quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Monumento à "justiça de Fafe" pode ser deslocado

O Monumento à Justiça de Fafe, evocativo da "paulada" como forma de resolver os conflitos, está implantado nas traseiras do tribunal da comarca, mas esta proximidade desagrada ao presidente da câmara, que defende a deslocalização da estátua. "A localização actual, para além de não dar ao monumento a dignidade que merece, também não me parece a mais adequada, face à proximidade com o tribunal. Acho que há ali um choque entre a justiça de um Estado de direito e a justiça pelas próprias mãos", disse à Lusa o autarca José Ribeiro.
A câmara já lançou uma auscultação pública à população, cujo resultado promete divulgar em breve, para decidir se a estátua fica no local onde foi implantada em 1981 ou é transferida, e para onde. O monumento é uma homenagem à Lenda da Justiça de Fafe, que alude a um episódio do séc. XVIII protagonizado pelo visconde de Moreira de Rei. Deputado às Cortes, terá chegado atrasado a uma sessão daquele órgão monárquico, no que terá sido censurado grosseiramente por um marquês, também deputado, que lhe chamou "cão tinhoso". Na época, os conflitos resolviam-se em duelo. Ao ofendido cabia escolher as armas e, quando todos pensavam que iria preferir espadas ou pistolas, o visconde apresenta-se para o reencontro munido de dois resistentes varapaus. O marquês não sabia manejar tal arma e acabou por levar uma grande sova.
Os assistentes não se contiveram e gritaram, em coro, "Viva a Justiça de Fafe".
PÚBLICO/Lusa | 05-09-2012

Tudo bons rapazes. Somos ou não um país de corruptos?

