Governo vai cortar 965 milhões de euros aos trabalhadores do Estado
O Executivo tem de devolver este ano 800 milhões de euros aos funcionários públicos, após ser forçado pelo Tribunal Constitucional a repor o subsídio de férias. Em 2014, entre alterações à tabela remuneratória, aumento do horário de trabalho e outras mudanças que estão na calha, segundo as contas do Governo validadas pela Comissão Europeia o total de perdas para os trabalhadores do Estado será de 965 milhões de euros. Economia 20 e 21
AUSTERIDADE
Funcionários públicos perdem mais que um subsídio em 2014
Se às perdas salariais se juntar a redução de pessoal então o Estado até poupará mais que os 13° e 14° meses juntos, mostram estimativas da Comissão Europeia
RUI PERES JORGE
rpjorge@negocios.pt
O Governo foi obrigado a pagar o subsídio de férias este ano, mas entre alterações à tabela remuneratória, aumento do horário de trabalho e outras mudanças que estão na calha irá retirar mais que esse valor aos trabalhadores do Estado em 2014. No ano seguinte a diferença aumenta. Estas são contas do Executivo, validadas pela Comissão Europeia no relatório da sétima avaliação divulgado a semana passada.
Segundo as estimativas do Executivo, o aumento do horário de trabalho na Função Pública, a redução do número de horas extraordinárias e o aumento das contribuições de trabalhadores para os sistemas de saúde (com respectiva redução do financiamento do Estado) traduzir-se-ão em poupanças de 520 milhões de euros com os seus trabalhadores. A este montante juntamse 445 milhões de poupanças nas alterações das tabelas remuneratórias, perfazendo um total de perdas para os trabalhadores de 965 milhões de euros.
Esta valor ultrapassa os 800 milhões de euros que o Governo devolveu este ano aos funcionários públicos após ser forçado pelo Tribunal Constitucional a repor o subsídio de férias. Em 2015, como notou a Unidade Técnica de Apoio Orçamental em Maio, a diferença será ainda maior: “o impacto total do conjunto destas medidas ascende a 1.133 milhões de euros o que representa um valor significativamente superior ao previsto no Orçamento do Estado” para a devolução do subsídios de férias.
Estado consegue poupanças superiores a dois subsídios
Se a estas poupanças se juntarem a redução do número de funcionários e os cortes salariais obtidos por saídas para a reforma e para o programa de mobilidade especial que o Governo está a desenhar, então, de 2013 para 2014, o Governo deverá conseguir uma poupança de 1.700 milhões de euros, calcula a Comissão Europeia na sétima avaliação ao programa de ajustamento português.
Este valor ultrapassa os 1.600 milhões de euros que resultam da soma dos dois subsídios e significa que no próximo ano a despesa com salários do Estado português cairá para os 15,6 mil milhões de euros, menos que os 16,4 que gastou em 2012, conclui-se do relatório da Comissão Europeia.
O ajustamento no Estado é uma pedra angular da estratégia de consolidação orçamental e a Comissão Europeia está preocupada com a sua implementação e os riscos que acarreta quer em termos políticos como constitucionais. Isso mesmo ficou evidente no relatório divulgado a semana passada no qual, referindo-se às medidas que terão de entrar em vigor já este ano, pressionou o Executivo avançar o mais rapidamente possível para assim resolver os riscos de choque político e constitucional que poderão aparecer.
Cortes no Estado são mesmo para avançar
Os responsáveis da troika têm deixado claro que, da parte dos credores, não há abertura para mudanças no rumo do programa de ajustamento. Isso significa que a nova vaga de cortes na Administração Pública, cujo processo legislativo deveria estar concluído ao longo deste mês, terá mesmo de avançar segundo o previsto, apesar da crise política que se instalou no País. Ou seja, em 2014, os funcionários públicos vão mesmo sofrer um novo revés financeiro.
