sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Coisas do mundo do direito e da justiça


Hoje em dia o mundo da Internet veio criar a possibilidade de a justiça e o direito poderem ser falados sob outras formas
O mundo do direito e da justiça interessa-nos a todos. É fácil constatar que um número substancial das notícias de primeira página, em termos de televisão e de parte da imprensa escrita, se relaciona com a justiça, nomeadamente com julgamentos e processos criminais. Se os processos além de serem criminais envolverem ricos e poderosos, maior o interesse. E se forem condimentados com um pouco de sangue ou de sexo, o êxito é assegurado. Uma realidade, independentemente de a julgarmos louvável ou censurável…
Mas o mundo do direito e da justiça não se esgota nesses processos nem nesses meios de comunicação. Hoje em dia o mundo da Internet, nomeadamente com a existência dos blogues, veio criar a possibilidade de a justiça e o direito poderem ser falados sob outras formas. Neste princípio do ano, um blogue, o Aventar, decidiu organizar um concurso de blogues com o objectivo de “promover e divulgar o que de mais interessante se faz na blogosfera portuguesa e de língua portuguesa” e que engloba diversas áreas, que vão desde a Actualidade Política até à Saúde, passando, naturalmente, pelo Direito e Justiça.
Infelizmente não foi feito o “trabalho de casa” de selecção e nomeação dos blogues em cada área, antes se tendo optado pelas inscrições feitas pelos autores e pelos leitores. E assim, no campo do direito e da justiça, para além de alguns que aí merecem estar, estão também a concurso blogues que nada têm a ver com o mundo do direito, outros com pouca ou nenhuma qualidade, faltando, por outro lado, blogues essenciais da blogosfera jurídica nacional como o sine die e o cum grano salis.
Mas verdade seja dita que, apesar de alguns esforços meritórios, a nossa blogosfera jurídica é ainda muito pobre, sobretudo se comparada com a fascinante riqueza e criatividade dos blogues jurídicos existentes noutros países, nomeadamente nos EUA.
Quem quiser acompanhar as discussões mais interessantes ou mais absurdas sobre a justiça e o direito nos EUA pode viajar durante horas em inúmeros blogues. Recomendo, em especial, os blogues da “Law Professor Blogues Network”, em especial do “Media Law Prof Blog” e do “Constitutional Law Prof Blog”. Nesta altura, no “Media Law Prof Blog” os posts incidem especialmente sobre a legislação antipirataria, em discussão no Congresso norte-americano, legislação que é considerada essencial pelo grande patrão da comunicação social Rupert Murdoch e que é contestada, por exemplo, pela Google e pela Wikipedia. Outro dos blogues que vale indiscutivelmente a pena visitar com regularidade é o “The Volokh Conspiracy” onde com grande profundidade, sumidades diversas, entre os quais o próprio autor do blogue, discutem questões tão diversas como a legitimidade e a necessidade da tortura ou o anti-semitismo. Neste momento, também há uma especial atenção sobre a legislação antipirataria, analisando-se nomeadamente a questão de a Google se opor a tal legislação, invocando a liberdade de expressão. A questão da liberdade de expressão das empresas é uma questão com enorme actualidade nos EUA tendo em conta a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no caso Citizens United, em que reconheceu o direito de as grandes empresas poderem financiar propaganda política, direito este que sempre lhes tinha sido recusado.
Para quem se interessa pelas questões que se debatem na blogosfera jurídica norte-americana é essencial tornar-se assinante (gratuitamente) do Law.Com - Legal Blog Watch, para passar a receber regularmente mails sobre os novos posts que vão sendo colocados nos mais diversos blogues legais norte-americanos. O Legal Skills Prof Blog, por exemplo, denunciava há pouco tempo o facto de muitos escritórios de advogados exigirem aos estagiários que o acesso gratuito que têm a bases jurídicas enquanto estudantes seja posto ao serviço de todo o escritório, defraudando o propósito das empresas que concedem tais facilidades. A Comissão Deontológica da Ordem dos Advogados do Utah já veio denunciar que tal exigência, que obriga os estudantes/estagiários a violarem os termos em que lhes foi concedida essa facilidade, constitui uma violação do Código de Ética dos Advogados.
Mas o Legal Blog Watch apresenta também as questões e problemas do mundo do direito de uma forma muito divertida na secção “As 3 questões legais escaldantes do dia”. Há alguns dias, uma das questões era: “Por que é que está um agente da polícia à minha porta a pretender falar com a minha filha de 5 anos de idade?” E a resposta era: “Provavelmente porque ela se atrasou na devolução de livros à biblioteca”, remetendo-nos para uma notícia que referia que, numa cidade de Massachusetts, uma criança de 5 anos se tinha atrasado alguns meses na devolução de dois livros à biblioteca local e fora confrontada com a polícia em sua casa exigindo a devolução dos livros ou o pagamento das multas.
Voltando a Portugal: “Apesar de se ter convertido num símbolo nacional da República Checa, a figura de Milada Horáková (1901-1950) é ainda pouco conhecida no Ocidente e, segundo creio, praticamente ignorada em Portugal”, assim começa um post notável num recente blog que já foi notícia por ter exposto o plágio feito por uma escritora francesa de uma obra de Felícia Cabrita. O blog chama-se malomil e recomendo-o vivamente !
P.S.:
A proposta de um grupo de sábios da saúde para ser proibido fumar totalmente nos restaurantes e até à volta deles é de uma insanidade total. Espera-se que o legislador tenha um mínimo de bom senso e se lembre que os proprietários dos estabelecimentos investiram na criação de zonas de não fumadores confiantes nas leis da República !
Opinião de Francisco Teixeira da Mota
Público 2012-01-20