Por Rosa Ramos
Cândida Almeida disse que não há políticos corruptos em Portugal, mas todos os estudos sobre o assunto apontam em sentido contrário
Todos os estudos parecem apontar no mesmo sentido: a corrupção é um fenómeno em crescimento em Portugal, os indicadores nacionais estão abaixo do que seria esperado para um país desenvolvido e os partidos políticos são os organismos mais influenciáveis. Mesmo assim, a directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, afirmou há dias na universidade do Verão do PSD que Portugal não é um país corrupto. “Digo olhos nos olhos: o nosso país não é corrupto, os nossos políticos não são corruptos, os nossos dirigentes não são corruptos”, garantiu a procuradora-geral adjunta em Castelo de Vide. Mas, de acordo com os dados do Global Corruption Barometer (GCB) de 2010, 83% dos portugueses consideram que os níveis de corrupção não param de aumentar desde 2007 e que os partidos políticos são os mais afectados pelo fenómeno. Mais: 75% dos inquiridos disseram mesmo que as acções do Estado para combater a corrupção são ineficazes. Já este ano, o Eurobarómetro mostrou que 97% dos portugueses consideram que a corrupção é um “problema grave do país”. Por outro lado, a percepção que os outros países têm da transparência nacional parece confirmar as suspeitas dos portugueses: num espaço de apenas 10 anos, entre 2000 e 2010, Portugal passou do 23º para o 32º lugar no índice de percepção da corrupção – num ranking que engloba 170 países. Só quatro países da zona euro estão agora atrás de Portugal no ranking geral: Malta, Eslováquia, Itália e Grécia. As estatísticas oficiais da Justiça também parecem apontar para um crescimento do fenómeno da corrupção detectada pelas autoridades. Segundo os números da Direcção-Geral de Política de Justiça, em 2007 foram constituídos 210 arguidos por crimes relacionados com corrupção e peculato. Em 2009 o número aumentou para 297 arguidos Destes, 175 foram condenados e 109 acabaram absolvidos. MÁ JUSTIÇA E MÁ POLÍTICA Segundo o último relatório do Sistema Nacional de Integridade (SNI), que se debruça sobre a temática da corrupção, a administração pública e o sistema de repressão criminal – o Ministério Público, os organismos de investigação criminal e os especializados no combate ao fenómeno – são as áreas mais vulneráveis à corrupção. O relatório é claro: as condições propícias à corrupção têm aumentado consideravelmente nos últimos anos, devido “ao crescimento do Estado e da sua função reguladora na Economia”. Paulo Morais, vice-presidente da organização Transparência Nacional, garante que a política está dominada pela corrupção e se transformou, em Portugal, “numa mega-central de negócios”. “É preciso mais transparência na vida política e nos negócios públicos”, defende. Por outro lado, a “lentidão” e a “complexidade” no sistema judicial é considerado um obstáculo ao eficaz combate ao fenómeno, além da falta de formação de juízes e a inexistência de tribunais especializados. Isto acaba por provocar demoras nos processos, “que acabam por prescrever”, sublinha o SNI, que exemplifica com os casos de Isaltino Morais ou Fátima Felgueiras. No que toca à repressão da corrupção, o relatório concluiu que os resultados têm sido “bastante limitados”. Em suma, o combate ao fenómeno apresenta resultados “mais baixos do que seria de esperar para um país desenvolvido”. “Há imenso fumo de corrupção no aparelho do Estado. O que não há é uma investigação do Ministério Público. É mais fácil vir dizer que não há corrupção do que investigá-la e punir os corruptos”, diz Marinho e Pinto, o bastonário da Ordem dos Advogados, numa alusão às declarações recentes de Cândida Almeida. É CULTURAL? O presidente do Sindicato dos Juízes, Mouraz Lopes, sublinha que a corrupção não se resume só ao crime previsto no código penal, mas também tem a ver com “uma série de comportamentos não éticos que, não sendo ilegais, não são correctos”. Por isso, defende que é preciso “atacar comportamentos – dos compadrios às cunhas – que ainda continuam a ser tolerados e que são trágicos”. Marinho e Pinto vai mais longe e garante que a corrupção existe, é o “cancro da democracia” em Portugal e está “entranhada nas estruturas do Estado de Direito”. EFEITOS NA ECONOMIA Em 2005, Daniel Kaufmann, na altura responsável do Banco Mundial, disse publicamente que a diminuição da corrupção em Portugal poderia colocar o país ao nível da Finlândia em termos de desenvolvimento. Rui Cardoso, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, acredita que “parte do problema” que o país tem em mãos, em termos económicos, é “consequência das decisões políticas que lesaram o Estado”. “Ainda que não se possa afirmar que haja crime por detrás de algumas decisões políticas, sabemos que lesaram gravemente o Estado, muitas vezes em centenas de milhões de euros”, diz. E, segundo o SNI, a corrupção tem tido mesmo um impacto negativo no clima de negócios do país. Portugal desceu da 28ª posição em 2000 para a 46ª em 2010 no Indice Global de Competitividade e os investigadores do SNI sugerem que entre os factores que terão contribuído para a queda estão o “desperdício de recursos públicos”, “a ineficácia da Justiça”, “o favoritismo recorrente nas decisões governamentais” e a “má gestão verificada em aquisições, contratos, participações em negócios e parcerias público-privadas desastrosas para o Estado”, além da “corrupção e desvio de dinheiros públicos”. “Tudo isto se traduz num aumento descontrolado da despesa pública e, inevitavelmente, num aumento da carga fiscal”, refere o relatório de 2011. Com Pedro Rainho
As causas da corrupção    AUSÊNCIA DE ESTRATÉGIA    Segundo o Sistema Nacional de Integridade (SNI), não há uma orientação política estruturada. Multiplicam-se, sem coordenação, os organismos de combate à corrupção e as medidas anticorrupção adoptadas pelos vários governos estão “dispersas e são inconsistentes”. Não existe prevenção.    MÁS LEIS Boa parte dos diplomas que regulam o combate à corrupção contêm lacunas, são deficientes e não podem ser implementados na prática.    POUCA REPRESSÃO O SNI sublinha o número “escasso” de condenações por corrupção em Portugal e critica os “infindáveis recursos que os corruptos mais hábeis, ricos e influentes exploram”.    FALTA DE ESPECIALIZAÇÃO    Faltam especialistas no meio judicial e no combate ao crime económico.    FALTA DE SUPERVISÃO    Portugal é o país “dos buracos e das derrapagens financeiras”. Os mecanismos de acompanhamento da despesa pública são “muito rudimentares”.    INTERESSE PÚBLICO    Não há uma definição clara do que é o interesse público nos negócios do Estado e existe uma grande permeabilidade a influências que ligam escritórios de advogados, sociedades de auditoria, instituições financeiras, deputados, governantes, autarcas e partidos. As ligações empresariais dos políticos “fazem-se sentir em múltiplos sectores”.    POUCA TRANSPARÊNCIA    Falta transparência, parcialidade e responsabilização na Administração Pública.    CONSULTAS PÚBLICAS    Consultas em matérias como a reforma da justiça ou o combate à corrupção são “meras formalidades”.    RETÓRICA Combate à corrupção faz-se “ao nível da retórica e numa perspectiva eleitoralista”.    Conclusões retiradas do último relatório do SNI
Luís de Sousa Coordenador do Sistema Nacional de Integridade    “Portugal não é um país desenvolvido em matéria de corrupção”    – Portugal é um país corrupto?    – Todos os relatórios sobre o fenómeno têm concordado em alguns pontos: em Portugal há corrupção, raramente há condenados e os processos arrastam-se numa teia infindável de recursos. Julgo que isto dá uma má imagem do país a nível externo e acaba por afastar os investidores mais sérios e prudentes. Em matéria de corrupção, Portugal não tem dado uma imagem de país desenvolvido. Mas dizer que é um país de corruptos é uma afirmação pobre. Ninguém nasce com o ADN de corrupto.    – E há uma estratégia anticorrupção?    – Não. A corrupção é um tema que tem constado em todos os programas do governo, mas que nunca passa das intenções. Tem havido falta de vontade política, porque a própria política vive refém de uma série de interesses. Basta ver o parlamento, onde muitos dos deputados têm ligação a grandes escritórios de advogados ou a grandes empresas. Por outro lado, há uma questão cultural que não pode ser esquecida: os portugueses não têm o hábito de lidar com o escrutínio público, levam-no muito a peito.    – Mas existe um Conselho de Prevenção da Corrupção…    – Sim, mas até à data não tem tido qualquer tipo de actividade, nem foram definidas prioridades ou áreas de risco. E as coisas não podem ser feitas de forma amadora. Há organismos mais sólidos no combate à corrupção e menos permeáveis. O Tribunal de Contas aparece como um dos casos mais sólidos; os menos sólidos são os partidos.    – Os últimos relatórios mostram que o fenómeno da corrupção está a aumentar em Portugal. A crise tem influência?    – A crise não é desculpa para tudo e pode até servir para as instituições reforçarem controlos internos e repensarem modelos. Mas há um risco maior de corrupção em tempo de crise, porque se verifica um enfraquecimento da ética pública e um desinvestimento nos mecanismos de controlo. E, muitas vezes num curto espaço de tempo, é preciso angariar receitas e têm de ser tomadas decisões rapidamente, correndo-se o risco de um controlo menos rigoroso.    – E quais são as áreas mais preocupantes?    – Sectores ligados ao urbanismo e às grandes aquisições e contratações públicas – como as aquisições no domínio da defesa, protegidas pelo segredo de Estado, e da saúde.
Jornal I 2012-09-05

