terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

Casa da Suplicação LXI


Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça — pedido de aclaração infundado — arguição de nulidade com os mesmos fundamentos — demoras abusivas — remessa à 1.ª instância para execução
Se o arguido pede a aclaração de um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, quando nada há para aclarar e é patente que bem o compreendeu, aclaração que é desatendida, e depois argúi a nulidade do mesmo acórdão utilizando exactamente os mesmos elementos, tendo decorrido cerca de 10 anos sobre os factos, é manifesto que quer obstar ao transito em julgado da decisão condenatória, pelo que, nos termos do n.º 2 do art. 720.º do CPC, aplicável por força do art. 4.º do CPP, devem os autos ser remetidos à 1.ª instância para execução e o incidente prosseguir em traslado, para o efeito, extraído.
Ac. do STJ de 02.02.2006, Proc. n.º 2646/05, Relator: Cons. Simas Santos

Natureza dos recursos — questão nova — correcção das conclusões da motivação — matéria de facto — conhecimento oficioso dos vícios de facto — especificações — texto da motivação
1 – Os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas não apreciadas pelo tribunal recorrido, mas sim para apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso.
2 – Assim se o arguido só recorreu da decisão final da 1.ª Instância para a Relação invocando a existência de erro notório na apreciação da prova, não pode depois recorrer para o STJ invocando outros vícios da decisão ou impugnando a qualificação jurídica ou a medida da pena.
3 – Pois não pode o Supremo Tribunal de Justiça pode conhecer de questões que, embora resolvidas pelo Tribunal de 1.ª Instância não foram suscitadas perante a 2.ª Instância, de cuja decisão agora se recorre.
4 – O entender o STJ que pode conhecer oficiosamente dos vícios da matéria de facto, só significa que, se o tribunal reconhecer espontaneamente a existência de tais vícios, pode/deve conhecer deles e declará-lo. Não significa que os interessados os podem indicar como fundamento do recurso, pois isso seria «a requerimento das partes». Não tendo o Tribunal reconhecido a existência de um desses vícios não se pode afirmar que, não só o tribunal o reconheceu, como, nessas circunstâncias, dele não conheceu, assim omitindo pronúncia devida.
5 – Entendendo a Relação que o recorrente não forneceu os elementos legais necessários para reapreciar a decisão de facto nos pontos que questiona, a solução não é "a improcedência", por imodificabilidade da decisão de facto, mas o convite para a correcção das conclusões. A ausência de tal convite e a subsequente ausência de pronúncia sobre matéria que devia conhecer torna nulo o acórdão da Relação
6 – Mas deve distinguir-se a deficiência resultante da omissão na motivação dessas especificações, caso em que o vício seria insanável, da omissão de levar as especificações constantes do texto da motivação às conclusões, situação que impõe o convite à correcção. O texto da motivação constitui o limite à correcção das respectivas conclusões.
Ac. do STJ de 02.02.2006, Proc. n.º 4409/05-5, Relator: Cons. Simas santos

«Temos de assumir o nosso estatuto por inteiro»

Devo dizê-lo com toda a frontalidade: sou contra a tão (hoje) badalada "greve de zelo" nos tribunais. É um comportamento que só degrada ainda mais a imagem de magistrados e oficiais de justiça junto da população. Para nós, magistrados, o Governo não é o "nosso" patrão, nós não trabalhamos para o MJ ou para o Governo! Não temos que estar "motivados" ou "desmotivados", conforme o MJ sorria ou faça cara feia para nós. Nós não somos funcionários (mesmo os oficiais de justiça são, e eles tendem a esquecê-lo quando isso importa desvantagens, um corpo especial). Temos de assumir o nosso estatuto por inteiro. Assumir a condição de funcionários-burocratas, ainda que como forma de "luta", tem um custo demasiado alto. Quem não quer ser funcionário não veste "mangas de alpaca"! Se as veste, não se pode queixar...


Publicado por Eduardo Maia Costa, em Sine Die

A providência de habeas corpus e a (ir)regularidade de actos do processo

I - No âmbito da decisão sobre uma petição de habeas corpus, não cabe julgar e decidir sobre a natureza dos actos processuais e sobre a discussão que possam suscitar no lugar e momento apropriado (isto é, no processo), mas tem de se aceitar o efeito que os diversos actos produzam num determinado momento, retirando daí as consequências processuais que tiverem para os sujeitos implicados.
II - A providência de habeas corpus não decide, assim, sobre a regularidade de actos do processo com dimensão e efeitos processuais específicos, não constituindo um recurso de actos de um processo em que foi determinada a prisão do requerente, nem um sucedâneo dos recursos admissíveis.
III - Na providência há apenas que determinar, quando o fundamento da petição se refira a uma dada situação processual do requerente, se os actos de um determinado processo, valendo os efeitos que em cada momento produzam no processo, e independentemente da discussão que aí possam suscitar (a decidir segundo o regime normal dos recursos), produzem alguma consequência que se possa acolher aos fundamentos da petição referidos no art. 222.°, n.° 2, do CPP.

Ac. do STJ de 02-02-2005 - Proc. n.º 351/05 - 3.ª Secção

Henriques Gaspar, Antunes Grancho, Silva Flor, Soreto de Barros

(deferência alheia)