A austeridade traçada para os funcionários públicos
A redução da massa salarial no Estado concretiza-se por várias vias, desde a redução de pessoal até aos cortes salariais, passando por mais tempo de trabalho
Novos cortes salariais a caminho
A intenção de rever as tabelas salariais da Função Pública chegou a ser admitida pelo Governo em Novembro de 2011, mas só um ano e meio depois se tornou oficial.
Na carta enviada à troika, o primeiro-ministro compromete-se a criar uma única de salários e suplementos com o objectivo de poupar, de forma permanente, 445 milhões de euros por ano, a partir de 2014. A forma como esta poupança será feita ainda não é conhecida.
Excedentários a caminho do despedimento
O Governo preparou uma alteração profunda às regras que determinam com que condições ficam os funcionários considerados excedentários. A proposta sobre o novo regime de requalificação, baseado nas orientações do memorando da troika, alarga as situações em que um funcionário pode ser enviado para a mobilidade especial, facilitando o processo.
Quem for dispensado fica no máximo um ano em mobilidade, com remuneração reduzida e, findo este prazo, tem um de dois caminhos: ou assume outro posto de trabalho no Estado, ou rescinde o contrato.
Apenas os funcionários com vínculo de nomeação, como os membros das forças armadas e de segurança, ficam a salvo dos despedimentos. Os professores, por seu turno, conquistaram pelo menos um adiamento, para 2015.
O diploma já está no Parlamento, e será discutido na generalidade no próximo dia 11 de Junho.
Rescisões por acordo assinadas no final do ano
As rescisões por acordo no Estado vão avançar ainda este ano. O Governo está disposto a pagar uma indemnização entre um mês e um mês e meio de salário base e suplementos regulares por cada ano trabalhado, dependendo da idade do trabalhador. A cessação de contratos deverá ter efeitos a partir de 1 de Janeiro, mas os requerimentos devem ser apresentados entre 1 de Setembro e 30 de Novembro. Nessa altura, o novo regime de mobilidade especial deverá estar em vigor. Com as duas medidas, espera-se reduzir 30 mil funcionários.
Mais cinco horas de trabalho por semana
Os funcionários públicos vão passar a ter um horário normal de trabalho de 40 horas semanais, que corresponde ao limite máximo permitido no sector privado. Inicialmente foi dito que o aumento seria para todos mas entretanto soube-se que a alteração não prejudica os regimes de transição próprios de algumas carreiras, o que pode proteger alguns médicos. A medida prevalece sobre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho mas nada impede que, no futuro, possam ser negociados horários inferiores.
Além de poupar em horas extraordinárias, a ideia do Governo é também estender o horário dos serviços públicos.
A medida está prevista num diploma autónomo que, tal como o do sistema de requalificação, será discutido no dia 11 e poderá entrar em vigor no início do Outono.
Para já, os professores já beneficiaram de uma flexibilização, podendo trabalhar as cinco horas adicionais em casa.
Mais descontos para a ADSE
As contribuições para a ADSE vão subir de 1,5% para 2,25% em Julho e para 2,5% a partir de Janeiro de 2014. A medida, que deverá entrar em vigor com o orçamento rectificativo, terá como efeito uma redução no salário líquido.
Redução de férias e de direitos laborais
O Governo está a rever a legislação laboral da Função Pública com o objectivo de criar uma espécie de código único de trabalho.
Uma das consequências deste processo será a redução do número de dias de férias, dos actuais 25 dias mínimos (que, devido as majorações, podem superar os 30) para 22 dias, tal como no sector privado. Contudo, admite-se que os dias de férias aumentem um dia útil por cada 10 anos de serviço e também pelo desempenho.
Esta medida está na lei geral do trabalho em Funções Públicas, onde o Governo alinhava um conjunto de regras laborais no Estado com as que são aplicadas no sector privado.
Este é um diploma central na reforma do Estado, que deve dar entrada no Parlamento até dia 15 de Julho, segundo o memorando da troika. Contudo, o ritmo das negociações com os sindicatos, com quem o Governo voltará a encontrar-se no início desta semana, poderá atrasar o processo. EM/CAP