terça-feira, 23 de outubro de 2012

Joana Marques Vidal promete combater corrupção e criminalidade violenta

A Procuradora-geral da República (PGR) disse esta terça-feira, ao empossar o vice-PGR, contar com Adriano Cunha para responder às exigências do combate contra uma "complexa, sofisticada e eficaz" criminalidade económico-financeira, contra a corrupção e a criminalidade violenta.

Joana Marques Vidal promete combater corrupção e criminalidade violenta
15:00 - 23 de Outubro de 2012 | Por Lusa

Joana Marques Vidal, que sucedeu recentemente a Pinto Monteiro à frente do Ministério Público, disse ainda contar com Adriano Cunha para "assegurar o cumprimento do rigor das contas públicas", sem esquecer a restante criminalidade, principalmente a que atinge a essência da pessoa humana, como sejam os abusos sexuais, a violência doméstica e a violência contra os idosos.

A nova PGR sublinhou ainda precisar do vice-PGR para a ajudar a responder às exigências que se colocam nas áreas do direito do ambiente e do urbanismo, do direito das crianças e da família e do direito do trabalho.

"A tarefa não é fácil. Vai exigir capacidade de modernização e de abertura a novas e atuais formas organizacionais. Vai exigir especialização. Vai exigir estudo, trabalho e dedicação", frisou Joana Marques Vidal, observando que só aceitou o cargo de PGR porque sabia que podia contar com o apoio de "uma boa equipa de magistrados" isenta, independente, leal e preparada.

Adriano Cunha defendeu o actual modelo de nomeação do vice-PGR e a manutenção dos poderes conferidos ao Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), prometendo ser o primeiro elemento de uma equipa que coadjuva o PGR.

O vice-PGR prometeu também "ouvir a opinião" dos magistrados que "estão no terreno", numa altura em que decorrem "reformas essenciais", e encetar uma "enérgica perseguição ao crime económico".

A cerimónia contou com a presença da presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, da procuradora-geral distrital de Lisboa, Francisca Van Dunem, do director nacional da PJ, Almeida Rodrigues, e das directoras dos departamentos do MP que investigam os crimes económicos, Cândida Almeida e Maria José Morgado, entre outras figuras.

Mais de um milhão de euros em calotes ao Tribunal Constitucional


Processos. Quase metade das custas judiciais em dívida, relativas a recursos ali interpostos, dizem respeito apenas ao ano de 2011

LICÍNIO LIMA

Interpor um recurso no Tribunal Constitucional (TC) custa dinheiro, mas nem todos os requerentes cumprem as devidas obrigações pecuniárias. O universo de custas ali em dívida desde 2006 atingiu já o valor de 1 019 387,26 euros no final de 2011. Os processos executivos entretanto acionados contra os devedores conseguiram recuperar apenas cerca de 20 mil euros, menos de dois por cento. No ano passado, o TC proferiu 1341 decisões: 660 acórdãos e 681 decisões sumárias. A maioria destes processos tem custas inerentes que nem todos pagam. Só no ano passado, aquele tribunal emitiu 225 certidões executivas com o objetivo de recuperar as dívidas. "Apesar das 225 certidões executivas enviadas aos tribunais competentes em 2011, envolvendo um total de custas em dívida de 454 081,28 euros, apenas foi recuperado o equivalente a 7568,40 euros (1,67%). Há, todavia, ainda inúmeras ações executivas em curso", explicou o Ministério Público (MP) junto do TC em relatório da Procuradoria-Geral da República (PGR) relativo a 2011.

Desde 2006 que as custas em dívida estão a crescer. O montante, neste momento, já ascende a um milhão de euros, do qual apenas foi possível recuperar 20 018,82 euros, ou seja, 1,96% do total. Um magistrado contactado pelo DN explicou que a realidade do TC é semelhante ao que se passa nos restantes tribunais. Mesmo os processos executivos interpostos têm poucos resultados. Referindo-se ao relatório da PGR, lembrou que, "dos processos entretanto concluídos nas instâncias de execução, foi efetuado pagamento em apenas quatro deles (em 2010 foi apenas um), 46 foram arquivados por não existirem bens suscetíveis de penhora (17 em 2010), nove foram arquivados pelo facto de os executados beneficiarem de apoio judiciário (cinco em 2010) e um por ser desconhecido o paradeiro do devedor".

