segunda-feira, 25 de março de 2013

Política nos tribunais

Correio da ManhãCorreio da Justiça

Frequentemente, são os tribunais acusados de intromissão na política.
Por: Rui Cardoso, Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
Acusação injusta, pois são os próprios políticos que, pela sua acção ou inacção, obrigam os tribunais a resolver os problemas políticos que eles criam e não resolvem.
Exemplo antigo, mas usual, é o refúgio desses políticos no processo penal e no princípio de presunção de inocência que este consagra, pretendendo reconduzir a este âmbito toda a sua responsabilidade, mesmo a puramente política.
Uma verdadeira presunção de inocência política fundada na presunção de inocência penal com que querem afastar qualquer sancionamento político enquanto não estiver determinada definitivamente a sua responsabilidade penal. Exemplo recente é o da limitação dos mandatos dos presidentes de Câmara.
Não podendo os tempos da justiça ser tão rápidos quanto os da política, isto transfere para o plano judicial um debate apressado que deveria existir no campo político.

A judicialização da política

JOSÉ MOURAZ LOPES 

Público - 25/03/2013 - 00:00
É recorrente a acusação pública sobre o fenómeno da judicialização da política onde, em regra, estão no banco dos réus as magistraturas. Falamos, naturalmente, de questões tão diversificadas como a investigação criminal que envolve titulares de cargos políticos, a legítima iniciativa de cidadãos que nos tribunais administrativos contestam por via cautelar decisões políticas ou mesmo a intervenção do Tribunal Constitucional no exercício dos seus poderes de fiscalização da constitucionalidade, sobretudo na dimensão preventiva de leis controversas à luz do Estado de direito.
Os "acusadores" são, sobretudo, os que exercem poderes de facto do alto de uma aparente intocabilidade mediática e que, com a insinuação de que os tribunais estão a ir para caminhos que não são os seus, pretendem apenas inibir a atuação judicial sobre aqueles que sempre se viram como intocáveis.
Diz-se, por isso, em regra, "à justiça o que é da justiça, à política o que é da política"! O discurso da judicialização da política é, assim, um discurso manipulado e que serve apenas aqueles que deles se queixam, porque por eles são ou podem ser afectados.
Para o cidadão, em regra, sobra sempre o juízo crítico sobre os tribunais e o consequente desgaste da imagem pública da justiça. O episódio da lei das incompatibilidades eleitorais é, claramente, mais uma pedra na construção do desgaste sobre a actuação dos tribunais nos sistemas democráticos.
Os autarcas "ex-presidentes" e futuros candidatos a municípios diversos daqueles em que exerceram já funções e os seus adversários políticos, certamente que verão nas decisões dos tribunais relativas à sua elegibilidade ou inelegibilidade eleitoral um excelente motivo para verberar a "incompetência", a "falta de cuidado" ou, quiçá, a "juventude" dos juízes que decidiram da exclusão ou da não exclusão de determinados candidatos das listas eleitorais.
Deixando, propositadamente, aos tribunais, o ónus de interpretar uma lei que o legislador não quis clarificar e que a doutrina também não reflectiu devidamente, remete-se para a justiça uma decisão que terá sempre um reflexo político-partidário imediato. Os juízes, aplicando a lei, decidirão sempre de forma livre e independente, ainda que de forma diversa, segundo a sua consciência.
Num tempo onde a justiça deve ser objeto de outras preocupações, os tribunais não podem ser empurrados para um jogo partidário que não lhes pertence. Apenas cumprirão as leis e a Constituição.
Presidente da Ass. Sindical dos Juízes Portugueses

