RAQUEL
MARTINS
Público - 10/04/2013 - 00:00
Desde segunda-feira, centros de emprego, hospitais públicos,
centros de saúde, escolas e universidades estão proibidos de assumir novos
compromissos de despesa. Restrição é a primeira resposta do Governo ao acórdão
do Tribunal Constitucional
Uma das consequências imediatas do despacho de Vítor Gaspar
ontem divulgado - que proíbe novas despesas no Estado sem autorização prévia -
é o cancelamento de todas as acções de formação para desempregados e jovens que
ainda não se iniciaram. O despacho vai afectar os hospitais públicos, centros
de saúde, escolas, universidades, autarquias, algumas empresas do Estado e a
generalidade dos organismos públicos.
Desde segunda-feira, todos
os ministros estão impedidos de assumir compromissos de despesa e só os
salários, os serviços básicos (água e luz) e as custas judiciais ficam a salvo.
Outras despesas precisam da autorização expressa do ministro das Finanças.
Ontem, os directores dos centros de formação geridos pelo Instituto do Emprego
e Formação Profissional (IEFP) ou em parceria com outras entidades receberam
ordem para suspenderem as novas acções, até indicação em contrário. Numa altura
em que a taxa de desemprego já ultrapassa os 17%, a medida coloca problemas ao
nível da integração dos desempregados e dos jovens.
Esta não é, contudo, a
primeira vez que isso acontece. Em 2012, na sequência de um outro despacho de
Vítor Gaspar, a formação de desempregados e jovens, incluindo a formação
profissional, ficou em suspenso em meados de Setembro e só um mês depois as
verbas foram desbloqueadas. O PÚBLICO tentou obter esclarecimentos junto do
IEFP, que remeteu para hoje a resposta.
Ontem, também o Ministério
das Finanças não deu esclarecimentos adicionais sobre o despacho, referindo
apenas que "ele tem carácter temporário", "até deliberação em
sede de Conselho de Ministros em matéria de medidas de adequação do Orçamento
do Estado". Não se sabe quando isso acontecerá. Contudo, e ao que o
PÚBLICO apurou, as restrições são para manter ao longo de todo o ano, embora
possam ser aprovadas outras excepções para além das que agora figuram na
orientação dada pelo ministro.
Entretanto, o país fica
congelado à espera que Vítor Gaspar desbloqueie as verbas. Caberá à
Direcção-Geral do Orçamento "autorizar os pedidos de libertação de
créditos e as solicitações de transferência de fundos referentes às situações
excepcionadas", nomeadamente despesas com pessoal, custas judiciais e
serviços básicos, registadas nos sistemas informáticos desta direcção até
segunda-feira.
O despacho conhecido visa
responder ao buraco orçamental de 1,3 mil milhões de euros, deixado em aberto
pelo acórdão do Tribunal Constitucional (TC). No domingo, o primeiro-ministro
já tinha deixado o aviso de que iria dar instruções aos ministérios para que
reduzissem as despesas de funcionamento. Mas o alcance da proibição de novas
despesas deixou alguns dirigentes públicos preocupados.
O presidente da
Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) pediu uma reunião com carácter
de urgência ao ministro Paulo Macedo, para perceber o alcance do despacho. O
ministro da Saúde garantiu ontem que a maior parte dos hospitais, que são
entidades públicas empresariais (EPE), vai ficar de fora, "por não estarem
incluídos no perímetro das contas nacionais". Seja como for, os centros de
saúde vão ser afectados, tal como hospitais do sector público administrativo,
que são actualmente uma minoria.
Tal como acontece no sector
da saúde, também no Sector Empresarial do Estado (SEE) só uma parte das
entidades é abrangida pelo congelamento de novas despesas. Isto porque só são
consideradas as empresas incluídas no perímetro de consolidação das contas
públicas, como é o caso da RTP, da Refer ou da Estradas de Portugal. Há muitas
outras, como a TAP ou a CGD. E, mesmo para as que são afectadas, o impacto será
praticamente neutro, dado que a maioria dos compromissos está contratualizada e
que a proibição vigorará por pouco tempo.
No entanto, o SEE deverá
afectado, de uma forma mais global, por outra via: a do reforço na contenção de
gastos. O primeiro-ministro deixou claro, no domingo, que esta será uma das
áreas chamadas a apertar o cinto para compensar o chumbo do TC. Houve já uma
consequência directa desta intenção, que vai resultar no alargamento da fusão
da Carris e da Metro, iniciada em 2012, à Transtejo (ver página 20).
Na educação receia-se que
este despacho seja uma antecipação do que está para vir dentro de dois ou três
meses e receia-se que as cativações cheguem mais cedo do que o costume. Do lado
das universidades, Sampaio da Nóvoa, reitor da Universidade de Lisboa, critica
uma "medida cega e contrária aos interesses do país" e alerta que
bloqueia compromissos internacionais, sem que isso signifique qualquer poupança
para o Estado.
Estes despachos são um
expediente usado com frequência pelos governos, para evitar a derrapagem das
contas públicas. Mas esta é uma das mais fortes restrições das despesas dos
últimos anos. Em Setembro do ano passado, Gaspar deu uma ordem semelhante, mas
restringia o congelamento aos estudos, pareceres, consultoria, trabalhos
especializados e investimentos. Este ano, as excepções são bem menos. com Alexandra Campos, Andrea Cunha
Freitas, Raquel Almeida Correia, Sofia Rodrigues