Portas cede a Passos no enriquecimento ilícito


O CDS já aceita que a criminalização do enriquecimento ilícito se estenda a todos os cidadãos, como pretende o PSD.
Após semanas de desacordo entre os dois partidos na Assembleia da República, o impasse foi desbloqueado na passada segunda-feira, numa reunião que juntou Passos Coelho e os líderes parlamentares do PSD e CDS, Luís Montenegro e Nuno Magalhães. Paulo Portas estava na Sérvia, mas os centristas levaram para o encontro ‘luz verde’ para aceitar o princípio do alargamento do crime.
As negociações vão agora continuar no Parlamento, dado que o CDS quer ver alterados alguns dos conceitos jurídicos da proposta social-democrata.
Apesar disso, nos dois partidos há a expectativa de se alcançar um acordo, num diploma considerado prioritário pela ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz.
CDS viabiliza enriquecimento ilícito
Passos Coelho reuniu com direcções parlamentares do PSD e CDS
O CDS deu luz verde à proposta do PSD para alargar a criminalização do enriquecimento ilícito a todos os cidadãos, abrindo assim a porta a um acordo entre os dois partidos.
Após semanas de desentendimentos entre os dois parceiros de coligação, os líderes parlamentares do CDS e do PSD reuniram na última segunda-feira com o primeiro-ministro, Passos Coelho. Paulo Portas não esteve presente (encontrava-se na Sérvia), mas os centristas levaram para o encontro a disponibilidade para retomar as negociações a partir da proposta social-democrata. «Foi uma reunião de aproximação», afirmou ao SOL fonte da maioria. Desbloqueado o impasse, que se arrastava há semanas, as conversações vão agora continuar ao nível das direcções parlamentares.
Apesar de aceitar o princípio de alargamento do crime (a versão inicial aprovada pelos dois partidos visava apenas os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos), o CDS quer ver alterados alguns dos conceitos jurídicos que constam do texto social-democrata. Em causa estão, sobretudo, dois pontos. Onde o PSD fala em «detenção» de bens, os centristas consideram que o conceito é demasiado vago – deter um bem não significa ser o seu proprietário. Mas o CDS traçou outra linha vermelha: não aceita que a criminalização do enriquecimento ilícito assente só na declaração fiscal, dado que esta não obriga à publicitação de todo o património.
Entre os dois partidos há, no entanto, a expectativa de que haverá acordo. PSD e CDS comprometeram-se, na comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, a fechar a matéria até ao fim de Janeiro. Uma data definida depois de o PCP ter ameaçado avançar com o pedido de votação final do diploma, aprovado na generalidade na AR há quatro meses, no final do mês de Setembro. A disponibilidade da bancada comunista para aprovar o diploma levou entretanto o PSD a admitir avançar sem o acordo do parceiro de coligação. A ministra da Justiça tem sido uma das grandes defensoras da criminalizacão do enriquecimento ilícito. «É preciso higiene na política e no tecido empresarial», defendeu já Paula Teixeira da Cruz. Foi, aliás, do seu Ministério que partiu a iniciativa para a proposta que o grupo parlamentar do PSD viria a apresentar ao CDS, substituindo o texto que estava já aprovado.
Sol 2012-01-20

