Estou plenamente de acordo com o texto que o Dr. Bruto da Costa escreveu no blog Ciberjus sobre o anúncio da redução das férias judicias para um mês – texto que li graças à sempre atenta curiosidade do meu colega no Supremo C. M., que o divulgou, como sempre tem feito, pelos colegas.
Há muito tempo que a redução das férias tem sido aflorada, sem que tenha encontrado grandes obstáculos por parte dos magistrados. A ideia não é nada original e nem sequer tem a autoria do PS. Acontece que este Governo tomou agora a dianteira com o anúncio de a levar por diante, inscrevendo a medida, aparentemente, numa luta contra os interesses das corporações: primeiro, o lobbie das indústrias farmacêuticas e agora as corporações judiciárias. Esta iniciativa aparentemente audaciosa pretende ser emblemática da determinação do Governo em, finalmente, encarar a sério os grandes problemas numa perspectiva de «interesse nacional», cortando a direito pelas resistências corporativas. Tem um relevo mais semântico, do que pragmático ou de eficiência. Ora, tal como Bruto da Costa, acho que seria uma tolice não aproveitar a oportunidade para, de uma vez por todas, aceitar o repto e pôr a nu a questão da demagogia das férias judiciais e da lentidão da justiça. Por mim, acho que só teremos a lucrar com isso. Quem é que faz dois meses de férias? É possível que haja uma minoria de magistrados que o faça. Eu não faço e nenhum dos meus colegas no STJ o faz. Além de uma semana de turno, que normalmente é de trabalho intenso (basta ver o número de habeas corpus que entram nas férias), são bem precisos 15 dias, no mínimo, de trabalho normalíssimo para pôr o serviço em dia e uma semana, também no mínimo, para preparar a «rentrée» com a leitura da legislação que saiu durante as férias (e normalmente as grandes reformas legislativas entram em vigor, por causa disso mesmo, a seguir às férias) e a jurisprudência que foi sendo publicada, principalmente a do Tribunal Constitucional, que normalmente a Imprensa Nacional aproveita para actualizar no período de férias. Por outro lado, a seguir a estas, as distribuições de processos são de tal ordem (porque os processos não considerados urgentes ficaram, afinal, a aguardar que os magistrados regressassem de férias para os fazerem depois), que é preciso todo ou quase todo o período que vai de meados de Setembro às férias de Natal para, com esforço suplementar, ter o serviço controlado. Falo do STJ, que é a realidade que eu agora melhor conheço, mas nas outras instâncias passar-se-á o mesmo.
Isto, pelo que toca às férias. Mas há ainda os feriados e fins-de-semana. Há muito que eu não sei o que são feriados nem fins-de-semana completos. Pelo menos um dos dias do fim-de-semana é preciso ocupá-lo como um dia de trabalho normal. Mesmo que um juiz tivesse só dois processos por semana (e são mais, bastando atentar na distribuição normal de processos), é fácil de ver que, tirando o dia em que se realizam as sessões, ficam apenas 4 dias úteis para estudar e decidir esses processos, o que daria, em média, se fosse aquela a distribuição, um dia para estudar cada um desses processos e outro para escrever o projecto da decisão, o que, numa grande parte dos casos é completamente impossível. Já tenho tido decisões que demoram uma semana inteira e mais do que isso a passá-las ao papel. Mas, para além dos processos que cabem a cada juiz como relator, há os dos outros colegas, em que cada um de nós é adjunto. Se quisermos ter, realmente, a responsabilidade colegial da decisão, teremos de os estudar com a seriedade que tal implica. Só não temos o trabalho da redacção, mas temos o tempo perdido no seu estudo. Continuo a falar dos tribunais superiores e, sobretudo do STJ, mas na 1ª instância as coisas não são mais simples. Têm até outras complicações, que por agora descuro, deixando que outros falem do que melhor conhecem.
Ora, as férias reduzidas a um mês vêm clarificar toda esta situação. Não teremos problemas de consciência para estabelecermos novas e mais claras regras de trabalho, em que se possa, à vontade, falar da contingentação de processos, sem que se possa invocar a desculpa dos dois meses de férias, e também, correlativamente, para termos os nossos fins-de-semana e feriados. E férias na sua plenitude, sem que os processos acumulem durante estas, para depois os termos que fazer em esforço redobrado. Por outro lado, poderemos reclamar tempo para uma superior qualidade do trabalho e para uma revalorização profissional mais assídua, pois é notório que os magistrados frequentam pouco os cursos de formação contínua, o que é levado à conta de desinteresse, quando, muitas vezes, é devido à falta de tempo, embora não seja este o exclusivo factor de ausência. Tudo isto redundará em qualidade e qualificação profissionais, prestígio da justiça e melhoria dos direitos dos cidadãos. E também em qualidade de vida para os magistrados. Então, com estas medidas, se poderemos ser responsabilizados sem ambiguidades nem demagogias pelos atrasos que nos possam ser imputados, que não ao sistema, poderemos também nós claramente responsabilizar quem deve ser responsabilizado, porque tudo isto tem os seus custos e só por via deles, creio, é que a redução das férias, há muito tempo pensada, nunca foi implementada.
Artur Costa
PS – Comecei a escrever este texto na segunda-feira, dia 21. Interrompi para prosseguir um trabalho que tinha em mãos – um processo complicado – e foi de tal modo absorvente o trabalho, que só parei na 5.ª feira à hora de almoço. Tudo para conseguir ter uns curtos dias de férias de Páscoa, como toda a gente. Hoje, segunda, retomei o trabalho e depois do jantar, a finalização deste texto.
terça-feira, 29 de março de 2005
Documentos
Espaço penal comum europeu: Que perspectivas? - de Jean-François Kriegk e Dominique Barella
L’Union européenne travaille désormais à la construction de cet espace de liberté, de sécurité et de justice, et se trouve aujourd’hui confrontée au défi du rapprochement des systèmes pénaux en vue d’une meilleure efficacité.
Pena de morte
Anulação da condenação
The Florida Supreme Court has vacated James Floyd's 1985 conviction and death sentence, ruling that critical evidence was withheld by the prosecution and that the evidence might have been enough to change the verdict at trial.
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