Riqueza dos políticos

Mas no TC o único problema do MP não é apenas o de não garantir a cobrança dos processos. Também as suas capacidades para controlar a riqueza dos titulares de cargos está limitada. "A manter-se a dimensão do gabinete do MP junto do TC, pode colocar-se seriamente em risco a possibilidade prática de se poder realizar uma indagação fáctica inicial e posterior", refere o relatório da PGR. A estrutura do MP no TC, que data ainda dos anos 90, conta com dois procuradores-gerais adjuntos, dois procuradores da República, como assessores, e dois funcionários de secretariado. A sua composição "mantém-se, assim, inalterada há mais de uma década, apesar do sensível acréscimo de funções que ao mesmo gabinete têm, nos últimos anos, vindo a ser cometidas", lamenta o ME

Diário Notícias de 23 de Outubro de 2012

Partilhas nas mãos dos Notários


Notários ganham mais competências na fase inicial do processo de partilhas, mas será sempre obrigatório enviar para homologação no tribunal
O Governo vai aprovar um novo regime jurídico do processo de inventário, ou seja, de partilhas e heranças, que entrega aos notários a competência de iniciar o processo e tratar de toda a documentação necessária à relação de bens em partilha. Mas mantém o poder de de cisãono juiz, ao contrário da lei inicial, aprovada em 2009 e que nunca foi regulamentada, que foi revista por ser considerada inconstitucional.
Segundo o documento a que o CM teve acesso, "a competência para o processamento dos actos e termos do processo de inventário é atribuída aos cartórios notariais sediados no município do lugar da abertura da sucessão", evitando-se que "o processo de inventário ocorra num cartório notarial que não tem qualquer relação com o óbito ou com os respectivos herdeiros". Porém, os processos devem ir ao tribunal da comarca do cartório notarial onde o processo foi apresentado, sempre que se trate de matéria de facto e de direito complexa. E é obrigatório serem apresentados ao juiz na fase final para homologação.
Além disso, esta proposta de lei especifica também o papel a atribuir ao Ministério Público, que nas questões de processo de inventário fica com a competência de ordenar as diligências necessárias para assegurar os direitos e interesses – pagamentos de impostos referentes às heranças – da Fazenda Pública, isto é, das Finanças.
Heranças de 30 mil euros
O novo regime jurídico dos inventários pressupõe também que todos os requerimentos deste processo, da eventual oposição, bem como do envio ao Ministério Público junto do tribunal da comarca do cartório notarial onde o processo foi apresentado, devem ser apresentados através de meios electrónicos em sítio na internet. Para processos de valor superior a 30 mil euros, da alçada do Tribunal da Relação ou sempre que forem suscitadas ou discutidas questões de direito, é necessária a constituição de um advogado. Quando há incidentes e são necessárias testemunhas, é imposto um limite de cinco para cada parte. Os depoimentos devem ser gravados ou reduzidos a escrito, com redacção ditada pelo notário.
Sónia Trigueirão
Correio da Manhã, 23-10-2012