Pinto Monteiro diz que não sai aos 70 anos


O PROCURADOR-geral da República (PGR), que completa 70 anos no início de Abril, diz ao SOL que vai manter-se em funções, apesar de ser esse o limite de idade para o exercício de funções previsto no estatuto dos magistrados.
«O PGR cumprirá a lei e a Constituição em vigor e ao abrigo das quais terminará o seu mandato a 9 de Outubro», respondeu Pinto Monteiro, instado pelo SOL a desfazer as especulações surgidas nos últimos meses sobre a possibilidade de saúda Procuradoria já em Abril e não em Outubro.
Pinto Monteiro deixa claro que valoriza o prazo do mandato, previsto na Constituição, e que não tomará a iniciativa de se afastar.
PGR recusa sair por limite de idade. Lembra que tem um mandato que só acaba em Outubro
PINTO Monteiro considera que só tem de sair da Procuradoria-Geral da República (PGR) quando acabar o mandato, a 9 de Outubro próximo, e que não se lhe aplica a norma que obriga os magistrados a cessar funções quando fazem 70 anos – idade que completa em Abril.
A situação tem gerado especulações, com os juristas a dividirem-se quanto à interpretação das leis em vigor, o estatuto dos magistrados, que fixa o limite de idade, e a Constituição, que estipula um mandato de seis anos para o PGR.
Questionado esta semana pelo SOL, no sentido de esclarecer se vai afastar-se quando fizer 70 anos, Pinto Monteiro foi claro na resposta: «O PGR cumprirá a lei e a Constituição que neste momento estão em vigor e ao abrigo das quais terminará o seu mandato no dia 9 de Outubro».
Nos meios judiciais, têm sido recordados, a propósito, os exemplos de Arala Chaves e de Alfredo José de Sousa. Nos anos 80, quando a lei não previa o mandato, o então PGR, Arala Chaves, saiu quando fez 70 anos. Mais recentemente, o mesmo fez o juiz Alfredo José de Sousa, presidente do Tribunal de Contas (já num regime de mandato, igual ao do PGR).
Sobre estes casos, Pinto Monteiro salienta apenas que as normas actuais «não são as mesmas do conselheiro Arala Chaves». Desde que o novo Governo tomou posse que o destino de Pinto Monteiro tem sido discutido, tendo em conta a apreciação muito crítica que o primeio-ministro e a ministra da Justiça fizeram no passado ao seu desempenho. E chegou a ser noticiado que Passos Coelho poderia aproveitar o aniversário de Pinto Monteiro para propor ao Presidente da República a sua substituição – hipótese que não desagradaria a Cavaco Silva.
Com esta resposta, fica claro que Pinto Monteiro não lhes facilitará vida, tomando a iniciativa.
Presença mais assídua no Conselho
Os últimos meses têm sido, por outro lado, de relativa acalmia, sem polémicas a atingirem Pinto Monteiro. E ganhou força a ideia de que não vale a pena criar um caso político em torno do PGR, quando a sua saída por via do fim do mandato é uma questão de meses.
No Conselho Superior do Ministério Público, a questão do limite de idade de Pinto Monteiro não foi até agora discutida. Mas até as relações do PGR com o Conselho estão muito mais pacíficas. A sua presença nas sessões do Conselho é agora a regra (no ano passado, foi na maioria das vezes substituído pela vice-PGR) e, segundo membros deste órgão, tem assumido uma atitude «mais dialogante» e de «mais atenção».
Por outro lado, a composição do Conselho também mudou, tendo saído alguns dos membros que habitualmente secundavam as posições de Pinto Monteiro. Na última sessão do ano passado, já com novos vogais, o PGR foi questionado, por exemplo, sobre o facto de, em vez de um inquérito por violação de segredo de justiça, ter ordenado uma averiguação disciplinar às fugas de informação para a comunicação social nas buscas a Duarte Lima – pondo, assim, directamente em causa o coordenador da investigação, Rosário Teixeira. Pinto Monteiro assegurou que a averiguação pretende apurar primeiro o que se passou, não visando em particular este magistrado.
Ana Paula Azevedo
Sol 2012-01-20

Acordos sobre a sentença no processo penal


Como demos conta, a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa aderiu à reflexão do Prof. Dr. Jorge de Figueiredo Dias, quanto a esta matéria e deu orientações neste sentido, que publicou aqui.

