segunda-feira, 18 de março de 2013

Prescrição de processos: Juízes aconselhados a usar alarmes

Sistema informático já permite definir alertas. Conselho Superior da Magistratura pede que passe a ser usado.

O Conselho Superior da Magistratura (CSM) pretende que os juízes passem a definir alarmes nos sistemas informáticos Citius e Habilus – usados na gestão dos processos – para evitar a prescrição de penas e processos-crime. A sugestão do CSM é feita a todos os juízes numa circular recente, à qual o PÚBLICO teve acesso.
A recomendação surge na sequência de uma exposição do presidente da Comarca do Baixo Vouga, Paulo Brandão, ao CSM face a um "episódio de prescrição de pena aplicada em processo-crime que corria termos" naquela comarca.
"A prescrição ocorreu num processo em que tinha sido decretada pena de prisão remível em pena de multa. É algo que não pode voltar a acontecer, por isso tomámos medidas", referiu Paulo Brandão ao PÚ- BLICO. A exposição do juiz prevê uma planificação de alertas informáticos que sejam accionados cinco meses antes da data de prescrição bem como quando faltem cinco dias para a mesma.
"Apreciado o expediente apresentado relativamente à uniformização de procedimentos de controlo de prescrição de pena aplicada em processo-crime, foi deliberado fazer circular o mesmo como sugestão", refere a deliberação do CSM. Todos os dias há três processos-crime que prescrevem nos tribunais portugueses, segundo dados do Ministério da Justiça noticiados pelo PÚBLICO em 2012.
O Código Penal (CP) prevê prazos de prescrição para os processos e para as penas decretadas. Estabelece que as penas prescrevem no prazo de 20 anos, se forem superiores a dez anos de prisão; 15 anos, se forem iguais ou superiores a cinco; dez anos, se forem iguais ou superiores a dois anos de prisão; e quatro anos, nos restantes casos.
A secretária-geral da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Maria José Costeira, considera a sugestão "muito importante".
"Nenhum sistema é perfeito e por isso o que se pretende é a sua contínua melhoria. O sistema já permite isso, mas boa parte dos juízes desconhece a possibilidade. Em algumas comarcas já são usados os alertas", diz a juíza, que recorda que "são os funcionários que colocam os alertas e não os juízes", ainda que estes sejam "responsáveis".
A juíza admite que os alarmes podem "ajudar a evitar a prescrição de processos" – "Antigamente era o escrivão que ia de 15 em 15 dias ver os prazos que corriam em cada processo", explica ainda.
O presidente do Sindicatos dos Magistrados do Ministério Público, Rui Cardoso, recorda, por seu lado, que os procuradores "já utilizam, normalmente, alarmes e outras formas de controlo de prazos" durante a fase de inquérito e que as prescrições são "raríssimas".
"Juízes deviam ter agendas"
Já o bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, admite que a medida pode ser importante, mas culpa os juízes pelas prescrições. "Os despertadores só acordam quem está a dormir. Os juízes deviam ter agendas como têm os advogados e deviam ser responsabilizados de cada vez que um processo ou pena prescrevem", diz o bastonário. E recorda o "caso mais exemplificativo da falta de responsabilidade nos tribunais": em 2011, o antigo director do Departamento de Urbanismo da Câmara de Portimão e ex-presidente do Portimonense Sporting Clube, Alberto Estêvão, livrou-se do cumprimento de uma pena de prisão a que tinha sido condenado em Maio de 2006. Nessa altura, recorreu da sentença para o Tribunal da Relação de Évora, mas este demorou mais de quatro anos para decidir que o processo, afinal, tinha prescrito quase três anos depois de ali ter chegado. Aplicou-se um artigo do CP que determina que a prescrição do processo ocorre logo que sob a prática do crime tiverem decorrido 15 anos. Os factos, neste caso, reportavam-se a 1991.
Ao PÚBLICO, o Ministério da Justiça faz saber que os "alarmes já são utilizados por vários funcionários e magistrados", mas salienta que o seu uso "está dependente da activação do alarme por parte do utilizador". E avança que no "âmbito do Plano de Acção para a Justiça na Sociedade de Informação, já foi identificada a necessidade de melhorar o modelo de alertas existente", com "alertas automáticos de acordo com regras que estão a ser definidas".
Pedro Sales Dias | Público | 18-03-2013

Maioria teme crise política depois da decisão do TC

Falar em crise serve de pressão indirecta sobre os juizes, mas no PSD e no CDS há quem acredite que o pior pode estar para vir.

