quarta-feira, 2 de maio de 2012

Situação injusta

É justificada a excitação causada por uma sentença judicial que considerou inteiramente saldada uma dívida hipotecária com a entrega da casa adquirida com o (e dada em garantia do) empréstimo, mesmo que o valor do bem em causa não cubra afinal o montante em dívida. Independentemente do fundamento da sentença ("abuso de direito"), haverá motivos para isentar os devedores da responsabilidade pela parte da dívida acima do valor da casa hipotecada?
Sucede que frequentemente os bancos sobreestimaram deliberadamente o valor das casas, a fim de aumentarem o montante emprestado, assim induzindo os adquirentes em erro, perante a passividade do Estado e do Banco de Portugal. Por outro lado, a crise económica veio provocar algo que durante décadas nunca se admitiu, ou seja a deflação do valor das casas, em vez da sua contínua valorização, como anteriormente. Ninguém, muito menos os bancos, alertou as pessoas para essa eventualidade. Será justo que sejam só os devedores a suportar agora o custo do inesperado risco?
Mesmo que a imaginação judicial possa encontra remédios pontuais, não deverá o próprio legislador fazê-lo com efeito geral, impondo uma justa partilha do risco?

Adenda

Nunca é demais denunciar a responsabilidade dos sucessivos governos no empolamento do crédito à habitação e do endividamento das famílias (e do endividamento externo da economia) -- para júbilo dos bancos, da indústria do construção civil e das câmaras municipais --, quando permitiu o crédito a 100%, consentiu o alargamento excessivo do prazo dos empréstimos, concedeu generosas deduções fiscais em IRS (chegando a subsidiar o chamado "crédito à habitação jovem"), tudo isto acompanhado pela inércia quanto ao regime do arrendamento, o que empurrava as pessoas para a solução de habitação própria.

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