcção do SMMP informa aqui que, acolhendo um desejo há muito formulado, aceitou o pedido de exoneração do seu associado Dr. Eduardo Maia Costa (P.G. A. no STJ) do cargo de Director da Revista do Ministério Público. Com elementar sentido de justiça - acrescenta -, aqui fica o público reconhecimento de um valiosíssimo trabalho de muitos anos à frente da nossa publicação científica, respeitada e lida por inúmeros juristas. Para o lugar em causa a Direcção nomeou, a partir de Janeiro próximo, o associado Rui do Carmo, Procurador da República em Coimbra, colega que, sem dúvida, reúne o perfil adequado àquelas importantes funções.
O Cum grano salis presta aqui a sua homenagem ao Dr. Maia Costa pelo excelente trabalho desenvolvido, ao longo dos últimos anos, à frente da Revista do Ministério Público, do mesmo passo que se congratula com a nomeação do seu membro Dr. Rui do Carmo para o substituir, a quem deseja as maiores felicidades no desempenho dessa difícil tarefa.

segunda-feira, 29 de novembro de 2004

"A REFORMA DA JUSTIÇA CRIMINAL EM PORTUGAL"

Realizou-se no passado dia 24 de Novembro, no Instituto Sá Carneiro, uma Conferência sobre "A REFORMA DA JUSTIÇA CRIMINAL EM PORTUGAL", em que participaram diversas individualidades:

  • Dr. José Aguiar Branco, Ministro da Justiça
  • Dr. José Souto Moura, Procurador-Geral da República
  • Dr. Antero Luís, do Conselho Superior da Magistratura
  • Dr. José Júdice, Bastonário da Ordem dos Advogados
  • Dr. Paulo Pinto de Albuquerque, da Universidade Católica.
Vão assinaladas as intervenções possíveis de obter.

O texto (essencial) do (injustamente maltratado) acórdão 3250/04-3

«Em resumo, esta a factualidade relevante para a determinação da pena. Analisada e ponderada à luz dos princípios e critérios subjacentes à previsão do art. 72.º CP, dela não resulta qualquer motivação susceptível de justificar atenuação especial da pena. Para além dos abalos psíquicos e de eventuais problemas/doenças do foro psiquiátrico, parece ainda que faltou a ambos - recorrente e vítima - tolerância, resignação, paciência e compreensão para ultrapassarem a tragédia da morte da filha. Refugiaram-se em comportamentos que conduziram à destruição do casal e, pior do que isso, à morte da esposa. Não são por certo algumas falhas reveladas pela vítima na confecção de alimentos, nem as saídas à noite para tomar café, ainda que não desse conhecimento ao arguido de uma deslocação; nem o facto de ter mostrado a barriga nas condições descritas; nem os levantamentos de dinheiro, ignorando-se em que condições e qual a motivação (sendo certo que as contas eram do casal); e nem a participação criminal apresentada contra a vítima, por ameaça com arma, quando não se provou qualquer ameaça nem a existência de arma; não são, dizíamos, estas circunstâncias (que o recorrente invocou como justificativas de atenuação especial) que revelam acentuada diminuição de ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena. Ademais e não obstante o estado de saúde da vítima, depauperado a nível psíquico, o recorrente não deixou de reagir e com violência (maus tratos) àqueles comportamentos, os quais, de resto e tal como resultaram provados, nem sequer se mostram eivados de qualquer carga provocatória ou ofensiva da honra do arguido. A última agressão, incluída nos maus tratos ocorreu em 16 de Maio; em 18, o recorrente apresenta a tal queixa crime contra a esposa; e só em 28 veio a matar a mulher, por estrangulamento, após discussão por razões não apuradas. Ora, continuando o recorrente a negar qualquer intenção e vontade de matar a esposa; não apresentando quaisquer sinais de arrependimento; não se verificando qualquer provocação injusta ou ofensa imerecida; e nem se vislumbrando quaisquer outras circunstâncias de preponderante valor, há-de a pena encontrar-se na moldura legal do crime de homicídio simples, 8 a 16 anos de prisão, sem recurso a qualquer atenuação especial. Retomando as considerações já atrás expendidas, não perdendo de vista as necessidades de prevenção geral de ressocialização, que, no caso, até nem se afiguram de particular exigência, havemos de convir que a pena aplicada ao homicídio se apresenta de algum modo exagerada e desproporcionada à situação concreta. Na verdade, o arguido, com 44 anos de idade, é primário, foi emigrante na Suiça onde angariou poupanças que investiu em Portugal; dedicou toda a sua vida ao trabalho na construção civil; do casamento (com a vítima) teve dois filhos e sempre zelou pela sua educação, preocupando-se com o seu futuro; é considerado um bom pai de família e estimado por todos os seus amigos. Com a prisão preventiva que vem sofrendo, interiorizou já o verdadeiro sentido de uma medida detentiva. Aparte as desavenças conjugais (onde por regra não existe apenas um culpado) que conduziram ao crime em apreço, o arguido mostra-se socialmente inserido. Será o típico homicídio ocasional, que, com fortes probabilidades, não reincidirá após cumprimento da pena. Dai que se tenha prognosticado não serem de forte densidade as exigências de prevenção especial de ressocialização. Acresce que não terão sido alheias as condutas anteriores da vítima, designadamente os levantamentos bancários, deixando as contas do casal a zero, a ponto de o arguido ficar sem dinheiro para pagar o almoço; e, talvez isto, o detonador da raiva que conduziu ao homicídio! Não se esqueça que "a capacidade para cometer crime dormita em cada homem e sustentar o contrário é puro farisaísmo" (Figueiredo Dias,...). Muitas vezes, só falta aquele detonador! Tudo ponderado (...), considera-se mais adequada a pena de 10 anos de prisão pela prática do crime de homicídio. Cumulando-se esta pena com a que foi aplicada pelo crime de maus tratos a cônjuge, fixa-se a pena única em 11 anos de prisão (...)»

Le bon argument

Daumier, Le bon argument

Legislação do dia (selecção)

Aviso n.º 171/2004. DR 279 SÉRIE I-A de 2004-11-27 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Torna público ter, por nota de 1 de Outubro de 2004, o Secretariado-Geral do Conselho da União Europeia notificado terem a Lituânia, a República Checa, a República Eslovaca, a Eslovénia, a Hungria, a Letónia, a Polónia, o Chipre e Malta concluído as formalidades necessárias para a entrada em vigor da Convenção, fundamentada no artigo K3 do Tratado da União Europeia, Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia, assinada em Bruxelas, em 24 de Julho de 1995

Resolução do Conselho de Ministros n.º 171/2004. DR 280 SÉRIE I-B de 2004-11-29 – Presidência do Conselho de Ministros: Aprova o Programa de Actuação para Reduzir a Dependência de Portugal face ao Petróleo

Declaração n.º 18/2004. DR 280 SÉRIE I-B de 2004-11-29 – Ministério das Finanças e da Administração Pública - Direcção-Geral do Orçamento: Publica os mapas II, V e VII da Lei do Orçamento do Estado relativos ao ano de 2004, modificados pelas alterações orçamentais decorrentes da nova Lei Orgânica do Governo

domingo, 28 de novembro de 2004

A "notícia" do PÚBLICO e o Supremo Tribunal de Justiça

No número de 27 de Novembro de 2004 do jornal Público, foi publicada por Ana Sá Lopes o seguinte:

«Notícia da Mulher Que Deixava a Comida Esturricar
No dia 10, o Supremo Tribunal de Justiça diminuiu uma pena de um homem que tinha estrangulado a mulher. A primeira instância ditara 14 anos de prisão, mas os sereníssimos do Supremo, consideradas algumas atenuantes, reduziram-na para 11 anos.
A quem tenha escapado a notícia de Maria Fernanda, estrangulada pelo marido a 28 de Maio de 2002, que saiu no PÚBLICO da última quarta-feira, passo a informar: o acórdão refere que "não terão sido alheias" ao crime "as condutas anteriores da vítima, designadamente os levantamentos bancários deixando as contas do casal a zero, a ponto de o arguido ficar sem dinheiro para pagar o almoço", o que pode, segundo os cavalheiros do Supremo, "detonador da raiva que conduziu ao homicídio".
Mas os alucinados juízes do Supremo convocam outras (más) condutas da vítima para justificar que se atenue a pena pelo estrangulamento. Fica a saber-se que em Portugal 2004, é atenuante do crime de homicídio o facto de uma vítima ter "deixado algumas vezes esturricar a comida que confeccionava".
Para além dos desastres na cozinha, a estrangulada "chegou a sair e a chegar a casa de noite; ia tomar café a um estabelecimento de cafetaria e não deu conhecimento ao arguido de uma deslocação". No Estado Novo, as mulheres precisavam de consentimento dos maridos para saírem para fora do país; para os juízes do Supremo na democracia de 2004, é atenuante do crime de homicídio ir ao café ou não avisar o marido de uma saída. Ah, a vítima também "chegou a mostrar a barriga quando se encontrava junto de pessoas amigas e se falava da condição física de cada uma delas", conduta repreensível. E, no entanto, os juízes admitem que os "comportamentos resultantes dos problemas psíquicos da vítima, decorrentes da morte de uma filha do casal".
Foram dados como provados agressões do arguido à vítima - "insultos, murros, estalos e pontapés" - que a suprema judicatura considera irrevelantes para o assunto, reduzindo-as à simplória categoria de "desavenças conjugais" e enuncia que também a vítima, nesta matéria, seria culpada. "Àparte as desavenças conjugais (onde, por regra, não existe apenas um culpado) que conduziram à criminalidade em apreço, o arguido mostra-se socialmente inserido", afirma o acórdão.
O PÚBLICO teve acesso ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça na semana em que se comemorou o dia contra a violência doméstica. Os números alarmantes tornam-se então "socialmente inseridos", para usar a linguagem do Supremo, quando o próprio Supremo Tribunal desvaloriza "desavenças conjugais" e considera conduta atenuante de um homicídio o deixar esturricar a comida. O Supremo é o retrato do país medieval, mas já não retrata o país jurídico: em Portugal, a violência doméstica é um crime público e o acórdão do Supremo viola, evidentemente, o espírito da lei.
Não se pode exterminá-los mas, ao menos, não se pode processá-los? »

Trata-se de um exemplar edificante de como a (certa) imprensa trata os tribunais (neste Caso o Supremo Tribunal de Justiça), ultrapassando todos os limites da irresponsabilidade e da falta de ética.
Começa logo por intitular como “Notícia” um comentário muito pessoal, numa ironia deslocada, salvo para os propósitos da autora.
E não fica por menos do que pedir a morte dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça, ou na impossibilidade de o obter, que os mesmos sejam processados…
Tudo a propósito de um recurso num processo de violência doméstica, quando decorria a semana destinada a chamar a atenção para esse mesmo problema social, em que o Supremo Tribunal de Justiça baixou a pena de 14 para 11 anos de prisão.
A colunista coloca o Supremo como «o retrato do país medieval» que «já não retrata o país jurídico».
Mas escapa-lhe completamente que o Supremo Tribunal de Justiça procurou seguramente fazer justiça, o que passa entre nós e em qualquer país civilizado, por tentar apreender os motivos que levaram o arguido a agir, num esforço para melhor apreciar a sua culpa, para depois e tendo em consideração a gravidade do resultado, encontrar a pena mais justa para aquele homem concreto, situado num determinado país real.
Podem os juízes do Supremo Tribunal de Justiça, que subscreveram aquele acórdão, (entre os quais não me encontro) e que são tratados por "alucinados", ter errado, mas qualquer apreciação critica não se pode ficar, como no caso, por uma atitude preconceituosa, que à margem de qualquer análise dos comandos da lei sobre a determinação da pena e do uso que deles foi feito, se fica por primárias afirmações maniqueístas, integrando a turba ululante de que no Público falava Vasco Pulido Valente.