EDITORIAL: A política e o sistema judicial


Pinto Monteiro falou do perigo da “politização” da PGR. Com as escutas a Passos, o aviso requer reflexão
O problema não está nos mensageiros nem nas mensagens que os leitores dos jornais hão-de ler e avaliar de acordo com o seu próprio juízo. O problema, e há um problema, está na crescente convicção de que o sistema judicial parece ter abandonado o princípio da separação dos poderes para se converter num actor político. As escutas a Miguel Relvas e a Passos Coelho no âmbito do caso não são por si só o indício de um crime, mas o relato da sua existência ajuda os cidadãos a perceber como certos círculos de influência se movimentam em torno dos seus legítimos interesses e como se faz o processo de decisão nos grandes negócios do Estado.
O problema não está por isso nas notícias (apesar do absurdo jurídico que as responsabiliza pela violação do segredo de Justiça), mas no receio de que quem as revela possa estar a exercer um poder em função de interesses corporativos. O caso não é novo e basta lembrar que, numa das suas últimas entrevistas, o ex-procuradorgeral da República considerou que o principal problema do Ministério Público está na sua excessiva politização, defeito que Pinto Monteiro reconheceu não ter sido capaz de resolver. O problema está também no facto de haver magistrados judiciais que condenam opções políticas como o Orçamento com base em análises políticas, sem a devida ponderação da matéria de direito. Depois de tudo o que aconteceu com José Sócrates e do desfecho de inúmeras escutas, indícios ou suspeitas, era bom que todos os magistrados fossem contidos na revelação de matérias cobertas pelo segredo de Justiça.
Os jornalistas não deixarão de revelar todas as diligências processuais que envolvam os governantes, mas o papel da imprensa nem sempre coincide com o papel das magistraturas. A divulgação de peças de um processo em fase de inquérito dá uma boa notícia, mas não serve para ilustrar o papel crucial que os agentes judiciais desempenham numa democracia a sério.
Áquila e um sismo na justiça italiana
Três anos depois do terrível sismo de Áquila, um outro sismo ocorreu ontem em Itália e foi judicial. Bernardo de Bernardinis, então vice-director do Departamento de Protecção Civil, e seis cientistas foram condenados a seis anos de prisão por terem subestimado os riscos do tremor de terra que levou à morte 309 pessoas. É verdade que Bernardinis os subestimou: aos jornalistas que lhe perguntaram, na altura, se podiam relaxar e “beber um bom copo de vinho”, respondeu “absolutamente”. Mas Bernardinis é um político, não um cientista, e os políticos costumam servir-se dos cientistas para justificarem actos movidos por tudo menos pela ciência.
Bernardinis quis “sossegar” a população e falhou, cometendo, ainda que involuntariamente, um crime. Mas para os cientistas, chamados ao local para cumprirem a sua missão, esta pena é de uma severidade sem precedentes. A dor de Áquila não devia aplacar-se com sentenças assim nem com bodes expiatórios.
Público, 23 Outubro 2012

Ministra pede à Judiciária que não se desmotive


A ministra da Justiça pediu à PJ para não se desmotivar perante a austeridade, e anunciou que está em preparação uma nova lei orgânica da polícia de investigação. Durante o seu discurso na cerimónia de comemoração do 67º aniversário da PJ, Paula Teixeira da Cruz assinalou que, “agora, mais do que nunca, a crise potenciará um aumento da criminalidade”, tendo defendido a criação “de mecanismos de cooperação”. A unificação de polícias está contudo fora da agenda, segundo a Lusa.
Jornal Negócios, 23 Outubro 2012

