segunda-feira, 15 de novembro de 2004

Os discursos... e a realidade


Reportando-se ao acto de posse de um novo Vice-presidente do STJ, o site do STJ insere mais um discurso do seu Presidente, Conselheiro Aragão Seia (que aqui também se pode ler).
Diz-se mais um, porque o site é como se fosse pertença do Senhor Presidente, uma vez que ninguém mais aí tem voz; nem mesmo na abertura do Ano Judicial se abre a cortesia para inserir os discursos dos convidados, as mais altas figuras institucionais da Democracia.
Só quem tenha passado, ou vá passando, ao lado do STJ não se apercebe como as referências que no discurso se fazem à colaboração dos vice-presidentes – com todo o respeito pelas Venerandos Magistrados em causa – estão próximas de uma figura de retórica, remetidos que têm sido para actos de representação protocolar ou paralelos, sem qualquer cooperação num “programa” de vitalização que permitisse ao STJ assumir-se como o Tribunal de cúpula na organização judiciária comum.
O discurso é algo incongruente quando receia para breve os “ventos de agitação na área da Justiça”, que as reformas atinjam a “independência do judiciário” (sic) e tenham apenas o intuito de “domesticar e funcionalizar” as magistraturas, mas ao mesmo tempo acaba por as reconhecer, à contre coeur, como necessárias.
Duvida-se que algum magistrado atento se reveja nesta linguagem “doméstica” – nem tão pouco na que foi usada a propósito da formação, há uns dias. A generalidade dos magistrados desincumbem-se do seu munus, com liberdade e independência, e não têm receio de os restantes poderes democráticos, para os quais dão a sua quota-parte, os reduzirem à escravatura de consciência. Não só porque as suas vozes também serão ouvidas como porque as grilhetas acabaram.
Nem é coerente apelar à transparência de processos e à colaboração, pois basta recordar o que tem acontecido nos últimos anos na cooperação institucional que alguns magistrados do STJ ingenuamente têm dado e o proveito que daí se recolheu, em matérias, por exemplo, como a onerosa construção das bases de dados de jurisprudência, o seu uso racional intensivo, a discussão de problemas importantes no interior do Conselho Consultivo, a sequência dada a sugestões de alteração legislativa, etc., para se ver como também aqui a distância entre o discurso e a realidade é enorme.
Nem está esquecida a falta de colaboração do STJ com o próprio Congresso da Justiça.
O Presidente da República reafirmava que na democracia de opinião em que vivemos, a reforma da Justiça é condição essencial para que haja uma cidadania suficiente. E nas “urgências” de intervenção insistia nos temas da “melhor legitimação democrática das magistraturas e da sua responsabilização”, da “estrutura e atribuições dos tribunais superiores”, da formação dos agentes da Justiça, do “regime de recursos”, a par do reforço, na fase de inquérito, dos direitos de arguidos e das vítimas.
Não é desejável o unanimismo entre os órgãos de soberania, mas um mínimo de sintonia no desejo de mudanças na Justiça era necessário.
Coloca-se este post também para dizer que não existe unanimismo com este discurso.

PS – Acabo de ver que o Blog “Abrupto” vai ser premiado pelo Forum III Millennium, o que é bem revelador do peso que este tipo de participação social vai conquistando.

Coito oral e cópula: duas violações?

