Nunca gabaremos suficientemente a forma como o "Diário da República" nos revela todos os dias (com mais que merecida folga aos fins-de-semana) o perplexo rosto da República. Na prosa disciplinada e seca de decretos, portarias, despachos, avisos, anúncios, o Cartógrafo da República traça um paciente Mapa quotidiano do que somos como aquele de Borges do tamanho do Império e coincidente, ponto por ponto, com ele. Quem pode, por exemplo, ler as fadigosas quatro páginas de prosa corrida & anexos da Portaria nº 1055/2006, de 25 de Setembro, onde o Governo manda, pelos ministros da Defesa Nacional e do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, e para efeitos de várias alíneas de vários artigos de várias leis, acerca de contra-ordenações em matéria de assistência aos banhistas e de segurança nas praias, sem um estremecimento de saudade? Publicada em 25 de Setembro, quando o Outono já vai de vento (e chuva, e frio) em popa, e já tirámos as camisolas de lã dos armários e ligámos esquentadores e aquecedores, a melancólica Portaria "entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e vigora durante a época balnear de 2006". "Capri c'est fini", mas o "Diário da República", imperturbável, continua em calções de banho.
segunda-feira, 2 de outubro de 2006
O "DR"a banhos
Por Manuel António Pina, no JN de hoje
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