A decisão do Tribunal Constitucional (TC) sobre as normas do Orçamento para este ano está prestes a ser conhecida e no governo e na maioria o clima já é de pré-crise política. Mas desta vez não no seio do executivo, entre CDS e PSD, como aconteceu depois da apresentação do aumento da TSU, mas para fora: com a restante oposição, principalmente com o PS, e com a sociedade.
Nas bancadas do PSD e do CDS acredita-se que o eventual chumbo do TC de normas do Orçamento do Estado é uma decisão politicamente pesada para o executivo. A acontecer, a equipa de Passos Coelho vê o Orçamento não passar no TC pela segunda vez. Contudo, a reacção do primeiro-ministro, acreditam, depende das normas que sejam chumbadas, uma vez que a margem é curta para arranjar novas medidas que substituam as que venham a não passar no crivo da constitucionalidade. "Se o Tribunal chumba as normas todas, é a desgraça", desabafa um deputado. Não é único a temer o desfecho. Ao "Expresso" um ministro alertava que "o país pode ficar ingovernável" no caso de chumbo do TC uma vez que já não há muita criatividade para arranjar mais medidas de corte. O cenário da demissão não é posto em cima da mesa, tendo em conta a personalidade do primeiro-ministro, mas há quem defenda um apelo ao Presidente.
Ao contrário do que aconteceu aquando do anúncio do aumento da TSU, a crise não parte dentro do executivo. Outro deputado acredita que desta vez Paulo Portas e o CDS estão "dentro" do governo e que foi aliás o papel do ministro, juntamente com o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, que levou à cedência da troika em mais um ano para o corte de quatro mil milhões de euros. Fonte centrista diz no entanto que a ideia era ir mais longe na flexibilização para acautelar o eventual chumbo do TC. A pressão do executivo que acenou aos técnicos da troika com as previsões macroeconómicas e com a conjuntura externa criaram um mal-estar entre os dois lados da negociação, com a troika a não flexibilizar mais e a fazer um ultimato ao governo: os cortes na despesa são para apresentar até à próxima avaliação e são condição para o desembolso da próxima tranche de ajuda.
As movimentações, oficiais e nos corredores, parecem ir num único sentido: o de pressionar os juizes, mesmo que indirectamente, uma vez que as decisões, ao serem mais politizadas, podem ter consequências catastróficas desencadeando uma crise. A ideia contrasta com a reacção inicial quer do PSD quer do CDS que evitaram falar na decisão do Presidente da República de pedir a fiscalização de três normas.
Além da pressão sobre o conteúdo da decisão, há também uma pressão para que esta decisão saia o mais depressa possível. No sábado, Marques Mendes, na SIC, criticava a demora dos juizes, dizendo que estes já deviam ter decidido e afirmou que a decisão deverá ser conhecida nas próximas semanas.
A par da situação económica e financeira e da decisão do TC, outra preocupação é o clima com o PS (ver pág. 4). Mesmo assim há quem defenda um governo que inclua o PS, como o economista Daniel Bessa que, em entrevista à Rádio Renascença, traçou um cenário negro: "Estamos todos no país a tentar evitar o momento final do anúncio ao mundo da bancarrota e do incumprimento".
Além do PS, a tensão é evidente com os parceiros sociais - o acordo tripartido que Passos Coelho tem vendido lá fora como uma conquista, está preso por um fio. A UGT já ameaçou rasgar o acordo e a decisão de reduzir novamente as compensações por despedimento volta a pôr à prova a relação. O secretário-geral da UGT já reforçou que rasgará o acordo caso o fundo de compensações não entre ao mesmo tempo que a nova redução. E ontem, Silva Peneda, presidente do Conselho Económico e Social, defendeu que a austeridade deve abrandar e que sejam "mais escutadas as vozes e anseios dos parceiros sociais".
Este pedido de Silva Peneda vai ao encontro da crítica da troika sobre a comunicação do executivo. Já não é a primeira vez que FMI, BCE e CE alertam para os perigos da deficiente comunicação (já o ano passado o tinham feito), mas agora insistem que o governo tem de explicar melhor o que está a fazer.
Para já, no executivo, a única esperança baseia-se numa recuperação da actividade económica, apesar de ténue, e na "boa notícia" que pode significar dois investimentos avultados, um deles chinês, que estão a ser negociados.
Liliana Valente | ionline | 18-03-2013

Correio da Justiça: Alterações ao CPP

Por: Rui Cardoso, Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
Entram em vigor esta semana as alterações ao Código de Processo Penal aprovadas recentemente pela Assembleia da República. Se algumas são discutíveis ou pouco relevantes, outras são verdadeiramente importantes e permitirão que a "verdade" apurada pelos tribunais se aproxime mais da "verdade" material e que a Justiça deixe de se contentar com meras aparências de "verdade"; outras ainda, como o alargamento do processo sumário, permitirão ganhos de celeridade, sem prejuízo para a qualidade.
Porém, para que assim aconteça, é imprescindível que polícias e Ministério Público se adaptem às alterações e se articulem de forma mais eficaz. Os juízes, habitualmente avessos a mudanças, deverão aceitá-las e aplicá-las dentro dos princípios gerais. Aos Conselhos Superiores, caberá adequar os quadros de magistrados. Sem isto, estas alterações tornar-se-ão apenas boas intenções.
O que ninguém deverá fazer é, assumida ou dissimuladamente, boicotar a lei.