quarta-feira, 31 de agosto de 2005

Conselho Consultivo da PGR

Parecer n.º 66/2005 (DR 167 SÉRIE II de 2005-08-31)
Rede Eléctrica Nacional - Regulamento - Despacho normativo - Inconstitucionalidade - Validade - Lei habilitante - Princípio da primariedade da lei - Princípio da preferência da lei - Governo de gestão - Anulabilidade.

1.ª O modelo organizativo do sector da energia eléctrica em Portugal, originariamente instituído pelos Decretos-Leis n.os 182/95 a 188/95, todos de 27 de Julho, assenta na existência de um Sistema Eléctrico Nacional (SEN), que se desdobra no Sistema Eléctrico de Serviço Público (SEP) e no Sistema Eléctrico Independente (SEI).
2.ª Especificamente sobre a recepção e entrega de energia eléctrica proveniente de centros electroprodutores do SEI nas redes do SEP, rege o Decreto-Lei n.º 312/2001, de 10 de Dezembro - diploma que regula o procedimento de atribuição de pontos de recepção de energia eléctrica a promotores privados, nos seus artigos 10.º a 14.º, cabendo a respectiva decisão à Direcção-Geral de Geologia e Energia (DGGE).
3.ª Para a eventualidade de a capacidade de recepção das redes do SEP não ser suficiente para atender a todos os pedidos de recepção, deve a DGGE proceder à selecção desses pedidos para efeitos de atribuição da capacidade disponível, de acordo com os critérios de selecção estabelecidos no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 312/2001.
4.ª O despacho n.º 53-A/XVI/2005, de 9 de Fevereiro, do Secretário de Estado do Desenvolvimento Económico do XVI Governo Constitucional - no qual se estabelecem novos critérios de atribuição dos referidos pontos de recepção de energia eléctrica, por se entender que os critérios do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 312/2001 não oferecem "base de selecção bastante" -, reveste natureza regulamentar, na medida em que se mostra possível a sua aplicação a um leque indeterminado de entidades e casos e, apesar de dirigido ao director-geral de Geologia e Energia, tem repercussão externa na posição dos interessados, porquanto é susceptível de condicionar decisivamente qualquer concreto acto de atribuição.
5.ª O princípio da primariedade ou precedência da lei, consagrado no n.º 7 do artigo 112.º da Constituição, estabelece a exigência da habilitação legal dos regulamentos e o dever de citação da lei habilitante por parte de todos os regulamentos.
6.ª O princípio da preferência ou preeminência da lei, afirmado no n.º 5 do artigo 112.º da Constituição, não permite que os regulamentos contrariem actos legislativos ou equiparados, proibindo os regulamentos interpretativos, modificativos, suspensivos ou revogatórios das leis.
7.ª De acordo com o disposto no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição, o Governo em funções após a sua demissão fica sujeito a um regime jurídico especial, caracterizado por uma substancial limitação da sua capacidade, resultante da demissão e do consequente défice de legitimação, apenas podendo praticar validamente os actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos - sendo que essa estrita necessidade corresponde a uma urgência concreta e datada, traduzida na premência de praticar um certo acto, cujo adiamento comprometeria gravemente a realização do interesse público.
8.ª O referido despacho n.º 53-A/XVI/2005, de 9 de Fevereiro, do Secretário de Estado do Desenvolvimento Económico, quer por carência de habilitação legal quer por falta de individualização da lei habilitante, violou o princípio da primariedade ou precedência da lei - o que o fere de inconstitucionalidade.
9.ª Esse mesmo despacho, ao pretender modificar o regime legal de atribuição de pontos de recepção de energia eléctrica, no que toca aos critérios de atribuição, violou o princípio da preferência ou preeminência da lei - sendo, também por essa razão, um regulamento inconstitucional.
10.ª Tal despacho não foi editado no respeito das condições estabelecidas no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição, e acima enunciadas, pelo que viola esse preceito - enfermando, igualmente por isso, de inconstitucionalidade.
11.ª O mencionado despacho n.º 53-A/XVI/2005, ao adoptar novos critérios de selecção dos pedidos para atribuição de pontos de recepção de energia eléctrica em momento posterior ao da apresentação de propostas de interessados, configura uma clara violação dos princípios da igualdade, da transparência e da publicidade, acolhidos no artigo 6.º, n.º 1, alínea d), do Decreto-Lei n.º 312/2001, aplicável ao respectivo procedimento ex vi do artigo 13.º, n.º 2, do mesmo diploma, pelo que incorre ainda em ilegalidade, por violação de lei.
12.ª O subsequente despacho do director-geral de Geologia e Energia (DGGE), em que este procede à concreta atribuição de pontos de recepção de energia eléctrica, com base nos critérios extralegais fixados por aquele despacho governamental, enferma igualmente de ilegalidade, por violação de lei - vício que, por si só, é gerador de anulabilidade.
13.ª Esse despacho do DGGE, na medida em que não foi precedido da audiência dos interessados, nos termos do disposto nos artigos 100.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, sofre ainda de um vício de forma, por preterição de uma formalidade essencial - o que também gera anulabilidade.

Legislação do Dia (selecção)

Lei n.º 52/2005. DR 167 SÉRIE I-A de 2005-08-31 – Assembleia da República: Aprova as Grandes Opções do Plano para 2005-2009

terça-feira, 30 de agosto de 2005

Legislação do dia

  • Lei n.º 49/2005. DR 166 SÉRIE I-A de 2005-08-30 – Assembleia da República: Segunda alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo e primeira alteração à Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior
  • Lei n.º 50/2005. DR 166 SÉRIE I-A de 2005-08-30 – Assembleia da República: Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a lei geral tributária e o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária
  • Lei n.º 51/2005. DR 166 SÉRIE I-A de 2005-08-30 – Assembleia da República: Estabelece regras para as nomeações dos altos cargos dirigentes da Administração Pública

segunda-feira, 29 de agosto de 2005

Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República

Parecer n.º 50/2005. - Contrato administrativo de provimento - Agente administrativo - Caducidade - Lista de classificação final Momento da verificação dos requisitos - Aviso de abertura.

1.º Os requisitos (gerais e especiais) legalmente exigidos para a admissão a concurso de provimento devem verificar-se "até ao termo do prazo fixado para a apresentação de candidaturas" (artigo 29.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de Julho) e manter-se no momento do provimento.
2.º A cessação de contrato administrativo de provimento na pendência de concurso interno de ingresso obsta à nomeação dos candidatos que, por virtude da cessação, não detenham no momento do provimento a qualidade de agente administrativo.

José Adriano Machado Souto de Moura - Alberto Esteves Remédio (relator) - João Manuel da Silva Miguel - Mário António Mendes Serrano - Manuel Joaquim de Oliveira Pinto Hespanhol - Maria de Fátima da Graça Carvalho (com voto de vencida em anexo) - Manuel Pereira Augusto de Matos - José António Barreto Nunes - Paulo Armínio de Oliveira e Sá - José César Pinto Cardoso de Oliveira.