OE 2013: “Confisco” no IRS pode obrigar TC a pronunciar-se


Pela primeira vez desde a criação do IRS, metade do rendimento vai ser cobrado. Algo que o Tribunal Constitucional pode considerar “confiscatório”
João Ramos de Almeida
Há, sobretudo, dois problemas que o Tribunal Constitucional (TC) deveria abordar preventivamente sobre as mexidas no IRS. Segundo os fiscalistas ouvidos pelo PÚBLICO, um é o “nível confiscatório” do imposto quando, pela primeira vez desde a sua criação em 1989, o IRS ultrapassará a taxa simbólica de metade do rendimento colectável. O outro é o do IRS tender a ser um imposto proporcional a partir de rendimentos relativamente baixos (80 mil euros anuais).
As alterações surgem na proposta de Orçamento do Estado (OE) de 2013 em resposta às preocupações do TC (acórdão 353/2012 de 5 de Julho). Grosso modo, o TC exigiu que, por violação da regra de igualdade na repartição dos encargos públicos, os esforços não incidissem sobretudo sobre os funcionários públicos e pensionistas. O Governo foi forçado a anular o corte de um subsídio, mas agravou a carga fiscal. Primeiro, pela redução do número de oito para cinco escalões. Depois, pelos rendimentos escolhidos para esses escalões e pela subida de todas as taxas de IRS. Os rendimentos mais baixos são penalizados, mas o último escalão é fortemente reduzido (de 153 mil para 80 mil euros). Quarto, pela criação de uma sobretaxa de 4% para os rendimentos acima de 485 euros e ainda uma taxa de solidariedade de 2,5% para o último escalão. Os rendimentos acima de 80 mil euros serão tributados a uma taxa-base de 48%, a que se soma a sobretaxa e a taxa de solidariedade, atingindo os 54,5%. Como sublinha a fiscalista Serena Cabrita Neto (ver pág. 47), uma acima da “taxa máxima praticada no Reino Unido, em França e na Alemanha e em linha com a tributação que ocorre em países como a Suécia e a Dinamarca”. Quinto, ainda pelo novo rombo nas deduções fiscais. E sexto, pelo agravamento complementar de outros impostos.
Na altura da sua apresentação em conferência de imprensa, a 3 de Outubro passado, o ministro das Finanças esforçou-se por mostrar que “o enorme aumento de impostos” não agravava a progressividade do IRS (quem mais recebe, paga mais IRS). Mostrou gráficos e sublinhou que “as alterações de IRS foram calibradas por forma a conseguir um aumento significativo da progressividade do imposto”.
A polémica que se seguiu colocou o ministro Vítor Gaspar em rota de colisão com fiscalistas, economistas e até firmas de consultoria. Ao contrário do ministro, todos reiteravam que a progressividade diminuía. Quem mais tinha continuava a pagar mais IRS, mas essa diferença iria esbaterse. A discussão chegou ao Parlamento com os ministro das Finanças e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, a apresentar aos deputados da maioria PSD/CDS simulações equívocas e até com erros, mostrando apenas o lado positivo do OE de 2013. A eventual redução da progressividade do IRS suscitou a questão de poder ser um dos pontos a salientar pelo TC, numa avaliação preventiva ao OE de 2013. A Constituição estabelece que “o imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar”. Mas para os fiscalistas ouvidos pelo PÚBLICO o problema é outro.
O que será inconstitucional?
Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra Casalta Nabais, a questão não se coloca se o IRS fica mais ou menos progressivo. “A Constituição em norma alguma estabelece qualquer ritmo da progressividade, para o IRS, nem, em meu entender, o poderia fazer.” Na sua opinião, “o decisivo para o teste da constitucionalidade desse agravamento reside no que se tira e no que se deixa aos contribuintes, neste caso aos trabalhadores, pensionistas e pequenas empresas”. Ou seja, que “não seja um imposto verdadeiramente confiscatório”.
No mesmo sentido vai António Carlos Santos, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do Governo Guterres. Além de o Governo continuar a cortar dois subsídios ao funcionalismo público (um directo e outro por via fiscal), o fiscalista acha que o Estado exorbitou das suas funções ao levar a cabo um “confisco” de pensões e levanta a questão analisada noutros países – a da “tributação confiscatória”.
“A questão”, afirma, é, “com esta punção tributária”, quanto “queda de rendimento disponível” ao contribuinte. “Mesmo que os impostos não se baseiem no princípio do benefício, terá de haver algum equilíbrio entre a receita e o que, em termos gerais, o Estado disponibiliza aos cidadãos, incluindo coesão social e territorial. O aumento é manifestamente desproporcionado e não tem em conta, em muitos casos, a capacidade contributiva.”
O mesmo sublinha Serena Cabrita Neto: tributar mais de metade do rendimento “levanta importantes questões sobre a admissibilidade destas medidas à luz dos limites constitucionais à tributação, nomeadamente se olharmos para os princípios da justiça redistributiva e da proporcionalidade”.
Para outro ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, do último Governo Guterres, Rogério Fernandes Ferreira, o problema é “o IRS estar a tornar-se num imposto proporcional”, ao chegar mais rapidamente ao escalão mais alto de tributação, ao mesmo tempo que o IRC se está a tornar num imposto progressivo. Vasco Valdez, secretário de Estado dos Assuntos Fiscais dos governos Cavaco Silva e Durão Barroso, alinha com esta ideia: “Caminhamos para uma flat rate [uma única taxa], como nos países do Leste.” O IRS é “altamente progressiva até aos 80 mil euros”, mas a partir daí é proporcional. “Mais um anito estamos numa flat rate.” Mas as mexidas podem ainda ser olhadas como fonte de “trapalhadas”. Rogério Fernandes Ferreira lembra que há uma dupla progressividade – dos escalões de IRS, mas igualmente a das deduções consoante os escalões; introduz-se uma sobretaxa proporcional num imposto progressivo. “São dois impostos sobre o mesmo rendimento”, com retenções na fonte diferenciadas e liquidações à parte. Será que a resposta do Governo ao TC, com pesados efeitos recessivos, não redundará num novo acórdão e tudo regressa à estaca zero? com
