domingo, 5 de agosto de 2012

Primeiro-ministro italiano alerta Alemanha para risco de "dissolução da Europa"

Económico com Lusa  
05/08/12 11:18
Monti alerta a Alemanha para o risco de um "confronto entre Norte e Sul" na Europa, numa entrevista hoje publicada pela Der Spiegel.
Monti manifestou-se preocupado com as "tensões que acompanham a zona euro nos últimos anos", que contêm "a semente da dissolução psicológica da Europa".
O chefe do Governo italiano considera "muito preocupante" o aumento das tendências nacionalistas na Europa, que "levantaram uma frente de confronto entre Norte e Sul".
Monti sugere que, mais do que financiamento, o sul da Europa precisa de solidariedade: "Se a Alemanha e outros países estão interessados em que a atual política em Itália tenha futuro, (devem dar) apoio moral, não financeiro", disse o estadista italiano, segundo traduções da entrevista feitas pelas agências EFE e Bloomberg.
O chefe do Governo italiano considera que alemães e outros europeus "devem dar mais alguma margem de manobra a alguns países da zona euro que estão a cumprir os requisitos da forma mais estrita".
A "margem de manobra" também deve ser concedida pelos parlamentos nacionais aos respetivos governos, disse Monti, numa referência velada à situação política alemã. Monti sugeriu que uma política de inflexibilidade tornará "a dissolução da Europa mais provável que o reforço da integração".
Monti tem sido um dos grandes defensores de uma política mais interventiva das instituições europeias para resolver a crise da zona euro. Nesse sentido, saudou as medidas anunciadas recentemente pelo seu compatriota Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu.
Esta semana, Draghi afirmou que o "conselho de governadores (do BCE) poderá aplicar mais medidas não convencionais para restaurar a transmissão de política monetária", uma referência à possibilidade de o BCE voltar a comprar títulos de dívida europeia - e assim reduzir as taxas de juro pagas por países como a Espanha e a Itália.
Draghi disse que qualquer nova compra de obrigações pelo BCE terá de ser precedida por um pedido de ajuda a um dos fundos de estabilidade financeira. Mas, mesmo nesta versão condicional, a ideia de o BCE financiar diretamente os Estados da zona euro não agrada a todos os membros do banco - particularmente à Alemanha.
"Essas preocupações são infundadas", disse Monti ao Spiegel. "É exatamente essa desconfiança que nos impediu de encontrar uma solução clara para esta crise. Temos que a superar e voltar a confiar uns nos outros."