Este parecer foi votado em sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de 19 de Maio de 2005 e foi homologado por despachos dos Secretário de Estado da Segurança Social de 31 de Maio de 2005 e Ministro de Estado e das Finanças de 25 de Julho de 2005.
(DR 165 SÉRIE II de 2005-08-29)

Legislação do dia

  • Lei Orgânica n.º 3/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Terceira alteração à Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto (lei que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais)
  • Lei n.º 42/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Sexta alteração à Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), oitava alteração à Lei n.º 21/85, de 30 de Julho (Estatuto dos Magistrados Judiciais), quinta alteração à Lei n.º 47/86, de 15 de Outubro (Estatuto do Ministério Público), e quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 343/99, de 26 de Agosto (Estatuto dos Funcionários de Justiça), diminuindo o período de férias judiciais no Verão
  • Lei n.º 43/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Determina a não contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras e o congelamento do montante de todos os suplementos remuneratórios de todos os funcionários, agentes e demais servidores do Estado até 31 de Dezembro de 2006
  • Lei n.º 44/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Lei das associações de defesa dos utentes de saúde
  • Lei n.º 45/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Primeira alteração à Lei n.º 13/2003, de 21 de Maio, que revoga o rendimento mínimo garantido, previsto na Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e cria o rendimento social de inserção
  • Lei n.º 46/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Estabelece limites à renovação sucessiva de mandatos dos presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais
  • Lei n.º 47/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Estabelece o regime de gestão limitada dos órgãos das autarquias locais e seus titulares
  • Lei n.º 48/2005. DR 165 SÉRIE I-A de 2005-08-29 – Assembleia da República: Procede à quarta alteração ao regime jurídico do cheque sem provisão, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro

sexta-feira, 26 de agosto de 2005

Banzai!

Quando o Japão quis ter um Código Civil parecido com o do Ocidente, que ele tomava como modelo de civilização, encomendou-o a um francês, um tal Gustave-Émile Boissonade. Estava-se no ano de 1873, em plena dinastia Meiji. Acusado de estrangeirado, o Código nunca chegou a entrar em vigor. Venceram os críticos. O resultado viu-se: em 1896 o Império do Sol Nascente aprovou um novo Código, directamente copiado do Código Civil alemão.

CURSOS DE PREPARAÇÃO PARA ADMISSÃO NO CEJ

Vi anunciada na imprensa escrita a abertura de inscrições para um dos cursos de “preparação para admissão ao Centro de Estudos Judiciários”. A subsistência e aumento do número destes cursos não é dissociável do modo como é feita a selecção dos candidatos para o ingresso no CEJ e de uma certa padronização dos testes escritos, para a qual, de resto, tem também contribuído a existência daqueles.
Os chamados “cursos de preparação”, partindo da análise dos testes escritos e dos critérios de classificação dos últimos anos, procuram fornecer aos candidatos a resposta pertinente a temas e perguntas previsíveis, de acordo com uma grelha de correcção esperada. São cursos talhados para um objectivo muito específico: que quem os frequenta passe naqueles testes.
Não constituem, por isso, a meu ver, um contributo, que é desejável, das Universidades para o melhor apetrechamento dos licenciados que se assumem como candidatos ao ingresso nas profissões forenses.
Desconheço qual a “taxa de êxito” desses cursos. Apenas tenho os dados, publicados, do inquérito feito aos auditores de justiça que ingressaram no XX Curso Normal de Formação (ano de 2001/2002) *. Dos 110 auditores de justiça do curso, 68 responderam à pergunta sobre se tinham frequentado algum curso de preparação para admissão ao CEJ, tendo 48 respondido que sim e 20 respondido que não. Mas, tomando-se em consideração que os testes escritos das matérias jurídicas visam fazer uma reavaliação da aprendizagem obtida nas licenciaturas dos conhecimentos essenciais das principais áreas do direito, permitindo a lei que seja consultada toda a bibliografia que o candidato consiga transportar consigo, quem frequenta aqueles cursos beneficia ainda, normalmente, dos dossiês com doutrina e jurisprudência seleccionadas por temas, dos quais pode fazer transcrições que, mesmo sendo inúteis para a abordagem do caso concreto, com grande probabilidade o beneficiarão na classificação final.
Repetindo o que já disse e escrevi noutras ocasiões, entendo que a avaliação dos conhecimentos de direito deve incidir essencialmente sobre a capacidade, em face de situações concretas, de sobre elas reflectir, de utilizar adequadamente os conhecimentos jurídicos pertinentes, de encontrar para elas respostas jurídicas suficientemente fundamentadas, de demonstrar ponderação na sua análise – ou seja, uma avaliação não limitada ao conhecimento memorizado, ou à transcrição acrítica da doutrina e da jurisprudência disponíveis. Devendo as provas de acesso ser construídas de forma a serem capazes de aferir estes conhecimentos e estas capacidades.
E, a manter-se a exigência de que os candidatos ao ingresso no CEJ terão de ser licenciados há pelo menos dois anos, impõe-se que o concurso público inclua a análise e discussão curriculares.

* “Sociografia dos Auditores de Justiça – XX Curso Normal”, Fernanda Infante e Rui do Carmo, ed. CEJ – Julho 2002

AINDA A "UNIDADE DE MISSÃO PARA A REFORMA PENAL"

Decidi reler a Resolução do Conselho de Ministros que constituiu a Unidade de Missão para a Reforma Penal, pois surgiram-me dúvidas sobre a opinião a que aderi logo que tive conhecimento da sua criação e constituição.
Leio no nº1 da Resolução que “tem por objectivo a concepção, o apoio e a coordenação do desenvolvimento dos projectos de reforma de legislação penal” – que deverão ser aqueles que estão enunciados no programa do Governo, penso eu. Parece-me que a criação desta estrutura é positiva se tiver em vista procurar garantir a coerência e articulação entre as diversas intervenções legislativas anunciadas (prioridades de política criminal, alterações ao Código Penal e ao de Processo Penal, execução das penas, etc.), uma vez que a incoerência e a desarticulação entre diplomas legais estão entre os problemas actuais da produção legislativa, provocando ineficácia e enfraquecendo a sua força normativa.
Compõem-na, para além do coordenador, um conselho integrado por membros de departamentos do Ministério da Justiça ou sob a sua tutela e um membro do gabinete do próprio ministro. E o nº4 estabelece que “o coordenador da UMRP pode propor ao Ministro da Justiça que sejam convidados a participar em reuniões do conselho (...) representantes do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público e da Ordem dos Advogados, bem como professores universitários de áreas científicas consideradas relevantes para a reforma penal”.
Ora, está aqui o centro das críticas: a não integração na composição do conselho da UMRP de membros do CSM, do CSMP e da OA, o que vem sendo entendido por alguns como uma forma de marginalizar os profissionais do foro, os que aplicam a lei e melhor conhecem o funcionamento e os problemas do sistema de justiça penal, do debate e concepção das reformas legislativas.
Também assim comecei por pensar, influenciado por algumas atitudes de gratuito afrontamento que o Ministro da Justiça tem adoptado no relacionamento com magistrados, advogados e funcionários de justiça, o que me levou a concluir de imediato: cá está mais uma atitude de afrontamento.
Há, contudo, que tomar em consideração que este governo se demarcou da ideia de Pacto da Justiça defendida pelo anterior, em face da qual fazia todo o sentido a constituição de um colectivo que integrasse o poder político e também os órgãos representativos e de gestão das profissões forenses. E que afirmou assumir a responsabilidade política de apresentação das suas próprias propostas, pelo que faz sentido que constitua um órgão que, sob a dependência do Ministro da Justiça, conceba os “projectos de reforma da legislação penal” que pretende vir a apresentar; assim como faz sentido que tal órgão tenha necessidade de ouvir o CSM, o CSMP, a OA e professores universitários no processo da sua elaboração, sobre aspectos técnico-jurídicos e da sua incidência na prática judiciária.
Este caminho permite, de resto, dois tipos de clarificações: por um lado, clarifica que as opções de política criminal (em sentido lato) não são questões meramente técnicas, mas essencialmente escolhas políticas ideologicamente informadas; por outro lado, clarifica a autoria e a responsabilidade dos projectos, que são inequivocamente do governo.
Elaborados os projectos, então há que haver um debate amplo, no qual o CSM, o CSMP e a OA desempenharão um papel muito importante, que terá de ser necessariamente alargado às associações sindicais do sector, à sociedade civil, a todos os cidadãos. Em que se debaterão as opções político-legislativas, as soluções técnico-jurídicas escolhidas para a sua concretização, o texto concreto dos projectos, e serão apresentados todos os contributos tendo em vista a elaboração da versão final a ser aprovado pelo Governo ou a ser apresentada por este à Assembleia da República.
Nessa fase é que têm de ser exigidas as condições necessárias a uma ampla participação democrática.