Casa da Supplicação


O Supremo Tribunal de Justiça proferiu um acórdão, cujo sumário se segue, e que pode ser lido na integra aqui, sobre um falado caso de corrupção em Lisboa

Prescrição do procedimento criminal - 
interrupção da prescrição - suspensão da prescrição - métodos proibidos de prova - caso julgado - corrupção - corrupção activa - titulares de cargos políticos - pena - fins das penas - escolha da pena - pena de prisão - pena de multa - medida concreta da pena - pena suspensa - condição da suspensão da execução da pena
I - O crime de corrupção ativa para ato lícito a titulares de cargos políticos, p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2, da Lei 34/87 de 16/7, na redação da Lei 108/2001 de 28/11, vigente ao tempo dos factos, é punível com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 60 dias.
II - O procedimento criminal por crime punível com pena inferior a um ano de prisão extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do crime tiverem decorrido dois anos (art.º 118.º, n.º 1, al. d, do CPP).
III - Nos termos do art.º 119.º, n.ºs 1 e 2, o prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se tiver consumado, sendo que o prazo de prescrição só corre, nos crimes permanentes, desde o dia em que cessar a consumação.
IV - Porém, de acordo com o art.º 121.º, a prescrição do procedimento criminal interrompe-se, nos casos que ora nos interessam, com a constituição de arguido e com a notificação da acusação. Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição. A prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.
V - O arguido nestes autos foi constituído como tal em 17/02/2006 (fls. 159, 1º. volume) e foi notificado da acusação por via postal simples remetida em 10/01/2007, o distribuidor do serviço postal depositou a carta no dia imediato e, portanto, a notificação considera-se efetuada em 16/01/2007 (terça-feira) – cf. art.º 113.º, n.º 3, do CPP. Em qualquer dessa datas se interrompeu, portanto, a contagem do prazo da prescrição.
VI - Mas, a notificação da acusação, simultaneamente, suspendeu a contagem do prazo, pelo prazo máximo de 3 anos (art.º 120.º, n.ºs 1, al. b e 2, do CPP).
VII - Relativamente a este último prazo máximo de 3 anos de suspensão da contagem da prescrição, a lei não estabelece qual o seu termo, ao contrário do que sucede nos casos das outras alíneas do n.º 1 do art.º 120.º, cujo termo será o “dia em que cessar a causa da suspensão” (n.º 3), isto é, quando houver autorização legal, ou for proferida sentença no estrangeiro, ou findar a contumácia, etc.
VIII - Com efeito, a “notificação da acusação”, como causa de suspensão, esgota-se no próprio ato e, portanto, não se pode ficar à espera de “cessar a causa da suspensão”, nos termos do n.º 3. Por isso, o único entendimento possível é o de que a suspensão da contagem do prazo da prescrição do procedimento criminal, por força da notificação da acusação ao arguido, destina-se a permitir que, num prazo razoável, contado pelo máximo de 3 anos, se efetue o julgamento e se processem os recursos das decisões que entretanto venham a ser proferidas. Por isso, o prazo de suspensão, nesse caso, é de 3 anos e só será menor se transitar até lá a decisão final que decidir a causa. Na realidade, é o que a própria alínea b) do n.º 1 do art.º 120.º refere: «- A prescrição do procedimento criminal suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que: (…) b) O procedimento criminal estiver pendente a partir da notificação da acusação…».
IX - Da conjugação de todas estas normas resulta que a prescrição do procedimento criminal só ocorre, no caso dos autos, no prazo de seis anos contados ou desde a consumação do crime, portanto em 27-01-2012 ou 30-01-2012 (consoante se considere que o crime é ou não de atividade), ou em 17-02-2012, seis anos depois da constituição de arguido, como é opinião de alguma Doutrina.
X - O arguido, aqui recorrido, invocou diversas ilegalidades suscetíveis de tornarem alguns meios de prova proibidos e, portanto, nulos. Todavia, como bem decidiu o acórdão recorrido, toda essa matéria foi objeto de decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferida em 21-10-2008 e já transitada em julgado.
XI - Ora, se o Tribunal da Relação já decidiu essas questões por acórdão transitado em julgado, não podia o mesmo tribunal na decisão recorrida – como não pode agora o STJ neste recurso – voltar a discutir o mesmo assunto, sob pena de violação do caso julgado formal.
XII - Segundo o art.º 672.º do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo penal, as sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.
XIII - O caso julgado formal existe para impedir que no âmbito do mesmo processo recaiam uma ou mais decisões contraditórias com outra que, sendo suscetível de recurso, já tenha transitado em julgado.