Pedro Félix Ribeiro
Depoimentos dos fiscalistas ouvidos pelo PÚBLICO
Há sérias dúvidas se o agravamento do IRS respeita a Constituição
Na minha modesta opinião, as perguntas feitas [sobre se o OE reduz ou não a progressividade do IRS] falham em larga medida o alvo (quanto à inconstitucionalidade do forte agravamento do IRS constante da Proposta de LOE/2013), pois a Constituição em norma alguma estabelece qualquer ritmo da progressividade para o IRS, nem, em meu entender, o poderia fazer. Para mim, o juízo sobre esse agravamento tem outros vectores.
I. De um lado, é decisivo saber se um tal agravamento conduz ou não aos resultados pretendidos, isto é, ao aumento das receitas. Ora, eu tenho as maiores dúvidas (para não dizer certeza) de que esse agravamento produzirá menos receitas do que as previstas na referida Proposta, pois os efeitos da lei de Laffer, que já se verificou na LOE/2012, serão ainda mais evidentes. Ou seja, essa cura agravará o estado do doente. Por certo que não sossegarão os credores, pois a última coisa que estes podem querer é que morra o devedor.
II. Passando ao plano jurídicoconstitucional, o decisivo para o teste da constitucionalidade desse agravamento reside no que se tira e no que se deixa aos contribuintes, neste caso aos trabalhadores, pensionistas e pequenas empresas. Pois, o que a Constituição por certo exige é que, no respeitante aos rendimentos mais baixos, se respeite o mínimo de existência dos indivíduos e das famílias, e, em relação aos rendimentos médios e mais altos, que o IRS não seja um imposto verdadeiramente confiscatório. O que interessa do ponto de vista jurídico-constitucional não é a taxa marginal máxima (que ainda assim não é a mais alta da Europa) mas a efectiva taxa média, que será muito elevada para parte significativa dos contribuintes, ficando estes assim com rendimento disponível insuficiente para ter uma vida que mereça ser vivida. Quanto ao limite inferior (mínimo de existência) e superior (carácter confiscatório) da taxa do IRS, trata-se de ideias que já constam do meu livro (que é a minha tese de doutoramento, de 1998, O Dever Fundamental de Pagar Impostos).
Ora, mesmo que no actual estado de excepção económicofinanceira em que vivemos se permita uma certa contracção dos princípios e normas constitucionais, temos sérias dúvidas se o agravamento do IRS proposto para o OE/2013 respeite os mencionados limites.
III. Todavia, para mim, mais importante do que quaisquer questões de inconstitucionalidade é a praticabilidade da solução referida em I.
Casalta Nabais, professor da Universidade de Coimbra É o IRS, mais a TSU, o IMI, o IVA e quanto sobra?
Diria que há duas boas razões para o Tribunal Constitucional se pronunciar sobre o OE:
1.ª O OE mantém os cortes nos vencimentos da função pública, um corte directo e um indirecto por via fiscal. Não contraria este facto o que foi decidido? Não há mesmo incumprimento de uma decisão por parte do executivo?
2.ª O TC deixou bem claro que a questão dos cortes nas pensões (sobre os quais não se pronunciou) PODE CONVOCAR OUTROS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS QUE NA ALTURA NÃO FORAM ANALISADOS. Na realidade, o executivo na questão dos vencimentos age como entidade empregadora, no caso das pensões age como gestor de um património que é alheio e que as pessoas lhe confiaram. Pode pedir um empréstimo forçado. Não pode é efectuar um confisco.
Noutros países (por exemplo, na Alemanha), a jurisprudência é muito atenta à questão da tributação confiscatória. A questão até agora não tem sido analisada entre nós. Assim, alguém que vê subir a sua tributação para 54,5% por que passa a cair no último escalão (mais de 80 mil euros) e é trabalhador por conta de outrem vê acrescer à tributação nominal de IRS (cada vez mais próxima da efectiva, pois as deduções à colecta diminuem drasticamente) a tributação em TSU (11%). A isto acresce, se tiver casa própria, o IMI (sabe-se lá quanto), o IVA nas compras e prestações de serviços, pois não goza do direito à dedução e provavelmente o imposto de circulação, o imposto sobre produtos petrolíferos e inúmeras taxas (esgotos, etc) e contribuições (rodoviária, audiovisual, etc.). A questão é: com esta punção tributária, quanto lhe queda de rendimento disponível?
Sobre questão de saber se as alterações introduzidas aumentam ou diminuem a progressividade do IRS, diria que diminuem nos escalões mais baixos e no mais alto. A partir de 80 mil, a taxa é proporcional. A progressividade do imposto é ainda lesada pelo facto de se introduzir uma sobretaxa proporcional (4%) num imposto que deve ser progressivo. A aplicação desta sobretaxa, sendo idêntica para todos, atinge mais fortemente os contribuintes de menor rendimento. Mantém-se uma enorme desigualdade de tratamento de contribuintes com igual rendimento, ferindo o princípio da equidade horizontal. As deduções à colecta acabam para muita gente pondo em causa um princípio de personalização do imposto e de apoio à família Mesmo que os impostos não se baseiem no princípio do benefício, terá de haver algum equilíbrio entre a receita e o que, em termos gerais, o Estado disponibiliza aos cidadãos, incluindo coesão social e territorial. O aumento é manifestamente desproporcionado e não tem em conta, em muitos casos, a capacidade contributiva. Sem prejuízo de um estudo mais profundo, eis, quanto a mim, vários tópicos que justificariam a fiscalização a priori da constitucionalidade de muitas das normas da parte tributária e parafiscal do OE.
António Carlos Santos, fiscalista
Público, 23 Outubro 2012