quarta-feira, 24 de agosto de 2005

Faleceu o Juiz Conselheiro Armando Sá Coimbra

Morreu hoje o meu amigo, colega e mestre Conselheiro Sá Coimbra, que sempre terei como exemplo de cidadão e magistrado.
Foi mensageiro dessa infausta notícia o comum amigo António Arnaldo Mesquita, na singela mensagem que aqui deixo:
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Armando Sá Coimbra (1919-2005) faleceu hoje no Porto e o funeral realiza-se amanhã, pelas 10h.00, da Igreja de Cedofeita para o cemitério de Barcelos. Escritor e juiz conselheiro, Sá Coimbra publicou quatro romances (“O Sol e a Neve”, “Teia”, Chancela” e “Cor do Ouro” e duas peças de teatro (“Até à vista” e “O Relógio”. Mas a biografia de Sá Coimbra inclui também sinais de um “magistrado íntegro e radicalmente independente, que se impôs ao respeito de todos os advogados e de todos os que com ele trabalhavam”, garante o conselheiro Artur Costa, numa evocação recente na Revista do Ministério Público.
Desde a adolescência, Sá Coimbra nunca perdeu o ensejo de exprimir a sua capacidade de afirmação e acabaria por ser expulso “por indisciplina” de um seminário, prosseguindo os seus estudos para concluir o curso na Faculdade de Direito de Lisboa, em 1945. Desta fase da sua vida inspirou-se para o seu primeiro romance, “Teia”. Óscar Lopes prefaciou o romance e sintetiza a trama. “É a história de um seminarista que descobriu no seminário não ter sido nunca verdadeiramente inspirado pela vocação sacerdotal e que, depois de vencidas muitas dificuldades, consegue chegar ao fim do curso de Direito”. “O tema de Teia pode resumir-se assim: uma consciência que se busca a si própria por entre o que a vida lhe oferece e lhe nega, e que nesta busca descobriu o seu lugar e o dos outros, no mundo, se transformou, ganhou consciência”, frisa o autor de “O Modo de Ler”.
Nas três décadas seguintes, Sá Coimbra foi magistrado judicial nas três instâncias e da sua passagem pelo Tribunal de Polícia do Porto ficaram ecos de uma perspicácia e ironia ímpares, com que condenava um tempo que gerava homens e mulheres que as agruras da vida encaminhavam para o “banco dos réus”. Nesse tribunal do “pé rapado”, recorda o conselheiro Artur Costa, Sá Coimbra ganhou “uma aura de juiz inconformista e destemido”, que lhe “valeram a marginalização e a perseguição, quer do poder político, quer do poder corporizado nas instituições judiciárias”.
O escritor Armando Sá Coimbra acabaria por retratar o universo judicial anterior a Abril de 1974 num outro romance”Chancela”, saído do prelo há quase três décadas e que está há muito esgotado. O prefácio de Maria Glória Padrão começa assim: “Pardo é Prado. Prado é juiz. Pardo é o juiz. Este juiz que se movimenta nesta narração e de que o narrador se serve para questionar uma forma brutal de poder — o poder dos tribunais”.

Para quem melhor o quiser conhecer que leia a sua obra e estes dois prefácios, na íntegra, são o melhor incentivo. Um é de Óscar Lopes e outro da Maria da Glória Padrão, que é feito de ti, mulher?

TEIA, Sá Coimbra
Prefácio de Óscar Lopes

Teia é o primeiro romance que Sá Coimbra escreveu, embora só tivesse sido publicado um ano depois de O Sol e a Neve. Como seria de esperar na primeira obra de um romancista, os heróis de Sá Coimbra são em grande medida veículo do muito que há de significativo na vida do autor; quando seminarista, quando estudante de Direito. Contudo, Teia não é um pretensiosismo autobiográfico, e muito menos, uma tentativa adolescente de "escrever um romance". Esta obra é mesmo um romance no sentido de expressão artística que se procura total de realidade social e psicológica do homem. Para isso contribui grandemente uma vasta experiência pessoal de juiz, que compreende o sentido social da justiça e da moralidade que procura e sabe como encontrar os últimos porquês das acções humanas. Esta experiência de Sá Coimbra jorra por toda a sua obra, revigora com realismo os pormenores mais acidentais e deixa ficar no leitor como que uma adesão, uma revelação daquilo que em si já pressentia.

Teia é a história de um seminarista que descobriu no seminário não ter sido nunca verdadeiramente inspirado pela vocação sacerdotal e que, depois de vencidas muitas dificuldades, consegue chegar ao fim do curso de Direito; mas o significado profundo deste romance não se esgota nos acidentes da vida imaginária dos seus heróis. Cada um de nós, seminarista ou não, estudante de Direito ou não, encontra lá um pouco de si próprio. O tema de Teia pode resumir-se assim: uma consciência que se busca a si própria por entre o que a vida lhe oferece e lhe nega, e que nesta busca descobriu o seu lugar e o dos outros, no mundo, se transformou, ganhou consciência.