A construção social da corrupção na Europa


Giannakopoulos, Angelos, Maras, Konstadinos, Tänzler, Dirk, The social construction of corruption in Europe, Ashgate Publishing Limited, Aldershot. Reino Unido 2012, SBN: 9781409402978
Apresentação do livro:

The volume demonstrates the suitability of the theory of social constructivism in portraying and analyzing the diversity of the phenomenon of corruption. The approach of social constructivism taken in this volume is able to reconstruct the "construction of corruption" both from a societal perspective, by assessing it as generally accepted or tolerated behaviour in more or less standardized rule-governed social situations, and from the perspective of actors who perceive corrupt behaviour as problem solving in everyday life. The volume proves the usefulness of a social construction perspective for empirical research. It contains case studies of social definitions of corruption in eleven European countries that contribute in different ways to establishing a grounded theory of the phenomenon of corruption.

A certeza jurídica como previsibilidade


Gianmarco Gometz, La certeza jurídica como previsibilidad, Marcial Pons,  Madrid 2012, ISBN: 9788497689793
Apresentação do livro:
Neste libro se exponen los resultados de al menos tres distintas y sucesivas actividades intelectuales realizadas por el autor: la presentación de nociones de certeza jurídica ofrecidas por iuspensadores de escuelas y tradiciones diversas; el análisis de tales nociones para detectar, en los discursos ordinarios y teóricos que las usan, afinidades respecto a lo que pretenden referir con ellas; y por último, el objetivo-fin del autor, la (re)definición de un concepto preciso de «certeza jurídica» —que resulte de la actividad reconstructiva de los diversos usos que a tal noción han sido dados— liberado, sobre todo, de nociones «absolutistas». En cuanto a estas últimas han resultado ser presa fácil de las críticas de los incrédulos respecto a la «posibilidad de predicción de las consecuencias jurídicas conectables a las propias acciones». La reconstrucción conceptual aquí ofrecida, por una parte, es útil a una labor científica de detección del grado de certeza jurídica respecto a un ordenamiento, sector o norma suya; y por otra parte, responde a problemas definitorios, formulados por el mismo autor, sobre el qué, quién, cómo y cuánto se prevé. Además, se trata de un concepto de «certeza jurídica» neutro en el sentido que se aplica a la previsión, basada en información (extra)jurídica, de las consecuencias jurídicas conectables a hechos o a acciones propias, independientemente ya sea de las consideraciones morales respecto al mérito o demérito de tales consecuencias, ya de los propósitos respecto a los cuales el éxito de las previsiones resulta ser funcional, es decir, independientemente de que estos propósitos sean generalmente premiados o, por el contrario, reprimidos por la sociedad. Se trata, muy sucintamente, de una (re)definición de «certeza jurídica» que hace referencia a la difundida capacidad subjetiva de tomar decisiones (extra)jurídicamente informadas en interés propio, es decir, prudentemente.