SOBE E DESCE: Joana Marques Vidal


Depois do coro de elogios que recebeu quando foi anunciada como PGR, esperava-se que marcasse a diferença em relação ao seu antecessor. No primeiro caso com que foi confrontada repetiu a fórmula: veio a público dizer que o governante em causa não é suspeito de qualquer crime; e mandou abrir um inquérito por violação de segredo de justiça. Será que Joana Marques Vidal vai fazer o mesmo quando o visado não for uma figura pública? (Pág. 6)
Público, 23 Outubro 2012

OE2013 - Sampaio defende documento no Tribunal Constitucional

23-10-2012
O ex-Presidente da República Jorge Sampaio defende que o Governo devia ter “prestado mais atenção” ao acórdão do Tribunal Constitucional quando elaborou o Orçamento de Estado para 2013 e admitiu que a constitucionalidade do documento poderá ser analisada.
Em entrevista à rádio TSF, a propósito da apresentação do primeiro volume da sua biografia hoje em Lisboa, Jorge Sampaio disse que o Governo não tem sabido escutar as mensagens que lhe chegam e devia ter “prestado mais atenção” ao primeiro acórdão do Tribunal Constitucional (TC).
“É um momento particularmente difícil. (…) a possibilidade de se enviar o Orçamento do Estado (OE) para o TC tem de ser equacionada mas, é prematuro estar a dizê-lo na medida em que temos de ter alguma confiança em que algumas coisas ocorram no debate parlamentar”, disse.
No entender de Jorge Sampaio, o Presidente da República tem um “momento terrível” pela frente quando receber o OE, altura em que terá de equacionar todas as circunstâncias.
“Há um momento crucial em que se tem que ponderar a margem de manobra. Não é a que se fala agora e aquilo que o Governo pode fazer em matéria orçamental tem de ser tudo constitucional e há coisas que não são constitucionais. A culpa não é da Constituição, ela está lá, a culpa é de quem não prestou a devida atenção”, frisou.

