quinta-feira, 25 de abril de 2013

Deputado do PS João Galamba diz que Cavaco “endoidou”


O PS não gostou do discurso do Presidente da República nas cerimónias oficiais do 25 de Abril na Assembleia da República. Alguns ficaram mesmo indignados. É o caso do deputado João Galamba que diz mesmo que Cavaco Silva “endoidou”.
Ainda Cavaco Silva discursava na Assembleia da República quando João Galamba escreveu na sua conta pessoal no Twitter: “Cavaco quer cumprir o tratado orçamental mas queixa-se da austeridade generalizada em toda a Europa. É oficial: endoidou.”
Mais à frente acrescentava que as palavras do chefe de Estado no Parlamento eram um “discurso miserável de um miserável Presidente. Que vergonha”.
Contactado pelo PÚBLICO, João Galamba confirmou que aquela era a sua conta pessoal no Twitter e que as mensagens eram da sua autoria. “Foi um discurso insultuoso para a democracia”, reforçou.
“O 25 de Abril enraizou nos três D [Democratizar, Descolonizar e Desenvolver]. O que ele [Cavaco Silva] nos informou agora é que o tratado orçamental é que é o grande desígnio nacional”, acrescentou. Para o deputado socialista, o Presidente da República “informou os portugueses” que as eleições “deixaram de ser um instrumento para gerar alternativa”. “Basicamente o que diz é que as eleições deixaram de ser relevantes. Foi um discurso insultuoso”.
Na sua intervenção desta quinta-feira na Assembleia da República, o chefe de Estado pediu consensos e deixou um aviso implícito ao PS: “Se se persistir numa versão imediatista, se prevalecer uma lógica de crispação política em torno de questões que pouco dizem aos portugueses, de nada valerá ganhar ou perder eleições, de nada valerá integrar o governo ou estar na oposição”.
Público on line, 25-4-2013

Enriquecimento ilícito


Teresa Leal Coelho: PSD avança com lei
A vice-presidente do PSD afirmou ontem que o partido vai avançar com o diploma legal que penaliza o enriquecimento ilícito.
Correio da Manhã, 25-4-2013

Isaltino Morais deverá ser impedido de continuar a dirigir a Câmara de Oeiras a partir da prisão


Isaltino Morais foi preso para cumprir pena de dois anos NUNO FERREIRA SANTOS
Isaltino Morais não deverá poder continuar à frente da Câmara de Oeiras a partir da prisão. O seu vice-presidente, Paulo Vistas, garantiu nesta quarta-feira, no início da reunião de câmara, que as questões que levaram à detenção do presidente “em nada afectam o funcionamento” da autarquia, sugerindo assim que Isaltino poderia dirigir a autarquia a partir da prisão. Porém, se o autarca ficar a cumprir os dois anos de prisão a que foi condenado, a lei determina a suspensão ou, no limite, a perda do mandato.
“A assembleia municipal tem que declarar a suspensão de mandato e nomear um substituto, que em princípio será o vice-presidente”, diz o especialista em Direito Administrativo Pacheco Amorim, tendo por base o artigo n.º 67 do Código Penal.
Segundo esta norma, “o arguido definitivamente condenado a pena de prisão, que não for demitido disciplinarmente de função pública que desempenhe, incorre na suspensão da função enquanto durar o cumprimento da pena”. A regra aplica-se a “profissões ou actividades cujo exercício depender de título público”, como é o caso.
Caso a assembleia municipal não declare a suspensão do mandato poderá aplicar-se uma outra norma que leva quase “inevitavelmente” à perda de mandato, explica Pacheco Amorim: “Pode haver perda de mandato por faltas, uma vez que o cumprimento de pena de prisão não configura falta justificada.”
A Lei n.º 27/96, que define o regime jurídico da tutela administrativa, prevê a perda de mandato caso os membros de órgãos autárquicos não compareçam, “sem motivo justificativo”, a três sessões da assembleia municipal ou a seis reuniões de câmara seguidas. Estando preso, Isaltino esgotaria o número de faltas injustificadas permitido, muito antes das autárquicas no Outono.
“Há uma situação de impossibilidade física que, a médio prazo, inviabiliza a gestão da câmara”, afirma o também professor da Universidade do Porto, embora admita que a lei não é clara neste ponto, por não dizer se a prisão pode ou não ser similar a doença. A perda de mandato teria que ser determinada pelo tribunal, na sequência de uma acção interposta pelo Ministério Público.
Isaltino Morais foi detido nesta quarta-feira pela Polícia Judiciária para cumprir a pena de dois anos de prisão efectiva a que foi condenado por crimes de fraude fiscal e branqueamento de capitais.
A detenção ocorreu à hora do almoço junto à Câmara de Oeiras, na sequência do mandado de detenção emitido pela juíza do Tribunal de Oeiras titular do inquérito.
O autarca, antigo magistrado do Ministério Público, encontra-se detido no estabelecimento prisional anexo à sede da Polícia Judiciária, em Lisboa. O advogado de Isaltino Morais, Rui Elói Ferreira, considerou, em declarações à Lusa, que a detenção é "ilegal" e que já pediu a libertação imediata do seu cliente. "Temos ainda vários recursos pendentes com questões como a prescrição dos crimes ou a contradição dos acórdãos”, justificou o advogado. Os recursos não têm “efeitos suspensivos”, mas segundo Rui Elói Ferreira podem alterar a decisão condenatória e a medida da pena de prisão.
A detenção decorre do último acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, com data de 18 de Abril e de que é relator o juiz-conselheiro Fernando Estrela, que indeferiu uma reclamação do autarca quanto à decisão do Tribunal de Oeiras de rejeitar o pedido de prescrição do crime de branqueamento de capitais, tal como pretendia a defesa de Isaltino.
Contas não declaradas
Isaltino Morais começou por ser condenado, em Agosto de 2009, a sete anos de prisão efectiva por um crime de corrupção passiva, um de abuso de poder, um de fraude fiscal e um de branqueamento de capitais. Em causa estava, fundamentalmente, o depósito de mais de 1,1 milhões de euros em contas na Suíça, entre 1993 e 2002, que nunca foram declaradas ao fisco. Foi condenado ainda a pagar 463 mil euros ao Estado por fuga ao fisco.
Em Julho de 2010, o Tribunal da Relação reduziu a pena de prisão a dois anos, condenando o arguido por três crimes de fraude fiscal e um de branqueamento e absolvendo-o dos restantes, à excepção do de corrupção passiva, cujo julgamento terá ainda de ser repetido. O mesmo acórdão baixou a indemnização para 197 mil euros.
O arguido recorreu para o Supremo, mas este decidiu, em Abril de 2011, não tomar conhecimento do recurso no que respeita à pena de prisão. Seguiram-se vários recursos e reclamações, no total de mais de três dezenas, para várias instâncias judiciais, que Isaltino foi perdendo sucessivamente. [veja as datas-chave do processo]
Público, 25-4-2013

Grécia vai avançar com pedido de reparações de guerra à Alemanha


O MNE grego Avramopoulos disse que a Grécia nunca tinha desistido de procurar indemnizações
O ministro dos Negócios Estrangeiros da Grécia, Dimitris Avramopoulos, anunciou nesta quarta-feira no Parlamento que o país vai mesmo avançar com um pedido de indemnizações à Alemanha por danos na II Guerra Mundial.
