quarta-feira, 7 de novembro de 2012
Fim dos procuradores distritais pode gerar "implosão" da hierarquia do MP
A nova procuradora-geral da
República, Joana Marques Vidal, preside por inerência ao conselho Miguel Manso
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Por Pedro Sales Dias
Parecer do Conselho Superior do Ministério
Público diz que medida atenta contra autonomia do Ministério Público.
Ministério da Justiça diz que procuradores-gerais distritais não serão
eliminados
Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) teme que o
projecto de lei de Organização do Sistema Judiciário, do Ministério da Justiça
(MJ), possa afectar a autonomia e a independência do Ministério Público (MP).
Em causa está a eliminação dos distritos judiciais e dos respectivos
procuradores-gerais distritais, que não aparecem mencionados na proposta do
Governo. Para o CSMP, a "eliminação do segundo nível de hierarquia"
do Ministério Público representa a "introdução de mudanças
destrutivas" e "a implosão da hierarquia, a crise da sua autonomia e
a pulverização da sua organização".
Se a proposta for aprovada tal como está, o MP passará a ser um "corpo pulverizado, constituído por inúmeras partículas isoladas", que se revelará "incapaz de se conduzir como um todo e de se afirmar em conjunto no cumprimento da missão que lhe está confiada", diz o CSMP no parecer a que o PÚBLICO teve acesso. O ministério salienta, contudo, que não haverá eliminação das procuradorias distritais e sustenta que o CSMP - órgão a que preside por inerência o procurador-geral da República - fez uma "leitura que não corresponde à intenção do projecto".
Fonte do gabinete da ministra da Justiça avançou ao PÚBLICO que o parecer terá sido elaborado por um grupo de trabalho dentro do próprio CSMP que incluía os procuradores-gerais distritais de Lisboa e Coimbra e não foi votado por todos os conselheiros. O PÚBLICO apurou, contudo, que não é frequente que estes pareceres sejam aprovados, devido aos prazos reduzidos de resposta.
PGR em silêncio
O Estatuto do MP estabelece que "na sede de cada distrito judicial existe uma Procuradoria-Geral Distrital" dirigida por um procurador a quem compete, entre outras missões, "dirigir e coordenar a actividade do MP no distrito judicial, emitir ordens e instruções e representar o MP no Tribunal da Relação". A proposta do MJ, contudo, omite os procuradores-gerais distritais e cria, por outro lado, a figura do procurador-geral adjunto coordenador nos cinco tribunais da Relação existentes no país.
Alguns procuradores reconheceram ao PÚBLICO o receio de estes "coordenadores, de quem ainda não se conhece os futuros poderes, não terem a mesma autonomia e poder face à Procuradoria-Geral da República", que garantiu ontem que não se vai pronunciar publicamente sobre o assunto e que a sua posição "será transmitida às entidades competentes". Já José Baranita, da direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, assume que os procuradores têm "algumas reservas quanto à proposta".
Sem "blindagem a pressões"
O CSMP salienta ainda no seu parecer que não estão explicadas as razões pelas quais se pretende esta alteração nos níveis de hierarquia e lembra que esta "é condição de autonomia e de afirmação da magistratura do MP e, nesse quadro, da Lei, do Estado de direito democrático e de cada um dos seus magistrados", constituindo "um factor de blindagem a pressões exteriores". Por isso, defendem que a "presente iniciativa legislativa seja abandonada" e que a sua discussão "seja retomada em conjunto com os "estatutos dos magistrados judiciais e do MP".
Os conselheiros criticam também o MJ por pretender instituir um modelo de governance do MP com uma magistratura não hierarquizada. "Na coerência do modelo proposto seria até dispensável a Procuradoria-Geral da República e o respectivo titular - o PGR -, subsistindo só, em coincidência com a magistratura judicial, o CSMP e o respectivo presidente."