Com a alteração introduzida ao art. 164.º do C. Penal, pela Lei n.º 65/98 de 2 de Setembro, o coito anal e o coito oral passaram a integrar, ao lado da cópula, os modos de execução do crime de violação.
O que coloca a questão de saber se se mantém a jurisprudência anterior que entendia que o coito anal e oral ocorrido numa violação eram punidos, como atentado ao pudor, em concluso real com a violação.
O Supremo Tribunal de Justiça respondeu afirmativamente no acórdão de 11.11.2004 (proc. n.º 3259/04-5, Relator: Cons. Simas Santos), cujo sumário foi aqui divulgado (Casa da Suplicação VIII).
Argumentou-se então:
«Quando o coito oral e anal não integravam o tipo da violação, mas integravam antes o atentado ao pudor com violência, era uniforme a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que: «(1) nos últimos anos começou a criar-se um movimento jurisprudencial no sentido de conceder autonomia punitiva às diferentes condutas de natureza sexual de que é vítima uma determinada pessoa, mesmo quando os actos são praticados na sequência de uma conduta, prolongada no tempo, sim, mas circunscrita a um intervalo temporal relativamente reduzido. (2) - Mas, semelhante ao que sucede com o roubo, quando haja condutas enquadráveis nas figuras da violação e do atentado ao pudor, deverá entender-se que serão consumidos pelo crime de violação os actos necessários para a sua prática, mesmo quando possam ser considerados como correspondentes a crimes de atentado ao pudor, mas que, tais casos passarão a contribuir a comissão de crime autónomo de atentado ao pudor quando não tenham qualquer relação com o de violação, ou se mostrem desnecessários para a sua normal consumação. (3) Se à «cópula» bocal com a menor se seguiu a violação, então verifica-se o concurso real entre os dois crimes (Ac. do STJ de 14.10.93, proc. nº 45177, já em 9.11.83, BMJ 331-229, se afirmava que «continua a justificar-se a autonomização do crime de atentado ao pudor relativamente à violação, pois se trata de interesses juridicamente diferentes»).
Neste sentido se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça ainda nos Acs de 12.11.86, BMJ 361-259 , de 23.5.90, BMJ 397-232, de 13.2.91, BMJ 404-218, de 20.3.91, AJ n.º 17 e BMJ 405-209; de 24.11.93, proc. n.º 45532; de 17.6.92, proc. n.º 42688; de 28.2.96, proc. n.º 48589; de 17.10.96, proc. n.º 568/96, de 20.2.97, Acs STJ V, 1, 227; de 20.3.97, proc. n.º 1315/96; de 17.9.97, proc. n.º 616/97, de 30.7.98, proc. n.º 693/98, de 29.10.98, proc. n.º 538/98, de 30.7.98, proc. n.º 693/98; de 29.10.98, proc. n.º 538/98; de 30.7.98, proc. n.º 693/98; de 29.10.98, proc. n.º 538/98.
Com a redacção dada ao art. 164.º do C. Penal, pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro, o coito anal ou o coito oral passaram a integrar o tipo de violação, ao lado da cópula.
O que não alterou, só por si, aquela jurisprudência assente.
Desde logo, pretendeu-se aumentar a protecção do bem jurídico em causa, agravando assim a sanção para o coito oral ou anal, por meio de violência, ameaça grave ou abuso de autoridade, e não diminui-la, como resultaria do abandono daquela posição jurisprudencial.
Depois, a razão de ser desta posição mantém-se. O processo executivo, em qualquer dos três meios agora previstos (coito oral, coito anal, cópula), pressupõe motivação diversa e decisões autónomas, para cada um deles. Da mesma forma não é o mesmo o desvalor de resultado em cada um dos casos, por forma a que se possa falar em mera repetição mecânica imediata de uma mesma agressão.
Cada um daqueles meios implicando para o ofendido uma diferente intromissão e compressão da sua liberdade e autodeterminação sexual, bem como da sua intimidade sexual. E para o agente uma nova formulação de vontade.»
Mas será assim ?

Regulamentação da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais

Lê-se aqui:
O regime de Acesso ao Direito e aos Tribunais, aprovado pela Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, foi regulamentado pelas Portarias n.ºs 1085-A/2004 e 1085-B/2004, de 31 de Agosto, e n.º 1386/2004, de 10 de Novembro. O regime de acesso ao direito e aos tribunais e a respectiva regulamentação produzem efeitos a partir de 1 de Setembro de 2004.

A Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 91/2004, de 21 de Outubro, concretiza os critérios de prova e de apreciação da insuficiência económica do requerente previstos na Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais).
Esta portaria explicita a fórmula de cálculo do valor do rendimento relevante para efeitos de protecção jurídica a que se refere a Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais. A mencionada fórmula tem em conta os elementos relativos ao rendimento, ao património e à despesa do agregado familiar do requerente, assim permitindo uma avaliação objectiva e transparente da sua capacidade de pagamento.
A portaria enuncia ainda os documentos que devem ser juntos com o requerimento de protecção jurídica e estabelece regras quanto à periodicidade da liquidação e ao montante final a liquidar quando tenha sido concedido apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado.
É também regulamentado o mandato dos membros da comissão competente para a apreciação dos pedidos de protecção jurídica prevista no n.º 2 do artigo 20.º da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais e são definidas regras quanto ao procedimento de decisão.

