Valor
inclui nove tribunais administrativos e fiscais, incluindo Lisboa, mas deixa de
fora sete outras instâncias
Mariana Oliveira
Os pedidos de indemnização contra o Estado a correr
em nove tribunais administrativos e fiscais do país atingem quase 1,8 mil
milhões de euros. O valor deixa de fora sete outras instâncias onde não há
dados contabilizados do valor destes processos. O montante consta do último
relatório da Procuradoria-Geral da República. Pela primeira vez, o documento
avalia a taxa de sucesso do Ministério Público (MP) na defesa dos interesses
patrimoniais do Estado em nove tribunais, que em 2010 e 2011 resultaram em 24
condenações do Estado (em 122 processos), com indemnizações que totalizam mais
de dois milhões de euros a cargo do erário público. O valor é menos de 1% dos
210 milhões pedidos por cidadãos e empresas nesses processos.
Não é de esperar, assim, que os 1,8 mil milhões de
euros de indemnizações pedidas ao Estado, em nove tribunais administrativos e
fiscais, resultem em condenações em montantes semelhantes. Contudo, o próprio
MP mostra-se preocupado com o aumento destas acções – em número, em valor dos
pedidos e em grau de complexidade -, o que, sustenta-se no relatório, deve
levar a uma “especial reflexão” da intervenção do principal representante do
Estado.
Os motivos são diversos, mas os pedidos de
indemnização têm sempre na base actos ou omissões da administração pública.
Exemplo disso é o cancelamento de um concurso, uma expropriação irregular ou o
erro de um magistrado num processo judicial, casos em que terão de ser provados
os prejuízos morais ou materiais causados ao reclamante.
Os perto de 1,8 mil milhões de euros dizem respeito
a acções que correm na área de intervenção do Tribunal Central Administrativo
do Sul, que abarca os tribunais especializados de Almada, Beja, Castelo Branco,
Funchal, Leiria, Lisboa, Loulé, Ponta Delgada e Sintra.
O Tribunal Administrativo do Círculo (TAC) de
Lisboa é o que reúne mais processos e de maior valor. É na capital que se
concentram os ministérios e outras entidades públicas, a quem são pedidas as
indemnizações. “As acções entradas, em particular as acções administrativas
comuns instauradas contra o Estado, apresentam cada vez mais uma especial
complexidade e dificuldade. Os valores reclamados são, em alguns casos, bem
significativos”, lê-se no balanço da actividade deste tribunal, onde estão
pendentes processos contra o Estado no valor de mais de 1,3 mil milhões de
euros. Já as acções interpostas pelo Estado têm um valor substancialmente
inferior: 3,7 milhões de euros, que no total dos nove tribunais sobe para 4,8
milhões.
“Deve ser dada particular atenção ao aumento das
acções de responsabilidade civil extracontratual do Estado (44 em 2008, 69 em
2009, 76 em 2010 e 104 em 2011), sendo de sublinhar que se tem a sensação de
que existe uma tendência para as acções de responsabilidade civil, por actuação
dos magistrados e por morosidade na realização da justiça, poderem aumentar no
decurso dos próximos anos”, destaca-se no balanço do TAC de Lisboa.
O MP aproveita o relatório para lamentar: “Têm
existido algumas dificuldades de comunicação, em particular quando os
ministérios recorrem à prestação de serviços externos (por exemplo de
escritórios de advogados) para preparar os elementos.” E acrescenta: “A
institucionalização de novas e mais estreitas formas de cooperação facilitaria
novas metodologias de trabalho que poderiam agilizar e melhorar a defesa do
Estado.” Mesmo assim, o gabinete do coordenador do Tribunal Central
Administrativo do Sul (uma instância de recurso que corresponde às Relações nos
tribunais judiciais) realça que o MP “tem defendido com êxito os interesses
patrimoniais do Estado e em percentagens muito satisfatórias”.
O Ministério Público queixa-se ainda da dificuldade
em obter elementos materiais das entidades administrativas para instaurar
acções em nome do Estado e na falta de apoio técnico para instruir estes
processos. “A grande dificuldade continua a centrar-se na ‘falta de apoio
técnico permanente’ de engenheiros, arquitectos, urbanistas, topógrafos, atenta
a complexidade e a natureza técnica das questões que os processos de urbanismo
colocam.”
Público, 22-10-2012