Sarkozy vai contestar imparcialidade do juiz que o fez arguido

CLARA BARATA 

Público - 25/03/2013 - 00:00
Furioso com a forma como foi tratado, o ex-Presidente da República francês quer pôr em causa o juiz que está a instruir o processo Bettencourt, em que é suspeito de abuso de confiança de pessoa fragilizada
Nicolas Sarkozy é advogado de profissão, mas as suas relações com os juízes, enquanto político, nunca foram boas. Agora estão piores que nunca. Thierry Herzog, o advogado de Sarkozy, anunciou que vai contestar a imparcialidade do juiz Jean-Michel Gentil, que fez o ex-Presidente da República arguido por suspeita de "abuso de confiança de pessoa fragilizada", no caso Liliane Bettencourt, a mulher mais rica do mundo.
Sarkozy, considerou o juiz de instrução após uma acareação com vários trabalhadores da casa de Bettencourt, ter-se-á aproveitado dos problemas mentais da nonagenária para obter doações milionárias para a sua campanha eleitoral de 2007, em que foi eleito para o Eliseu. Principal argumento? O pessoal da mansão testemunhou lembrar-se de ver Sarkozy lá pelo menos duas vezes em 2007 - e não apenas uma, como o ex-Presidente sempre disse -, uma com uma camisa vermelha, outra com uma camisola de gola alta, em Fevereiro daquele ano.
Furioso, Sarkozy quer um contra-ataque "maciço", relatava ontem oJournal du Dimanche, citando o ex-Presidente, embora não directamente - publicava também uma entrevista com o seu advogado de defesa. "Querem-me fazer afundar. Estou indignado, mas não me vou deixar ficar", terá dito Sarkozy, segundo o semanário francês.
Uma sondagem publicada ontem pelo Le Parisien pode dar-lhe alguma paz: 63% dos franceses julgam que o facto de ter sido feito arguido não afectará as possibilidades de Sarkozy se voltar a candidatar à presidência. A sondagem foi feita por Internet, numa amostra representativa da população francesa, diz o Instituto BVA. Mas qual a explicação para este resultado? "Pode ser o cinismo dos franceses, que consideram que todos os políticos são corruptos", diz Gaël Sliman, do BVA.
Tanto o lado de Sarkozy como o do juiz Gentil vieram contar um episódio sucedido no final da acareação a que foi submetido o ex-Presidente, na quinta-feira à noite, quando o juiz lhe comunicou que deixaria de ser apenas testemunha e passaria a ter um estatuto semelhante ao de arguido na justiça portuguesa. Sarkozy disse que era "uma injustiça", o juiz Gentil considerou que estava a ser "injuriado". O ex-Presidente acrescentou ainda: "Não me fico por aqui". O juiz Gentil - considerado apartidário, mas dado a cóleras - levou isto como uma ameaça.
Mais, considerou injuriosas as palavras da antiga "pena" de Sarkozy, o seu chefe de gabinete no Eliseu, Henri Guaino, actual deputado da UMP, que considerou que o juiz Gentil tinha "desonrado a justiça". Várias figuras gradas da UMP, o partido de Sarkozy, que ficou com um forte sentimento de orfandade depois de o Presidente ter perdido as eleições de Maio, vieram a público tecer críticas violentas contra a magistratura. Mas a que ofendeu mesmo o juiz Gentil foi a de Guaino. Resultado: o juiz instruiu o seu próprio advogado a apresentar um processo contra a ex-"pena" presidencial.
O contragolpe de Sarkozy veio ontem, no Journal de Dimanche, com a entrevista do advogado do ex-Presidente, que vai pedir a anulação da classificação de Sarkozy como arguido, que deverá ser analisada em Abril ou Maio pelo tribunal de instrução de Bordéus, onde está a correr o processo Bettencourt. O objectivo, diz Thierry Herzog, é "fazer explodir o castelo de cartas" construído pelo juiz.
A sanha do juiz de instrução de Bordéus, defendem os próximos de Sarkozy, tem motivações políticas. Para fundamentar esta afirmação, o advogado foi desenterrar um manifesto assinado pelo juiz Gentil em Junho de 2012, juntamente com outros 81 juízes de instrução, polícias ou investigadores que se destacaram na investigação de casos de corrupção em França, e publicado no Le Monde. Denunciavam "o abandono da luta contra a grande delinquência financeira".
Verdade seja dita que a relação de Sarkozy com os juízes, ao longo do seu mandato presidencial, não foi pacífica. Em 2007, comparou os magistrados a "pequenas ervilhas sem sabor", recorda a Reuters, e no início de 2010, pôs a classe em causa após o homicídio de uma menina. Houve várias manifestações, em protesto contra o seu projecto de supressão dos juízes de instrução.

Veredicto da Casa Pia é conhecido hoje à tarde

ANA HENRIQUES 

Público - 25/03/2013 - 00:00
Em causa estão crimes alegadamente cometidos em Elvas, que podem agravar penas já aplicadas no primeiro julgamento
A poucos dias de voltar à cadeia para cumprir o resto da pena que lhe foi aplicada por abuso de menores no processo da Casa Pia, Carlos Cruz conhece hoje o veredicto dos juízes sobre os crimes do mesmo género que ele e outros três arguidos são acusados de ter praticado numa casa particular em Elvas. Trata-se de uma parte do julgamento da Casa Pia que o Tribunal da Relação de Lisboa mandou repetir. Além do apresentador televisivo, sentar-se-ão esta tarde no banco dos réus para ouvir o acórdão do colectivo de juízes encabeçado por Ana Peres também Hugo Marçal, Gertrudes Nunes e Carlos Silvino, estando este último já a cumprir o resto da pena de 15 anos a que foi condenado.
Se for considerado culpado também relativamente à casa de Elvas, local onde terá conduzido vários adultos para aí manterem relações sexuais com menores, o antigo motorista da Casa Pia poderá ver a sua pena agravada até aos 20 anos, três dos quais já cumpriu em prisão preventiva.
O mesmo é válido para Carlos Cruz: o veredicto de hoje pode fazer crescer os seis anos a que foi condenado inicialmente. O apresentador televisivo tem pendente um recurso no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Alega, entre outras coisas, que não foi julgado num prazo razoável. Mas este tipo de recurso não lhe pode adiar a entrada na cadeia. Será já depois de ser detido que o seu advogado, Ricardo Sá Fernandes, interporá na justiça portuguesa um outro recurso, desta vez extraordinário, destinado a conseguir a reabertura do caso e a repetição do primeiro julgamento. Carlos Cruz tem dito que prefere entregar-se de livre vontade às autoridades a irem-no buscar a casa.
Se for hoje ilibada, a dona da casa de Elvas, Gertrudes Nunes, não terá de cumprir pena, uma vez que tinha sido absolvida no julgamento anterior. Já Hugo Marçal ainda tem à sua disposição vários recursos antes de ser detido, uma vez que a sua primeira condenação foi anulada.