XIV - O acórdão do TC referido pelo arguido - n.º 387/2008, de 22 de julho de 2008 – segundo o qual os juízos formulados no despacho de pronúncia são provisórios e devem ser reavaliados em julgamento, respeita a uma época em que certa jurisprudência interpretava a lei no sentido de considerar o despacho de pronúncia incindível e, portanto, irrecorrível na parte em que conhece das questões prévias e incidentais, nomeadamente, das nulidades, no caso de concluir pela pronúncia do arguido pelos factos constantes da acusação do M.º P.º.
XV - No caso dos autos, porém, não foi essa a orientação que veio a ser seguida, pois, entretanto, o STJ, pelo Acórdão de 19 de janeiro de 2000 ("Assento n.º 6/2000", no Diário da República, I Série-A, n.º 6, de 7 de março de 2000), havia fixado jurisprudência nos seguintes termos: "A decisão instrutória que pronunciar o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público é recorrível na parte respeitante à matéria relativa às nulidades arguidas no decurso do inquérito ou da instrução e às demais questões prévias ou incidentais” e por Acórdão n. ° 7/2004, de 21 de outubro de 2004 (Diário da República, I Série-A, n. ° 282, de 2 de dezembro de2004), fixou a seguinte jurisprudência: "Sobe imediatamente o recurso da parte da decisão instrutória respeitante às nulidades arguidas no decurso do inquérito ou da instrução e às demais questões prévias ou incidentais, mesmo que o arguido seja pronunciado pelos factos constantes da acusação do Ministério Público."
XVI - A interpretação que aqui fazemos, de que o trânsito em julgado do acórdão da relação que julgou um recurso sobre questões incidentais do despacho de pronúncia, relativas à proibição de provas, impede um novo conhecimento das mesmas no processo, não padece de qualquer inconstitucionalidade, pois, como bem explicou o acórdão recorrido, o Tribunal Constitucional tem sempre afirmado a validade desta conceção do caso julgado formal (veja-se, entre todos, o Ac. do TC 86/2004, de 04/02/2004).
XVII - O assistente B é vereador da Câmara Municipal de Lisboa e, portanto, titular de cargo político (art.º 3.º, al. i) da Lei 34/87, de 16/07).
XVIII - É fora de dúvida que o arguido ofereceu ao assistente, por intermédio do irmão deste, uma vantagem patrimonial de € 200 000,00 para que praticasse determinados atos, a saber:
1º- Desistência da ação popular já movida pelo assistente no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, contra o Município de Lisboa, a sociedade "D" e a "G", tendo em vista tal ação que o Tribunal declarasse a nulidade das deliberações que aprovaram o acordo e do contrato de permuta de terrenos do “D” pela “F”, bem como a nulidade da deliberação e das operações de loteamento do terreno onde se encontrava instalada a F.
2º- Afirmação pública do assistente perante a Câmara Municipal de Lisboa e perante jornalistas, na qual deveria declarar que, tendo consultado os processos camarários respetivos, as pessoas e as entidades que haviam negociado com a CML o contrato da F / D, isto é, o arguido e os demais acionistas da "C" e da "D", haviam estado de boa fé, tendo cumprido as exigências legais, pelo que não deveriam ser prejudicados, tanto mais que apenas haviam atuado na defesa dos interesses das suas empresas.
3º- O silêncio futuro do Assistente, em particular no que se pudesse referir ao direito de preferência reconhecido pela Câmara Municipal de Lisboa (facto a.40 da matéria de facto provada).
XIV - Os atos dos funcionários, para serem relevantes para o preenchimento dos tipos da corrupção, hão de caber dentro das suas específicas competências legais ou dos poderes de facto decorrentes do cargo que desempenham.»
XV - Ora, das três contrapartidas acima discriminadas, exigidas pelo arguido ao assistente a troco da gratificação que se lhe propunha dar, uma estava manifestamente fora das competências legais ou dos poderes de facto decorrentes do cargo político que o assistente exercia, pois que a ação popular tinha sido proposta pelo cidadão B antes de ocupar qualquer cargo político e, portanto, a apresentação de uma desistência dessa ação, ainda que uma contrapartida remuneratória, não passaria de uma vulgar transação processual, em que o autor, a troco de um benefício oferecido pelo réu, desiste do pedido.
XVI - Já a declaração pública que o arguido desejava que fosse feita pelo vereador B e o seu posterior silêncio quanto ao exercício do direito de preferência pela Câmara, a troco da gratificação prometida, tem de ser encarada de outro modo.
XVII - É que um vereador de uma Câmara não exerce apenas o cargo no que respeita ao pelouro ou aos pelouros que lhe são atribuídos. As suas funções estendem-se por outras áreas, pois, nomeadamente, tem funções políticas, de representação do partido ou do grupo de cidadãos que o elegeram e, para além disso, outras funções administrativas nos órgãos autárquicos, nomeadamente, as de fiscalização da legalidade, podendo e devendo suscitar perante a Assembleia Municipal as irregularidades ou nulidades dos atos camarários.
