terça-feira, 16 de outubro de 2012

“Discute-se o orçamento mais difícil da história democrática”

16-10-2012

Guilherme d' Oliveira Martins

O Presidente do Tribunal de Contas considera que uma parte significativa dos problemas no OE está relacionada com a inexistência da informação completa.

Guilherme d' Oliveira Martins reconheceu hoje que o Orçamento de Estado (OE) do próximo ano é o mais difícil desde 1974 e, por essa razão, obriga a maior transparência. O presidente do Tribunal de Contas lembrou a recomendação da instituição a que preside para que a Conta do Estado seja apresentada “mais cedo, até ao final de março” de cada ano, para que exista já um parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado quando o Orçamento de Estado é discutido no parlamento, em outubro.

“Em 2012 estamos a debater o Orçamento mais difícil do período democrático. Uma parte significativa dos problemas no OE está relacionada com a inexistência da informação completa. Há défice de transparência no fenómeno das finanças públicas”, afirmou Guilherme d' Oliveira Martins, numa conferência em Lisboa sobre o Estado e a competitividade da economia portuguesa, salientando que esta dificuldade reforça a importância de o debate orçamental ser “mais transparente”.

Sobre as parcerias público privadas (PPP), o presidente do Tribunal de Contas defendeu que “o mal da derrapagem não está no instrumento mas sim nos maus cadernos de encargos”: “O Estado tem de executar o interesse público não apenas no momento da execução mas em termos planeamento”, completou.

Justiça: as boas mudanças

António ClunyPor António Cluny, publicado em 16 Out 2012 - 03:00
Conceber uma organização judiciária que sirva os interesses mais comuns dos cidadãos será porventura o melhor caminho para modernizar e, de novo, prestigiar os tribunais

1. As escolhas das lideranças das magistraturas decorrem de processos constitucionalmente diferentes.
Os juízes do Supremo Tribunal de Justiça elegem, com o seu saber, experiência e independência, o seu presidente.
O procurador-geral da República é, nos termos da Constituição, nomeado pelo Presidente da República por proposta do governo.
Os processos de escolha e legitimação destas figuras cimeiras do poder judicial não são, contudo, iguais em todos os países: resultam de concepções históricas diversas – por vezes ultrapassadas – das funções da magistratura judicial e do Ministério Público.

2. Fruto de uma excessiva personalização da actividade judiciária, alimentada também pela abordagem mediática fulanizada da política moderna, ambas as figuras cimeiras das magistraturas são por isso confrontadas com responsabilidades que legalmente não têm e não devem ter.
Hoje, contudo, o controlo da acção e das carreiras das magistraturas está, felizmente, entregue a órgãos colegiais, compostos por elementos vindos de áreas cívicas, profissionais e funcionais distintas. A sua composição é, por conseguinte, plural e pluralista, e permite, se cumprido com dedicação e seriedade, uma total e eficaz fiscalização democrática do exercício do poder judicial e dos seus protagonistas.
São, pois, esses os órgãos que no essencial devem garantir aos cidadãos que a justiça se exerce com independência e objectividade.
Quem estiver atento – e observar, por exemplo, os problemas de legitimidade que se desenvolvem em torno dos sistemas de gestão e controlo das magistraturas na Alemanha, em França, na Itália, em Inglaterra, Espanha e na Hungria – percebe quão aperfeiçoado e pacificador é, apesar de tudo, o sistema português.

3. O problema do funcionamento da justiça não reside de facto aí, nem nos métodos de escolha das lideranças das magistraturas.
O problema – e ele realmente existe – situa-se sobretudo na organização das jurisdições e das procuradorias, e na incoerência existente entre essa organização, as formas de processo em vigor e as carreiras dos magistrados.
Encontra-se ainda no programa da sua formação inicial e permanente, bem como na adequação destas a uma especialização dos magistrados, fundamental no enquadramento dos modernos modelos de organização e actividade judicial.
Conceber uma organização judiciária que sirva os interesses mais comuns dos cidadãos e que, simultaneamente, seja dotada de instrumentos processuais apropriados e de equipas de magistrados especializados e capazes de atingir níveis de intervenção altamente qualificada, será porventura o melhor caminho para modernizar e, de novo, prestigiar os tribunais.
Importa pois construir um sistema simples, eficiente mas eficaz e acessível, que faça valer os direitos dos cidadãos e assegure ainda a transparência e a correcção da actuação dos mercados no comércio privado e na relação que estes desenvolvem com o Estado.
Isso não significa, porém, que o contributo positivo ou negativo de quem, ao mais alto nível, representa as magistraturas (ou a advocacia) não possa ser – como é – fundamental para promover e afirmar a normalidade institucional e o alento colectivo necessário às transformações organizativas e legais, indispensáveis ao funcionamento eficiente e efectivo da justiça.
Por isso, o exercício de tais lugares constitui uma enorme responsabilidade cívica, que adquire no actual momento um relevante significado político. Bom trabalho!

Jurista e presidente da MEDEL