terça-feira, 21 de maio de 2013

Constituição não vai travar lei da coadoção por casais ‘gay’


Especialistas. Maioria dos constitucionalistas ouvidos pelo DN não vê razão para contestar lei. Paulo Otero destoa e diz que Estado não estará a “assegurar especial proteção” da criança
PATRÍCIA JESUS
Não há problemas de constitucionalidade no projeto de lei da coadoção. É esta convicção da maioria dos constitucionalistas ouvidos pelo DN, que consideram que a decisão está dentro da liberdade que a Constituição dá ao legislador, tal como aconteceu na questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Paulo Otero destoa e argumenta que a seu ver “será inconstitucional, o que significa que o CDS ou qualquer outra entidade tem boas chances de obter provimento”.
O constitucionalista refere-se à intenção, anunciada pelo CDS, de em último caso pedir a fiscalização sucessiva da constitucionalidade do diploma aprovado na sexta-feira, na generalidade, no parlamento. O projeto lei toma possível que os homossexuais possam coadotar os filhos da pessoa com quem estão casados ou com quem vivem.
“À primeira vista parece-me que não há nenhum problema. Assim como o legislador tem liberdade para decidir no caso do casamento, parece-me que também terá na coadoção. Aliás, o Tribunal Constitucional já foi chamado a pronunciar-se sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo e disse que o legislador era livre para decidir, não impondo nem permitindo”, lembra o constitucionalista Bacelar Gouveia. Isto, independentemente “do que se possa pensar “do ponto de vista do mérito e oportunidades da medida”.
“É uma questão fundamental de decisão, de liberdade do legislador, não creio que haja problema de constitucionalidade”, concorda Vital Moreira, referindo também a decisão propósito do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Bacelar Vasconcelos vai mais longe. Não só não vê “nenhuma matéria no projeto lei que atinja os valores constitucionais”, como lembra que a Constituição proíbe a discriminação com base na orientação sexual. “É um princípio que claramente aponta para a coadoção e até para a adoção plena de casais do mesmo sexo”, conclui.
Paulo Otero discorda completamente, invocando o artigo 69 da Constituição que diz que “o Estado assegura especial proteção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal”. O constitucionalista não tem dúvidas que “a coadoção por pessoas do mesmo sexo não é uma ambiente familiar normal, que não assegura a diversidade e a complementaridade entre pai e mãe”. O professora catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa também defendia que o casamento entre pessoas do mesmo sexo era inconstitucional.
Já Gomes Canotilho, embora não tenha “grandes opiniões” em relação ao tema, garante que não seria ele a levantar a questão da constitucionalidade.
PROJETO
Um longo caminho pela frente
A aprovação do projeto lei da coadoção, sexta-feira no parlamento, foi uma surpresa, mas enfrenta ainda um longo caminho até se tornar realidade. Depois da aprovação na generalidade, ainda vai ser discutido na especialidade e só depois voltará ao plenário para votação final, onde não é garantido que a votação seja no mesmo sentido.
Até agora o CDS tem sido o partido que mais criticou a aprovação, tendo já pedido o veto política do Presidente da República, Cavaco Silva. E não exclui a possibilidade de pedir a fiscalização sucessiva da constitucionalidade do diploma.
‘Pai’ e ‘mãe’ substituídos por ‘progenitores 1 e 2′
Estados Unidos
Formulários vão ter designações mais genéricas, para abranger filhos de casais do mesmo sexo.
Mudança é polémica
O ministério da Educação dos Estados Unidos decidiu substituir as palavras ‘Pai’ e ‘Mãe’ por ‘Progenitor 1′ e ‘Progenitor 2′ em alguns formulários. As mudanças vão ser introduzidas no próximo ano para melhor abranger os filhos de casais do mesmo sexo e incluir “as suas dinâmicas familiares únicas”, explicou o secretário de estado da Educação, Ame Duncan. O anúncio levantou alguma polémica, sobretudo junto de grupos cristãos mais conservadores.
A alteração será introduzida no formulário para pedir apoio financeiro e vai permitir incluir, pela primeira vez, ambos os pais (parents, palavra que em inglês pode significar pai ou mãe), independentemente do género e estado civil, desde que vivam juntos, avançou o Washington Times. Ou seja, pai é substituído por um termo neutro e entre parênteses acrescenta-se “pai, mãe, padrasto, madrasta”
Além de ser “mais inclusiva”, a mudança vai permitir calcular melhor o rendimento do agregado familiar e avaliar com mais precisão se o estudante precisa de apoios, argumenta o governo federal.
Argumentos que não convencem toda a gente. Cathy Ruse, do Family Research Council, considerou a mudança “profundamente ofensiva”, citada pelo jornal britânico Daily Mail.
Em países como a Suécia a questão da neutralidade da linguagem está no centro do debate sobre a igualdade há algum tempo. Um exemplo mais radical é a criação de um pronome neutro, uma mistura entre ‘ele’ e ‘ela’.
Diário Notícias, 21 Maio 2013

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