terça-feira, 18 de setembro de 2012

PJ recruta dois ex-espiões ‘ despedidos’ das secretas

Direção daJudiciária garante desconhecer motivos do afastamento dos agentes
Carlos Rodrigues Lima e Valentina Marcelino
Doisex-espiões do Serviço de Informações Estratégicas e Defesa (SIED), exoneradosna sequência da polémica do chamado “caso das secretas,” foram requisitadospela Polícia Judiciária para a Unidade de Prevenção e Apoio Tecnológico (UPAT), o departamento que trata das vigilâncias aos suspeitos, assim como das açõesencobertas. A requisição de ambos, segundo informações recolhidas pelo DN, foiproposta com carácter de urgência pelo diretor da UPAT, João Carreira,justificando-a com os “conhecimentos técnicos e profissionais” dos ex-espiões.A direção da PJ garantiu ao DN desconhecer a ligação de ambos ao “caso das secretas”.
Foi nofinal de 2011, após meses de tensão e polémica no interior dos serviços deinformações devido a suspeitas sobre o ex-diretor do SIED Jorge Silva Carvalho,que o secretário-geral do Sistema da Informações da República (SIRP), JúlioPereira, levou a cabo uma “reestruturação interna”, eufemismo para aquilo quenas “secretas” ficou conhecido como uma “purga interna”. H. S e C. V., esteúltimo diretor de área do Departamento Operacional do SIED, foram dois dosalvos da tal “reestruturação”. Como decorre da lei, ambos foram colocados na Presidência do Conselho de Ministros. H. S. e C. V. estavam há mais de seis anos colocados no SIED, tendo adquirido, segundo a legislação, vínculo à função pública, sendo a PCM obrigada a abrir uma vaga caso os espiões cessem funções das secretas e o pretendam.
O despacho de integração no quadro da PCM foi assinado pelo primeiro- ministro e pelo ministro das Finanças a 5 de junho passado. Desde que tinham cessado as suas funções no SIED, H. S. e C. V. estavam sem funções atribuídas, em casa, a receber o seu salário de técnicos superiores.
Um dos ex-espiões em causa, C. V., tinha já tentado entrar na Polícia Judiciária em 2000, mas, por um mês, não foi aceite no concurso de agentes estagiários. É que C. V. fez 21 anos a 5 abril daquele ano, porém o concurso era de março, e uma das regras era “ter idade não inferior a 21 anos nem superior a 30”. Quatro anos depois, C. V.ingressou no SIED como “técnico superior de informações”, isto é, espião.
Contactada pelo DN, fonte da Direção Nacional da PJ manifestou-se surpreendida quando confrontada com a ligação dos dois ex-espiões ao escândalo das secretas. Esta fonte oficial garantiu desconhecer que tinham sido “despedidos” e assegura que não foi informada sobre o motivo que levou o secretário-geral do Sistema deInformações da República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira, a afastar H. S. e C.V. do SIED. Garante que também desconhecia que um dos novos contratados era testemunha de acusação do Ministério Público contra o ex-diretor do SIED JorgeSilva Carvalho.
“A proposta de recrutamento foi-nos apresentada no âmbito do regime de mobilidade da função pública e a informação curricular que nos foi transmitida era sobre as suas qualificações técnicas”, explica a mesma fonte. “Sabíamos a sua proveniência, mas não tentámos saber mais nada.” A Direção da PJ sustenta que o processo “foi tratado com a maior transparência”, tendo começado com uma proposta do diretor da UPAT, fundamentando-a com a necessidade urgente de contratar estes técnicos,para o “adequado funcionamento” daquela unidade tão sensível da PJ. A Direção de Recursos Humanos aprovou o recrutamento depois de assegurar a cabimentaçãoorçamental.
A mesmafonte referiu ainda que ambos não farão trabalho de investigação criminal, masuma espécie de trabalho administrativo na UPAT. No fundo, estarão à secretária. Porém, não foi possível apurar quais as razões da “urgência” na requisição dosantigos espiões para aquela unidade da Polícia Judiciária, uma vez que, nosúltimos tempos, não tem sido noticiada qualquer tipo de falta de meios nodepartamento de vigilâncias da PJ.
Contactadopelo DN, Carlos Garcia, presidente da Associação Sindical dos Funcionários deInvestigação Criminal (ASFIC), afirmou conhecer a situação, mas não quis pronunciar- se sobre a mesma. Questionado pelo DN sobre uma eventual falta de quadros na UPAT, que justificasse a requisição dos ex-expiões, Carlos Garcia manteve o silêncio. Certo é que a requisição dos antigos espiões para osquadros da PJ está a motivar alguma controvérsia. A dúvida é: se foram afastados das secretas são bons para a PJ?
‘ Password’ de ‘ e-mail’ pessoal nas mãos de Jorge Silva Carvalho
SECRETAS Ex-expião do SIED ficou no processo das secretas como testemunha de acusação do Ministério Público Ouvido a 27de abril pela procuradora Teresa Almeida, que investigou o chamado “caso das secretas”, C. L. ficou, segundo consta do auto de inquirição, “estupefacto” comuma revelação feita pela magistrada: no telemóvel de Jorge Silva Carvalho, ex-e um e-mail seu, assim como a respetiva password.
Ao processo, C. L. garantiu nunca ter “revelado a quem quer que seja” o referido endereço de email, utilizado, segundo o próprio, para “um contato pessoal”, assim como a respetiva password. Acrescentando que “quando acedia a endereços de correio eletrónico nunca o fez a partir da rede externa do SIED, mas apenas através de um portátil que, quando não estava em uso, estava guardado num armário”.
C. L. consta do “caso das secretas” como testemunha do Ministério Público. Recorde-se que a procuradora da 9. ª secção do Departamento de Investigação e Ação Penalde Lisboa acusou, em maio deste ano, Jorge Silva Carvalho, João Luís ( ex-diretor operacional do SIED) de crimes de abuso de poder, acesso ilegítimo adados pessoais. O antigo diretor do SIED foi ainda acusado de violação do segredo de Estado e corrupção passiva. Por sua vez, Nuno Vasconcellos, presidente do grupo Ongoing, foi acusado de corrupção ativa.
Ao Ministério Público, C. L. contou que um seu subordinado numa das áreas dos Departamento Operacional do SIED lhe contou ter recebido uma ordem direta de João Luís para efetuar uma pesquisa na base de dados da Dun& Bradstreet (cujo acesso é pago pelo SIED) sobre um empresário madeirense. C. L. disse ainda que João Luís o tinha sondado sobre a possibilidade de obter informações na operadora de telemóveis Optimus.
Diário de Notícias 2012-09-18

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