Óscar Lopes

A CHANCELA, Sá Coimbra

Pardo é Prado. Prado é juiz. Pardo é o juiz. Este juiz que se movimenta nesta narração e de que o narrador se serve para questionar uma forma brutal de poder — o poder dos tribunais.
Pardo é Prado. No universo da relação familiar tipifica a instituição que transporta para o espaço da casa (passado o momento de pitoresco que vive na primeira noite nos Açores) a condição da marca de classe que suporta. É juiz.
Pardo é Prado. No universo da relação social é o voluntária e conscientemente arredado dela, num círculo de estreitamento que lhe castra o gesto do dialogo. Restar-lhe-á o rato necessário para o dizer estereotipado do bom dia. Porque para o espaço da relação com o outro, ele transporta a condição da marca de classe que suporta. Ele é juiz.
Pardo é Prado. No universo da relação profissional, em deambulação geográfica, vai sendo promovido. Por tempo.
Mas também por competência, lato é, por assepsia, meticulosamente cumpridor da lei. Porque no espaço da hierarquia de que depende e sobre que impende, ele transporta a condição da marca de classe que suporta. É juiz.
Pardo é Prado. Agora com toda - a força da superlativação.
No universo da relação superstrutural, não se descola da escrupulosa execução da norma jurídica com a consequente deslocação de valores: os códigos são, acima de qualquer suspeita; os processos são, acima de qualquer cidadão.
O prémio é óbvio: o convite para o tribunal político. Produto de um sistema que nunca põe em causa, automatizando-se numa pretensa e cega independência, começa como vítima dele, sistema, e acaba como vítima de si próprio: por não optar, optam-no. É guarda, castrador de si, do outro, até à morte. Linearmente.
Quando a família sai do cemitério, mudara já o pano de fundo: Venceremos, venceremos, / a batalha da terra e do pão!» É o canto atirado para a rua a derrubar a história que pariu a lei que o juiz cumpriu. Canto colectivo de polaridade oposta ao fado que plana desde os Açores: «Tudo lato é fado.» O jogo oposicional de sons é outra simbologia dos dois momentos históricos em que se processa a diegese.
Mas em tempo de fatalismo já Pedras tem a funcionalidade de contrariar o fado desde os mais rotineiros sinais até à questionação mais profunda do espaço normativo em que se movimenta a forma de poder. Por isso, pretendendo servir o homem, manter-se-á com o labéu de perigoso e deixará de ser nomeado no texto depois da data da transformação. Porque a história do poder começará a ser contada de outro modo!
A narração é ainda um lugar de movimentação de peque nos grandes casos ou acidentes humanos, esferas auxiliares que contribuem para a fixação da impessoalidade do juiz Prado que, apesar do sistema e também por causa dele, vive frequentemente uma crise de identidade de que lhe advém um complexo de culpa presente em alguns dos momentos mais humanos deste texto.
Por isso, o título permite a ambiguidade: chancela será metáfora de sistema, de processo, de sujeito. Só numa perspectiva ele é rígido: nunca metáfora de povo em movimento.

Maria da Glória Padrão

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Faz algum tempo que, neste espaço, o Conselheiro Artur Costa exprimiu um sentir de muitos amigos e admiradores, que esta morte inesperada (sempre inesperada) já não permitirá concretizar com o mesmo significado, mas que impõe seja relembrado.

