por
VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
As ambíguas decisões do Ecofin (Conselho que reúne
os ministros das Finanças dos países da UE) sobre as novas formas de
"resolução bancária", deixaram de fora o escândalo político e moral
revelado pela imprensa irlandesa, quando esta divulgou gravações de conversas
datadas de final de 2008, envolvendo o ex-presidente do Anglo Irish Bank e o
seu gerente principal, respetivamente, David Drumm e John Bowe. A vulgaridade
da linguagem, onde se incluem insultos aos investidores alemães que confiavam
na seriedade da banca irlandesa, não permite a sua transcrição. Mas ficámos a
saber que o presidente do banco falido, que custou até agora 30 mil milhões de
euros ao povo irlandês, incitou, num tom alarve, os seus subordinados a
abusarem das garantias dadas pelo Tesouro irlandês, com um dolo que transforma
o conceito de "capitalismo de casino" numa expressão quase bondosa.
Aqui ao lado, em Espanha, a figura mais notável do festival de ofensa ao bem
público por parte de uma pequeníssima facção de gestores de topo chama-se
Rodrigo Rato. Um verdadeiro super-homem, que passou por todos os anéis do poder
contemporâneo: foi ministro da Economia de Madrid; alto dirigente do FMI,
terminando a sua carreira em maio de 2012 como presidente de um banco que
conduziu à falência, o Bankia, que custou aos contribuintes espanhóis 20 mil
milhões de euros. Em Portugal também tivemos os nossos Costas e Rendeiros,
lesando em milhares de milhões o Estado português com as suas malfeitorias no
BPN e BPP. Dados da Comissão Europeia, indicam que os europeus já gastaram 4,5
biliões de euros para salvar o sistema financeiro do Velho Continente. Isso
significa mais de dez vezes todos os planos de resgate dirigidos a países
(incluindo o de Chipre)! Em nenhum momento da história um grupo tão pequeno e medíocre
de delinquentes causou tanto dano a centenas de milhões de pessoas. Chamar a
isto a "crise das dívidas soberanas" é um insulto à inteligência,
pois confundem-se os efeitos com as causas. Em nenhum momento, o Ecofin alude a
estes crimes que ficaram sem castigo. Pior, as regras para salvar os bancos no
futuro continuarão a ser aplicadas por autoridades nacionais, deixando intactos
os mecanismos de cumplicidade entre o sector financeiro e os dirigentes
governamentais, que estiveram na origem do "fartar vilanagem" em que
se transformou a "supervisão prudencial" por parte dos bancos
centrais nacionais. Mas há uma coisa que o Ecofin nos ensinou em relação ao
futuro do sistema financeiro na Europa: os ratos continuam, acima da lei, a
fazer a sua vida no navio que se afunda. Estamos avisados para mantermos as
mãos nos bolsos, se quisermos minimizar os danos.
Diário de Notícias, 1 de Julho de 2013
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