PSICOLOGIA E JUSTIÇA

Na tarde do dia 02 de Dezembro, no Auditório Agostinho da Silva da Universidade Lusófona, em Lisboa, o tema do debate entre docentes universitários de psicologia, juízes, procuradores e advogados vai ser a Psicologia e a Justiça, num seminário organizado pela área de Psicologia Criminal e do Comportamento Desviante da U.L. e pela Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, que visa “promover a reflexão, o diálogo e a comunicação de saberes entre os operadores judiciários e os psicólogos da Justiça.”
Com o título “Advogados e Psicólogos: de costas voltadas até quando?”, o seminário tem o seguinte programa:
14h30m – Abertura dos Trabalhos
15h15m – 16h30m – Mesa 1
Novas Gerações de Psicólogos e Advogados: um novo paradigma
16h45m – 18h 00m- Mesa 2
Psicologia e Justiça: o Homem no epicentro do diálogo
18h15m – 19h30m – Mesa 3
Advogados e Psicólogos: aprender a dialogar.

“Ao Direito compete regular as condutas humanas na vida social, sendo a justiça o fim e o valor fundamental da ordem jurídica. A Psicologia é uma ciência que incide igualmente sobre o comportamento humano em sociedade. Estas duas afirmações seriam suficientes para constatar o inevitável relacionamento que entre Direito e Psicologia se terá de estabelecer.
Distintas quanto ao objecto, quanto à área e às premissas de intervenção, quanto aos métodos, direito e psicologia entrelaçam-se porque ambos de debruçam sobre a previsão, a explicação e o controlo do comportamento humano.
Apesar de, a meu ver, conterem algum excesso, são, de todo o modo, elucidativas as afirmações de Diamond, que afirma “pensar que a lei poderia ser caracterizada como uma componente da psicologia, pois se a psicologia é o estudo do comportamento humano, inclui necessariamente a lei enquanto instrumento usado pela sociedade para o controlar”, ou de Crombag, que adianta poder ser a lei considerada “um ramo da psicologia aplicada”.
Cada vez mais a lei procura criar e potenciar mecanismos de prevenção de condutas desviantes e associais, de prevenção do litígio; cada vez mais se procura tratar o litígio de forma mediada; cada dia os litígios assumem maior complexidade social; cada vez mais se procura que a resposta da justiça não seja meramente declarativa ou meramente repressiva, mas sim constitutiva de novos comportamentos, de novas relações humanas e sociais, de novas perspectivas de afirmação dos direitos individuais e sociais. Cada vez mais julgar é compreender.
Do que resulta, também, uma maior exigência quanto aos conhecimentos disponíveis, uma maior exigência de conhecimento e de individualização de cada situação tendo em vista a construção da resposta adequada a cada caso concreto. Ou seja, o melhor conhecimento do comportamento humano e do seu contexto é uma exigência da boa aplicação do direito, da boa administração da justiça.”
(extracto de “Diálogo da Justiça com a Psicologia”, intervenção proferida em Maio de 2004 no Congresso Internacional “Educação, Psicologia e Justiça – Diferentes Olhares sobre o Comportamento Humano”, organizado pelo Centro de Psicopedagogia da Universidade de Coimbra)

sábado, 27 de novembro de 2004

Vozes da história do direito - Demóstenes

Alguns discursos judiciários de Demóstenes (384-322 AC):

Casa da Suplicação X

Tráfico simples — tráfico de menos gravidade — condições pessoais — medida concreta da pena

1 – Como vem entendendo este Supremo Tribunal de Justiça quando o legislador prevê um tipo simples, acompanhado de um tipo privilegiado e um tipo agravado, é no crime simples ou no crime-tipo que desenha a conduta proibida enquanto elemento do tipo e prevê o quadro abstracto de punição dessa mesma conduta. Depois, nos tipo privilegiado e qualificado, vem definir os elementos atenuativos ou agravativos que modificam o tipo base conduzindo a outros quadros punitivos. E só a verificação afirmativa, positiva desses elementos atenuativo ou agravativo é que permite o abandono do tipo simples

2 – Se o agente efectuou durante 3 meses vendas de dois produtos estupefacientes (cocaína e heroína) aos consumidores que para tanto o contactassem numa zona relativamente vasta e muito populosa (Albufeira e Armação de Pêra), com relativa sofisticação (previamente para o seu telemóvel nº964422588 a fim de combinarem o local onde iria entregar a droga), fazendo-se, então, transportar para esses locais no seu automóvel, e foi detectado de regresso de Lisboa com 14 sacos contendo 38,353 grs de cocaína que destinava à venda aos consumidores, não se está perante um tráfico de menor gravidade.

3 – Por outro lado, as circunstâncias de ter trabalhado de forma regular, ter uma companheira e um filho menor ser portador de HIV e de beneficiar de apoio familiar, respeitam às condições pessoais do agente [al. d) do n.º 2 do art. 71.º do C. Penal], são completamente alheias à ilicitude, de cuja diminuição considerável deriva o privilegiamento do tráfico de estupefacientes.

4 – Estas circunstâncias pessoais, designadamente as possibilidades francas de ressocialização encontradas pelo IRS, podem encontrar mais expressão na medida da pena reduzindo ao mínimo e quase ao mínimo as penas parcelares dos crimes do art. 275.º do C. Penal e de tráfico simples, ou seja respectivamente em 4 anos e 3 meses e 2 anos respectivamente, e na pena única de 5 anos.

Ac. de 25.11.2004 do STJ, proc. n.º 3970/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Recurso extraordinário de revisão — fundamentos do recurso — matéria de facto — matéria de direito

1 - Perante o ordenamento jurídico português, o recurso de revisão de sentença não é um meio de reapreciação jurídica do anterior julgado, tal como acontece em regra com os recursos ordinários já que o recurso extraordinário em causa visa, antes, a obtenção de uma nova decisão assente em novo julgamento do feito, agora com apoio em novos dados de facto, e, assim, a revisão versa apenas sobre a questão de facto.

2 - A reapreciação de questões de direito, como a da pretensa prescrição do procedimento criminal estaria definitivamente coberta pelo caso julgado, sendo processualmente descabida, no âmbito deste recurso extraordinário, uma vez que tal discussão ou a possibilidade dela ficou precludida com o encerramento normal do processo e o trânsito em julgado do ali decidido.

3 - Aqui, do que se cura é, apenas, saber se há ou não «novos factos» ou «novos meios de prova» com relevância bastante para alterarem a base do decidido, ou seja, capazes de criarem graves dúvidas sobre a justiça da decisão tomada, sendo irrelevante para o efeito a concreta solução jurídica adoptada.

4 - A razão de ser de tal distinção de tratamento – entre matéria de facto e de direito – reside nesta constatação: enquanto o eventual [mero] erro de direito é logo suprível, nomeadamente mediante interposição de recurso ordinário, pois o processo contém já todos os elementos para o efeito, os «novos factos» ou «novos meios de prova», justamente porque reclamam «novidade» para serem relevantes, não têm, então, ainda, qualquer expressão processual, sendo desconhecidos do tribunal e estando, assim, fora da possibilidade de apreciação.

Ac. de 25.11.2004 do STJ, proc. n.º 3192/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Tráfico de estupefacientes — medida concreta da pena — “correio de droga”

1 – A medida concreta da pena é determinada dentro da moldura penal abstracta, funcionando todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente, designadamente: – O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente); – A intensidade do dolo ou negligência; – Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; – As condições pessoais do agente e a sua situação económica; – A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; e – A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

2 – Transportando o arguido 977,57 gramas líquidas de heroína, sem que se tenha descortinado com clareza o seu papel neste acto de tráfico, designadamente se era um mero “correio de droga”, atendendo às penas que o STJ vem fixando em casos semelhantes e à natureza e quantidade de droga transportados, mostra-se adequada a pena de 5 anos de prisão.

