terça-feira, 8 de outubro de 2013

UMA IDA À LEI

   Ontem, fui chamado à Lei. Ao contrário dos guardiões de «A Lei», de Kafka, os guardiões do 3.° Juízo Criminal do Porto são gente cordial e paciente; por aí, a minha aventura na Lei seria uma sensaboria.
   Só que, mesmo não esperando que a Lei servisse chá e bolos, contava eu que tivesse umas cadeiras onde chamados e escolhidos se sentassem. Não tem. Advogados, queixosos, arguidos, testemunhas e público amontoam-se ali em dois lanços de escada e, se quiserem sentar-se, têm que fazê-lo (e é o que fazem) nos degraus ou em «zazen» no chão, pois que os colos uns dos outros estão fora de hipótese.
   A Lei, amiúde anfitriã mal-encarada, prestava-se ontem a receber os convidados mal estes, cumprindo escrupulosamente a hora fixada, chegaram. Só que, menos escrupulosa, uma incerta advogada, regendo-se no caso pelo fuso de Vila da Feira, onde (ou ali ao lado, no Mercado do Bolhão) alguém a desencantou, se esteve nas tintas para Lei, juiz, procurador, cliente, colegas, testemunhas e só pôs os saltos altos no local quase hora e meia depois. Atrasos assim costumam custar aos cidadãos não advogados entre 204 e 1020 euros. A mim e a mais uma dezena de pessoas, o atraso de Sua Anónima Advogância custou uma hora e tal de pé e as pernas inchadas para o resto do dia.
   O bastonário, que tanto se queixa dos magistrados quanto às indignidades do funcionamento da Justiça, faria bem se olhasse para a própria casa.


Manuel António Pina, JN,08/10/2010