Sindicatos estudam recurso a tribunal para evitar cortes no subsídio de Natal

Público: 05.08.2012 - 11:57 Por Raquel Martins
<p>O Tribunal Constitucional chumbou os cortes de subsídios, mas com efeitos apenas a partir do próximo ano Pedro Cunha</p>O Tribunal Constitucional chumbou os cortes de subsídios, mas com efeitos apenas a partir do próximo ano Pedro Cunha
Alguns sindicatos da função pública estão a ponderar avançar com acções judiciais para reclamarem o pagamento ainda este ano do subsídio de Natal, numa tentativa de contornar o acórdão do Tribunal Constitucional (TC). Os gabinetes jurídicos dos sindicatos estão a analisar a viabilidade das acções, que deverão dar entrada nos tribunais durante o mês de Setembro.
A 5 de Julho, o TC declarou inconstitucional a suspensão dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e dos pensionistas, mas entendeu que essa decisão não se aplicaria em 2012, mas a partir de 2013, uma decisão inédita que surpreendeu tudo e todos. Porém, a doutrina dominante em Portugal entende que essa limitação dos efeitos do acórdão não pode ocorrer quando os tribunais e o próprio TC são confrontados com um caso em concreto.
Rui Medeiros, advogado e professor da Universidade Católica, foi quem alertou para esta possibilidade, numa entrevista ao Jornal de Negócios há algumas semanas. Agora, em declarações ao PÚBLICO explica que a questão tem sido meramente teórica e doutrinária, porque o TC nunca tinha remetido os efeitos de uma decisão para o futuro. "Esta é a primeira vez que se suscita esta questão. Mas a posição dominante entre os constitucionalistas é que esta limitação de efeitos pode acontecer no âmbito da fiscalização abstracta, mas não quando se está perante um caso em concreto", realça. E concretiza: "Uma coisa é a fiscalização abstracta, que foi pedida por um grupo de deputados, outra coisa é um funcionário do Estado propor uma acção judicial, a pedir que lhe reconheçam o direito ao subsídio de Natal. Aqui já estamos perante uma situação concreta". Ou seja, mesmo que na fiscalização abstracta o TC tenha remetido os efeitos da inconstitucionalidade para 2013, se lhe for pedida a fiscalização de um caso concreto, a decisão pode ser diferente, e os efeitos podem aplicar-se já este ano.
Embora não defenda que isso deva acontecer, Rui Medeiros alerta que existe um risco que deve ser tido em conta.
O constitucionalista Tiago Duarte vai contra a corrente dominante e entende que os tribunais administrativos e fiscais "aplicarão a norma tal como foi aplicada pelo TC, considerando que os efeitos só se produzem a partir de 1 de Janeiro de 2013". Tiago Duarte assinala que a Constituição prevê a possibilidade de o TC fixar os efeitos para o futuro no caso da fiscalização abstracta de uma norma. E reconhece que se o tribunal tivesse sido colocado perante um caso concreto, não podia adiar os efeitos. No entanto, agora, dado que já existe uma decisão em sede de fiscalização abstracta, o constitucionalista entende que se o TC tiver que se pronunciar sobre casos relacionados com este assunto, "dificilmente mudará de opinião".
Também o especialista em Direito Público e Administrativo Raul Mota Cerveira diz não vislumbrar "qualquer fundamento para as acções individuais, porque o acórdão do TC legitimou os cortes em 2012". Embora assinale que a questão "não está fechada".
Estratégias sindicais
Perante estas posições, os sindicatos tentam aproveitar a brecha deixada em aberto pela decisão inédita - mas não unânime - dos juízes do Constitucional, embora reconheçam que nada é garantido.
O Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE) enviou uma carta aos sócios, no final de Julho, a disponibilizar-se para interpor novas acções em tribunal para reclamar o pagamento dos subsídios de férias e de Natal. O STE pergunta se os funcionários devem resignar-se com a decisão do TC ou reagir "dentro da estreita margem em que é possível fazê-lo e com as dúvidas e incertezas que a situação concreta suscita".
Bettencourt Picanço, presidente do STE, é cauteloso e reconhece que "não são favas contadas". "Convém não esquecer que são os tribunais que, face a pedidos concretos, irão decidir se as normas declaradas inconstitucionais devem ou não ser aplicadas relativamente ao subsídio de Natal de 2012", realça-se.
Bettencourt Picanço adianta que "poucas dezenas" de funcionários já se mostraram interessados em avançar com acções, mas o prazo dado aos sócios é até ao final de Agosto.
Também no Sindicato da Função Pública do Sul e Ilhas (STFPSA) o tema está a ser estudado pelo gabinete jurídico. "Convém ter uma posição consolidada. Não vale a pena criar expectativas nas pessoas, que depois não se concretizam", adiantou ao PÚBLICO Alcides Teles, dirigente do sindicato da CGTP.
Em cima da mesa está a decisão de avançar ou não com acções e, por outro lado, decidir se elas devem ser individuais ou uma acção do sindicato em representação dos sócios. "No princípio de Setembro teremos uma decisão quanto à forma de recuperar o subsídio de Natal", acrescenta.
José Abraão, dirigente da Frente Sindical para a Administração Pública (Fesap), dá conta de alguns casos de trabalhadores que pediram apoio jurídico para avançar com acções contra o Estado. E não tem dúvidas: "Não pode haver intervalos e os tribunais certamente decidirão nesse sentido".
O acórdão do TC chumbou os cortes nos subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores das entidades públicas e dos pensionistas por considerar que a medida viola o princípio da igualdade e por considerar que estes cortes têm um peso "excessivamente gravoso". Mas para evitar problemas orçamentais este ano, o TC remeteu os efeitos para 2013.

Escutas de políticos

Por: Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
O anúncio da possível revisão do regime de "escutas de políticos" aconselha a uma análise do seu conteúdo, origem e razão de ser. Análise que deve começar por uma advertência: esse regime só abrange o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro-Ministro e não os deputados, membros do Governo e autarcas em geral.
Mas de que regime se trata? O artigo 11º do Código de Processo Penal atribui ao Presidente do Supremo competência para "autorizar a interceção, a gravação e a transcrição de conversações ou comunicações em que intervenham o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República ou o Primeiro--Ministro e determinar a respetiva destruição". Esta norma foi aprovada em 2007, mas não teve origem nos trabalhos da Unidade de Missão para a Reforma Penal. Foi acordada diretamente no âmbito do Pacto de Justiça, celebrado em 2007 pelo PS e pelo PSD. O seu objetivo parece ser resguardar as conversações e comunicações dos mais altos dignitários do Estado, tendo em conta as suas funções e responsabilidades.
A norma citada foi inovadora em relação à versão originária do Código de 1987? Só em parte, visto que o Código prevê, desde sempre, que o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro-Ministro sejam julgados pelo pleno das secções criminais do Supremo e que o juiz de instrução pertença, obrigatoriamente, a uma dessas secções.
Assim, se o Código retomasse a sua redação primitiva, as escutas do Presidente da República, do Presidente da Assembleia da República e do Primeiro-Ministro voltariam a ser autorizadas por um juiz do Supremo escolhido por sorteio e não pelo Presidente. O princípio do juiz natural prevaleceria sobre a presunção de maior responsabilida-de do Presidente do Supremo.
A esta alteração pontual poderia acrescer outra mais subtil mas não menos importante. No caso de escutas fortuitas aos referidos dignitários, no âmbito de processos em que são arguidas quaisquer outras pessoas, não seria necessária a intervenção de um juiz do Supremo, bastando que as escutas tivessem sido autorizadas pelo juiz do processo.
Porém, a revogação do modelo instituído pelo Pacto de Justiça não sujeitaria ao regime geral das escutas os três principais dignitários do Estado. E nem a revogação do regime originário do Código conseguiria plenamente tal efeito, dado que a Constituição garante que o julgamento do Presidente da República e a instrução do processo decorrem no Supremo.