Especulava-se que Atenas pudesse tomar este passo desde que o diário gregoTo Vima noticiou a existência de um relatório secreto do Ministério das Finanças detalhando danos e calculando reparações – tanto por perdas materiais como por um empréstimo forçado do Banco Central grego às forças de ocupação.
Mas responsáveis admitiam que a decisão seria política, já que não era a melhor altura para irritar Berlim, que é quem mais contribui para os empréstimos aos países em dificuldade. 
O ministro Avramopoulos sublinhou que a Grécia nunca tinha desistido das indemnizações e pediu “a restauração da justiça e verdade sobre o sofrimento do povo grego durante os anos difíceis da ocupação, um período durante o qual o povo grego sofreu, passou fome, e foi pilhado como nenhum outro”, cita o diário norte-americano Wall Street Journal. Não especificou como será feito o pedido nem a quantia.
Na última vez que esta questão surgiu, o ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble, disse que o caso estava fechado e aconselhou a Grécia a focar-se nas reformas e não desviar as atenções. O seu homólogo grego ripostou que uma questão é independente da outra.
162 mil milhões em jogo?
O ministro dos Negócios Estrangeiros diz que vai agora ser estudado o modo como apresentar este pedido de reparações. Segundo o documento citado no início de Abril pelo To Vima, tratar-se-ia de 108 mil milhões de euros por danos de infra-estrutura e 54 mil milhões resultantes dos empréstimos forçados da Grécia à Alemanha. Ou seja, 162 mil milhões de euros, cerca de 80% do PIB grego.
A Alemanha pagou já, em 1960, 115 milhões de marcos (equivalente a 57,8 milhões de euros) à Grécia, diz a Deutsche Welle – e do ponto de vista de Berlim, a questão ficou aí encerrada. O jornal alemão Die Welt dizia, pelo seu lado, que desde 1949 a Alemanha pagou já pelo menos o equivalente a 31 mil milhões de euros, sublinhando, no entanto, que é difícil ter uma quantia exacta, já que houve várias formas de pagamentos.
Há quem ache que o pedido grego – pelo menos uma parte – é justificado. Quem melhor para o defender do que um professor alemão da Universidade de Atenas? O historiador Hagen Fleischer duvida da validade do argumento de que todas as reparações foram pagas em 1960. Primeiro, lembra que “a Holanda, que sofreu muito menos perdas, teve uma indemnização maior”, cita a Deutsche Welle. E segundo, Fleischer nota que o empréstimo ainda começou a ser pago logo depois da guerra. Os próprios nazis reconheceram o empréstimo, o que seria uma vantagem.
O mais recente caso de reparações individuais acabou, no entanto, com uma derrota para a Grécia. Trata-se de um pedido relacionado com um ataque a uma localidade chamada Distomo, que matou 218 pessoas. Em 1997, um tribunal grego declarou que os familiares das vítimas tinham direito a uma indemnização de cerca de 37,5 milhões de euros. Mas em 2011, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos decidiu que não havia lugar a reparações.
Notícia corrigida 25/4 às 12h10, no subtítulo o valor estava errado, é 162 mil milhões como se dizia à frente no texto
Público, 25-4-2013

Outras leituras...




O que melhoraria na democracia portuguesa?

PÚBLICO - 25/04/2013 - 00:00
39 anos depois do 25 de Abril, a qualidade da democracia portuguesa está em debate. O PÚBLICO foi ouvir 55 personalidades representativas da sociedade sobre a situação do país. Esta é a avaliação que fazem, dada através das ideias que apresentam sobre como melhorar a democracia portuguesa. Inquérito organizado por São José Almeida
Adolfo Luxúria Canibal - Músico
Acabaria com a sua excessiva dependência dos partidos políticos, que detêm o papel quase exclusivo de representação da vontade popular: 1. Grupos de cidadãos não organizados em partido político poderiam ser eleitos para a Assembleia da República; 2. Os deputados eleitos representariam os cidadãos dos círculos eleitorais que os elegeram e não o partido político que integram.
Reforçaria a democracia directa, tirando aos cidadãos o papel de reféns indefesos dos ciclos eleitorais: 1. O partido que forma Governo estaria limitado ao cumprimento do programa de Governo que eleitoralmente apresentou, sendo deposto em caso de incumprimento; 2. Dependeria de referendo a adopção de qualquer medida que não estivesse prevista no programa de Governo eleitoralmente aprovado.
Alexandre Quintanilha - Professor na Universidade do Porto
Dois aspectos essenciais para aumentar a nossa confiança nas instituições e tornar a nossa sociedade mais dinâmica e justa:
1. Que o jornalismo fosse menos "de opiniões" e mais "de investigação". A maioria dos meios de comunicação está a preencher os seus "espaços" com comentadores individuais ou com debates entre personalidades. Suponho que com o objectivo de que todas as opiniões possam ser ouvidas. Seria mais interessante que a informação fosse aprofundada e fidedigna.
2. Que exigíssemos uma maior responsabilização a todos os cidadãos. O que só seria possível com um sistema de justiça mais transparente e eficiente; com meios de comunicação mais independentes dos grandes grupos financeiros; com códigos de honra exigidos e respeitados por todas as profissões; e com uma meritocracia a sério.
Ana Bacalhau - Cantora
Eu, sozinha, não conseguiria melhorar grande coisa. Isso é que é interessante na democracia. Precisa do colectivo, mais do que do individual. Melhor dizendo, o primeiro impulso para a congregação parte do indivíduo, mas a finalidade será sempre o trabalho em equipa. Por isso é que é tão importante o contributo de todos para a sua manutenção. Por isso é que é tão perigosa a ideia do salvador, que chega e resolve os problemas. Nenhum indivíduo poderá representar bem todos os indivíduos. Ao contrário, um conjunto de pessoas apostadas em trabalhar juntas já estará mais bem preparado para representar o maior número de indivíduos possível. O ideal seria que todos obrigássemos este individualismo que ainda vive na nossa sociedade a socializar e a aprender a trabalhar em equipa, para o bem comum.
Ana Luísa Amaral - Poeta, professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Bastaria justiça! Quando a separação de poderes é vista como um entrave à governação; quando as soluções propostas para aliviar a crise passam por empobrecer a classe média e aqueles que vivem já no limiar da pobreza; quando os direitos dos investidores são postos à frente dos direitos daqueles que trabalharam toda uma vida; quando quem roubou ou defraudou o Estado e os seus concidadãos não é punido; quando os direitos previstos pela Constituição, como o direito à educação ou à saúde, estão a ser desmantelados, eu pergunto: mas que democracia? Não me parece que se trate de "melhorar" a democracia portuguesa, mas de a salvar de uma espécie de "fascismo social", como diz Boaventura de Sousa Santos. Bastaria justiça, esse princípio básico que engloba direitos, respeito, legalidade e igualdade. Que ela se faça.
Ana Vidigal - Artista plástica
Millôr Fernandes escreveu:
"Realmente voto não enche barriga, mas chega aquele momento em que o pessoal já comeu o suficiente."
Para melhorar (inclusive a dita democracia) recomendo um antiácido.
Ana Zanatti - Actriz e escritora
Ir à fonte de todas as coisas, que somos nós, e fazer uma profunda análise de consciência, para distinguir o essencial do acessório, porque é do essencial que vimos a abdicar.