XVIII - Assim, ao pretender que a troco da vantagem económica prometida, o vereador B se vinculasse perante a Câmara e perante a opinião pública, em declaração formal, que os atos de permuta supra referidos eram, afinal, válidos e límpidos e ao comprometer-se a que, no futuro, se mantivesse silencioso em relação a tudo que a tal respeitasse, nomeadamente, quanto ao exercício do direito de opção por parte da Câmara, o arguido estava a condicionar o exercício do cargo que aquele vereador exercia, tanto na vertente política, como no próprio desempenho do seu cargo.
XIX - E os atos que o vereador em causa pudesse ou não praticar não estavam dependentes de uma sua “opinião”, mas de um poder/dever inerente ao seu cargo administrativo e político, de respeitar a legalidade e os compromissos, ao menos, com os cidadãos eleitores.
XX - Não faz qualquer sentido uma pretensa similitude entre atos hipoteticamente praticados por juízes e atos hipoteticamente praticados por um vereador, pois que a esfera de atuação de um juiz é limitada aos processos que lhe estão afetos no tribunal onde presta funções, enquanto um vereador é um político, pois como tal o define a lei e, portanto, as suas funções não se limitam apenas aos papéis e dossiers que lhe são colocados na secretária.
XXI - Não faz parte do objeto deste recurso averiguar se a corrupção ativa praticada pelo arguido foi para ato ilícito. Assim, estando-nos vedado caminhar nessa direção, não resta senão reconhecer que o arguido, por si, prometeu a titular de cargo político, ou a terceiro com conhecimento daquele, vantagem patrimonial que ao titular de cargo político não era devida, com o fim de que o mesmo praticasse atos que cabem na sua esfera de atuação desse cargo. Por outro lado, está provado que o arguido A atuou livre e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei (ponto a.55).
XXII - Por isso, o arguido cometeu um crime de corrupção ativa para ato lícito, p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2, da Lei 34/87 de 16/7, na redação da Lei 108/2001 de 28/11.
XXIII - O crime praticado pelo arguido assume, no quadro da moldura penal respetiva, uma ilicitude muito alta, quase no seu máximo possível, pois a promessa de gratificação foi feita de um modo insistente e repetido, durante vários dias e através de três encontros pessoais.
XXIV - Por outro lado, ainda no quadro da ilicitude, há que referir que a quantia prometida pelo arguido como suborno era de valor consideravelmente elevado, o que, por si só, é elucidativo de que o arguido pretendia obter, ao comprar atos e omissões do assistente, elevadíssimos proventos com o negócio subjacente, em desrespeito pela coisa pública.
XXV - Como se sabe, os relatórios divulgados demonstram que em Portugal o fenómeno da corrupção tem minado o Erário Público e a confiança dos cidadãos nas instituições. Há, portanto, elevadas exigências de punição nos casos de corrupção que são detetados.
XXVI - O dolo do arguido foi elevadíssimo.
XXVII - Quanto à personalidade do arguido, há que ter em conta a sua idade (nascido em 17-09-1954), o seu percurso pessoal, cultural e empresarial, as suas estáveis condições familiares e a sua boa integração social, as suas elevadas condições económico-financeiras, a sua conduta social e comunitária e a sua escolaridade. Não tem antecedentes criminais.
XXVIII - Tudo ponderado, atenta a fortíssima exigência de prevenção geral já apontada, a pena de multa alternativa não poderá corresponder às expectativas comunitárias na validade da norma, pois não conduziria à tutela dos bens jurídicos que se exprime no caso concreto. Será, pois, de fixar a pena em 5 (cinco) meses de prisão.
XXIX - Contudo, a ausência de antecedentes criminais e a boa inserção social e familiar do arguido levam a que o tribunal, a par de uma estratégia intimidatória, não possa deixar de fazer um juízo de prognose favorável, no sentido de que a simples ameaça da pena e a mera censura do facto irão afastar o arguido da criminalidade e não defraudarão as finalidades da pena neste caso concreto, tanto mais que já passaram quase seis anos e não chegou a haver entrega de dinheiro, nem o político em questão se deixou corromper.
XXX - Por isso, nos termos dos art.ºs 50.º e 51.º do CP, a pena será suspensa por um ano, mas com a condição de o arguido entregar, no prazo de dois meses, na Repartição de Finanças da área da sua residência quantia igual à que prometeu como suborno, isto é, € 200 000,00 (duzentos mil euros), que assim reverterá para o Erário Público.
XXXI - Não se diga que esta quantia é desproporcionada, pois se o MP o tivesse requerido, ou se fosse objeto deste recurso, tal quantia teria de ser declarada perdida para o Estado (cf. art.º 111.º, n.º 1, do CP: “Toda a recompensa dada ou prometida aos agentes de um facto ilícito típico, para eles ou para outrem, é perdida a favor do Estado”).  
Ac. STJ de 20-01-2012, proc. n.º 263/06.8JFLSB.L1.S1, Relator: Conselheiro Santos Carvalho