Ac. de 25.11.2004 do STJ, proc. n.º 3779/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

quinta-feira, 25 de novembro de 2004

Maternidad judicial

Una abuela deberá ser indemnizada por la muerte de un nieto al que crió

Por RAFAEL MÉNDEZ - Madrid
EL PAÍS - Última - 25-11-2004

Vicenta Burgo ha tenido por fin una alegría. Una juez de Madrid ha sentenciado que debe ser indemnizada como si fuera la madre de su nieto, Borja León, que falleció con 19 años en un accidente de tráfico. Vicenta cuidó de Borja desde que nació. Su madre era toxicómana y murió de sobredosis cuando el niño tenía cinco años. La juez afirma que Vicenta actuó siempre como "una verdadera madre", aunque su caso no está contemplado por la ley.
El rostro de Vicenta, de 62 años, refleja una vida dura. Ha trabajado desde que, con 16 años, llegó a Madrid procedente de Zamora. "He sido cocinera, frutera..., de todo". Tuvo una hija, Susana, que con 19 años se enganchó a la heroína y poco después dio a luz a un niño al que llamó Borja. Era 1984. "Desde que nació, yo me hice cargo porque mi hija no podía. Ella y mi yerno estaban a sus líos, a sacarme dinero si podían. Yo intentaba convencer a mi hija de que lo dejara por el niño. 'Mamá, si yo sé que va a estar mejor contigo', me decía". A Vicenta le cuesta seguir.
En 1989 su hija falleció de sobredosis y tres años después murió el padre de Borja por la misma causa. Borja vivió una vida normal ("siempre riendo, con amigos, se metía a todo el mundo en el bolsillo") hasta el 25 de agosto de 2003.
Ese día, cogió su ciclomotor nuevo y se fue a ver a un amigo antes de entrar en la cristalería en la que había encontrado trabajo tres meses antes. Según la sentencia, un hombre que conducía un automóvil por la calle Francos Rodríguez, "de forma sorpresiva [...] realizó un cambio de sentido [...] prohibido". Eran las tres de la tarde y la calle estaba casi desierta. El conductor declaró que no vio la moto. Borja se estampó contra la puerta del coche y cuatro días después falleció en el hospital.
A Vicenta le correspondía una indemnización de 22.569 euros, la que fija para los abuelos la ley sobre responsabilidad civil y seguro en la circulación de vehículos. Pero ella sentía que no era justo. "Borja era mi hijo. No es que tuviéramos una relación estrecha, es que era mi hijo", afirma nerviosa al contar la historia.
Vicenta acudió al abogado Daniel Onrubia. "Intentamos negociar con la compañía de seguros del conductor, pero se negó en redondo. Le advertí a Vicenta de que no iba a ser fácil ganar el caso, pero decidimos pedir la indemnización de 82.750 euros, lo que le corresponde a una madre que pierde un hijo en accidente", explica Onrubia.
El juicio de faltas se celebró el 1 de junio de 2004 en el Juzgado de Instrucción número 28 de Madrid. Onrubia intentó sortear la norma: "Las indemnizaciones no se pueden conceder como si fuese una tabla de multiplicar fija. Debe haber margen de maniobra en ciertos casos extremos, como el de Vicenta, de los que hay muy pocos".
La magistrada, Ana Victoria Revuelta, sentenció el 12 de noviembre que la relación de Vicenta con su nieto "es equivalente a la de una madre, puesto que si no lo fue desde la perspectiva biológica [...], sí lo ha sido desde el punto de vista de hacerse cargo de su nieto como una madre".
La juez invoca en la sentencia (contra la que cabe recurso) el artículo 4.1 del Código Civil, que habla de aplicar la ley a situaciones análogas a las que explícitamente se contemplan.Vicenta no acaba de creerse que por fin tenga una buena noticia. "Ya veremos, ya veremos si al final me indemnizan", recela. Desde la muerte de Borja se ha apuntado a natación y da paseos para evadirse. Cuando sale a la calle mira al cielo y le pide a Borja que le cuide la casa. Como haría una madre.

Conselho Consultivo do Ministério Público

Parecer n.º 78/2004 (DR 277 SÉRIE II de 2004-11-25)
Aposentado - Exercício de funções - Gabinete ministerial - Contrato de prestação de serviços - Agente político - Despesas públicas.

1.ª Os aposentados não podem exercer funções públicas salvo, designadamente, quando exerçam funções em regime de prestação de serviço nas condições previstas na alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º (cf. artigo 78.º do Estatuto da Aposentação).
2.ª A celebração de contratos de prestação de serviço por parte da Administração está sujeita ao regime de realização de despesas públicas em matéria de aquisição de serviços, estabelecido no Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho (cf. artigos 17.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 41/84, de 3 de Fevereiro, e 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho).
3.ª No âmbito dos gabinetes ministeriais, o recurso à celebração de contratos de prestação de serviço está expressamente previsto no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 262/88, de 23 de Julho (regime, composição e orgânica dos gabinetes ministeriais).
4.ª Os contratos de prestação de serviço celebrados no âmbito dos gabinetes ministeriais estão igualmente sujeitos ao regime estabelecido no Decreto-Lei n.º 197/99.
5.ª A situação funcional titulada pelos despachos, do Ministro da Cultura, n.os 4897/2003 (2.ª série), de 7 de Fevereiro, e 5202/2004 (2.ª série), de 30 de Janeiro, configura, na globalidade de todos os seus elementos, uma relação jurídica de emprego público.
6.ª Assim, os despachos, do Ministro da Cultura, n.os 4897/2003 (2.ª série), de 7 de Fevereiro, e 5202/2004 (2.ª série), de 30 de Janeiro, são ilegais, por violação do disposto no artigo 78.º, n.º 1, do Estatuto da Aposentação.
(Este parecer foi votado na sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de 23 de Setembro de 2004 e foi homologado por despacho da Ministra da Cultura de 14 de Outubro de 2004).

Tribunal Constitucional

Acórdão n.º 600/2004 – DR 277 SÉRIE II de 2004-11-25: Não julga inconstitucional a norma do n.º 1 do artigo 863.º do Código Civil, quando aplicada a um acordo de remissão complementar do da cessação de um contrato de trabalho por reforma antecipada do trabalhador fundada em invalidez.

Acórdão n.º 601/2004 – DR 277 SÉRIE II de 2004-11-25: Não julga inconstitucional a norma do artigo 32.º, n.º 1, do Código de Processo Tributário, quando interpretada no sentido da necessidade para a procedência da impugnação de liquidação do imposto de mais-valias de decisão judicial autónoma a declarar a nulidade de actos simulados, obtida em acção instaurada contra os sujeitos intervenientes no negócio e no tribunal competente para o efeito.

Acórdão n.º 602/2004 – DR 277 SÉRIE II de 2004-11-25: a) Nega provimento ao recurso e confirma a decisão recorrida na parte em que recusou a aplicação de uma interpretação literal da norma constante do artigo 312.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, que viola os artigos 13.º e 32.º, n.os 1 e 2, da Constituição, por apenas admitir a concertação da data para a audiência quando existe advogado constituído, mas não quando existe defensor oficioso; b) Fixa como interpretação a seguir, ao abrigo do n.º 3 do artigo 80.º da Lei do Tribunal Constitucional - por ser a única compatível com a Constituição - a que postula que há concertação da data para a audiência, ao abrigo do n.º 4 do artigo 312.º do Código de Processo Penal, quer quando existe advogado constituído quer quando existe defensor oficioso.

Legislação do dia (selecção)

Resolução da Assembleia da República n.º 74-A/2004. DR 272 SÉRIE I-A 1º SUPLEMENTO de 2004-11-19 – Assembleia da República: Proposta de realização de referendo sobre a Constituição para a Europa

Portaria n.º 1426/2004. DR 277 SÉRIE I-B de 2004-11-25 – Ministério das Finanças e da Administração Pública: Aprova os coeficientes de localização mínimos e máximos a aplicar em cada município, previstos no artigo 42.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI)

Portaria n.º 1450/2004. DR 277 SÉRIE I-B de 2004-11-25 – Ministério da Saúde: Aprova o Regulamento do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia

quarta-feira, 24 de novembro de 2004

Artigo 270.º do Código de Processo Penal. Delegação de competência. Polícia Judiciária Militar

O Procurador-Geral da República delega aqui competências na Polícia Judiciária Militar.

terça-feira, 23 de novembro de 2004

O Novo Código da Estrada

Em 11.10.04 coloquei aqui um post sobre o Código da Estrada e as novas coimas e vi com muito interesse um artigo sobre este tema, que não resisto a trazer aqui:

«No próximo mês de Janeiro, entrará em vigor o novo Código da Estrada, que prevê, entre outras medidas, o agravamento de penalidades aplicáveis a diversas infracções, bem como a obrigatoriedade do seu pagamento imediato em certas circunstâncias. Desde a condução sob a influência do álcool ao excesso de velocidade, até ao vulgar estacionamento sobre os passeios ou sobre passadeiras de peões, vício já internalizado na conduta de milhares de automobilistas, o campo de actuação disciplinadora do novo Código será vasto. Muito embora seja de esperar uma deficiente implementação desta nova legislação, quer devido a uma actuação policial tipicamente fraca, quer devido a um sistema judicial muito pouco eficaz, devemos aplaudir as novas medidas adoptadas. Será importante acompanhar a evolução futura dos vários tipos de infracções ao novo Código, em particular da sinistralidade rodoviária em Portugal, de forma a se poder aferir da eficácia destas medidas. O elevado número de acidentes rodoviários que ocorrem diariamente nas estradas portuguesas, e não obstante uma tendência descendente que se tem verificado recentemente, revela um tipo de comportamento anti-social que contrasta com os relativamente baixos índices de violência verificados fora das estradas. A explicação para a elevada sinistralidade rodoviária vai muito para além da deficiente qualidade de várias estradas nacionais. Revelará não só uma má preparação inicial dos condutores - para quando uma reforma das escolas de condução? - como uma incapacidade, ou resistência, à aceitação de certas regras de conduta social, facilitada pela ineficaz implementação destas. O agravamento das penalidades proposto pelo novo Código, pode, no entanto, ser interpretado como o reconhecimento da pouco eficaz actuação policial em Portugal, talvez sem paralelo no resto da Europa dos 15. De facto, a teoria económica informa-nos que o efeito dissuasor resultante de um agravamento das penalidades, monetárias ou outras, por comportamentos anti-sociais, é tipicamente superior ao efeito dissuasor resultante de um aumento da probabilidade de detecção e punição dos infractores. Mais concretamente, dado que os potenciais prevaricadores são, na sua maioria, avessos ao risco, um determinado aumento do valor da penalidade associada a uma dada infracção de um código de conduta (e.g., o Código da Estrada), provoca uma redução na utilidade (esperada) do infractor, que é maior do que a redução da utilidade (esperada) deste, resultante de um aumento da probabilidade de detecção e punição. Isto assumindo que ambas estas medidas resultam numa mesma penalidade (esperada), monetária ou monetarizável, sobre o infractor. Acresce que o investimento que o Estado teria que fazer para conseguir um aumento da probabilidade de detecção e punição de infractores, via aumento da vigilância policial e da eficácia do sistema judicial, é tipicamente superior ao investimento necessário à concretização de um agravamento das multas e outras penalidades (mesmo incluindo a prisão de infractores) com equivalente efeito dissuasor. No entanto, uma sociedade moderna impõe limites à gravidade das medidas punitivas por comportamentos anti-sociais, já que se procura manter uma proporcionalidade entre gravidade da infracção e respectiva punição. Assim, a dissuasão de comportamentos infractores acaba, inevitavelmente, por ser função não só da eficácia da actuação policial e judicial, como da 'eficácia' no processo de socialização de comportamentos, aos quais se associa, no caso da condução automóvel, a qualidade do sistema de atribuição de carta de condução.
Finalmente, seria desejável uma mais eficaz punição dos automobilistas que circulam sem o seguro automóvel obrigatório. Segundo o jornal PÚBLICO, cerca de 16.500 automobilistas em 2003, ou seja, uma média de 50 por dia, foram autuados nas estradas portuguesas por não possuírem esse seguro. Neste mesmo ano, foram gastos cerca de 25 milhões de euros de dinheiros públicos em indemnizações, por danos infligidos a terceiros por automobilistas sem seguro. Este montante foi pago através do denominado Fundo de Garantia Automóvel, formado pelas contribuições dos automobilistas segurados. Tudo isto significa que os automobilistas cumpridores subsidiam há muito os infractores. Estes, ou boa parte deles, conhecendo a situação, reagem duma forma 'racional', ou seja, optam por conduzir o seu automóvel privado sem seguro, numa ponderação de custos e benefícios. Ora, esta forma de subsídio indirecto ao automobilista prevaricador, é totalmente inaceitável. Seria importante que medidas penalizantes, preconizadas pelo Instituto de Seguros de Portugal, como a apreensão imediata de carta e de viatura ao automobilista não segurado, com um agravamento muito significativo das respectivas coimas, fossem implementadas com o novo Código. Quanto aos prevaricadores, seriam naturalmente desviados para o uso dos vários transportes públicos que, aliás, têm sofrido, nos últimos anos, um declínio preocupante no seu número de utentes.
Em síntese, o funcionamento de uma sociedade avalia-se, em boa parte, pela sua definição do que constitui um comportamento anti-social, e pela forma como este tipo de comportamento é sancionado. No que concerne ao comportamento de automobilistas, a sociedade portuguesa tem falhado, num misto de complacência e de incapacidade de actuação. Não é fácil estimar a gravidade que este falhanço representa.
JOÃO E. GATA, Público/Economia, 22 de Novembro de 2004