Outro motivo de preocupação do CSMP refere-se às alterações na própria composição deste órgão, onde passarão a ter assento já não os quatro procuradores-gerais distritais mas os cinco procuradores-gerais adjuntos coordenadores que vão representar o Ministério Público nos tribunais da Relação. O CSMP diz que a alteração, a avançar, contribuirá para "desequilibrar" ainda mais "a representação no conselho, que já hoje conta com um número de magistrados muito superior ao de não magistrados". Para além disso, a alteração pode ser inconstitucional por ser feita através de uma lei ordinária, quando a lei fundamental prevê a composição daquele órgão.
Se a proposta for aprovada tal como está, o MP passará a ser um "corpo pulverizado, constituído por inúmeras partículas isoladas", que se revelará "incapaz de se conduzir como um todo e de se afirmar em conjunto no cumprimento da missão que lhe está confiada", diz o CSMP no parecer a que o PÚBLICO teve acesso. O ministério salienta, contudo, que não haverá eliminação das procuradorias distritais e sustenta que o CSMP - órgão a que preside por inerência o procurador-geral da República - fez uma "leitura que não corresponde à intenção do projecto".
Fonte do gabinete da ministra da Justiça avançou ao PÚBLICO que o parecer terá sido elaborado por um grupo de trabalho dentro do próprio CSMP que incluía os procuradores-gerais distritais de Lisboa e Coimbra e não foi votado por todos os conselheiros. O PÚBLICO apurou, contudo, que não é frequente que estes pareceres sejam aprovados, devido aos prazos reduzidos de resposta.
PGR em silêncio
O Estatuto do MP estabelece que "na sede de cada distrito judicial existe uma Procuradoria-Geral Distrital" dirigida por um procurador a quem compete, entre outras missões, "dirigir e coordenar a actividade do MP no distrito judicial, emitir ordens e instruções e representar o MP no Tribunal da Relação". A proposta do MJ, contudo, omite os procuradores-gerais distritais e cria, por outro lado, a figura do procurador-geral adjunto coordenador nos cinco tribunais da Relação existentes no país.
Alguns procuradores reconheceram ao PÚBLICO o receio de estes "coordenadores, de quem ainda não se conhece os futuros poderes, não terem a mesma autonomia e poder face à Procuradoria-Geral da República", que garantiu ontem que não se vai pronunciar publicamente sobre o assunto e que a sua posição "será transmitida às entidades competentes". Já José Baranita, da direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, assume que os procuradores têm "algumas reservas quanto à proposta".
Sem "blindagem a pressões"
O CSMP salienta ainda no seu parecer que não estão explicadas as razões pelas quais se pretende esta alteração nos níveis de hierarquia e lembra que esta "é condição de autonomia e de afirmação da magistratura do MP e, nesse quadro, da Lei, do Estado de direito democrático e de cada um dos seus magistrados", constituindo "um factor de blindagem a pressões exteriores". Por isso, defendem que a "presente iniciativa legislativa seja abandonada" e que a sua discussão "seja retomada em conjunto com os "estatutos dos magistrados judiciais e do MP".
Os conselheiros criticam também o MJ por pretender instituir um modelo de governance do MP com uma magistratura não hierarquizada. "Na coerência do modelo proposto seria até dispensável a Procuradoria-Geral da República e o respectivo titular - o PGR -, subsistindo só, em coincidência com a magistratura judicial, o CSMP e o respectivo presidente."
Outro motivo de preocupação do CSMP refere-se às alterações na própria composição deste órgão, onde passarão a ter assento já não os quatro procuradores-gerais distritais mas os cinco procuradores-gerais adjuntos coordenadores que vão representar o Ministério Público nos tribunais da Relação. O CSMP diz que a alteração, a avançar, contribuirá para "desequilibrar" ainda mais "a representação no conselho, que já hoje conta com um número de magistrados muito superior ao de não magistrados". Para além disso, a alteração pode ser inconstitucional por ser feita através de uma lei ordinária, quando a lei fundamental prevê a composição daquele órgão.
