Público
de 2012-11-08
Por: Rui Pereira,
Professor Universitário
De quando em
vez, ouve-se dizer que os políticos devem dar o exemplo para credibilizar a
Política (que consiste, ou deve consistir, na nobilíssima missão de governar o
Estado e procurar o bem comum).
Creio que
alguns interessados em dar o exemplo disporão, dentro em breve, de uma
magnífica oportunidade para o fazer. Estarão os partidos dispostos a adoptar a
interpretação mais rigorosa possível da lei, que estabelece um número máximo de
mandatos dos presidentes de câmara municipal e de junta de freguesia, nas
próximas eleições autárquicas?
A revisão
constitucional de 2004 veio admitir limites à renovação sucessiva de mandatos
dos titulares de cargos políticos executivos e a Lei nº 46/2005 determinou que
os presidentes de câmara municipal e de junta de freguesia só podem ser eleitos
para três mandatos consecutivos. No entanto, o parto desta lei não foi fácil
(os presidentes dos Governos Regionais, inicialmente abrangidos, ficaram de
fora) e a sua interpretação é controversa: o número de mandatos torna-se
ilimitado quando os autarcas mudam de concelho ou de freguesia?
Juridicamente,
há argumentos para todos os gostos. Como a lei não faz distinções, poderia
dizer-se que o intérprete também não as deverá fazer e que a contagem do limite
de mandatos inclui mudanças de autarquia. Todavia, a expressão utilizada pelo
legislador ("mandato consecutivo") parece apontar para mandatos
exercidos na mesma autarquia. Por outro lado, os trabalhos preparatórios do
novo regime legal não parecem conclusivos e os seus protagonistas fazem apelo a
um nível de subjectividade que não permite apreender com nitidez o espírito da
lei.
Mas o
problema não é só jurídico e a Constituição nem sequer impõe uma das
interpretações. Embora se destine a evitar a criação de nichos de poder e a
viabilizar a alternância, a limitação de mandatos também deve ser posta ao
serviço da renovação dos autarcas, como se assumiu aquando da aprovação da lei.
Ora, a mudança de cadeiras nas próximas eleições será entendida como um modo de
defraudar o novo regime legal. Assim, os partidos devem adoptar a interpretação
mais rigorosa e apresentar candidatos que não tenham esgotado o limite de
mandatos.