Tribunal Constitucional

Acórdão n.º 567/2004 - DR 275 SÉRIE II de 2004-11-23: Decide não declarar a inconstitucionalidade nem a ilegalidade das normas contidas nos artigos 83.º, 84.º, 85.º, 88.º e 89.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, aditadas pela Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto, e no artigo 3.º desta última lei.

Legislação do dia

Portaria n.º 1421/2004. DR 275 SÉRIE I-B de 2004-11-23
Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios da Defesa Nacional, das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional, da Ciência, Inovação e Ensino Superior, da Saúde e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações
Adopta as restrições básicas e fixa os níveis de referência relativos à exposição da população a campos electromagnéticos

segunda-feira, 22 de novembro de 2004

UNE DEMANDE EN SÉPARATION

- Mon client n'est pas un des maris présomptueux qui viennent se vanter devant vous d'avoir été trompés par leur femme, sans avoir autre chose que de vagues soupçons.... grâce au ciel nous avons des preuves... nous en avons à foison, et c'est le front levé et sans crainte d'un démenti, que monsieur peut annoncer hautement et en tout lieux... qu'il est... enfin ce qu'il est!....

Litografia de Honoré Daumier, da série Les beaux jours de la vie, publicada em Le Charivari, em 29/1/1845

Muitos Parabéns...

... ao Causa Nossa pelo seu 1.º Aniversário! Desde o seu aparecimento que a blogosfera nacional enriqueceu a olhos vistos pela pertinência, qualidade e seriedade da sua intervenção cívica e política. De leitura diária obrigatória, é para nós uma referência imprescindível. Parabéns!

Legislação do dia

Portaria n.º 1418/2004. DR 273 SÉRIE I-B de 2004-11-20 – Ministério da Agricultura, Pescas e Florestas: Altera o artigo 7.º do Regulamento sobre a Protecção das Obtenções Vegetais, aprovado pela Portaria n.º 940/90, de 4 de Outubro. Revoga a Portaria n.º 493/2001, de 11 de Maio

Portaria n.º 1419/2004. DR 273 SÉRIE I-B de 2004-11-20 – Ministério da Saúde: Regula o concurso de ingresso no internato médico com início em Janeiro de 2005, para efeitos de escolha do estabelecimento para a frequência do ano comum

Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2004. DR 274 SÉRIE I-B de 2004-11-22 – Presidência do Conselho de Ministros: Aprova a minuta do contrato de investimento e respectivos anexos a celebrar entre o Estado Português, a Infineon Technologies, AG, a Infineon Technologies Holding, BV, e a Infineon Technologies - Fabrico de Semicondutores, Portugal, S. A., para a realização de um projecto de investimento em Vila do Conde

Resolução do Conselho de Ministros n.º 170/2004. DR 274 SÉRIE I-B de 2004-11-22 – Presidência do Conselho de Ministros: Ratifica a alteração ao Regulamento do Plano Director Municipal de Alcácer do Sal

domingo, 21 de novembro de 2004

Casa da Suplicação IX


Tráfico de estupefacientes — tráfico de menor gravidade — matéria de facto — recurso para o Supremo Tribunal de Justiça
1 – Actualmente, quem pretenda impugnar um acórdão final do tribunal colectivo, de duas, uma: - se visar exclusivamente o reexame da matéria de direito, dirige o recurso directamente ao Supremo Tribunal de Justiça; - ou, se não visar exclusivamente o reexame da matéria de direito, dirige-o, «de facto e de direito», à Relação, caso em que da decisão desta, se não for «irrecorrível nos termos do art. 400.º», poderá depois recorrer para o STJ.
2 – Nesta hipótese, porém, o recurso – agora, puramente, de revista – terá que visar exclusivamente o reexame da decisão recorrida (a da Relação) em matéria de direito (com exclusão, por isso, dos eventuais vícios, processuais ou de facto, do julgamento de 1.ª instância), embora se admita que, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto ostensivamente insuficiente, fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias detectadas por iniciativa do Supremo para além do que tenha de aceitar-se já decidido definitivamente pela Relação, em último recurso, aquele se abstenha de conhecer do fundo da causa e ordene o reenvio nos termos processualmente estabelecidos.
3 – Para efeitos de qualificação/punição do crime de tráfico como de «menor gravidade», para além das quantidades traficadas ou em vias do o serem, a lei – artigo 25.º do DL n.º 15/93, de 22/1 – aponta claramente para outros índices de aferição da ilicitude, «nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade das plantas, substancias ou preparações», e só no fim, a «quantidade».
4 – Assim, não obstante a quantidade, olhada isoladamente, poder não constituir óbice à incriminação privilegiada do tráfico, tal não invalida a circunstância de todos os demais elementos daquela avaliação complexiva, a poderem excluir.
Ac. de 18.11.2004 do STJ, proc. n.º 3219/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Tráfico de estupefacientes — prisão preventiva — prazo — especial complexidade — declaração judicial
Reportando-se o procedimento a um dos crimes referidos no n.º 1 do art. 54.º do DL n.º 15/93, de 22/1, se deva considerar de 4 anos – independentemente da eventual declaração de «excepcional complexidade» do processo – o prazo de duração máxima da prisão preventiva dos arguidos já condenados em 1.ª instância, se bem que por sentença ainda não transitada, por um de tais crimes.
Ac. de 18.11.2004 do STJ, proc. n.º 4192/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Habeas Corpus — fundamentos — recurso
1 - O habeas corpus, tal como o configura a lei (art. 222.º do CPP), é uma providência extraordinária e expedita destinada a assegurar de forma especial o direito à liberdade constitucionalmente garantido e que tem, em sede de direito ordinário, como fundamentos, que se reconduzem todos à ilegalidade da prisão:
— a incompetência da entidade donde partiu a prisão;
— a motivação imprópria;
— o excesso de prazos.
2 - Para que possa merecer acolhimento o pedido de habeas corpus é ainda necessário que a ilegalidade da prisão seja actual, actualidade reportada ao momento em que é apreciado aquele pedido, como tem sido a jurisprudência constante e pacífica deste Supremo Tribunal de Justiça.
3 - O habeas corpus não é um recurso, mas um remédio excepcional, a ser utilizado quando falham as demais garantias defensivas do direito de liberdade, para estancar casos de detenção ou de prisão ilegais.
4 – Se o condenado discorda da aplicação que foi feita de perdão de pena, deveria ter recorrido ordinariamente e não socorrer-se do expediente de habeas corpus mais de anos depois do transito em julgado da decisão condenatória.
Ac. de 18.11.2004 do STJ, proc. n.º 4193/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

JUSTIÇA: OS PRIMEIROS SINAIS

Artigo de opinião de A. Lourenço Martins *, no Correio da Manhã de ontem (20/11):

1. Quando este Governo tomava posse e era conhecido o seu programa, escrevi algumas linhas de expectativa em que o Ministério da Justiça mudasse de “conteúdos” e de forma de fazer.
Decorridos cerca de quatro meses, quais são os primeiros sinais?
Alguns, positivos.
1.1. Desde logo, o tomar em mãos o Pacto de Regime para a Justiça, ideia adquirida, significa valorizar o esforço dos que trabalharam para o Congresso da Justiça, evitando que tenha sido uma jornada inútil. A discussão do Pacto com os representantes institucionais, sem privilégio para qualquer deles, será igualmente o caminho certo.
Também se mostra ajustado que o ministro da Justiça se faça rodear de uma equipa de missão, constituída por personalidades representativas do core das questões e não apenas os das formalidades.
Interessante será, porém, saber como vão estar ‘representados’ aqueles que não são os actores do sistema, mas que o usam e podem apontar as suas mazelas reais, para além da sua representação pela Assembleia da Republica.
1.2. Apesar do ‘ruído’ corporativo e dos votos passadistas, o ministro da Justiça agiu bem, e sem aparente subserviência a quaisquer interesses anómalos, quando nomeou para directora do Centro de Estudos Judiciários uma professora universitária. Alguém estranho às magistraturas mostra-se, à partida, em melhores condições para remediar as críticas sobre uma formação que tem veiculado para o interior dos tribunais visões residuais de arrogância, confundida com independência e de menos atenção às pessoas e aos interesse dos que em hora de conflito querem ‘depositar’ confiança em magistrados de rosto humano.
Parece que os ânimos se aquietaram... (permita-se o apelo a que a modernidade tecnológica e a discussão dos seus problemas deixe de ser um ‘fait divers’ no CEJ). Até porque,
1.3. Acaba de ser publicado (mais um) Plano de Acção para a Justiça na Sociedade da Informação, gizado em colaboração com a Unidade de Missão Inovação e Conhecimento e que pretende dar um impulso numa zona absolutamente prioritária.

