Como tive oportunidade de referir aqui e repetir ali, a decisão Hamdam v. Rumsfeld não é inequivoca em diversos vectores, nem abordou o núcleo das questões suscitadas pelas comissões militares aprovadas pela administração Bush. Pelo que importa seguir com atenção a sequência e o debate político e jurídico que provocou.
Sobre o acórdão parece-me com muito interesse o artigo de Cass Sunstein no New Republic, em que se analisa de uma forma sintética e clara (não exaustiva mas bastante mais apreensível do que o texto das várias «opiniões» do acórdão e mesmo o sumário que o precede) a decisão do Supremo Tribunal e as suas implicações. Refira-se que para Sunstein (que é um académico muito prestigiado da «Law School» da Universidade de Chicago, que já foi assessor do juiz Breyner), o essencial centra-se na reafirmação de uma jurisprudência histórica sobre a tensão entre os poderes do Congresso e do Presidente, tendo o tribunal rejeitando a tese da primazia presidencial na protecção da segurança nacional.
Tenho ainda de reconhecer que a expectativa de que a dimensão simbólica que referi aqui e, embora aí não o tenha dito, pensei, decerto em virtude de «wishful thinking», que poderia ser uma oportunidade que a presidência aproveitaria para um recuo, não foi confirmada por declarações de Bush.
Com efeito, Bush afirmou, em conferência de imprensa da passada sexta-feira, que, afinal, o tribunal «aceita a utilização de Guantanamo, a decisão que eu proferi» (o que está longe de ser exacto), em contraponto deixou em aberto a proposta que a presidência apresentará ao Congresso: «Temos lá [Guantanamo] cerca de 600 [prisioneiros], 200 já foram enviados de volta à casa. Gostaríamos de enviar mais para os seus países de origem. Alguns precisam de ser julgados e a questão fundamental é como vamos julgá-los?». Ou seja parece, que no seu estilo, Bush comunicou que, pelo menos, será ponderada a hipótese de sujeitar a um julgamento por entidades com um recorte distinto das comissões militares e, o que é fundamental em face da decisão do Supremo, com um procedimento justo (ou menos injusto do que o inicialmente previsto), em especial com espaço para o contraditório.
Por último, a carga simbólica da decisão não deixa de envolver na boa tradição anglo-americana a clara divisão de campos na crítica do acórdão, uma panorâmica com ligações pode ser encontrada aqui, no precioso SCOTUSblog.