A Portaria n.º 1085-B/2004, de 31 de Agosto, aprova os formulários de requerimento de protecção jurídica para as pessoas singulares e para as pessoas colectivas ou equiparadas, revogando, em consequência, a Portaria n.º 140/2002, de 12 de Fevereiro.

A Portaria n.º 1386/2004, de 10 de Novembro, define os termos em que o Estado garante a remuneração dos profissionais forenses, incluindo os solicitadores, pelos serviços prestados no âmbito do patrocínio oficioso e o reembolso das respectivas despesas.
É, em consequência, revogada a Portaria n.º 150/2002, de 19 de Fevereiro.
O regime de remuneração ora aprovado corresponde, no essencial, ao previsto na Portaria n.º 150/2002, de 19 de Fevereiro, conforme expressamente assumido no respectivo preâmbulo.
São, no entanto, introduzidas alterações pontuais àquele diploma, tendo por fito adequar o modelo de remuneração dos profissionais forenses ao regime de acesso ao direito e aos tribunais em vigor. Assim:
(a) Prevê-se o pagamento de honorários no montante de uma unidade de referência pela consulta jurídica prestada para efeitos de apreciação da existência de fundamento legal da pretensão;
(b) Estabelece-se que a remuneração referida na alínea anterior é acrescida de honorários no montante de cinco unidades de referência sempre que, em sede de consulta jurídica, o profissional forense alcance a superação do litígio por transacção ou por meios alternativos de resolução de litígios;
(c) Adequa-se a terminologia constante de alguns números da tabela anexa à presente portaria à usada em legislação em vigor (por ex., “processo sumaríssimo” passa a “processo sumaríssimo e acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias; “acção executiva ordinária e sumária” passa a “acção executiva, etc.);
(d) Alarga-se a regra relativa ao valor dos honorários a atribuir em caso de superação do litígio por transacção judicial às situações em que haja desistência, confissão, transacção ou impossibilidade superveniente da lide antes do fim da audiência de julgamento. Nestes casos, porém, o juiz pode decidir, tendo em consideração o trabalho prestado pelo profissional forense, a redução, até metade, dos honorários previstos na tabela anexa à portaria. A regra ora instituída aplica-se também aos casos em que o profissional forense alcance, durante a pendência da acção judicial, a superação do litígio por meios alternativos;
(e) Procede-se ainda à reestruturação formal da portaria.
De acordo com o disposto no preâmbulo da presente portaria, a publicação deste diploma regulamentar não prejudica a continuação do estudo de um novo modelo de remuneração dos profissionais forenses.
A Portaria n.º 1386/2004, de 10 de Novembro, entra em vigor em 11 de Novembro de 2004 e produz efeitos desde 1 de Setembro último.

Um advogado e uma cliente


Honore Daumier, A Lawyer with His Client (c. 1862)
Crayon and watercolor on paper
Staatsgalerie, Stuttgart, Germany

Direitos Humanos na Administração da Justiça - Conduta profissional (II)

Princípios Orientadores Relativos à Função dos Magistrados do Ministério Público

Adoptados pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de Setembro de 1990.

Podem se consultados aqui.

Concurso de provas públicas para a atribuição do título de notário

Ver aqui a lista dos candidatos admitidos e excluídos do concurso de provas públicas para a atribuição do título de notário.

Legislação do dia

Portaria n.º 1402/2004. DR 267 SÉRIE I-B de 2004-11-13 – Ministérios das Finanças e da Administração Pública e das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional : Fixa os factores de correcção extraordinária das rendas para vigorar em 2005

Aviso n.º 168/2004. DR 268 SÉRIE I-A de 2004-11-15 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Torna público ter o Secretariado-Geral do Conselho da União Europeia transmitido por nota verbal de 30 de Setembro de 2004 a acta de rectificação do Acordo de Parceria entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico e a Comunidade Europeia e os Seus Estados Membros, assinado em Cotonou em 23 de Junho de 2000 (Acordo de Cotonou), assinada em Bruxelas em 28 de Julho de 2004