2. Sinais não tão positivos parecem soprar para os lados da reforma do processo penal, posto que não seja ainda conhecida. Concentrar-se a mini-reforma no segredo de Justiça, na prisão preventiva e nas escutas telefónicas, como se o País continuasse a pensar apenas no processo ‘Casa Pia’, é uma visão redutora que não deve passar.
Há muitas outras questões a merecerem atenção como é o caso do regime dos recursos e das competências dos tribunais superiores.
Já é do domínio público a insatisfação crescentemente acumulada no Supremo Tribunal de Justiça, por nada ser feito em ordem a tornar mais racional a sua intervenção, sem perda de garantias dos arguidos. Um bom exemplo de necessidade de reforma urgente é o sistema actual de audiência oral, que não dignifica ninguém.
Senhor ministro, ouça também os magistrados do STJ e sentirá que a revisão tem de chegar lá. Em prol do cidadãos e não dos magistrados.

*Juiz Conselheiro do STJ (jub.)

Um dia de Novembro

A November day, de Frederick Ferdinand Schafer

Un día de noviembre (1968), de Leo Brouwer (Cuba, 1939)

sábado, 20 de novembro de 2004

DAQUI, DE MAPUTO

O PLURALISMO JURÍDICO NA CONSTITUIÇÃO

A nova Constituição da República de Moçambique, aprovada por unanimidade no dia 16 de Novembro, pela Assembleia da República, confere dignidade constitucional ao “pluralismo jurídico”, reconhecendo os vários sistemas normativos e de resolução de conflitos que coexistem na sociedade moçambicana, na medida em que não contrariem os valores e os princípios fundamentais da Constituição.

Um acórdão do Tribunal Supremo, de 13 de Maio de 2004

Síntese dos factos:
- F., casado segundo o direito costumeiro, vive na companhia das suas 5 mulheres, 15 filhos e outros dependentes menores, tendo do casamento com uma delas, D., nascido dois filhos;
- D. abandonou o lar e foi viver para a cidade da Beira, fugindo aos constantes maus tratos que F. lhe infligia, tendo levado consigo uma criança do sexo feminino;
- F. exigiu à família de D. que lhe trouxesse de volta a mulher e a filha, tendo o pai daquela ido à Beira, mas a criança faleceu de malária;
- F. exigiu, então, a devolução da sua filha com vida ou, caso contrário, a entrega de uma outra criança do sexo feminino a título de indemnização;
- A controvérsia foi, em 1998, decidida pelas autoridades tradicionais da zona de residência (Vilanculos), no sentido de que o pai de D. deveria entregar ao réu uma criança do sexo feminino para reparar a vida perdida, o que veio a acontecer com Q., menor de 6 anos, que deveria viver como uma mulheres de F. até que tivesse uma criança do sexo feminino, altura em que, considerada expiada a culpa da família de D., ficaria livre para voltar para casa dos pais;
- F. veio a ter relações sexuais com a menor, usando de violência, em Maio de 2001, quando ela tinha 9 anos de idade.

Foi condenado, na 1ª instância, como “autor do crime de violação de menor de 12 anos, p. e p. pelo artº 394º C.Penal”, na pena de 12 anos de prisão maior. O Tribunal Supremo confirmou a condenação, mas alterou a medida da pena aplicada ao arguido, tendo-a fixado em 8 anos de prisão maior.
Sobre os “circunstancialismos sócio-culturais antecedentes e concomitantes da prática do crime”, afirmou o acórdão que “a solução encontrada em sede de direito costumeiro é incompatível com valores e direitos fundamentais da criança consagrados na Constituição da República de Moçambique. Verifica-se, no presente caso, um conflito entre o que dispõe a lei e as práticas decorrentes da aplicação do direito costumeiro. Nele, hão-de prevalecer os ditames da constituição e das normas legais que melhor protegem os direitos e interesses da criança”.
E continua:
“A República de Moçambique é um Estado de Direito Social (artº1º da Constituição) e tem como objectivos fundamentais a edificação de uma sociedade de justiça social e a criação de bem-estar material e espiritual dos cidadãos (artº 6º.c), a defesa e a promoção dos direitos humanos e da igualdade dos cidadãos perante a lei (artº 6º b). Por tal razão, as normas e práticas sócio-culturais que conflituam com tais valores perdem qualquer base de sustentabilidade, mesmo face ao princípio constitucional da afirmação da personalidade moçambicana, das suas tradições e demais valores sócio-culturais (artº 6º g) da lei fundamental)”.
“A Constituição garante a protecção e educação da criança (artº 56), não podendo esta ser afastada do lar paterno a não ser nos casos permitidos na lei, sempre tendo em vista o melhor interesse da criança”.
“No caso em apreço, Q. foi coagida a abandonar o lar paterno para servir de objecto de reprodução e, sobretudo, a viver num estado de violência e de servidão”.
“A decisão das autoridades tradicionais entra em confronto directo igualmente com as disposições dos artigos 3º da Convenção dos Direitos da Criança e dos artigos 8º, 23º e 24º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos”.
“Assim, deve Q. ser devolvida ao lar paterno sem quaisquer condições, devendo o tribunal de 1ª instância e as autoridades administrativas competentes cumprir e fazer cumprir o que aqui se determina”.


Assinam o acórdão os Juízes Conselheiros Luís António Mondlane e José Norberto Carrilho.


Maputo, 20 de Novembro de 2004

sexta-feira, 19 de novembro de 2004

Conselheiro ou as inimigas da (juris)prudência

(...) O conselheiro há-se ser prudente e secreto, sábio e velho, amigo e sem vícios, não cabeçudo, nem temerário, nem furioso. Quatro inimigas tem a prudência: primeira, precipitação; segunda, paixão; terceira, obstinação; quarta, vaidade. A primeira arrisca, a segunda cega, a terceira fecha a porta à razão, a quarta tudo tisna (...)

[in Arte de Furtar, atribuída ao Padre António Vieira ] (envio amigo do CM)

DAQUI, DE MAPUTO

ASSOCIAÇÃO MOÇAMBICANA DE JUIZES

Teve lugar na tarde de hoje, no Centro de Formação Jurídica e Judiciária, a Cerimónia de Constituição da Associação Moçambicana de Juízes.
A Presidente da Direcção é a Juíza do Tribunal Provincial de Maputo, Drª Vitalina Papadakis, a quem aqui reitero as minhas felicitações.
Mais um passo importante na consolidação do sistema judicial moçambicano.

Maputo, 19 de Novembro de 2004

Direcção Central de Combate ao Banditismo da Directoria Nacional da Polícia Judiciária

Por Despacho de 5-11-2004 do Ministro da Justiça, foi nomeado director nacional-adjunto da Direcção Central de Combate ao Banditismo da Directoria Nacional da Polícia Judiciária o juiz desembargador auxiliar Agostinho Soares Torres, "possuidor de reconhecidas aptidão e experiência profissionais, adequadas ao exercício das referidas funções".

LA PRESIDENTA DEL TC CRITICA LA UTILIZACIÓN DEL RECURSO DE AMPARO COMO UNA TERCERA INSTANCIA

La presidenta del Tribunal Constitucional (TC), María Emilia Casas Baamonde, asegura en una entrevista que se ha perdido el carácter extraordinario del recurso de amparo, lo que le llevó a criticar que se utilice el mismo "como una tercera instancia". En la primera entrevista que concede, explica que "es posible que durante estos años de funcionamiento del Tribunal se haya perdido de vista ese carácter extraordinario del recurso de amparo (...) Lo cierto es que el número de recursos de amparo planteados es elevadísimo, sobre todo si nos atenemos al alto porcentaje de los mismos que son inadmitidos, lo cual puede reflejar una comprensión errónea del significado del recurso de amparo y una utilización del mismo como una tercera instancia".

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EL TRIBUNAL DE ESTRASBURGO CONDENA A LA ADMINISTRACIÓN A COMPENSAR A UNA CIUDADANA VALENCIANA POR EL RUIDO DE DISCOTECAS

El Tribunal Europeo de Derechos Humanos de Estrasburgo ha condenado a las autoridades españolas a pagar a una ciudadana de Valencia la cantidad de 3.884 € por daños y 4.500 € en concepto de gastos del proceso por haber permitido la apertura de locales nocturnos cerca de su domicilio, lo que ha perturbado su descanso en los últimos años.

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Ou aqui para ler o texto da decisão (obrigado a AC pela dica)

quinta-feira, 18 de novembro de 2004

Pena de multa e idade do arguido

1. O Supremo Tribunal de Justiça (Ac. de 4.11.2004 Proc. n.º 3502/04-5 Rel. Cons. Simas Santos, com sumário aqui na Casa da Suplicação) entendeu que, quando o Tribunal da condenação tenha optado, nos termos do art. 70.º do C. Penal, pela pena de multa, se esta for fixada em medida não superior a 6 meses, pode substitui-la por multa ou outra pena não privativa da liberdade, e argumentou assim:

«Sustenta o recorrente que a sua condenação na pena de prisão efectiva de 6 meses, pela prática do crime de detenção ilegal de arma de defesa, considerando o mau estado da arma e a sua não utilização, está em desconformidade com o art. 44.º, n.º 1 do CP que impõe a sua substituição pela pena de multa (conclusão 1.ª).
Mas o certo é que o crime em causa é punido em alternativa com prisão ou multa, o que impunha ao tribunal da condenação a ponderação da opção a que se refere o art. 70.º do C. Penal.
Percurso que a decisão recorrida seguiu. Com efeito, decidiu a esse propósito:
«Feito pela forma descrita o enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido importa, agora, determinar a escolha e medida da sanção a aplicar quanto ao crime de detenção ilegal de arma de defesa, sendo certo que, nos termos do preceituado no art. 70º do C. Penal, o tribunal deve dar preferência a uma pena não privativa de liberdade quando estatuída em alternativa à pena de prisão.
Consabidamente o critério geral de esco­lha da pena radica exclusivamente em exigências de prevenção (geral ou especial), centrando-se, agora, a função da culpa na determinação da medida da pena.
Sendo notória a elevada taxa deste tipo de criminalidade e a necessidade de satisfação do interesse geral de restabelecer a segurança da comunidade, também a personalidade agressiva e conflituante do arguido, apesar da ausência de antecedentes criminais, aliada ao uso gravíssimo que faz de instrumentos perigosos, como foi o caso da roçadora, sem que disso se mostre arrependido, acrescendo à falta de manifesto e registado da arma a inexistência de licença de uso e porte, desaconselham a opção pela pena de multa.»