Olhar menos para a esquerda e para a direita e mais para a frente, para o progresso do espírito. Uma democracia que assenta apenas em valores que se transaccionam nos mercados financeiros está condenada a ruir.
Reforma profunda no sistema educativo, desde a infância, para criar cidadãos conscientes da sua responsabilidade individual em todos os sectores da vida, com sólida formação moral, que possam vir a ocupar com dignidade e isenção os seus lugares na família, no trabalho, na sociedade, na política.
Uma classe política mais culta, informada e humanizada. Com mais amor a Portugal e menos à sua auto-promoção.
António Marinho e Pinto - Presidente da Ordem dos Advogados
Aumentaria o grau de participação dos cidadãos nos processos decisórios relativos às grandes questões do estado e da sociedade e, concomitantemente, diminuiria as competências dos titulares dos poderes representativos. Ou seja: restringiria o âmbito e a extensão da democracia representativa em benefício da democracia participativa, criando um novo equilíbrio entre a participação dos cidadãos e o exercício do poder pelos seus representantes.
O desenvolvimento estrondoso das tecnologias da comunicação, permite, hoje, auscultar, quase em tempo real, a vontade soberana do povo e, por isso, ele deve ser chamado, mais frequentemente, a pronunciar-se sobre as grandes questões do estado e da sociedade.
Nem a democracia participativa deve esvaziar a representativa, nem esta pode continuar a ser praticada tal como o tem sido até agora. Uma relação mais equilibrada entre elas fortalecerá ambas.
António Mega Ferreira - Escritor
A lista seria longa, o espaço é curto. Duas prioridades: prazos eleitorais e justiça. Mesmo sem entrarmos em debates sobre o sistema de representação (candidaturas independentes, círculos uninominais, autarquias, etc., etc.), há algo de mais imediato a que é preciso atender: prazos para realização de eleições (90 dias é pré-histórico) e para posse de novo Governo (30 dias é pré-moderno). Em Portugal, as crises governamentais são prenúncio de catalepsia institucional. Quanto à justiça: um prazo médio de 1096 dias para resolução de um processo (a média europeia é de 147 dias) é um absurdo; a possibilidade de inviabilizar, através de recursos, a execução das penas é um escândalo. Diminuir a burocracia e simplificar o processo não chega: rever todo o sistema de garantias dos direitos dos arguidos pode ser arriscado - mas é necessário.
Boaventura Sousa Santos - Sociólogo catedrático jubilado da Universidade de Coimbra
É necessário refundar a democracia, ir aos fundamentos. O primeiro é a visão e o projecto de país. É urgente um debate sobre o que queremos ser como comunidade cívica, cultural e política. A cultura autoritária dominante está a tentar convencer os portugueses de que o 25 de Abril foi uma aberração e que não merecíamos ter saído do jugo salazarista. Segundo, é preciso recuperar a soberania, o que pode ser feito por duas vias: aprofundando a democracia europeia ou saindo do euro. Neste momento, o euro é o nosso modo de nem sermos europeus nem podermos ser outra coisa. Para recuperar a soberania, é necessária uma classe política capaz de governar ao serviço dos portugueses. Medida de emergência: a demissão do Governo. Temos um Governo dominado por um ministro que governa o país ao serviço dos alemães. Medida de fundo: uma assembleia constituinte para fortalecer a democracia representativa com a democracia participativa, blindar o país contra tutelas externas não democráticas, estabelecer um sistema político e administrativo sujeito ao controlo dos cidadãos.
Catarina Furtado - Embaixadora de Boa Vontade do UNFPA e presidente da Associação Corações com Coroa
Muitas das coisas a melhorar podem não depender exclusivamente de nós. A Europa, tal como vem sendo construída, defendida e fundamentada nos seus princípios, vai acentuar cada vez mais a desigualdade e as demagogias sobre o carácter dos povos. Sou optimista e lutadora, no entanto, temo pelo futuro das gerações. Não acredito que, se não mudarmos o paradigma económico, alguma coisa se altere do ponto de vista social e político. Somos um povo amável, solidário e aventureiro e poderíamos contribuir para a nossa democracia se fizéssemos um esforço acentuado na Educação com base na promoção dos Direitos Humanos, uma educação de raiz, escolar, assente na igualdade de oportunidades e de género e na não-discriminação. Contrariar a dimensão mais caritativa de apoio imediato, que tem sido política e socialmente valorizada, e apostar na prevenção e na acção construtiva para uma mudança de mentalidades com uma abordagem de intervenção cívica e empoderadora.
David Marçal - Bioquímico
1. Uma democracia mais directa e menos dominada pelos partidos. Não há hoje em dia nenhuma boa razão que impeça a realização de referendos populares com grande regularidade, recorrendo ao voto electrónico, combinando a possibilidade de se votar nas juntas de freguesia, em casa através de computadores pessoais ou até com o telemóvel. Grupos de cidadãos deveriam ter a possibilidade de propor consultas populares, sem que estas tivessem que ser aprovadas pela Assembleia da República. É recorrente, e até tacitamente aceite, a quebra de compromissos eleitorais. A ideia dos nossos representantes democráticos como uma espécie de paizinhos que sabem o que é melhor para nós, não faz sentido.
2. Uma democracia socialmente mais coesa, com a adopção de políticas que contrariem a concentração de riqueza e em que o Estado atenue efectivamente a inevitável desigualdade de oportunidades entre os cidadãos, em áreas como a saúde e a educação.
Diogo Ramada Curto - Historiador
Melhoraria a distribuição da riqueza, multiplicaria as formas de participação política, quebraria o monopólio dos profissionais da política, tornaria transparente o financiamento dos partidos, lutaria por uma sociedade sem discriminações de classe, raça, credo e género, criaria quotas para a representação das mulheres, salvaguardaria o serviço nacional de saúde e a protecção aos idosos, tornaria mais acessível a leitura de livros, continuaria a rede de bibliotecas, daria melhores condições aos museus e aos arquivos, dignificaria por todos os meios a função dos professores, sobretudo do básico e do secundário, investiria mais na pesquisa científica e na criação artística e musical, trataria os emigrantes como parte integrante do que somos, estabeleceria relações de franca igualdade com as antigas colónias, sem derrapar em mitos paternalistas, e não esqueceria os ideais da Primeira República ridicularizados pelo Estado Novo.
Dulce Maria Cardoso - Escritora
Responsabilizaria de forma efectiva os governantes. A existência de eleições livres não faz com que os cidadãos sejam responsáveis por más governações nem pressupõe que sejam delas vítimas. Uma democracia que não penalize os que governam mal, que não puna os que o fazem por negligência ou dolo, determina que - mais cedo ou mais tarde - se defenda e se imponha uma ditadura.
Eugénia de Vasconcellos - Poeta
Para que a democracia tenha significado e exista, as acções têm de ter consequências previsíveis. As instituições têm de ter poder real e ética de conduta. Se nós, indivíduo e sociedade, confiamos no poder e na ética das instituições sentimo-nos representados por elas e representantes delas. Quando não nos revemos nos órgãos de soberania, nas empresas e nas comunidades, quando a opacidade das decisões remete para a aleatoriedade e o compadrio, ou para uma lógica de lucro sem ganho humano, excluímo-nos tanto como somos excluídos do tecido social que assim ainda mais se fragiliza. Perdem-se as expectativas de ser, produzir, intervir e ter. Perde-se a noção do valor da vida. Perde-se a esperança. É preciso acreditar. Acreditar é o primeiro passo para fazer.