Diário da República n.º 15 (Série I de 2012-01-20)

Presidência do Conselho de Ministros
·        Decreto-Lei n.º 11/2012: Estabelece a natureza, a composição, a orgânica e o regime jurídico a que estão sujeitos os gabinetes dos membros do Governo
·        Decreto-Lei n.º 12/2012: Estabelece a natureza, a composição, a orgânica e o regime jurídico do Gabinete do Primeiro-Ministro
·        Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/2012: Autoriza a emissão de dívida pública, em execução do Orçamento do Estado para 2012, aprovado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, e do Regime Geral da Emissão e Gestão da Dívida Pública, aprovado pela Lei n.º 7/98, de 3 de fevereiro
·        Resolução do Conselho de Ministros n.º 10/2012: Estabelece o regime de indisponibilidade das ações objeto da venda direta de referência, no âmbito da 2.ª fase do processo de reprivatização da REN - Redes Energéticas Nacionais, SGPS, S. A.
Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território
·        Decreto-Lei n.º 13/2012: Estabelece um conjunto de medidas a respeitar pelo Estado Português na sua relação com as organizações encarregues da inspecção, vistoria e certificação dos navios, com vista ao cumprimento das convenções internacionais sobre segurança marítima e prevenção da poluição marinha, transpondo a Directiva n.º 2009/15/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2009
·        Portaria n.º 18/2012: Aprova a alteração da delimitação da Reserva Ecológica Nacional do concelho da Covilhã
Ministério da Saúde
·        Portaria n.º 19/2012: Altera o Regulamento das Tabelas de Preços das Instituições e Serviços Integrados no Serviço Nacional de Saúde, aprovado pela Portaria n.º 132/2009, de 30 de janeiro
Ministério da Educação e Ciência
·        Decreto-Lei n.º 14/2012: Aprova a orgânica da Direcção-Geral da Educação
·        Decreto Regulamentar n.º 13/2012: Aprova a orgânica da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência
Região Autónoma dos Açores - Presidência do Governo
·        Decreto Regulamentar Regional n.º 1/2012/A: Define os princípios regulamentares quanto à dispensa, embalagem e identificação do medicamento em unidose com vista à sua rastreabilidade e segurança

Tribunais e Ministério Público (D.R. n.º 15, Série II de 2012-01-20)

Supremo Tribunal de Justiça
·        Despacho (extrato) n.º 811/2012: Exoneração, a seu pedido, do cargo de secretária pessoal do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
Tribunal de Contas
·        Parecer n.º 1/2012: Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2010
Conselho Superior da Magistratura
·        Despacho n.º 812/2012: Delegação de competências nos juízes presidentes dos Tribunais da Relação

Jornal Oficial da União Europeia (20.01.2012)

L (Legislação): L017
C (Comunicações e Informações): C017 C017A