«Li, já lá vão uns dias, uma curta, mas digna nota biobibliográfica de Sá Coimbra, e fiquei com vontade de acrescentar alguma coisa da minha experiência pessoal com essa figura ímpar de magistrado que ele foi. Na verdade, tive o privilégio de conviver com ele e com ele compartilhar alguns projectos, como o da Fronteira. Conheci-o na posição de advogado estagiário, quando o Dr. Sá Coimbra era juiz de um juízo correccional, no Porto. Tive, então, ocasião de observar a sua qualidade de magistrado íntegro e radicalmente independente, que se impôs ao respeito de todos os advogados e de todos os que com ele trabalhavam. Estava-se ainda no fascismo e, por isso, mais sobressaíam tais atributos, que, aliás, lhe valeram a marginalização e a perseguição, quer do poder político, quer do poder corporizado nas instituições judiciárias, estas não sendo mais do que a emanação daquele. O Dr. Sá Coimbra ficou a marcar passo na 1ª instância, até que o regime democrático instituído pelo 25 de Abril lhe fez justiça.Antes da sua colocação nos Correccionais, o Dr. Sá Coimbra tinha estado num tribunal de polícia – o tribunal do «pé rapado» -, onde a sua humanidade, a sua cultura, a sua sensibilidade e a ironia mordaz com que sublinhava muitas situações do quotidiano policial e autoritário, tão opressivo das franjas marginais da sociedade, lhe granjearam uma aura de juiz inconformista e destemido, com honras de destaque na imprensa. Quem quisesse conhecer a natureza do regime que vigorava antes do 25 de Abril tinha nos tribunais de polícia um espelho de eleição. Por isso, muitos jornais, que tinham o terreno barrado pela censura, lhes dedicavam crónicas diárias saborosas, falando habilmente do regime opressivo, e jornalistas houve que, sendo repórteres desse quotidiano judiciário, ficaram célebres. Um deles foi Mário Castrim.
E houve juízes que souberam impor-se como extraordinários exemplos de aprumo cívico e profissional no lidar com a miséria quotidiana de que se compunha essa justiça aparentemente de «rebotalho». Um deles foi Sá Coimbra e outro, mais ou menos da mesma altura, foi o Dr. Quintela, um juiz que também foi pontapeado pelo regime. Não o conheci, mas ainda há feitos seus que ecoam nos nossos ouvidos, pelo menos dos mais velhos. O Dr. Quintela, um dia, condenou uma pobre vendedeira, por questões de negócio na rua, sem licença. Mal acabou de ler a sentença, levantou-se e disse para a assistência: «E agora vamos aqui abrir uma subscrição para pagar a multa à mulher, porque, se não, ela vai para a cadeia; eu sou o primeiro a contribuir». E mergulhou a mão no bolso, de onde extraiu umas moedas. Haverá um gesto de maior «desmistificação» do que este? Para quando uma história dos tribunais de polícia?Conheci então o Dr. Sá Coimbra mais tarde, nos Correccionais, já ele tinha uma aura de juiz singular, isto é, «irregular». Foi o juiz de 1ª instância mais escrupuloso que conheci no apuramento da matéria de facto e na preocupação de fazer justiça. Onde se é juiz a sério é na 1ª instância, e foi com o Dr. Sá Coimbra que eu comecei a ter essa exaltante sensação. Talvez tenha contribuído para diluir a relutância que eu sentia pela magistratura. Tratava todos os profissionais – Ministério Público, advogados – por colegas. «Colega, tem a palavra.» Mas era um tratamento autêntico, não aquela capa de superioridade, disfarçada de condescendência, de que se revestem os mais altamente colocados na hierarquia ou numa posição de autoridade para fingirem uma proximidade fraterna com os que sentem ser-lhes inferiores. Nos intervalos, convocava todos para o seu gabinete, para fumar um cigarro e discretear sobre os mais diversos assuntos.
Não era só escrupuloso, mas corajoso. Quando foi do julgamento de dois polícias da PSP e um da PJ (se não estou em erro), por agressão, nas instalações da PJ do Porto, ao Néné Santos Silva (como nós lhe chamávamos), na sequência dos acontecimentos da crise académica de 1969, demonstrou abundantemente essas suas qualidades. Tanto na condução do julgamento, como na decisão final, em que condenou dois dos arguidos e absolveu o outro, absolvendo também o próprio Dr. Artur Santos Silva, que foi acusado de ter agredido ou injuriado membros da PJ, quando, no mesmo dia, foi às instalações daquela polícia tirar satisfações pela agressão ao filho. Este, portador de uma grave doença cardíaca, não haveria de chegar com vida ao dia do julgamento. Corria o ano 1972. Com pouco mais, estava-se no 25 de Abril. Nessa altura, já eu era magistrado.
Quando, depois de andanças pelo Sul, regressei ao Porto para fazer estágio na magistratura judicial, vim a privar com o Dr. Sá Coimbra e a tornar-me amigo dele. Havia um grupo de magistrados na capital nortenha que se distinguia pelas suas qualidades cívicas, culturais e profissionais. Foi uma plêiade de magistrados que marcou uma época. Entre outros, lembro Roseira de Figueiredo, que foi presidente da Relação do Porto a seguir ao 25 de Abril, Flávio Pinto Ferreira, o autor de Para Uma Abordagem Sociológica Da Magistratura Judicial, que chegou a ser secretário de Estado, Fernando Fabião, Herculano Lima, que ficou à frente da Procuradoria da República no Distrito do Porto nos alvores da democracia e, claro, Sá Coimbra, que, sendo de todos o que tinha mais prestígio intelectual, ficou a presidir à revista Fronteira – uma revista inovadora para discussão de temas constitucionais, a que esses magistrados deram alma e que – ponto muito importante – não estava confinada ao mundo judiciário, abrindo-se a outros sectores. Nessa revista, o Dr. Sá Coimbra escreveu vários artigos de grande relevância para uma outra compreensão do direito, da magistratura, da função de julgar, em que sobressaía a sua preocupação pela abertura do juiz ao mundo «profano», buscando aí tanto a sua legitimação, como a sua «dessacralização». Muitos desses textos, lidos hoje, ainda causariam surpresa pela novidade e ousadia.Foi nesse período que ele deu à luz a Chancela, um romance todo ele enraizado na experiência judiciária e que condensa o seu pensamento e a sua sensibilidade em torno da função de julgar, ao mesmo tempo que constitui um fresco do panorama da justiça em Portugal antes do 25 de Abril. Editado pelo prestigiado Cruz Santos, ao tempo da Editora Inova, apareceu com uma apreciação crítica de Maria da Glória Padrão reproduzida na badana da capa. Mas não é só na Chancela que emerge, embora aí apareça com toda a nitidez, dada a especificidade do tema, o acto de julgar como objecto de efabulação. Também em outros livros, como O Sol e a Neve, aparece a figura do juiz entronizado na sua função, aí num belo episódio, pleno de observação crítica, que poderia figurar numa antologia de textos literários acerca da justiça e que também veio reproduzido num dos números da Revista do Ministério Público, na secção designada de Vária, por sugestão que fiz ao Maia Costa, sendo eu, então, membro do Conselho da Redacção.
Recolhendo em síntese as principais qualidades do Dr. Sá Coimbra, destacaria: o espírito de radical independência, a coragem, a probidade intelectual e funcional, o aprumo cívico, o combate lúcido pela dignificação de julgar numa perspectiva democrática e não corporativa, a solidariedade interprofissional, a abertura à polis, onde o acto de julgar cobra fundamento e justificação. Falei sobretudo do homem e não do escritor, que esse mereceria apreciação autónoma. Quantos de nós, com trinta anos de democracia em cima, nos poderíamos reclamar de um tão rico naipe de qualidades?Pergunto: onde é que estão os políticos da nossa democracia que nunca foram capazes de encontrar, nos meios judiciais, homens como este para lhes atribuírem uma pequena distinção, em nome da comunidade que eles serviram com honra e verdadeiro empenho cívico, quando esbanjam comendas a torto e a direito por uma espécie em voga: os novos ricos da democracia? Onde estão eles, afinal, que, quando se lembram de atribuir honrarias desse tipo a magistrados, vão indagar junto dos presidentes dos conselhos superiores a quem as devem atribuir? Há tempos, um jornalista dos mais brilhantes da cidade do Porto – Germano Silva, da Visão – que foi um dos cronistas, ao serviço do Jornal de Notícias, que reportou, diariamente, os julgamentos do tribunal de polícia, perguntou-me para quando uma homenagem da «classe judicial» (foi assim que ele se exprimiu) ao Dr. Sá Coimbra. Encolhi os ombros envergonhado e culpabilizado. Artur Costa »

Internet for Lawyers

Internet for Lawyers has been written by Sue Pettit, Subject Librarian for Law, Wills Memorial Library, University of Bristol. It is one of a set of tutorials within the RDN Virtual Training Suite, created by subject-specialists from universities and professional organisations across the UK.

segunda-feira, 22 de agosto de 2005

O Mundo das Sombras

O Dr. José António Barreiros continua a surpreender-nos.
Depois da Revolta das Palavras, e para além do blog jurídico Patologia social e da sua participação no Cum grano salis, sustenta os blogues A Janela do Ocaso e Geometria do Abismo.

Recentemente, descobrimos-lhe mais um, O Mundo das Sombras, blog dedicado aos estudos de investigação que tem vindo a fazer sobre as redes estrangeiras de espionagem, contra-espionagem e operações especiais em Portugal, sobretudo durante a segunda guerra mundial.

José António Barreiros, advogado, nascido em 1949, tem-se dedicado nos últimos anos a investigar as redes de espionagem estrangeira em Portugal durante a Segunda Guerra Mundial.

Sobre o tema já publicou:
(1) «A Lusitânia dos Espiões», uma colectânea de artigos que editara na imprensa sobre o tema;
(2) «O Espião Alemão em Goa-Operação Longshanks», um relato de um incidente ocorrido em 1943 no porto de Mormugão, em que um comando do SOE britânico tentou apresar navios cargueiros do Eixo estacionados naquele porto neutral;
(3) «O Homem das Cartas de Londres - Rogério de Menezes», a biografia de um dactilógrafo da Embaixada portuguesa em Londres, preso em 1943 por espionagem a favor do Eixo e condenado à pena de morte, mas que o autor encontrou vivo em Castelo Branco.

Prepara actualmente um outro livro biográfico sobre a agente duplo «Treasure», Nathalie Sergueiew.

Tem colaboração dispersa em artigos na imprensa e em conferências.