Eugénio Fonseca - Presidente da Cáritas
A sua dimensão participativa. Considero que sem uma constante intervenção cívica teremos sempre uma democracia anémica. Sem dúvida que é importante continuar a valorizar a componente representativa, tanto mais que também esta está a ser, cada vez mais, desvalorizada. A forma mais segura de evitar a abstenção eleitoral é manter os cidadãos motivados a cooperarem, a seu nível, na governação do país.
Para que se efective a intervenção sociopolítica, impõe-se não dar apenas relevo retórico à missão da designada sociedade civil, mas criar-lhe, de facto, condições mobilizadoras e facilitadoras deste desempenho. Sem dúvida que os partidos políticos são imprescindíveis à concretização do regime democrático, mas não o esgotam. Até eles teriam a ganhar com uma maior participação organizada dos portugueses. É urgente insuflar mais cidadania à nossa democracia.
Filipe Vargas - Actor
Nós, portugueses, somos uma maioria melhor que a minoria que nos representa e temos de saber usar esse poder. Para isso, devemos começar por voltar a ganhar a consciência da importância de cada um na sociedade (com a nossa voz e trabalho, cumprindo obrigações e exigindo retorno) e fazer crescer o nosso poder, cuidando do papel educativo (e não delegável) da família (seja lá qual for a sua forma ou feitio), implicando-nos mais nas nossas comunidades (reactivando, e não enfraquecendo, a relação entre os eleitores e suas juntas de freguesia), agindo de forma concreta em cada localidade (o sucesso dos orçamentos participativos é disto um bom exemplo), fortalecendo a autonomia regional (descentralizando, por que não?) e intervindo a nível nacional com movimentos de cidadãos capazes de criar hipóteses reais de democracia directa.
Gastão Cruz - Poeta
A qualidade da democracia depende da qualidade da sociedade em que ela existe. Se essa sociedade for pouco culta e pouco educada, não saberá evitar que políticos arrivistas, aventureiros, alcancem lugares de topo, utilizando-os em proveito próprio e de uma minoria que lhes é afecta, e brutalizando a população indefesa.
Só a educação e a cultura poderão contribuir para "melhorar a democracia". Porém, os oportunistas, uma vez no poder, tudo fazem para que o esclarecimento das maiorias votantes não ocorra.
Mas a pergunta é sobre a democracia portuguesa. No tempo presente, ela foi tomada de assalto (por meio de mentiras e falsas promessas) por um bando de medíocres mas pertinazes serventuários dos poderosos.
É um tempo de monstros. Melhorar a democracia portuguesa? Os monstros não vão deixar. Tentarão não deixar...
Gonçalo M. Tavares - Escritor
1. "O cantor"
Um pássaro foi atingido com um tiro na asa direita e passou por isso a voar na diagonal.
Mais tarde foi atingido na asa esquerda e viu-se obrigado a deixar de voar, utilizando apenas as duas patas para andar no chão.
Mais tarde foi atingido por uma bala na pata esquerda e passou por isso a andar na diagonal.
Uma outra bala atingiu-o, semanas depois, na pata direita, e o pássaro deixou de poder andar.
A partir desse momento dedicou-se às canções."
Muitas pessoas estão a transformar-se em cantores - mas não por vontade própria. E isto é a primeira parte de uma tragédia.
2. Em 2013, nada tira mais liberdade do que o desemprego. A História mostrou, infelizmente vezes de mais, como a taxa de desemprego e a democracia estão ligadas.
"O desempregado com filhos"
"Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a mão.
Ele estava desempregado há muito tempo; tinha filhos, aceitou.
Mais tarde foi despedido e de novo procurou emprego.
Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a mão que te resta.
Ele estava desempregado há muito tempo; tinha filhos, aceitou.
Mais tarde foi despedido e de novo procurou emprego.
Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a cabeça.
Ele estava desempregado há muito tempo; tinha filhos, aceitou."
(de "O Senhor Brecht")
Irene Pimentel - Historiadora
Em situação de crise global, é bom regressar aos clássicos que definiram a sociedade civil e política e delinearam o Estado de Direito. Foi o caso de John Locke (1632-1704), segundo o qual todo o poder político legítimo deriva apenas do consentimento dos governados que confiam as suas "vidas, liberdades, e posses" à comunidade, tornada política. Mais tarde, outros filósofos definiram a separação de poderes, acrescentando ao legislativo e executivo, o judicial. Continuo adepta de uma democracia representativa, aceitando delegar em instituições democráticas o poder que não exerço directamente. Mas urge aprofundar o Estado democrático e o funcionamento da sociedade civil, de modo a que os partidos voltem a representar os que neles delegam. Por outro lado, face ao abuso do poder, não haverá direito de resistência civil? É que, como diz Locke, a comunidade política pode ser dissolvida sempre que o detentor do poder desrespeita a lei, perdendo assim o direito a ser obedecido.
Isabel Allegro de Magalhães - Catedrática UNL, membro do Graal
Não reconheço hoje em Portugal democracia representativa. Se um Governo retira garantias adquiridas, futuro, voz, à maioria na base da pirâmide social, e protege o topo: o regime treme. (Na Hungria já vacilou: newstatesman.com/austerity-and-its-discontents/2013/04/hungary-no-longer-democracy.) No mínimo, falta respeito pelos cidadãos e a Constituição: por cada pessoa como sujeito da sua história e participante do destino comum; faltam mulheres e homens competentes, experientes, dos partidos e da sociedade civil organizada, que na AR e Governo dêem prioridade aos mais frágeis e travem os desvios; falta um PR a impedir as sucessivas agressões ao regime, não um mero "Residente da República" (C. Albino). E perante o estado do mundo: há que aprender (toda a sociedade) a centrar mais a vida na alegria do que não custa dinheiro: afectos, imaginação, solicitude, silêncio, riso, arte, pensamento, natureza.
Isabel Hub Faria - Professora catedrática aposentada
Melhor democracia quer dizer mais ética, mais formação, melhor informação, mais conhecimento, menos capelinhas, mais representatividade e mais instrução explícita para o exercício pleno da liberdade individual e da cidadania.
Na altura em que são "os mercados" que mandam, melhorar a democracia significaria mais e melhor regulação do sistema bancário, de modo a que os "maus negócios" da banca privada não pudessem ser transformados em dívida pública.
O incumprimento injustificado dos programas eleitorais deveria ser suficiente para obrigar a mudanças no Governo ou de Governo.
Melhorar a democracia implica incentivar a democracia participativa, abrir a agenda política e promover a discussão de assuntos que, sendo do interesse da população, raramente são alvo de atenção dos partidos.
Uma outra ideia para melhorar a democracia portuguesa seria praticá-la "à portuguesa": "Ou há democracia ou...!!!"
