terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Socialistas mostram divisões internas sobre eventual extinção da ADSE

MARGARIDA GOMES 

Público - 15/01/2013 - 00:00
Jornadas Parlamentares do PS marcadas pelo futuro da ADSE. Coordenador para a área da saúde pediu a sua "extinção", Zorrinho desautorizou-o e Correia de Campos pede "solução alternativa"
A polémica estalou em plenas Jornadas Parlamentares do PS. O coordenador do partido para a área da Saúde e membro do secretariado nacional, Álvaro Beleza, não esteve ontem em Viseu, mas as suas declarações a favor da extinção da ADSE, um cenário que, segundo disse, está em cima da mesa caso os socialistas regressem ao poder, tomaram conta do debate. O líder da bancada parlamentar, Carlos Zorrinho, foi o primeiro a reagir, negando que o PS seja favorável à extinção da ADSE, contrariando, desta forma, a posição defendida por Álvaro Beleza em entrevista, ontem, ao Jornal de Notícias.
"Quero afirmar que o PS não é a favor da extinção da ADSE. Quero que isso fique bastante claro", sublinhou Carlos Zorrinho, negando que a extinção da ADSE se encontre nos planos dos socialistas.
Pouco depois, era a vez do antigo ministro da Saúde Correia de Campos dizer que é preciso "substituir a ADSE por um mecanismo de mutualização social na área da saúde, porque o actual sistema é mau e não permite a integração". Confrontado com esta polémica, o eurodeputado disse entender "perfeitamente" a posição de Álvaro Beleza. "O que há a fazer é a substituição da ADSE, que é um mau sistema da saúde, porque não é integrado e o doente, no fundo, é partido às fatias em função de cada especialista. Tem de haver uma integração e a ADSE não permite essa integração e é um não-sistema. É essencial encontrar uma solução alternativa à ADSE", declarou Correia de Campos.
Segundo o eurodeputado, a classe média portuguesa "está hoje a ser punida, sobretudo do ponto de vista fiscal". E acrescenta: "Temos de encontrar um mecanismo de mutualização social que permita ajudar a classe média, para evitarmos a sua proletarização. A ADSE é um sistema que tem a livre escolha, mas tudo o resto é mau e tem até um co-pagamento muito elevado. Seria impossível passar o sistema para todos os trabalhadores por conta de outrem", declarou.
A partir de Santarém, o ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, reagiu às declarações de Beleza, considerando "positiva" a proposta de extinção da ADSE, ao mesmo tempo que desafiava o PS a clarificar a sua posição e o que pretende fazer com os 400 mil beneficiários deste subsistema de saúde.
"É uma proposta que me parecia particularmente positiva, mas estamos à espera que o PS diga qual é que é a posição que vale, se a do porta-voz para o sector e membro da direcção, se a do líder parlamentar", afirmou o ministro dos Assuntos Parlamentares, comentando a hipótese de a ADSE ser extinta caso os socialistas regressem ao Governo.
Curiosamente, Miguel Relvas não afastou a possibilidade de o Governo avançar com a extinção daquele subsistema de saúde, revelando tratar-se de "uma matéria que deve ser tratada com muito cuidado e muito equilíbrio". "Estamos a tratar de direitos que tocam a muitos portugueses", sublinhou.
O PS e os cortes
Pela voz do deputado Adolfo Mesquita Nunes, o CDS-PP juntou-se à polémica para dizer que a proposta de extinção da ADSE era "útil", considerando que o facto de ter sido "retirada" pelo PS mostra que os socialistas se recusam a debater os cortes, porque não sabem o que querem e estão contra qualquer corte. "Acordámos hoje [ontem] de manhã com uma proposta do porta-voz para a área da saúde do Partido Socialista defendendo a extinção da ADSE como uma medida para combater a injustiça e, pouco tempo depois, ela foi desmentida pelo próprio Partido Socialista", afirmou o deputado do CDS-PP Adolfo Mesquita Nunes, citado pela agência Lusa.
"Esta circunstância permite retirar duas conclusões: em primeiro lugar, que o PS não participa no debate sobre o corte na despesa, porque não sabe ao certo aquilo que quer, e, em segundo lugar, que não participa porque se revela contra qualquer corte na despesa", disse.
Confrontado sobre a própria posição do CDS-PP quanto a uma eventual extinção da ADSE, Adolfo Mesquita Nunes avançou apenas que os democratas-cristãos têm "chamado a atenção para a necessidade de aproximar os regimes público e privado de saúde". "É um debate que deve ser feito", vaticinou.
Renegociação com a troika
Perante a polémica que se instalou, Álvaro Beleza justificou na sua página do Facebook que as declarações sobre a extinção da ADSE só o vinculavam a si e aproveitou para criticar "o aproveitamento miserável do PSD, do CDS e do ministro [Miguel] Relvas sobre o assunto".
"O PS é um partido livre e aberto, é nesse quadro que centenas de cidadãos têm debatido o futuro da saúde em Portugal e também a necessidade de reformulação da ADSE. Eu tenho muita honra em coordenar esse debate de ideias e de propostas", sublinhou Álvaro Beleza.
O contra-ataque oficial do PS chegaria entretanto ao fim do dia. O vice-presidente da bancada parlamentar do PS, José Junqueiro, reafirmou que a posição do partido é contra a extinção da ADSE e censurou o Governo e a maioria de procurarem criar um fait-divers a propósito desta questão.
"Governo, PSD e CDS, nomeadamente o ministro [Miguel] Relvas, estão a tentar construir um fait divers para não responder a algumas questões", afirmou Junqueiro, informando que Álvaro Beleza já se comprometeu em "respeitar a posição do PS".
Sob o mote Em Defesa de Um Estado Social Moderno e Solidário, as Jornadas Parlamentares do PS debateram ontem questões relacionadas com a educação e a Segurança Social, terminando hoje com uma intervenção do secretário-geral do partido, António José Seguro. Ontem, ao participar no painel da Segurança Social, o ex-líder do PS Ferro Rodrigues voltou a defender uma renegociação com atroika dos valores e dos prazos da dívida.

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