Tráfico simples — tráfico de menos gravidade — condições pessoais — medida concreta da pena
1 – Como vem entendendo este Supremo Tribunal de Justiça quando o legislador prevê um tipo simples, acompanhado de um tipo privilegiado e um tipo agravado, é no crime simples ou no crime-tipo que desenha a conduta proibida enquanto elemento do tipo e prevê o quadro abstracto de punição dessa mesma conduta. Depois, nos tipo privilegiado e qualificado, vem definir os elementos atenuativos ou agravativos que modificam o tipo base conduzindo a outros quadros punitivos. E só a verificação afirmativa, positiva desses elementos atenuativo ou agravativo é que permite o abandono do tipo simples
2 – Se o agente efectuou durante 3 meses vendas de dois produtos estupefacientes (cocaína e heroína) aos consumidores que para tanto o contactassem numa zona relativamente vasta e muito populosa (Albufeira e Armação de Pêra), com relativa sofisticação (previamente para o seu telemóvel nº964422588 a fim de combinarem o local onde iria entregar a droga), fazendo-se, então, transportar para esses locais no seu automóvel, e foi detectado de regresso de Lisboa com 14 sacos contendo 38,353 grs de cocaína que destinava à venda aos consumidores, não se está perante um tráfico de menor gravidade.
3 – Por outro lado, as circunstâncias de ter trabalhado de forma regular, ter uma companheira e um filho menor ser portador de HIV e de beneficiar de apoio familiar, respeitam às condições pessoais do agente [al. d) do n.º 2 do art. 71.º do C. Penal], são completamente alheias à ilicitude, de cuja diminuição considerável deriva o privilegiamento do tráfico de estupefacientes.
4 – Estas circunstâncias pessoais, designadamente as possibilidades francas de ressocialização encontradas pelo IRS, podem encontrar mais expressão na medida da pena reduzindo ao mínimo e quase ao mínimo as penas parcelares dos crimes do art. 275.º do C. Penal e de tráfico simples, ou seja respectivamente em 4 anos e 3 meses e 2 anos respectivamente, e na pena única de 5 anos.
Ac. de 25.11.2004 do STJ, proc. n.º 3970/04-5, Relator: Cons. Simas Santos
Recurso extraordinário de revisão — fundamentos do recurso — matéria de facto — matéria de direito
1 - Perante o ordenamento jurídico português, o recurso de revisão de sentença não é um meio de reapreciação jurídica do anterior julgado, tal como acontece em regra com os recursos ordinários já que o recurso extraordinário em causa visa, antes, a obtenção de uma nova decisão assente em novo julgamento do feito, agora com apoio em novos dados de facto, e, assim, a revisão versa apenas sobre a questão de facto.
2 - A reapreciação de questões de direito, como a da pretensa prescrição do procedimento criminal estaria definitivamente coberta pelo caso julgado, sendo processualmente descabida, no âmbito deste recurso extraordinário, uma vez que tal discussão ou a possibilidade dela ficou precludida com o encerramento normal do processo e o trânsito em julgado do ali decidido.
3 - Aqui, do que se cura é, apenas, saber se há ou não «novos factos» ou «novos meios de prova» com relevância bastante para alterarem a base do decidido, ou seja, capazes de criarem graves dúvidas sobre a justiça da decisão tomada, sendo irrelevante para o efeito a concreta solução jurídica adoptada.
4 - A razão de ser de tal distinção de tratamento – entre matéria de facto e de direito – reside nesta constatação: enquanto o eventual [mero] erro de direito é logo suprível, nomeadamente mediante interposição de recurso ordinário, pois o processo contém já todos os elementos para o efeito, os «novos factos» ou «novos meios de prova», justamente porque reclamam «novidade» para serem relevantes, não têm, então, ainda, qualquer expressão processual, sendo desconhecidos do tribunal e estando, assim, fora da possibilidade de apreciação.
Ac. de 25.11.2004 do STJ, proc. n.º 3192/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira
Tráfico de estupefacientes — medida concreta da pena — “correio de droga”
1 – A medida concreta da pena é determinada dentro da moldura penal abstracta, funcionando todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente, designadamente: – O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente); – A intensidade do dolo ou negligência; – Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; – As condições pessoais do agente e a sua situação económica; – A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; e – A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
2 – Transportando o arguido 977,57 gramas líquidas de heroína, sem que se tenha descortinado com clareza o seu papel neste acto de tráfico, designadamente se era um mero “correio de droga”, atendendo às penas que o STJ vem fixando em casos semelhantes e à natureza e quantidade de droga transportados, mostra-se adequada a pena de 5 anos de prisão.
Ac. de 25.11.2004 do STJ, proc. n.º 3779/04-5, Relator: Cons. Simas Santos
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