Januário Torgal Ferreira - Bispo das Forças Armadas e de Segurança
Ao contrário do "ninguém fica para trás", a sociedade portuguesa padece de uma gravíssima injustiça social. Se uma sociedade democrática tem como responsabilidade ser inclusiva, a saúde deste corpo doente só se restabelecerá atribuindo a cada um o que lhe pertence, a começar pelos mais esbulhados. Na resistência à ditadura, exigiu-se a distribuição, com equidade e justiça social, dos frutos do trabalho. Urgiu-se o respeito pelas pessoas, em tantas circunstâncias, reduzidas a meros objectos. Não vale tudo para salvar o "clube" ou para despoluir o patriotismo manchado. As destruições de emprego, da industrialização, do crescimento económico, da classe média, de direitos e de deveres são "crimes", dos quais os "últimos" não foram constituídos réus. Mais um motivo para lhes ser paga a dívida do prometido. Neste mundo em que se passou "da poesia da revolução à prosa da segurança social" (Marcel Gauchet), "quem vive na miséria tem direito a receber imediatamente o necessário" (João Paulo II, 1 de Janeiro de 1998). A única arma de Abril foi a razão do direito! O desconsolo de uma esperança adiada gerou um "dia inteiro e limpo".
João Botelho - Cineasta
Hoje, não sei mais se o meu país é uma democracia ou um caso de loucura. É um belo sítio mal frequentado, citando o escritor. O alheamento e a importância dos cidadãos face às tropelias dos pequenos e grandes poderes aproximam-se de uma ideia única, a náusea. Portugal transformou-se num reino de intermediários sem escrúpulos e de mercearias gigantescas (as duas ou três pessoas mais ricas deste país são merceeiros). Os patos são bravos, os governantes são incompetentes e sobretudo incultos.
Por que não o controlo do enriquecimento excessivo de ex-governantes visitando as suas off-shores, por que não deixar cair na falência os bancos fraudulentos, por que não investir prioritariamente na agricultura (couves e batatas, em vez de eucaliptos, carneiros, vacas e porcos, em vez de campos de golfe vazios) e nas pescas, nos recursos infindáveis do nosso mar (peixe fresco e algas fazem tão bem à saúde!) e sobretudo na investigação e na educação? Que decadência, meus senhores! Era difícil mas sabia tão bem dividir as orações de Os Lusíadas, ou resolver uma raiz quadrada aos dez anos. E ler, ler, ler.
Se os nossos governantes alguma vez tivessem lido um clássico, seriam mais humanos e, sobretudo, mais democratas.
Jorge Buescu - Professor de Matemática, FCUL
Tinha 9 anos na altura do 25 de Abril. A minha politização foi feita com figuras do calibre de Mário Soares, Sá Carneiro, Freitas do Amaral ou Álvaro Cunhal. Homens a quem, concordando-se mais ou menos com o respectivo ideário político, é forçoso reconhecer uma estatura política excepcional. O que tinham em comum? Uma educação e formação extraordinárias. Eram homens extraordinariamente bem preparados para a vida cultural, intelectual, profissional e cívica. Personalidades intensas e complexas cujo interesse não se esgotava na política mas a ela decidiram dedicar-se de corpo e alma, com espírito de missão.
É com tristeza que verifico que, quatro décadas depois, estas qualidades foram hoje substituídas pelo sucesso na navegação em estruturas partidárias mais ou menos medíocres.
Joana Vasconcelos - Artista plástica
Eu melhoraria tudo na democracia portuguesa. Faria um reset.
João Lobo Antunes - Neurocirurgião
A justiça no sentido mais amplo do conceito. De facto, aprendemos rapidamente as regras da democracia. Mais difícil tem sido aprender a viver em democracia e a justiça é uma condição de liberdade. Qualquer democracia, acima de tudo, exige justiça. Refiro-me não só ao seu exercício célere e exemplar no domínio que lhe é próprio, mas que atenda também à igualdade de oportunidades na educação, ao acesso equitativo na saúde, à vigilância das desigualdades sociais e da pobreza, à protecção dos velhos e dos que não têm emprego, ao cuidado da terra e do ambiente. É indispensável ainda garantir justiça na governação da República e a coragem de assumir uma solidariedade responsável que obriga à revisão de modelos sociais caducos, quando não irresponsáveis.
Só a justiça pode moldar a consciência moral de um povo que é afinal uma construção colectiva indispensável para enfrentar com convicção e energia as crises com que a modernidade irá, repetidamente, desafiá-la.
João Maria de Freitas Branco - Filósofo
Adicionar liberdade positiva (a social, estar livre do medo da fome).
Reforma eleitoral para que as eleições deixem de ser uma fraude e o seu resultado a paradoxal negação da D. Garantir que o programa executado corresponda ao programa eleitoral votado. Criar para tal o Conselho de Defesa do Cidadão Eleitor constituído por "homens bons" eleitos e indigitados pelas instituições estruturantes da D.
Fim do monopólio das direcções partidárias na escolha dos deputados (possibilidade de listas nominais), fim da partidocracia que gerou uma casta contaminada de deficientes morais que, sem elevação ético-política, tem governado o país, impedindo a participação cívica e as autênticas alternativas.
Criação de instrumentos jurídico-políticos eficazes no combate sistemático à corrupção.
Mais participação cívica.
José Mouraz-Lopes - Juiz conselheiro no Tribunal de Contas, presidente da Associação Sindical dos Juízes
Asseguradas as garantias primárias de um estado democrático e social, importa que a democracia evolua para uma maior participação dos cidadãos na efectiva definição das políticas e no controlo efectivo da actividade pública. Assim, importa ponderar:
- Um sistema social que quebre a espiral de desigualdade e incentive a maternidade enquanto factor de crescimento e de renovação.
- Um sistema político que amplie a participação dos cidadãos, através da alteração do sistema eleitoral permitindo a eleição de deputados em lista uninominal, exigente na transparência e na meritocracia da actividade política, ampliando a responsabilidade no exercício de funções públicas.
- Um sistema de justiça simplificado e eficaz, dotado de recursos e de garantias de independência, que permita que as decisões judiciais sejam efectivadas no tempo devido.
Lara Li - Cantora
Começando por uma ponta da meada redonda e densa, sente-se a falta do que deveria ser o material do núcleo: a Educação, a que deve ser intrínseca a decência, quer dizer, ética.
Sendo a ponta da meada o que se deve ir puxando para desenrolar o assunto e chegar ao centro, torna-se o problema bicudo: como fazer passar a Educação começando desde o princípio até ao tal núcleo, o emissor da energia que sustenta esta coisa?
Não sendo em meada doente electrizante a decência, parece indispensável falar nela para que o fio pense que está relativamente lavado e macio. O núcleo lá está, a emitir informação clara sobre como, com o maior vigor e extraordinário esforço, impoluto, tem lutado contra as maiores adversidades.
A sujidade tornou-se transversal à meada e todas as camadas de fio estão em tal estado que a Educação não consegue inscrever-se e ingressar na meada.
Além de uma boa escolaridade, a Educação é indispensável a quem vota em quem todos deve servir, governando.
Sobre como melhorar a democracia portuguesa, chegada a este ponto a meada: é possível, em democracia?
Lídia Jorge - Escritora
Agora que a sociedade portuguesa tem as veias abertas, é legítimo perguntar se aquilo de que enferma a Democracia Portuguesa provém da imperfeição das suas instituições ou da debilidade dos seus intérpretes. Não escondo que me inclino muito mais para a segunda hipótese do que para a primeira. Está à vista de todos, de forma muito cruel, como a debilidade de carácter se encontra na base da indiferença política. Os mecanismos que permitem o acesso dos indiferentes ao poder deveriam ser modificados. A questão da representatividade deveria ser revista. E a discussão premente, sobre uma relação de independência entre o poder político e o esmagador poder financeiro, coração do futuro do mundo, tem de encontrar entre nós intérpretes à altura. Nesse campo, e no estado de selvajaria em que nos encontramos, semelhante combate vai precisar não só de heróis mas de leis.