Não resistimos a dar-lhe, daqui, um forte e entusiasmado abraço pelo feito e a desejar-lhe o maior êxito nesta sua outra faceta.

quarta-feira, 17 de agosto de 2005

A unidade de missão: o vai-vem espacial

De acordo com a Resolução do Conselho de Ministros n.o 138/2005 foi criada uma «unidade de missão para a reforma penal». O texto do diploma é do seguinte teor:
[...]
O termo usado para designar a nóvel entidade tem o seu quê de evangélico, mas não será por isso que nenhum mal virá ao mundo da reforma penal. Os socialistas adoram estes novo-riquismos terminológicos e os que gostam de não parecer incultos também.
Mas ante a leitura do texto em si, permitam-se os seguintes comentários:
(1) porquê a distinção discriminatória, nele assumida, entre os membros que integram a «unidade de missão» por direito próprio e aqueles que podem vir a ser convidados? Será que se pensa que haverá membros de primeira classe e de segunda e que a reforma tem mais a ver com os primeiros do que com os segundos?
(2) porquê circunscrever o elenco dos que ali se sentam por direito próprio a representantes de organismos dependentes do Ministério da Justiça? Será que se pensa que a reforma penal, com tudo o que ela implica de liberdade de opinião e de iniciativa, se faz com o concurso respeitoso e obediente de funcionários, por mais respeito que eu tenha pelos que têm como ingrata missão sujeitarem-se a ministros?
(3) porquê não se definiram quais as balizas concretas da reforma, sendo que o preâmbulo do diploma praticamente refere todo o Direito Penal, augurando-se que a comissão [perdão, a unidade de missão] possa ir de A a Z, sem que saiba por onde ou para onde?
Eis, para já. Aguardemos confiadamente, após este lançamento. Não se sabe se a nave segue para Marte repressivo se para Saturno ressocializador, nem qual a sua missão. Mas a reforma continua! O próximo ministro também haverá de querer a sua. A propósito, ironia do destino: a resolução sobre a reforma essencial na área do Ministério da Justiça vem assinada pelo ministro da Administração Interna, «posing as» Primeiro-Ministro. É preciso ter azar!

José António Barreiros, na Patologia Social

Publicada, agora...

... a Resolução do Conselho de Ministros n.º 138/2005 que cria uma estrutura de missão para a reforma penal, com vista à concepção, apoio e coordenação do desenvolvimento das iniciativas de reforma em matéria penal, e nomeia o seu coordenador.

terça-feira, 16 de agosto de 2005

Legislação do dia...

... A ler em Leituras Oficiosas.

CEJ: primeiro estranha-se, depois entranha-se

É-me difícil, pessoalmente difícil, escrever isto. Mas também não ficaria bem comigo se não o disesse. Vejo que se discute o CEJ, os critérios da formação, a articulação com advogados, tudo questões seguramente relevantes. Lembrei-me de uma coisa. Sem querer ser injusto, fui ao CEJ, convidado, ao longo da vida do mesmo, nem uma meia-dúzia de vezes, sequer. Sei que houve conferências, colóquios, sei de gente que esteve lá nos júris de exames, no meu caso a verdade é aquela que fica em cima. Outra coisa de que me lembrei: vai para dezasseis anos ou mais, por eleição da Assembleia da República, fiz parte da colegial Direcção e do Conselho Pedagógico daquela entidade. Ora, a propósito, lembrei-me de uma terceira coisa: como tinha sido eleito sob proposta do PS, de que na altura era filiado [desde 1974] e como ao regressar do Governo de Macau [por razões que não vêm ao caso] me desvinculei de tal filiação, em coerência, pedi que me exonerassem do CEJ. A partir daí, passou a ser como digo. Nunca percebi o porquê dessa cláusula de exclusão. Deixem-me, no entanto, partilhar uma confidência: inseguro de mim, muitas vezes pus em causa a minha valia pessoal e profissional, só aí encontrando explicação razoável para o facto de nunca se lembrarem da minha pessoa. Agora, ao ver que se suscita a discussão sobre os critérios gerais, lembrei-me disto. Não para fazer «trottoir», oferecendo-me para que me convidem, só para pedir desculpa por não estar à vontade para emitir opinião.

Virtudes teologais, precisam-se!

Em 1982, quando foi aprovado o regime geral das contra-ordenações, o ingénuo legislador [creio que na altura o ministro da Justiça era o Doutor Eduardo Correia] julgou que com um artigo da lei convertia em contra-ordenações as milhentas vagantes contravenções. Depois veio um exercício de realismo e lá teve que se revogar à pressa o tal artigo conversor, por se ter entendido que era necessário criar estruturas em cada departamento da administração pública, para se incumbir então de aplicar as neófitas coimas. A partir aí entrou-se na via sacra da conversão, decreto a decreto. Claro que o legislador, pelos vistos não convertido totalmente, lá foi criando mais umas transgressões na legislação avulsa, para ajudar à confusão. Ora dizia eu, a campanha pela conversão arrancou em 1982. 23 anos depois, como se vê pelo que foi aprovado em Conselho de Ministros, estamos lá!. Viva, viva! Haja fé que a conversão chegará. É claro que para os cidadãos como eu, sem fé e já sem esperança, resta ainda a caridade.

segunda-feira, 15 de agosto de 2005

O CEJ e o seu Programa de Actividades

1. Acicatado por uma observação do Dr. Rui Carmo em Incursões e aqui transcrita, quanto ao programa do Centro de Estudos Judiciários, fui lê-lo. Até porque em tempos tinha manifestado a minha opinião sobre a provável vantagem de o CEJ também poder ser dirigido por alguém estranho às magistraturas.
Não vi os antecedentes de outros programas, estou pois isento de termos de comparação e devo dizer que fui especialmente atento ao que também se pudesse expressar sobre a aprendizagem dos magistrados no que às tecnologias de informação e comunicação diz respeito.
Posso afirmar que na generalidade fiquei agradado com a qualidade do programa e em particular com a atenção que nele se dedica ao ensino das novas tecnologias, nomeadamente, informática e meios audiovisuais. Pensa-se agora em uma disciplina de longo fôlego e numa presença constante do uso das novas ferramentas. É de aplaudir sem reticências.

2. Por certo que o CEJ já não era estranho na discussão e ensino de matérias como a ética e a deontologia, esta como manifestação da ética na profissão, a psicologia judiciária, contabilidade e gestão, sociologia, investigação criminal, gestão do inquérito.
Mas é bom de ver o interesse sobre aspectos tais como:
- A revalorização de disciplinas que interpelam novas dimensões e o sublinhar das questões que o uso das novas tecnologias suscita;
- A atenção a disciplinas como a organização, metodologia e discurso judiciários;
- A sensibilização dos auditores para a importância em conhecer os aspectos mais relevantes da comunicação em contexto profissional, já que a mediatização dos tribunais é uma evidência inelutável.

Debate esse sobre a ética e a deontologia profissionais “numa óptica de estreitamente relacional entre os diversos agentes que interagem na administração da justiça, de forma a favorecer as boas práticas de cooperação judiciária, sem prejuízo do respeito pela função e esferas de competências de cada um”.

3. É por demais conhecido que alguns maus exemplos de relacionamento com os restantes profissionais do foro, mas muito em particular com os cidadãos em nome dos quais se exerce a Justiça, constituem uma das principais críticas ao funcionamento dos tribunais. Fala-se à boca frequente em arrogância dos magistrados e magistradas, em insensibilidade quanto ao tratamento cortês e delicado, em distanciamento a pretexto de falsas independências, roçando a sobranceria.
Por isso é de aplaudir que (no 3.º ciclo) se procure consolidar a cultura de boas práticas no âmbito das relações humanas, em especial no que respeita às relações profissionais e institucionais.
E também é adequado desenvolver a aquisição de saberes não jurídicos, ainda que com relevo para a actividade judiciária.