Mas o recorrente não contestou esta opção da decisão recorrida. Parece antes que, aceitando embora a opção pela pena de prisão à luz do art. 70.º do C. Penal, pretende que a pena de prisão deveria ter sido, no entanto, substituída por multa, nos termos do art. 44.º, por ter sido fixada em medida não superior a 6 meses de prisão.
Dispõe com efeito este artigo, sobre a substituição da pena curta de prisão, que a pena de prisão aplicada em medida não superior a 6 meses é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir a prática de futuros crimes (n.º 1), sendo correspondentemente aplicável o disposto no art. 47.º [a pena de multa é fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos no n.º 1 do artigo 71.º, sendo, em regra, o limite mínimo de 10 e o máximo de 360 (n.º 1) e cada dia de multa corresponde a uma quantia entre 200$00 e 100.000$00, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais (n.º 2]].
Importa reter ainda que, de acordo com o falado art. 70.º, se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, que são a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (n.º 1 do art. 40.º).
Da consideração conjunta deste normativos resulta que, em caso de pena alternativa, a opção pela pena de multa deve ter lugar sempre que esta proteger suficientemente os bens jurídicos em causa e a reintegração do agente na sociedade (factor positivo de decisão), enquanto que a pena curta de prisão aplicada (não superior a 6 meses) é necessariamente substituída por pena de multa ou, sublinhe-se por outra pena não privativa da liberdade aplicável, salvo se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir a prática de futuros crimes (factor negativo de exclusão).
Ora, esta diversidade de regimes aponta no sentido de que, embora o Tribunal tenha optado, nos termos do art. 70.º do C. Penal, pela pena de multa, se esta for fixada em medida não superior a 6 meses, pode substitui-la por multa ou outra pena não privativa da liberdade.
Neste sentido se pronunciam Leal-Henriques e Simas Santos (Código Penal Anotado, I, 602):
«No domínio do texto de 1982, escrevemos que se podia questionar sobre a aplicabilidade deste artigo quando se trate de crimes punidos com prisão ou multa, dado o teor do art. 71.º (agora 70.º).
Dispõe esse normativo que, em tais casos, o Tribunal deve dar preferência fundamentada à pena não privativa de liberdade «sempre que ela se mostre suficiente para promover a recuperação social do delinquente e satisfaça as exigências de reprovação e de prevenção do crime ».
Deve perguntar-se, pois, se, tendo o juiz optado nos termos do art. 71.º (agora 70.º) pela pena privativa da liberdade, pode depois substituir a pena de prisão que aplique (desde que não superior a 6 meses) por multa.
A resposta parece dever ser afirmativa, pese embora a contradição que aparentemente gera. Na verdade, no art. 70.º reage-se contra as penas de prisão independentemente da sua medida, enquanto o art. 43.º (agora 44.º) só se dirige à pena aplicada em concreto, em medida não superior a 6 meses.
Ou seja: reage-se contra as curtas penas de prisão, como agora reza impressivamente a epígrafe do artigo.
Depois, enquanto o art. 71.º (agora 70.º) faz apelo à recuperação social, à reprovação e à prevenção geral e especial como elementos a atender pelo Juiz na sua opção, o art. 44.º impõe a substituição (a não ser que razões de prevenção geral o desaconselhem).
Pode, pois, acontecer que, por razões de prevenção especial, o Juiz, tendo opta pela pena de prisão, venha a fixar pena não superior a 6 meses quando se não perfilem especiais motivações de prevenção geral que obstem à substituição.
Perante o novo texto, entendemos ser de subscrever o mesmo entendimento para que parece apontar igualmente a assinalada alteração da epígrafe


2. No mesmo acórdão teve a idade avançada do arguido (no caso 77 anos) como uma atenuante num caso de homicídio tentado e reduziu a pena de 7 anos para 5 anos e 6 meses.
Apresentou, para tanto, a seguinte argumentação:
«A esta luz, impõe-se concluir que a pena concreta fixada (7 anos de prisão) e que o recorrente contesta, se situa dentro da sub–moldura a que se fez referência e que foram sopesados os elementos de facto que se salientaram, salvo um.
Referimo-nos à idade do recorrente (77 anos), conjugada com a falta de antecedentes criminais.
Essa circunstância, como sustentou o Ministério Público em alegações orais perante este Tribunal, não sendo hoje fundamento de atenuação especial da pena, deve funcionar como factor de atenuação geral.
Como se viu, o art. 71.º do C. Penal manda atender à culpa, às condições pessoais do agente e à sua conduta anterior ao facto, o que aconteceu, mas em medida insuficiente.
Com efeito, o Código Penal de 1886 previa como circunstância atenuante da responsabilidade criminal do agente o «ser menor de catorze (sendo punível), dezoito ou vinte e um anos, ou maior de setenta anos» (art. 39.º, circunstância 3.ª) (sublinhado agora), com atenuação especial nos art.ºs 107.º (menores de 21 anos) e 108.º (menores de 18 anos)
Escrevia, a propósito Maia Gonçalves (Código Penal Anotado, 3.º Ed., 1977, pág. 118) que é «uma circunstância de natureza pessoal, baseada em diminuição de culpa» (cfr. Ac. do STJ de 31.8.61, BMJ 107-432).
E Eduardo Correia: «compreende-se que uma idade avançada, fazendo voltar como que a uma segunda infância, produza sobre a imputabilidade efectivas consequências. Por isso, se manda atenuar a pena quando se é maior de setenta anos.» (Direito Criminal, II, 382). O mesmo Autor acrescentara anteriormente: «possível é também, a consideração de que é uma circunstância de ter mais de setenta anos exige uma maior benevolência pelo respeito devido aos velhos. A entender-se, todavia, assim, como parece ser mais razoável, será o momento do julgamento, e não da prática do crime que determina a possibilidade de atenuação.» (Apontamentos Sobre as Penas e sua Graduação no Direito Criminal Português, Coimbra, 1953, págs. 296-7).
Pode ainda dizer-se que a idade superior ao 70 anos, dá um outro e muito mais majorado sentido ao tempo de encarceramento, dado o limitado tempo de vida previsível.
O não ter sido indicada expressamente esta circunstância como atenuante no texto do C. Penal, mercê da nova técnica utilizada a propósito, não lhe retira actualmente o valor atenuativo que acima se analisou.
Neste sentido se pronunciou já este Supremo Tribunal de Justiça no Ac. de 8.7.2003, proc. n.º 2155/03-5, com o mesmo Relator (cfr. sobre esta problemática os Acs. 27.3.2003, proc. n.º 513/03-5, Relator: Cons. Santos Carvalho, de 22.4.04, proc. n.º 224/04-5 e de 11.12.2003, proc. n.º 2152/03-5, Relator: Cons. Rodrigues da Costa, de 5.5.04-3, proc. n.º 1130/04-3, Relator: Cons. Silva Flor e de 29.9.04, proc. nº 2695/04-3, Relator: Cons. Silva Flor)
Assim, considera-se que a pena já adequada à culpa atendendo ao maior valor que se atribuiu à circunstância de o arguido ter 77, sem antecedentes criminais, se situa num patamar mais baixo dos 7 anos estabelecidos pela decisão recorrida e que constituem a pena ainda adequada à culpa, ou seja nos 5 anos e 6 meses de prisão.»
Quid iuris?

Legislação do dia

Aviso n.º 169/2004. DR 271 SÉRIE I-A de 2004-11-18 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Torna público ter o Secretariado Geral do Conselho da União Europeia notificado, por nota de 1 de Outubro de 2004, terem a Lituânia, a República Checa, a República Eslovaca, a Hungria, a Letónia, a Polónia, Chipre e Malta concluído as formalidades necessárias para a entrada em vigor do Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia relativo à interpretação a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia, assinada em Bruxelas em 24 de Julho de 1996

Aviso n.º 170/2004. DR 271 SÉRIE I-A de 2004-11-18 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Torna público ter o Secretariado Geral do Conselho da União Europeia notificado, por nota de 1 de Outubro de 2004, terem a Lituânia, a República Checa, a República Eslovaca, a Eslovénia, a Hungria, a Letónia, a Polónia, Chipre e Malta concluído as formalidades necessárias para a entrada em vigor do Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia e no artigo 41.º, n.º 3, da Convenção Europol relativo aos Privilégios e Imunidades da Europol, dos Membros dos Seus Órgãos, dos Seus Directores-Adjuntos e Agentes, assinado em Bruxelas em 19 de Junho de 1997

Decreto-Lei n.º 221/2004. DR 271 SÉRIE I-A de 2004-11-18 – Ministério da Administração Interna: Define condições excepcionais para o transporte particular de trabalhadores agrícolas

Quand le crime ne donne pas...


Litografia de Honoré Daumier, publicada em 31/10/1848, em Le Charivari (Série Les gens de justice)
(para aumentar a imagem, clique nela)

quarta-feira, 17 de novembro de 2004

Vozes da História do Direito

COSTA, Afonso (1871-1937), Commentario ao codigo penal portuguez : introdução : escolas e pricipios de criminologia moderna / Affonso Costa - Coimbra : Impr. da Universidade, 1895, 341 p.