Luís de Sousa - Investigador ICS-UL e presidente da Transparência e Integridade, Associação Cívica
Alteraria por completo o modo de fazer política e de pensar o Estado: menos arte-&-manhas, mais ciência de Governo; menos preocupação pela conquista, exercício e manutenção de poder, mais preocupação com a resolução de problemas estruturantes; menos programas, mais planos estratégicos; menos mandar, mais consultar; menos impressionismo, mais método; menos "fazer obra", mais smart spending; menos leis, mais implementação; menos monopólios de poder, mais pluralismo; menos discricionariedade, mais responsabilidade; menos culto do sucesso, mais civilização; menos captura do Estado, mais res publica; menos sentido de mercado, mais sentido de Estado; menos austeridade, mais reorganização e optimização; menosjobs for the boys, mais competência e mérito; menos corrupção, mais ética.
Manuel Aires Mateus - Arquitecto
Democracia centra a ideia de comunidade, colectivo, comum. Somos nós e não "eus", é aceitar o estado de todos e para todos, é aceitar os outros. Melhorar a democracia é melhorarmo-nos, é investir na cultura e na educação, é criar uma maior consciência, exigência e capacidade em cada um, para melhor gerirmos ou em melhores delegarmos.
Democracia na sua relação com a Arquitectura é aceitar o espaço comum, o urbano ou a paisagem, de todos, como central e não como resultante, ou sobrante da realização ou interesses de alguns. É concentrar a atenção no colectivo, no que nos une, onde estabelecemos relações ou criamos identidade.
Manuel Clemente - Bispo do Porto
Somos nós todos, enquanto sociedade, que temos de melhorar. Sociedade significa reconhecimento mútuo, vizinhança, companheirismo, co-responsabilidade. E temos de fazê-lo num tempo novo, que traz grandes oportunidades e grandes desafios, ligados a dois factores que parecem contraditórios: globalização e individualização.
A globalização abre espaços e horizontes largos e imediatos, mas tanto possibilita deslocações rápidas como nos sujeita a domínios que não controlamos, extravasando a política tradicional. A individualização retém-nos mais na pretensão singular, imediatamente transposta para qualquer geografia real ou mediática, com menos dependência e proximidade concreta.
Daí a importância de desenvolvermos conjuntamente a solidariedade e a subsidiariedade, quer ganhando consciência e responsabilidade pelo todo, quer arriscando participações práticas e locais, onde nos possamos exercitar como "cidadãos" propriamente ditos, com nome e figura. Nós e os outros, nós com os outros, todos para todos.
Para a democracia portuguesa isto significa, além do mais: informação correcta, persistente e pedagógica da parte de quem dispõe de mais dados; diálogo e mútua escuta da parte dos intervenientes sociais, culturais, económicos e políticos; conhecimento recíproco e habitual de eleitos e eleitores; solidariedade e participação concretas, que unam o local e o geral, o particular e o público.
Manuel Sobrinho Simões - Cientista
Procuraria que Portugal não descolasse da Europa nem do euro. Apesar das limitações do regionalismo europeu vitimado pela cupidez do capitalismo financeiro e pela fragilidade das lideranças, não antevejo futuro para a nossa democracia fora desse espaço. Procuraria ajudar a evolução no sentido de um federalismo mitigado, com união bancária e federalismo fiscal. Apostaria na criação de uma área privilegiada de trocas comerciais com os EUA, Canadá, Austrália, etc. e procuraria atrair a Turquia e o Norte de África. Por cá, temos de acabar com as propostas publicitárias, avaliar e reforçar as instituições públicas e melhorar o funcionamento dos partidos em termos de representação e de participação. Não vai ser fácil porque somos uma sociedade de altíssimo contexto (primos, cunhados, organizações secretas e semi-secretas, corporações) a sofrer os efeitos de uma partidocracia esclerosada com classes dirigentes cada vez menos capazes e exemplares. Para além de possíveis alterações formais (não sei o suficiente para opinar sobre a Constituição e o regime semipresidencialista), continua a ser fundamental apostar na educação - sem melhorar a literacia e numeracia dos cidadãos, não vamos lá - e prestar uma atenção redobrada à questão geracional.
Margarida Martins - Presidente da Abraço
Promover uma cidadania activa, incentivando a participação da população em associações. O reforço destas organizações é fundamental para a conquista de uma sociedade mais justa, igualitária e solidária. Sublinho, a título de exemplo, a importância das comissões de moradores, de onde poderão sair propostas de melhor gestão dos bairros onde vivem. Penso que é urgente dar voz efectiva às associações, pois estas reflectem reais necessidades. Acredito, no entanto, que, para que haja cidadania activa, deverá estar garantido o acesso à educação, saúde e conhecimento.
Maria de Fátima Bonifácio - Historiadora e membro do conselho científico da Fundação Francisco Manuel dos Santos
Melhoraria os políticos, governantes e deputados. No plano da educação, recomendaria a muitos deles a repetição das suas licenciaturas, um ano sabático em universidades estrangeiras e, em alguns casos mais aflitivos, aconselhava mesmo a repetição do curso dos liceus. Depois impunha o Português como língua oficial obrigatória, banindo do Parlamento versões corrompidas da língua pátria que agridem os nossos ouvidos e deseducam o público. No plano da ética, liquidava pela raiz os incontáveis casos de promiscuidade e irresponsabilidade - desrespeito pela coisa pública e pelo bem comum - que gangrenam a nossa democracia e afastam muita gente boa e útil da política. Não hesitaria em introduzir cursos sobre a diferença entre o bem e o mal em horários pós-laborais.
Maria do Carmo Fonseca - Directora do Instituto de Medicina Molecular e professora da Fac. de Medicina da Univ. de Lisboa
Nos últimos anos, muito por culpa própria mas também por efeitos exteriores, Portugal está a viver um período de enormes dificuldades que, não em termos inéditos, poderão pôr em causa os próprios fundamentos da democracia. As últimas sondagens de opinião são um indicador violentíssimo: 77% dos inquiridos consideraram o Governo como "mau" ou "muito mau", mas 61% diziam que nenhum partido da oposição faria melhor. Dar receitas sobre como melhorar a democracia portuguesa é falar de como melhorar a cultura de exigência dos portugueses. Urge consolidar uma ainda frágil cultura de valores éticos, de transparência, e de valorização do mérito. A nossa sociedade continua mal adaptada à inovação criativa. Investir no conhecimento não pode ser um mero chavão inconsequente. Não existem à venda soluções "prontas para usar". Há que definir metas estratégicas e ser consistente na acção, no dia-a-dia das vidas de todos nós.
Miguel Real - Escritor, ensaísta, filósofo
Nomeação pela Assembleia da República e pelo Presidente da República de um Senado Provisório, sem poder legislativo, constituído por meia centena de portugueses acima de toda a suspeita, os melhores nas suas actividades e profissões, presidido por Viriato Soromelho-Marques ou João Lobo Antunes, que estabelecesse uma Carta do Futuro a 20 Anos para Portugal, um plano sábio, com objectivos, metas, instrumentos, que, paralelo à política partidária e institucional, pudesse fazer renascer a esperança aos portugueses, convictos de que dentro de duas dezenas de anos Portugal seria um país europeu "normal", isto é, inserido numa posição económica, social, financeira, demográfica, científica, cultural mediana face à dos quadros estatísticos da Comunidade Europeia.