Combater e prevenir a sério a “corrupção” que interessa

JustiçaPor António Cluny, publicado em 23 Out 2012 

A luta contra a “corrupção” não pode, decisivamente, ser “politicamente neutra”, como a pura resposta penal aparentemente pressupõe
1. Quando se fala de “corrupção”, a atenção e o escândalo dos portugueses centram-se, no essencial, nos elevados montantes de dinheiros públicos desviados para duvidosos negócios realizados pelo (ou com apoio) do Estado.
A “corrupção”, para a qual a justiça não dá suficiente resposta, reside no facto de os actualmente insuportáveis impostos que pagam não chegarem para custear os serviços públicos, que a Constituição prevê, enquanto financiam negócios obscuros, cuja utilidade, proveito e controlo escapam a todos.
Aí, mais do que nas pouco relevantes situações julgadas na jurisdição penal, situa-se a “percepção popular” e a verdade da grave “corrupção” que assola o país.
2. Da escolha privilegiada da resposta penal à corrupção, pese embora o entusiasmo de alguns políticos e jornalistas, a ingenuidade de alguns magistrados e a fé de alguns polícias, resultaram até agora muita demagogia, algum protagonismo fútil e, afinal, poucos sucessos.
A luta contra a “corrupção” não pode, decisivamente, ser “politicamente neutra”, como a pura resposta penal aparentemente pressupõe.
Uma política empenhada na luta contra a “corrupção” deve dirigir-se, sobretudo e por isso, ao controlo da qualidade e da transparência da despesa (e das receitas extraordinárias) e à responsabilização efectiva pela gestão dos dinheiros públicos.
3. Algumas sugestões simples:
- Devolução à administração pública de uma “carreira” e de um estatuto funcional que favoreçam a qualificação, a isenção e a autonomia técnica dos seus funcionários e agentes. Só isso permitirá que estes emitam (e devam fazê-lo) pareceres obrigatórios prévios sobre a despesa (ou receitas extraordinárias) que atinjam valores relevantes;
- Apuramento dos preceitos legais relativos à responsabilização financeira dos titulares dos cargos políticos, quando decidirem, contra ou sem pareceres (obrigatórios) por parte dos competentes organismos da administração pública, e causarem, por isso, dano ao Estado;
- Responsabilização financeira dos funcionários e agentes que, livre e conscientemente, tenham emitido pareceres obrigatórios favoráveis à despesa (ou receitas extraordinárias) e que estejam na base de posteriores decisões políticas causadoras de dano ao Estado;
- Responsabilização financeira das próprias pessoas colectivas privadas que, de algum modo ou a qualquer título, usem ou administrem dinheiros públicos contra a lei ou com fim diferente do que lhes estava destinado, causando assim danos patrimoniais ao Estado. Esta opção implica ainda um aperfeiçoamento da previsão das infracções financeiras.
- Alargamento do âmbito do visto prévio do Tribunal de Contas – mesmo que só a nível de parecer não vinculativo – ao controlo da economia, da eficácia e da eficiência dos actos e contratos geradores de despesa e receita relevante. Caberia depois à tutela das entidades responsáveis o ónus de prosseguir tais despesas contra a orientação e aviso do TC. No caso de dano ou derrapagem da despesa, deveria considerar-se, subsequentemente, a concretização legal de mais uma situação de responsabilização financeira.
Só clarificando e delimitando mais rigorosamente os níveis de responsabilidade dos decisores – e de quem oficialmente os deva aconselhar –, se contribui de forma decisiva para a prevenção deste tipo de “corrupção”, que é hoje a mais grave para o país e que a legislação penal não pode acautelar, nem impedir.
Os que verdadeiramente sofrem a “crise” exigem-no.
Jurista e presidente da MEDEL

PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA - Nota n.º 6/2012

COMUNICADO

         Na sequência de notícias vindas a público durante o fim-de-semana passado, relativas ao envolvimento do Senhor Primeiro-Ministro, Dr. Pedro Passos Coelho, no âmbito do denominado processo «Monte Branco», a Procuradoria-Geral da República esclarece o seguinte, nos termos da alínea a), do n.º 13, do artigo 86.º do Código de Processo Penal:
         1 –    Relativamente ao Senhor Primeiro-Ministro, Dr. Pedro Passos Coelho, não existem nos autos quaisquer suspeitas da prática de ilícitos de natureza criminal;
         2 –    O processo encontra-se em segredo de justiça, como já foi amplamente divulgado, pelo que não é possível prestar mais informações sobre o mesmo;
         3 -     Mais se informa que foi instaurado o competente inquérito, tendo em vista a investigação do crime de violação de segredo de justiça.

         Lisboa, 22 de Outubro de 2012

A Procuradora-Geral da República

(Joana Marques Vidal)