terça-feira, 1 de maio de 2012

Basta um deputado para impugnar as eleições no TC


O processo de eleição dos candidatos a juízes pode ser suspenso por qualquer deputado. Basta que recorra dos resultados para o Tribunal Constitucional, que pode anular a votação. Seria inédito.
A iniciativa de apenas um deputado poderá anular a eleição dos três candidatos indicados pelo PS, PSD e CDS para juízes do Tribunal Constitucional (TC). Se os três partidos mantiverem as suas escolhas – Fátima Mata- Mouros (juíza), Maria José Rangel Mesquita (docente) e José Conde Rodrigues (ex-secretário de Estado e advogado) – e aprovarem estes três nomes no Parlamento, qualquer deputado poderá recorrer dos resultados do acto eleitoral para… o próprio TC. Isto porque compete ao TC julgar os recursos relativos às eleições feitas na Assembleia da República.
Um deputado, de qualquer bancada, poderá, no prazo de cinco dias a partir da data das eleições, requerer a impugnação do acto. Perante o recurso, o processo eleitoral é suspenso e os juízes do Constitucional terão de decidir, em plenário, num prazo máximo de cinco dias. Essa decisão poderá traduzir a anulação das eleições, obrigando os partidos a apresentarem novos candidatos para o Tribunal. Ou seja, poderá ser o próprio TC a recusar os nomes propostos pelos partidos, dirimindo uma escolha polémica que já fez cair um dos candidatos: Paulo Saragoça da Matta, o jurista proposto pelos sociais-democratas, rapidamente substituído por Maria José Mesquita, professora na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Apesar de inscrita na lei do TC, esta interposição de recurso nunca foi feita relativamente a actos eleitorais no Parlamento. E afigura-se, face à eventual irredutibilidade dos três partidos em manterem as suas propostas, como a única solução para o Parlamento apresentar uma nova lista de candidatos.
Na verdade, existe ainda uma outra, mas a configuração do sistema judicial permite que uma violação da Constituição pelos próprios juízes do TC não seja punida com sanções jurídicas. Isto mesmo pode ser exemplificado com o processo de escolha dos três candidatos e com a controvérsia gerada pelo facto de Conde Rodrigues, proposto pelo PS, estar impedido de se candidatar como juiz, falhando assim a quota de seis juízes de carreira exigida na composição do Tribunal. Se os partidos da maioria e o PS não aceitaram o pedido da presidente do Parlamento, Assunção Esteves, que insistiu na necessidade de as bancadas apresentarem uma lista única cumprindo a quota dos juízes (dois dos três têm obrigatoriamente de ser juízes), e avançarem com a eleição de Mata-Mouros, Maria José Mesquita e Conde Rodrigues, o TC irá violar uma norma constitucional. Mas “não há qualquer entidade que faça esse controlo jurídico, pelo que não existe a possibilidade de uma decisão do TC vir a ser colocada em causa”, explica ao PÚBLICO o professor catedrático José Vieira de Andrade, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
Se o Parlamento eleger os candidatos do PS, PSD e CDS, até o acto de cooptação do 13.º juiz do TC (feito pelos restantes 12 juízes) é inconstitucional, uma vez que a composição é irregular e contrária à Lei Fundamental. Contudo, nota Vieira de Andrade, esta decisão “não é susceptível de ser controlada”. Não existindo qualquer sanção jurídica para os actos inconstitucionais realizados pelos juízes do TC resta “a sanção política ou pública”. Vieira de Andrade aponta que esta situação não se aplica unicamente à actuação dos membros do Constitucional: “Se o Presidente da República não promulgar uma lei dentro do prazo estabelecido está a actuar contra a Constituição, mas não existe qualquer controlo jurídico; o mesmo acontece com o Governo e o Parlamento em actos de execução directa da Constituição.”
Sem fiscalização, o que é que resta? “A confiança e a crença na maturidade das instituições”, responde o professor de Direito Constitucional. Que considera “desprestigiante” o processo de selecção dos candidatos pelo PS, PSD e CDS. “Desde logo pela forma como a lista surgiu em público, proposta pelos partidos, e também pela escolha em si”, diz, referindo-se concretamente a Conde Rodrigues. “Tem um perfil político-partidário, sem experiência como juiz e sem currículo académico”, observa Vieira de Andrade. O TC deve ser composto por “personalidades de grande nível, com muita experiência”, defende. Também o presidente do TC, Rui Moura Ramos, já criticou implicitamente a escolha de Conde Rodrigues, ex-secretário de Estado dos governos de Sócrates. Na última edição do Sol, afirmou: “Os juízes de outros tribunais que têm estado no TC são juízes com uma carreira na magistratura. Exerceram a sua profissão noutros tribunais. (…) Para cumprir o seu objectivo, os juízes dos outros tribunais têm de se rever nestes magistrados.”
Maria José Oliveira
Público de 01-05-2012

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