Público
| 2012.11.07
Relação do Porto esvaziada de competências, alerta juiz
O presidente do Tribunal da Relação do Porto, José Sousa
Lameira, lamenta que a última versão da reforma do mapa judiciário esvazie as
competências daquela instância e insiste que este modelo "inviabiliza por
completo" a especialização nos tribunais superiores. O juiz desembargador
mostra-se surpreendido com a redução da competência territorial da Relação do
Porto, uma opção que, garante, nunca foi sequer discutida. E insiste que a
mudança contribuirá para piorar a Justiça e aumentar as despesas.
Numa carta enviada ao gabinete da ministra da Justiça, José Sousa Lameira queixa-se que a competência da Relação do Porto ficará reduzida às comarcas do Porto, Porto Este e Aveiro, enquanto os processos dos distritos de Vila Real e Bragança passam para a Relação de Guimarães. "Não se vislumbra qualquer razão para esta mudança, que apenas acarreta inconvenientes e contribuirá, certamente, para uma pior Justiça", afirma. E realça que a Relação do Porto possui o único edifício do país com condições condignas para instalar um tribunal superior, que, com esta alteração, ficará subaproveitado. "[A mudança] não trará qualquer ganho de eficácia, nem se vislumbram quais as vantagens para as populações abrangidas, sendo certo que em termos económicos não se alcançarão quaisquer benefícios; antes pelo contrário, a despesa tenderá a aumentar", escreve o juiz.
O desembargador sustenta que se devia aproveitar esta reforma para discutir toda a organização judiciária, avaliando-se, por exemplo, se faz sentido manter a Relação de Guimarães e dois supremos (o de Justiça e o Administrativo). "Não faz sentido que a Norte do Douro existam duas relações", considera.
José Sousa Lameira defende que a dimensão dos tribunais da relação, com excepção do de Lisboa, tornará "impossível criar secções em matéria de família e menores, de comércio, de propriedade intelectual e de concorrência, regulação e supervisão", como pretende o Governo. "Uma secção tem que ter um número mínimo de magistrados que permita a discussão de ideias e a sedimentação da jurisprudência", sublinha o juiz. "Não faz sentido uma secção com três ou quatro juízes em que a discussão é feita em círculo fechado", remata.
Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Justiça adianta que só anteontem recebeu o parecer do presidente da Relação do Porto, não tendo ainda analisado o documento.
Numa carta enviada ao gabinete da ministra da Justiça, José Sousa Lameira queixa-se que a competência da Relação do Porto ficará reduzida às comarcas do Porto, Porto Este e Aveiro, enquanto os processos dos distritos de Vila Real e Bragança passam para a Relação de Guimarães. "Não se vislumbra qualquer razão para esta mudança, que apenas acarreta inconvenientes e contribuirá, certamente, para uma pior Justiça", afirma. E realça que a Relação do Porto possui o único edifício do país com condições condignas para instalar um tribunal superior, que, com esta alteração, ficará subaproveitado. "[A mudança] não trará qualquer ganho de eficácia, nem se vislumbram quais as vantagens para as populações abrangidas, sendo certo que em termos económicos não se alcançarão quaisquer benefícios; antes pelo contrário, a despesa tenderá a aumentar", escreve o juiz.
O desembargador sustenta que se devia aproveitar esta reforma para discutir toda a organização judiciária, avaliando-se, por exemplo, se faz sentido manter a Relação de Guimarães e dois supremos (o de Justiça e o Administrativo). "Não faz sentido que a Norte do Douro existam duas relações", considera.
José Sousa Lameira defende que a dimensão dos tribunais da relação, com excepção do de Lisboa, tornará "impossível criar secções em matéria de família e menores, de comércio, de propriedade intelectual e de concorrência, regulação e supervisão", como pretende o Governo. "Uma secção tem que ter um número mínimo de magistrados que permita a discussão de ideias e a sedimentação da jurisprudência", sublinha o juiz. "Não faz sentido uma secção com três ou quatro juízes em que a discussão é feita em círculo fechado", remata.
Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Justiça adianta que só anteontem recebeu o parecer do presidente da Relação do Porto, não tendo ainda analisado o documento.
Mariana Oliveira
Público | 2012.11.07
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