Legislação do dia

Resolução do Conselho de Ministros n.º 168/2004. DR 270 SÉRIE I-B de 2004-11-17 – Presidência do Conselho de Ministros: Cria, na dependência do Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho e do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, uma estrutura de missão com a finalidade de assegurar a avaliação da refinaria de Matosinhos da Galp Energia e de propor ao Governo um modelo de actuação relativamente ao destino futuro da refinaria

Declaração n.º 17/2004. DR 270 SÉRIE I-B de 2004-11-17 – Ministério das Finanças e da Administração Pública - Direcção-Geral do Orçamento: Publica os mapas I a IX da Lei do Orçamento do Estado de 2004, modificados pelas alterações orçamentais efectuadas no 3.º trimestre

terça-feira, 16 de novembro de 2004

Legislação do dia

Decreto do Presidente da República n.º 79/2004. DR 269 SÉRIE I-A de 2004-11-16 – Presidência da República: Ratifica as emendas aos artigos 7.º, 24.º, 25.º e 74.º da Constituição da Organização Mundial de Saúde, adoptadas em Genebra, respectivamente em 1965, 1998 e 1978, no decurso da 18.ª, 51.ª e 31.ª sessões da Assembleia Mundial de Saúde

Decreto do Presidente da República n.º 80/2004. DR 269 SÉRIE I-A de 2004-11-16 – Presidência da República: Ratifica a Concordata entre a República Portuguesa e a Santa Sé, assinada em 18 de Maio de 2004 na cidade do Vaticano

Resolução da Assembleia da República n.º 73/2004. DR 269 SÉRIE I-A de 2004-11-16 – Assembleia da República: Aprova, para ratificação, as emendas aos artigos 7.º, 24.º, 25.º e 74.º da Constituição da Organização Mundial de Saúde, adoptadas em Genebra, respectivamente em 1965, 1998 e 1978, no decurso das 18.ª, 51.ª e 31.ª sessões da Assembleia Mundial de Saúde

Resolução da Assembleia da República n.º 74/2004. DR 269 SÉRIE I-A de 2004-11-16 – Assembleia da República: Aprova, para ratificação, a Concordata entre a República Portuguesa e a Santa Sé, assinada em 18 de Maio de 2004 na cidade do Vaticano

A justiça e a doença

Seria interessante analisar a luta pelo protagonismo judiciário na comunicação social nestes últimos anos. É uma luta em que cada um fala de interesses próprios, mas parecendo que assume o rosto universal da Justiça (decididamente com maiúscula). Aliás, arvorando-se mesmo em paladino dessa mesma Justiça que diz representar de forma particularmente generosa e altruísta, despido de estreitezas corporativas, ainda quando ataque as outras «famílias» judiciárias, elas sim eivadas desse corporativismo estreito. Só quem fala de um lugar assim «abrangente», desinteressado e coincidente com o interesse geral reveste as características necessárias para merecer crédito, como se sabe. Os interesses particulares que se querem promover sempre se mascararam com a representação do interesse geral.
Na presente conjuntura, são os advogados quem está ou pretende estar na dianteira desse protagonismo. Já foram outras profissões judiciárias: o Ministério Público, os juízes, etc.
O que é curioso é ver como cada qual aparece como o salvador de um sistema em crise, do qual, ao mesmo tempo, se exclui da respectiva responsabilidade. Assim é que, a par das tradicionais «chapeladas» à comunicação social, sempre digna da maior consideração (não fosse ela o palco onde cada um se exibe em nome do tal interesse geral do país, da democracia e do povo português), abundam ultimamente as metáforas de doença, que supostamente ulceram e mesmo paralisam o corpo da Justiça. E transparece dos discursos que se produzem o desejo afirmado de acudir instantemente ao referido corpo enfermo e já em vias de passamento para o outro mundo, isto é, para o nada. Como é evidente, os produtores desse discurso é que reúnem as condições ideais para serem os médicos de excelência que hão-de restituir a saúde e mesmo a vida ao corpo moribundo da Justiça. Daí que na Ordem dos Advogados, agora em fase de luta eleitoral, resida a principal força motriz da mudança, isto é, para usar metáforas equivalentes, o principal estabelecimento clínico de cura.

Artur Costa

segunda-feira, 15 de novembro de 2004

Os discursos... e a realidade


Reportando-se ao acto de posse de um novo Vice-presidente do STJ, o site do STJ insere mais um discurso do seu Presidente, Conselheiro Aragão Seia (que aqui também se pode ler).
Diz-se mais um, porque o site é como se fosse pertença do Senhor Presidente, uma vez que ninguém mais aí tem voz; nem mesmo na abertura do Ano Judicial se abre a cortesia para inserir os discursos dos convidados, as mais altas figuras institucionais da Democracia.
Só quem tenha passado, ou vá passando, ao lado do STJ não se apercebe como as referências que no discurso se fazem à colaboração dos vice-presidentes – com todo o respeito pelas Venerandos Magistrados em causa – estão próximas de uma figura de retórica, remetidos que têm sido para actos de representação protocolar ou paralelos, sem qualquer cooperação num “programa” de vitalização que permitisse ao STJ assumir-se como o Tribunal de cúpula na organização judiciária comum.
O discurso é algo incongruente quando receia para breve os “ventos de agitação na área da Justiça”, que as reformas atinjam a “independência do judiciário” (sic) e tenham apenas o intuito de “domesticar e funcionalizar” as magistraturas, mas ao mesmo tempo acaba por as reconhecer, à contre coeur, como necessárias.
Duvida-se que algum magistrado atento se reveja nesta linguagem “doméstica” – nem tão pouco na que foi usada a propósito da formação, há uns dias. A generalidade dos magistrados desincumbem-se do seu munus, com liberdade e independência, e não têm receio de os restantes poderes democráticos, para os quais dão a sua quota-parte, os reduzirem à escravatura de consciência. Não só porque as suas vozes também serão ouvidas como porque as grilhetas acabaram.
Nem é coerente apelar à transparência de processos e à colaboração, pois basta recordar o que tem acontecido nos últimos anos na cooperação institucional que alguns magistrados do STJ ingenuamente têm dado e o proveito que daí se recolheu, em matérias, por exemplo, como a onerosa construção das bases de dados de jurisprudência, o seu uso racional intensivo, a discussão de problemas importantes no interior do Conselho Consultivo, a sequência dada a sugestões de alteração legislativa, etc., para se ver como também aqui a distância entre o discurso e a realidade é enorme.
Nem está esquecida a falta de colaboração do STJ com o próprio Congresso da Justiça.
O Presidente da República reafirmava que na democracia de opinião em que vivemos, a reforma da Justiça é condição essencial para que haja uma cidadania suficiente. E nas “urgências” de intervenção insistia nos temas da “melhor legitimação democrática das magistraturas e da sua responsabilização”, da “estrutura e atribuições dos tribunais superiores”, da formação dos agentes da Justiça, do “regime de recursos”, a par do reforço, na fase de inquérito, dos direitos de arguidos e das vítimas.
Não é desejável o unanimismo entre os órgãos de soberania, mas um mínimo de sintonia no desejo de mudanças na Justiça era necessário.
Coloca-se este post também para dizer que não existe unanimismo com este discurso.

PS – Acabo de ver que o Blog “Abrupto” vai ser premiado pelo Forum III Millennium, o que é bem revelador do peso que este tipo de participação social vai conquistando.

Coito oral e cópula: duas violações?

Com a alteração introduzida ao art. 164.º do C. Penal, pela Lei n.º 65/98 de 2 de Setembro, o coito anal e o coito oral passaram a integrar, ao lado da cópula, os modos de execução do crime de violação.
O que coloca a questão de saber se se mantém a jurisprudência anterior que entendia que o coito anal e oral ocorrido numa violação eram punidos, como atentado ao pudor, em concluso real com a violação.
O Supremo Tribunal de Justiça respondeu afirmativamente no acórdão de 11.11.2004 (proc. n.º 3259/04-5, Relator: Cons. Simas Santos), cujo sumário foi aqui divulgado (Casa da Suplicação VIII).
Argumentou-se então:
«Quando o coito oral e anal não integravam o tipo da violação, mas integravam antes o atentado ao pudor com violência, era uniforme a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que: «(1) nos últimos anos começou a criar-se um movimento jurisprudencial no sentido de conceder autonomia punitiva às diferentes condutas de natureza sexual de que é vítima uma determinada pessoa, mesmo quando os actos são praticados na sequência de uma conduta, prolongada no tempo, sim, mas circunscrita a um intervalo temporal relativamente reduzido. (2) - Mas, semelhante ao que sucede com o roubo, quando haja condutas enquadráveis nas figuras da violação e do atentado ao pudor, deverá entender-se que serão consumidos pelo crime de violação os actos necessários para a sua prática, mesmo quando possam ser considerados como correspondentes a crimes de atentado ao pudor, mas que, tais casos passarão a contribuir a comissão de crime autónomo de atentado ao pudor quando não tenham qualquer relação com o de violação, ou se mostrem desnecessários para a sua normal consumação. (3) Se à «cópula» bocal com a menor se seguiu a violação, então verifica-se o concurso real entre os dois crimes (Ac. do STJ de 14.10.93, proc. nº 45177, já em 9.11.83, BMJ 331-229, se afirmava que «continua a justificar-se a autonomização do crime de atentado ao pudor relativamente à violação, pois se trata de interesses juridicamente diferentes»).
Neste sentido se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça ainda nos Acs de 12.11.86, BMJ 361-259 , de 23.5.90, BMJ 397-232, de 13.2.91, BMJ 404-218, de 20.3.91, AJ n.º 17 e BMJ 405-209; de 24.11.93, proc. n.º 45532; de 17.6.92, proc. n.º 42688; de 28.2.96, proc. n.º 48589; de 17.10.96, proc. n.º 568/96, de 20.2.97, Acs STJ V, 1, 227; de 20.3.97, proc. n.º 1315/96; de 17.9.97, proc. n.º 616/97, de 30.7.98, proc. n.º 693/98, de 29.10.98, proc. n.º 538/98, de 30.7.98, proc. n.º 693/98; de 29.10.98, proc. n.º 538/98; de 30.7.98, proc. n.º 693/98; de 29.10.98, proc. n.º 538/98.
Com a redacção dada ao art. 164.º do C. Penal, pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro, o coito anal ou o coito oral passaram a integrar o tipo de violação, ao lado da cópula.
O que não alterou, só por si, aquela jurisprudência assente.
Desde logo, pretendeu-se aumentar a protecção do bem jurídico em causa, agravando assim a sanção para o coito oral ou anal, por meio de violência, ameaça grave ou abuso de autoridade, e não diminui-la, como resultaria do abandono daquela posição jurisprudencial.
Depois, a razão de ser desta posição mantém-se. O processo executivo, em qualquer dos três meios agora previstos (coito oral, coito anal, cópula), pressupõe motivação diversa e decisões autónomas, para cada um deles. Da mesma forma não é o mesmo o desvalor de resultado em cada um dos casos, por forma a que se possa falar em mera repetição mecânica imediata de uma mesma agressão.
Cada um daqueles meios implicando para o ofendido uma diferente intromissão e compressão da sua liberdade e autodeterminação sexual, bem como da sua intimidade sexual. E para o agente uma nova formulação de vontade.»
Mas será assim ?

Regulamentação da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais

Lê-se aqui:

O regime de Acesso ao Direito e aos Tribunais, aprovado pela Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, foi regulamentado pelas Portarias n.ºs 1085-A/2004 e 1085-B/2004, de 31 de Agosto, e n.º 1386/2004, de 10 de Novembro. O regime de acesso ao direito e aos tribunais e a respectiva regulamentação produzem efeitos a partir de 1 de Setembro de 2004.

A Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 91/2004, de 21 de Outubro, concretiza os critérios de prova e de apreciação da insuficiência económica do requerente previstos na Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais).
Esta portaria explicita a fórmula de cálculo do valor do rendimento relevante para efeitos de protecção jurídica a que se refere a Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais. A mencionada fórmula tem em conta os elementos relativos ao rendimento, ao património e à despesa do agregado familiar do requerente, assim permitindo uma avaliação objectiva e transparente da sua capacidade de pagamento.
A portaria enuncia ainda os documentos que devem ser juntos com o requerimento de protecção jurídica e estabelece regras quanto à periodicidade da liquidação e ao montante final a liquidar quando tenha sido concedido apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado.
É também regulamentado o mandato dos membros da comissão competente para a apreciação dos pedidos de protecção jurídica prevista no n.º 2 do artigo 20.º da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais e são definidas regras quanto ao procedimento de decisão.

A Portaria n.º 1085-B/2004, de 31 de Agosto, aprova os formulários de requerimento de protecção jurídica para as pessoas singulares e para as pessoas colectivas ou equiparadas, revogando, em consequência, a Portaria n.º 140/2002, de 12 de Fevereiro.

A Portaria n.º 1386/2004, de 10 de Novembro, define os termos em que o Estado garante a remuneração dos profissionais forenses, incluindo os solicitadores, pelos serviços prestados no âmbito do patrocínio oficioso e o reembolso das respectivas despesas.
É, em consequência, revogada a Portaria n.º 150/2002, de 19 de Fevereiro.
O regime de remuneração ora aprovado corresponde, no essencial, ao previsto na Portaria n.º 150/2002, de 19 de Fevereiro, conforme expressamente assumido no respectivo preâmbulo.
São, no entanto, introduzidas alterações pontuais àquele diploma, tendo por fito adequar o modelo de remuneração dos profissionais forenses ao regime de acesso ao direito e aos tribunais em vigor. Assim:
(a) Prevê-se o pagamento de honorários no montante de uma unidade de referência pela consulta jurídica prestada para efeitos de apreciação da existência de fundamento legal da pretensão;
(b) Estabelece-se que a remuneração referida na alínea anterior é acrescida de honorários no montante de cinco unidades de referência sempre que, em sede de consulta jurídica, o profissional forense alcance a superação do litígio por transacção ou por meios alternativos de resolução de litígios;
(c) Adequa-se a terminologia constante de alguns números da tabela anexa à presente portaria à usada em legislação em vigor (por ex., “processo sumaríssimo” passa a “processo sumaríssimo e acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias; “acção executiva ordinária e sumária” passa a “acção executiva, etc.);
(d) Alarga-se a regra relativa ao valor dos honorários a atribuir em caso de superação do litígio por transacção judicial às situações em que haja desistência, confissão, transacção ou impossibilidade superveniente da lide antes do fim da audiência de julgamento. Nestes casos, porém, o juiz pode decidir, tendo em consideração o trabalho prestado pelo profissional forense, a redução, até metade, dos honorários previstos na tabela anexa à portaria. A regra ora instituída aplica-se também aos casos em que o profissional forense alcance, durante a pendência da acção judicial, a superação do litígio por meios alternativos;
(e) Procede-se ainda à reestruturação formal da portaria.
De acordo com o disposto no preâmbulo da presente portaria, a publicação deste diploma regulamentar não prejudica a continuação do estudo de um novo modelo de remuneração dos profissionais forenses.
A Portaria n.º 1386/2004, de 10 de Novembro, entra em vigor em 11 de Novembro de 2004 e produz efeitos desde 1 de Setembro último.

Um advogado e uma cliente


Honore Daumier, A Lawyer with His Client (c. 1862)
Crayon and watercolor on paper
Staatsgalerie, Stuttgart, Germany

Direitos Humanos na Administração da Justiça - Conduta profissional (II)

Princípios Orientadores Relativos à Função dos Magistrados do Ministério Público

Adoptados pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de Setembro de 1990.

Podem se consultados aqui.

Concurso de provas públicas para a atribuição do título de notário

Ver aqui a lista dos candidatos admitidos e excluídos do concurso de provas públicas para a atribuição do título de notário.

Legislação do dia

Portaria n.º 1402/2004. DR 267 SÉRIE I-B de 2004-11-13 – Ministérios das Finanças e da Administração Pública e das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional : Fixa os factores de correcção extraordinária das rendas para vigorar em 2005

Aviso n.º 168/2004. DR 268 SÉRIE I-A de 2004-11-15 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Torna público ter o Secretariado-Geral do Conselho da União Europeia transmitido por nota verbal de 30 de Setembro de 2004 a acta de rectificação do Acordo de Parceria entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico e a Comunidade Europeia e os Seus Estados Membros, assinado em Cotonou em 23 de Junho de 2000 (Acordo de Cotonou), assinada em Bruxelas em 28 de Julho de 2004

domingo, 14 de novembro de 2004

Pacto para a Justiça e Contencioso

Artigo de opinião de A. Leones Dantas
Procurador-geral adjunto
no DN de hoje:

1 - Há muito que se tornou evidente a necessidade de um verdadeiro encontro de vontades entre as principais forças políticas que potencie um denominador comum para a área da justiça, pelo que todos esperam que o projectado Pacto para a Justiça seja mesmo o ponto de viragem de alguns dos mais graves problemas que afectam este sector.
Começam já a delinear-se temas que poderão ser incluídos nesse pacto e alguns deles não deixam de causar sérias preocupações.
Se através daquele pacto se procura dar resposta aos mais graves problemas que afectam esta área, não deixa de ser estranho que ali se venham a incluir assuntos que nada têm a ver com a chamada crise da justiça.
Um desses temas é o do Contencioso do Estado.
Há séculos que a defesa dos interesses materiais do Estado nos tribunais (vulgo advocacia do Estado) está em Portugal entregue ao Ministério Público. De facto, já desde a Idade Média que a defesa daqueles interesses está a cargo de uma instituição pública que é a origem do actual Ministério Público.
Foi com as reformas liberais que aquela magistratura veio a assumir as competências mais significativas que hoje tem no universo criminal, mas essas competências acabaram por ser atribuídas a uma instituição preexistente, não tendo justificado a criação de um novo serviço. A solução em vigor tem funcionado razoavelmente e não pode, de boa-fé, dizer-se que não assegure uma boa defesa dos interesses do Estado.
Integra, hoje, uma parte relativamente pequena do serviço global do Ministério Público, por norma acumulada com as outras tarefas que os magistrados asseguram, e é francamente exíguo o número de magistrados que estão afectos exclusivamente a este serviço. A intervenção nesta área apoia-se na dedicação dos magistrados e num controlo relativamente apertado da hierarquia, o que garante a segurança e a qualidade do serviço prestado.
Estão diagnosticadas e previstas no Estatuto do Ministério Público, desde 1998, algumas soluções que poderiam melhorar ainda a qualidade do trabalho levado a cabo, mas que não passaram de letra morta, compreendendo-se agora melhor o porquê desta situação.

2 - Pois, apesar de o Contencioso do Estado em nada ter contribuído para a chamada crise da justiça, e apesar de o interesse público continuar a ser razoavelmente assegurado pelos magistrados do Ministério Público, projecta-se a alteração deste estado de coisas e a atribuição a advogados da responsabilidade por esta intervenção processual, a coberto da alteração das atribuições daquela magistratura
Diz-se que somos o único país da Europa que adopta esta solução e que os magistrados do Ministério Público, em nome da sua autonomia, não podem receber ordens e instruções do Estado e das outras entidades públicas para defender os interesses destes nos tribunais!...
Quanto à originalidade da solução portuguesa, que é um facto, o que se deve discutir é se ela funciona ou não, e, caso não funcione, devem averiguar-se as causas e procurar alternativas.
No que se refere à aparente contradição entre a autonomia do Ministério Público e a natureza de direito privado dos interesses do Estado, importa que se diga que, sendo os interesses de direito privado, a disponibilidade dos mesmos cabe à Administração, não podendo os magistrados substituir-se àquela nas opções que entenda tomar.
O que o Ministério Público não pode é dar prossecução a pretensões ilegais da administração, aliás, tal como os advogados, pelo que nunca aquela magistratura teria o dever de dar apoio a pretensões que contrariem a lei e a consciência jurídica dos magistrados. Não existe, pois, qualquer contradição entre a qualidade de magistrado e a natureza privada e consequentemente disponível dos interesses em causa. É, aliás, nesta base, sem atropelo dos princípios, que as coisas têm funcionado desde 1978 - com a actual legislação orgânica do Ministério Público.
Diz-se ainda que a concentração dos magistrados do Ministério Público na área penal corresponderia a um aumento de quadros naquela que é considerada a área prioritária do serviço desta magistratura.
Tal como acima já se disse, a defesa do Estado não justifica a exclusividade dos magistrados nesta tarefa, uma vez que ela é assumida no âmbito das outras funções prosseguidas. Daí que da alteração projectada não resultem quaisquer economias de meios humanos.

3 - Se o Contencioso do Estado não é um problema no mundo dos problemas da justiça em Portugal, e se a solução actual não representa um encargo, já que as tarefas são assumidas no âmbito das atribuições gerais dos magistrados do Ministério Público, pode perguntar-se quais os interesses que justificam a mudança projectada.
Representa a actual solução uma saída onerosa sob o ponto de vista financeiro e pouco eficaz do ponto do vista de satisfação dos interesses do Estado que justifique a sua alteração?
É sabido que o Contencioso do Estado, aqui incluindo o apoio jurídico à Administração, há muito que é reclamado por certos sectores da advocacia.
Trata-se, de facto, de um mercado apetecível, onde se jogam interesses nem sempre coincidentes. É provável que venha a formar-se consenso entre as principais forças políticas sobre esta reforma, já que são conhecidas as ideias sobre este tema de sectores da oposição.
É legítimo, contudo, que se pergunte se se fizeram já os cálculos dos custos para o País, na época de crise em que vivemos, de mais esta desnecessária alteração, e que se pergunte também, e desde já, quem vai assegurar a transparência do sistema projectado, no que respeita, por exemplo, à selecção de advogados a contratar, aos honorários e até à avaliação do serviço desempenhado.
Estamos perante uma mudança anunciada que só terá razão de ser se se concluir que presentemente o Estado está mal servido neste campo e que a solução actual é mais cara.
Nem todos assim pensarão, sendo estas considerações estritamente pessoais, só responsabilizando, como é obvio, quem as subscreve.
O mundo da justiça anda há muitos anos a ser objecto de experiências que nunca são avaliadas e cujos resultados estão à vista de todos.
Os magistrados do Ministério Público e sobretudo os cidadãos em geral têm o direito de saber as motivações deste projecto.