Nuno Artur Silva - Autor e produtor
A justiça. A única área de poder da sociedade portuguesa onde o 25 de Abril parece não ter acontecido. Há uma profunda reforma por fazer nas estruturas do poder judicial. Sem ela, não há condições para que haja de facto justiça para todos e um eficaz combate à corrupção.
O sistema partidário e eleitoral. É preciso ligar os partidos aos cidadãos e romper o bloqueio instalado dos caciques, dos jotas e das claques militantes.
A educação e a cultura como prioridades estratégicas. Se é verdade que a educação foi uma das áreas de maior desenvolvimento da democracia portuguesa, é absolutamente necessário que esse investimento não se interrompa e seja alargado. E a cultura, que nunca foi prioridade, deve passar a sê-lo, no seu entendimento mais amplo e transversal. Ligada à educação, à economia, à estratégia internacional e à qualidade de vida dos cidadãos.
Nuno Júdice - Poeta, professor catedrático da FSCH, Univ. Nova de Lisboa
Os dirigentes. A democracia perdeu a capacidade de se ver representada por uma elite com formação política e com o conhecimento do que é a relação directa do eleito com o eleitor. Isto começou com a perseguição a quantos iam adquirindo envergadura política por uma imprensa de escândalo a que se somaram alguns jornais considerados sérios que, por razões de concorrência, entraram nesse jogo. Progressivamente, quem tinha competência e capacidade para se dedicar à política foi abandonando essa cena, deixando o espaço a amadores que, pelo simples domínio de uma retórica despida de ideias e de projecto, acederam à direcção dos partidos e dos órgãos de poder. Estamos portanto a ser governados por instrumentos de interesses nacionais (poucos) e internacionais (muitos) sem que se veja uma saída para este vazio.
Paulo Corte-Real - Presidente da ILGA
Democracia não é equivalente a ditadura da maioria, bem pelo contrário - e é por isso que é fundamental que exista e se aplique efectivamente uma Constituição que salvaguarde, nomeadamente, direitos fundamentais de minorias e princípios constitutivos do regime democrático.
Para isso, há desde logo uma falha que se tem tornado evidente: não existe a possibilidade de demitir a pessoa que exerce o cargo de Presidente da República, quando esta pessoa não zele adequada e atempadamente pelo cumprimento da Constituição.
E também em termos de respeito pelas minorias, há um enorme trabalho a fazer - e aqui destaco o reconhecimento legal da parentalidade exercida por casais do mesmo sexo, sobretudo, aliás, por uma questão de atenção ao bem-estar de crianças concretas, que a lei tem a especial obrigação de proteger.
Pedro Bacelar de Vasconcelos - Constitucionalista
Para que serve um Presidente que discursa, nomeia, empossa, promulga, veta, viaja, convoca o povo para decidir, mas ele próprio nem decide nem governa? Não se vê razão para não acabar com essa excrescência antidemocrática que é a eleição por sufrágio universal de um Presidente da República que até podia demitir o Governo ou convocar eleições, mas só o faz quando "a maioria" o consente! Para quê tão grande aparato e investimento? Porque não elegê-lo no Parlamento a cuja maioria, de facto, já obedece? Jorge Sampaio bem teria sido o remate digno e elegante da história de uma instituição que, depois da democracia atingir a maioridade, apenas sobrevive para iludir a sua própria irrelevância, para engendrar intrigas e desresponsabilizar os eleitos. Claro que, do mesmo passo, convém diminuir o número de deputados e exigir-lhes prestação de contas pelo uso que, em consciência, fizerem do seu mandato.
Raquel Freire - Cineasta e activista
Apostaria na educação para a cidadania, empoderando as pessoas. Dando-lhes ferramentas para a promoção da dignidade humana na sua diversidade, dos valores humanistas e feministas, da multi e interculturalidade, do aprofundamento da democracia e da construção de uma sociedade livre, justa, sustentável, solidária e fraterna. Faria uma revolução do Estado patriarcal, colonial, heterocentrado, autoritário e punitivo, corrigindo os desvios da Democracia representativa, reforçando a Democracia participativa e criando formas de Democracia directa. Como abrir as candidaturas para todos os órgãos, nacionais, locais e europeus, a movimentos cívicos e a cidadãos em condições semelhantes às dos partidos; e criar espaços de gestão comunitária com a concessão dos recursos e competências às comunidades auto-organizadas. Eles dizem crise. Nós dizemos revolução.
Rui Cardoso Martins - Escritor
Uma pergunta simples mas de resposta infinita. Com revisões constantes. Não "ajustamentos", a mentira estúpida do Governo PSD/CDS, que não percebe Portugal. Como se diz cá em casa, quanto mais se bate no fundo, mais ele desce. A queda é rápida quando se despreza a democracia (afinal, há uma resposta simples): "Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária" (Art. 1.º da Constituição). Não se suspende a soberania e a dignidade para pagar juros impossíveis, destruindo o trabalho. Em dois anos, por exemplo, aumentou muito o número de gravidezes não vigiadas. Quantos mortos e problemas nos esperam? E se o número de pobres explodiu, o de nascimentos encolheu. Seria um bom recomeço acabar com isto.
Rui Horta - Coreógrafo e bailarino
Portugal tem um gigantesco potencial por cumprir, algo não sabemos aproveitar, pois falta-nos a qualificação e a distância crítica para entender um mundo que, pleno de oportunidades, é cada vez mais complexo. É essencial um pacto de regime entre todos os partidos, para uma mudança radical ao nível da cultura e da educação, tornando-as pilares do discurso político.
Não existe democracia num país que separa cada vez mais os pobres dos ricos, destruindo a classe média. É fundamental uma discussão profunda e aberta a toda a sociedade, sobre o Estado Social que queremos e podemos ter, numa óptica de defesa e melhoria do S. N. de Saúde, da justiça e da protecção social.
É urgente discutir com toda a sociedade a alteração da nossa lei eleitoral, para que os movimentos de cidadãos, as estruturas não partidárias e a sociedade civil em geral possam intervir nas decisões. Os partidos são indispensáveis, mas a a democracia não se esgota neles. O Parlamento deve abrir-se a formas de pensar divergentes.
São José Lapa - Actriz
Portugal é uma república soberana baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária (2 de Abril de 1976). Constituição da República Democrática Portuguesa. Em 2013, Portugal não é uma república soberana, ela é refém de um conjunto de países e de especuladores que lhe retiram a sua autonomia política; a dignidade humana é violentamente contrariada por um tremendo desequilíbrio social, um abismo entre 1% da população possuidora da riqueza nacional para a restante população onde 1 milhão de portugueses em meros dois anos perderam os seus empregos e se encontram sem meios de subsistência; a vontade popular realizada através das últimas eleições democráticas acentuou exponencialmente a abstenção... falta cumprir os princípios da Constituição.
Sérgio Aires - Sociólogo, presidente da EAPN Europa - Rede Europeia Anti-Pobreza
A Democracia nunca estará totalmente concretizada enquanto todos os cidadãos não se sentirem totalmente incluídos nas sociedades onde vivem. Democracia e pobreza são incompatíveis. A juventude e a história da Democracia portuguesa ainda não lhe permitiram alcançar a sua plenitude. É ainda uma Democracia onde elites e oligarquias estão demasiado presentes.