4. Como se concorda de pleno com a ministração de “conhecimentos práticos sobre o modo de narração dos factos e de fundamentação das decisões e sobre como optimizar o seu conteúdo, de modo a orientar a leitura e a facilitar a compreensão do discurso judiciário pelo destinatário, nomeadamente, alertando para a conveniência na utilização de formulações claras, precisas e objectivas, expurgadas de expressões arcaizantes e de artifícios linguísticos inúteis”.
Claro que isto não vai atentar – não pode atentar – contra o estilo de cada um, exteriorização da sua individualidade, mas pode sem dúvida alertar para o facto de que o cidadão pretende compreender o que foi decidido a seu respeito, sem que isto envolva qalquer desvalorização da intermediação do seu patrono.

5. Sem que este breve apontamento fique obscurecido pelo que se vai dizer, permito-me apontar alguns aspectos que creio deveriam também merecer saliência ou, pelo menos, uma mais visível saliência.

Não se detecta um grande entrosamento com a formação de outros profissionais do foro, designadamente os advogados. O que se andou a dizer – percutido mesmo ao mais alto nível da magistratura ( de influência) - não merece começar a ser considerado com carácter institucional? A meu ver, seria enriquecedor multilateramente essa troca de experiências e de conhecimentos e que não ficasse remetida para a fórmula do sempre que “seja oportuno e aconselhável”.

A sensibilização para a comunicação em contexto profissional, mostra-se cada vez mais importante, mas tenho dúvidas de que uma disciplina de “Expressão e Voz” seja forma de concretização suficiente, dirigida ao domínio dos aspectos da relação entre voz, corpo e comunicação.
Cada vez mais os magistrados precisam não apenas de saber dominar-se no cenário da sua actividade funcional como dominar técnicas de condução de audições e audiências em que o sentido da autoridade e da dignidade têm de conjugar-se com o da liberdade de expressão e do livre desempenho dos diversos actores em presença, sem prejuízo da eficácia e da economia processual.
A própria postura pública a que o magistrado, quer queira quer não, está sujeito, exigirá uma preparação mais funda, ainda quando ele pretenda manter uma atitude de reserva.

Também não vi que exista um mecanismo que permita ao CEJ aperceber-se do que os cidadãos e as suas associações – a tal sociedade civil de que tanto se espera - pensam das instituições judiciárias.
Dir-se-á que isso cabe ao Governo, à Assembleia da República, e que podem os Conselhos Superiores veicular tais elementos, para além do que resulta da composição do órgão interno de Gestão do CEJ.
Penso que todos concordarão, porém, que o CEJ se encontra em posição privilegiada para atalhar às críticas mais certeiras que hoje se fazem ao funcionamento dos tribunais. Não falamos agora da celeridade, da competência de cada magistrado, mas da relação do magistrado com os cidadãos, do direito que estes têm a receber explicações oportunas e correctas sobre anomalias relativamente ao “seu processo”, de todo um “Serviço” que tem de ser prestado num ambiente em que o cidadão se sinta o seu primeiro destinatário, o que não se compadece com "torres de marfim".

6. Finalmente, ao ver como objectivos fundamentais da formação permanente, entre outros, a reflexão partilhada sobre a função social dos magistrados e o seu papel no quadro do sistema de justiça, o aprofundamento na compreensão das realidades da vida, nos planos económico, social, cultural e tecnológico, que, de forma inovadora ou mais complexa, interpelam a Justiça, dou por mim a pensar como é essencial que o magistrado possa estar a par, ainda que em linhas gerais, das principais correntes de pensamento extra-jurídico do seu tempo, dando-lhe a possibilidade de ouvir a reflexão dos principais pensadores contemporâneos, não apenas pela audição nos meios de comunicação, aqueles que a tal se dispõem.

domingo, 14 de agosto de 2005

Programa de Actividades do Centro de Estudos Judiciários

Depois da movimentação provocada no ano passado pela nomeação de uma professora universitária para directora do Centro de Estudos Judiciários, a ASJP e o SMMP constituiram-se na obrigação de emitir a sua opinião quanto ao Programa de Actividades para 2005/2006 (já aprovado pelo Conselho de Gestão do CEJ e que pode ser lido em http://www.cej.pt/plactividades.pdf), apresentado como constituindo uma reforma curricular da formação inicial e que é o primeiro elaborado sob a responsabilidade da Prof. Doutora Anabela Rodrigues.

Rui do Carmo, in Incursões

PROCURO, MAS NÃO ENCONTRO!?

1. Procuro, há já alguns dias, no sítio da Procuradoria-Geral da República, nomeadamente nas Novidades ou na entrada das Circulares, rasto da propalada “afinação” dos critérios do Ministério Público no que respeita às medidas de coacção a aplicar aos suspeitos de provocar incêndios – mas não encontro!?
Ainda bem, pois os pressupostos de aplicação da prisão preventiva (que é, de resto, da competência do juiz de instrução criminal) são iguais para todos os crimes que a admitem, sendo a criação de uma situação excepcional para certo tipo de crimes inconstitucional e o regresso àquilo que foi a figura dos “crimes incaucionáveis”.
Mas, que não se pense que o tratamento da notícia do crime e dos seus eventuais autores, no caso dos incêndios florestais, não exige uma especial atenção. Acho que exige um especial esforço de informação dos magistrados e de coordenação hierárquica, atendendo ao carácter sazonal do fenómeno e a que a sua ocorrência e a detenção dos suspeitos acontece, quase sempre, no período das férias judiciais do Verão (e continuará a acontecer!), com todas as contingências que daí advêm, como sejam: a ausência do tema, há já alguns anos, dos programas de formação; a não coincidência, em regra, entre o magistrado que acompanha a abertura do inquérito e os primeiros actos urgentes e aquele que será o titular do processo; o maior isolamento de quem tem o primeiro contacto com os factos.

2. Procuro no Público de hoje uma explicação, ou admissão do erro, no que respeita à notícia que ontem, aqui, L.C. considerou ser “Um caso de grosseira desinformação jornalística” – mas não encontro!?
A autora da notícia costuma espreitar neste sítio, pelo que a continuação do silêncio será (mais) um exemplo da prepotência de algum jornalismo.

Droit et Culture Juridique

"Les hommes construisent trop de murs et pas assez de ponts" (Isaac Newton)

sábado, 13 de agosto de 2005

Fim das contravenções e transgressões ainda subsistentes no ordenamento jurídico nacional

O Conselho de Ministros de ontem (12 de Agosto) aprovou uma Proposta de Lei que procede à conversão em contra-ordenações de contravenções e transgressões em vigor no ordenamento jurídico nacional. Com esta Proposta de Lei, aprovada na generalidade, visa-se concluir o programa de substituição das contravenções e transgressões por contra-ordenações, assumido pelo legislador há cerca de 25 anos, com a publicação do Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho. Deste modo, a uma mesma conduta antes considerada contravenção ou transgressão passará a corresponder o tratamento conferido aos ilícitos de mera ordenação social, pelo que o regime substantivo e processual conferido a estes ilícitos será agora o aplicável. Em concreto, com esta Proposta de Lei, procede-se, em regra, a uma indicação da entidade que terá competência para o processamento e aplicação das respectivas coimas, promove-se a alteração pontual de alguns regimes contra-ordenacionais vigentes e processa-se a revogação de um relevante conjunto de normas, bem como a consagração de uma norma geral de conversão em contra-ordenações das normas que prevêem contravenções e transgressões e que não são objecto de tratamento por este diploma. Consagra-se ainda um regime transitório para as contravenções e transgressões praticadas antes da data da entrada em vigor deste diploma e para os processos que se encontrem pendentes na respectiva data de entrada em vigor.

