Por: Fernanda Palma, Professora
Catedrática de Direito Penal
O Tribunal Constitucional já
se confrontou antes com o princípio da progressividade fiscal, consagrado no
artigo 104º da Constituição. Mas a questão colocada quanto ao Orçamento do
Estado para 2013 é, porventura, a mais complexa que já enfrentou. Trata-se da
supressão de três escalões do IRS, que Jorge Miranda não hesitou em classificar
como inconstitucional.
Não pode dar-se uma resposta sumária a esta
questão, a pretexto de que tem de ser o autor do pedido de fiscalização a
demonstrar a inconstitucionalidade. Na fundamentação do pedido só se exige a
indicação dos princípios ou normas constitucionais violados, podendo
substituir-se os argumentos apresentados por outros que fundamentem a
inconstitucionalidade.
Não é legítimo concluir que o Tribunal
Constitucional pode presumir a não inconstitucionalidade se os argumentos apresentados
não forem bons. O pedido fundamenta-se na violação de princípios ou normas
constitucionais. O Tribunal não gere um conflito entre o autor do pedido de
fiscalização e o autor da lei, mas sim entre a lei e a Constituição.
A progressividade do IRS não é concretizável de
uma só forma, mas possui um conteúdo essencial que não pode ser violado. Esse
conteúdo não será posto em causa só com a supressão de todos os escalões do
imposto ou a inversão da progressividade, mas também com o enquadramento no mesmo
escalão de situações de diferente capacidade contributiva.
Na verdade, a exigência de progressividade é
expressão da justiça distributiva e concretiza, no domínio fiscal, o princípio
da igualdade material. Para além da distinção entre cidadãos situados abaixo e
acima do limiar de risco de pobreza, a progressividade implica a diferenciação
entre várias classes de contribuintes, tendo em conta os respetivos
rendimentos.
Na identificação das classes de contribuintes a
integrar nos diversos escalões, não pode haver variações de rendimentos
desproporcionadas. A desproporcionalidade é bem visível quando rendimentos
médios e rendimentos muito elevados estão equiparados. É essa a questão que se
coloca quanto à supressão de três escalões do IRS, prevista no Orçamento do
Estado.
De todo o modo, não é razoável concluir que a
progressividade constitui um conceito formal ou meramente programático. A
progressividade corresponde, antes, a um parâmetro constitucional dotado de
conteúdo material, que coloca exigências ao legislador. Não o reconhecer
equivaleria, afinal, a recusar a validade do princípio da igualdade no âmbito
fiscal.