Para uma melhor democracia é fundamental investir tudo na fundação de uma cidadania plena. Para isso, é fundamental melhorar as formas de governação a todos os níveis. A boa governação é aquela que entende que o Estado não se confunde com o Governo, que a legitimidade democrática se renova e garante todos os dias pela forma como se governa, e onde a participação e co-responsabilização de todos é a única forma de garantir uma efectiva igualdade de oportunidades - a principal riqueza e sustento de uma Democracia.
Teresa Villaverde - Cineasta
Momento difícil para se falar da nossa democracia porque ela vive agora uma fase antropofágica, uma fase em que se come a si própria e a uma velocidade muito alta, parecendo não haver uma garantia dentro dela para travar esse processo.
Às vezes acontece um casamento em que um dos cônjuges maltrata o outro, sou contra que o casamento seja razão para autorizar o que maltrata a destruir o outro para sempre. Neste momento, acho que a nossa democracia foi sequestrada. Quem dirige o país não entende que a sua função primordial, haja o que houver e custe o que custar, tem que ser a defesa do bem-estar da população. Neste momento, é um pouco como se houvesse alguém que não sabe nem guiar nem as regras do trânsito, mas que guia a toda a velocidade numa auto-estrada em contramão, e não se pode mandar parar essa pessoa porque é filha de um rei ou de um deus, e algures uma lei cega diz que é proibido pará-la e ponto.
Tiago Torres da Silva - Escritor, encenador
A democracia é o melhor sistema que conheço mas também o mais desafiante. Aquele em que o indivíduo tem maior responsabilidade. Por isso mesmo, sucessivos governos democráticos descuram a educação e a cultura, na esperança de que todos nós nos mantenhamos de alma míope e coração cego. Na minha opinião, a grande melhoria a fazer na democracia seria investir nestes dois mundos mágicos que aumentam a capacidade de discernimento dos povos. Para isso, teriam os sucessivos governos de ter coragem de ver a sua actividade escrutinada por um povo esclarecido, interveniente, vivo!
A Música, o Teatro, a Poesia, a Dança, o Cinema deveriam ser tratados não como luxo desnecessário mas como motor de desenvolvimento, como prioridade absoluta na expectativa de aumentar a consciência cívica e fazer-nos parte de um todo mais fraterno, mais solidário e mais justo!
Valter Hugo Mãe - Escritor
Indubitavelmente deitaria mão à promiscuidade entre interesses públicos e privados. O modo como os cargos públicos são ocupados por gente com todo o tipo de compromisso nas mais variadas empresas privadas é obsceno. É obsceno que, quase invariavelmente, depois do Governo, aqueles que aparentemente desempenharam uma missão ocupem altas chefias e consultorias, estabelecendo um leva e traz insuportável, agredindo princípios de confidencialidade e honestidade comercial a todos os níveis.
Enquanto não tivermos políticos sem vínculos privados e sem favorecimentos feitos a filhos, primos e primas, sobrinhos aos mil e mais tios e tias, não temos democracia. Apenas a sua aparência.
Vasco Araújo - Artista plástico
Perguntar o que se melhoraria na democracia é o mesmo que perguntar o que se melhoraria no Amor, a resposta é sempre subjectiva e ambígua, mas de certeza que uma das respostas mais imediatas é a sinceridade. O exercício da sinceridade exige uma reinvenção da amizade, ética e da forma de viver do ser humano, como se a liberdade e a verdade residissem inteiras na força da sinceridade.
Ora como podemos cuidar de nós se não construirmos uma ética assente na sinceridade, só ela, enquanto transformação do sujeito, permite o acesso à verdade. A existir um eco qualquer na nossa vida, que seja um abrir do coração, e não uma aborrecida e monótona repetição do narcisismo vigente.
Vera Mantero - Coreógrafa e bailarina
Não há democracia possível sem igualdade de oportunidades. Não há verdadeira democracia sem uma educação liberal de qualidade para todos. Sem sabermos pensar e entender o que nos rodeia somos engolidos por todas as propagandas e manipulações (e não teremos ferramentas para construir uma vida e um país). Não há democracia que se veja sem informação a sério. Os média não podem estar nas mãos daqueles que querem que a população não perceba nada: políticos, negócios e banca. Não há democracia nenhuma enquanto não houver justiça eficaz e célere e enquanto toda a gente continuar a fazer asneiras (que dão cabo das nossas vidas) e a sair sem um arranhão. Não se melhora a democracia portuguesa sem melhorar a europeia, é preciso poder votar para a Comissão Europeia e para o Conselho Europeu. Não há melhor democracia em geral enquanto o poder não regressar às mãos daqueles que são democraticamente eleitos, enquanto como agora o verdadeiro poder continuar nas mãos da finança e dos grandes bancos globais. A política tem que estar por lei totalmente divorciada dos negócios e da finança. O resto não cabe aqui.
Virgílio Castelo - Actor
Introdução de círculos uninominais de deputados à Assembleia da República já, e levantamento do sigilo bancário para todos os responsáveis políticos (de presidentes de junta de freguesia a presidentes da República) de 1974 até agora, e para vigorar daqui em diante. O objectivo seria obrigar todas estas pessoas a investir 10% das suas economias na compra de dívida pública portuguesa a juros baixos.
Virgínia Ferreira - Socióloga, Fac. Economia e Centro de Estudos Sociais Univ Coimbra, activista na defesa dos direitos à igualdade de género
1. Tornava-a mais inclusiva e participada - o que faz a democracia é a operacionalização da representação substantiva dos interesses colectivos nos processos decisórios que os afectam.
2. Tornava-a mais transparente - o antídoto para a corrupção, causa da deslegitimação do nosso regime democrático, é mais transparência e prestação de contas na administração da res publica.
3. Tornava-a mais justa e igualitária - actuais cortes agravam desigualdades sociais, num país que é já dos mais desiguais, no qual uma justiça inoperante contemporiza com a desigualdade.
4. Desmercadorizava-a - o direito ao mercado livre deve perder a primazia que tem tido entre os direitos individuais reconhecidos.
Assim, a democracia deixaria de ser, em Portugal, um conjunto de procedimentos formais reprodutor das desigualdades sociais.
Y. K. Centeno - Escritora e professora catedrática (aposentada) da Universidade Nova de Lisboa
Se há diferença, na nossa democracia, quanto ao entendimento geral do que é a Democracia - trazida até ao Ocidente por Platão no desenho de uma sociedade justa -, faltará muito para melhorar.
A minha reflexão prende-se ainda com os conceitos de Liberdade, Igualdade, Fraternidade, estruturantes de um século XVIII que para mim é o século I da nova Era.
Mas impõe-se:
1. Recuperar a Ética quanto à dignidade de carácter, à honestidade intelectual, ao respeito mútuo, liberdade e correspondente responsabilidade, na intervenção social e política.
2. Recuperar a Estética: embora Platão expulse o poeta da cidade perfeita, a dimensão do Belo amplia, na sua criação e contemplação, uma actividade e um sentimento que devem ser repartidos dando condições de acesso a toda a sociedade.
3. Por fim: valorizar a Educação e a Cultura, nos seus espaços próprios, fomentando uma contínua existência e desenvolvimento.