Foi ainda aprovada uma Proposta de Lei que aprova o regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de transportes colectivos de passageiros, bem como uma Proposta de Lei que aprova o regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem. Estes dois diplomas, aprovados na generalidade, em coerência com o diploma anterior, visam proceder à conversão em contra-ordenações das transgressões e contravenções ainda vigentes no âmbito do direito dos transportes colectivos de passageiros e das taxas de portagens em infra-estruturas rodoviárias, considerando as necessidades de assegurar um tratamento coerente dos regimes e de reformular o respectivo quadro normativo. Assim, estes diplomas visam dotar o sistema de instrumentos adequados que permitam, por um lado, prevenir e sancionar a utilização fraudulenta de transportes colectivos ou das infra-estruturas rodoviárias e, por outro, aliviar os tribunais do peso dos processos correspondentes. Deste modo, propõe-se que a Direcção Geral dos Transportes Terrestres e Fluviais e o Instituto Nacional do Transporte Ferroviário, no âmbito das respectivas atribuições e competências, passem a ser as entidades responsáveis pela instrução e decisão final do procedimento, sem prejuízo da possibilidade de recurso judicial, nos termos gerais.

Fonte: Comunicado do Conselho de Ministros de 12 de Agosto de 2005

El presidente del Tribunal Supremo percibe "tensiones territoriales" por la reforma judicial

J. SÉRVULO GONZÁLEZ - El Escorial
EL PAÍS - España - 13-08-2005
El presidente del Tribunal Supremo y del Consejo General del Poder Judicial (CGPJ), Francisco José Hernando, denunció ayer la aparición de ciertas "tensiones territoriales" como consecuencia del anuncio de futuras reformas destinadas a fomentar la descentralización de la Administración de justicia.

Hernando, que intervino en la clausura del curso 20 años de Política Judicial en España, organizado por la Universidad Complutense de Madrid, reclamó más estabilidad para el Poder Judicial. El máximo representante de los jueces españoles aseguró que la justicia ha sido tradicionalmente "la cenicienta dentro de los poderes públicos en España".

El presidente del Tribunal Supremo solicitó la "máxima prudencia" a la hora de acometer "las reformas que puedan minar la idea de un Poder Judicial único para todos los españoles". Destacó la importancia de la creación de órganos de gobierno del Poder Judicial de ámbito autonómico o el aumento de las competencias de los tribunales superiores de justicia. "Cualquier reforma no debe olvidar que sin interpretación uniforme del derecho no hay garantías de seguridad jurídica ni de respeto de igualdad ante la ley de los ciudadanos", explicó.

Hernando recordó que el Poder Judicial se establece con carácter único en todo el Estado y, además, añadió, "en la Constitución sólo se contempla un único órgano de gobierno externo del Poder Judicial". También aseguró que para garantizar la unidad cualquier "órgano de ámbito ultraestatal" debe estar integrado en una estructura jerárquica en cuya cúspide esté el Consejo General del Poder Judicial.

Kilómetros de autopista
"Los problemas de la Justicia son ante todo presupuestarios", señaló el presidente del Tribunal Supremo. Por eso, Hernando reclamó una mayor atención del presupuesto público para equiparar la Justicia con el resto de organizaciones públicas en eficacia, disponibilidad y medios materiales. "La Administración de justicia ha sido la rama de poder que menos atención ha recibido, y ello le ha llevado a una situación de clara desventaja". Añadió que los problemas de la justicia "se solucionarían con el presupuesto de cinco kilómetros de autopistas".

El presidente del CGPJ pidió que la Administración de justicia en España deje de ser "algo mas que una figura retórica del discurso publico", o "un capítulo más de cada programa electoral". Pese a reclamar la modernización de la Justicia, Hernando precisó que debe gozar de estabilidad que aleje la sensación de permanente estado de transformación. El máximo representante de los jueces españoles aseguró que los continuos cambios generan inseguridad para los jueces, para los profesionales y los destinatarios de la justicia, que son los ciudadanos.

Um caso de grosseira desinformação jornalística

O Público de hoje, com manchete de 1.ª página, traz uma notícia, assinada por Tânia Laranjo, com o título «Procuradoria demorou 16 anos a decidir situação de um inspector da PJ» e, no interior, «Procuradoria-Geral da República demora mais de 16 anos para qualificar "risco agravado" de polícia».
Está em causa o Parecer n.º 54/2002, votado na sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de 3 de Fevereiro de 2005, homologado por despacho do Ministro da Justiça de 29 de Abril de 2005 e publicado no Diário da República, série II, do passado dia 8 do corrente mês de Agosto, a que oportunamente fizemos referência aqui.
A jornalista do Público, aparentemente mais interessada em denunciar um pretenso atraso da Procuradoria-Geral da República do que em informar o alcance e a valia do parecer emitido, prestou um mau serviço ao público leitor. Fundamentalmente, por duas razões: confundiu a natureza não decisória do mero parecer de legalidade do CS da PGR com a homologação ministerial desse parecer para valer como interpretação oficial, perante os respectivos serviços, das matérias nele destinadas a esclarecer; contou o início do prazo de elaboração do parecer a partir da ocorrência do evento que esteve na sua génese, e não do momento da respectiva solicitação pelo Governo, no caso, depois de coligidos novos elementos de prova necessários à sua feitura.
Em suma, responsabilizou a Procuradoria-Geral da República por uma “decisão” que não passa de um mero “parecer”, e imputou-lhe um atraso (de 16 anos) que não existe e de que não pode ser culpada. E descurou o essencial do parecer.
Uma desinformação que poderia ser uma notícia, isenta e objectiva. Bastaria um pouco de mais atenção e cuidado.

sexta-feira, 12 de agosto de 2005

Tomada de posse de Rui Pereira

Rui Carlos Pereira tomou posse, ontem, como Coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal (UMRP), recentemente criada "com vista à concepção, apoio e coordenação do desenvolvimento das iniciativas de reforma em matéria penal".
Segundo noticia o Público, a UMRP apresentará ao Governo, dentro de quatro meses, uma proposta de lei-quadro da política criminal.
Rui Pereira sustentou, no acto de posse, que a definição das prioridades "se há-de situar num plano abstracto, nunca permitindo a manipulação do processo penal", superando, contudo, a actual "indefinição, que gera a possibilidade de perversão do processo penal". A definição genérica das prioridades, acrescentou, "não pode ser objecto do acaso, de uma espécie de lotaria punitiva, ou, ainda pior do que isso, da escolha dissimulada de quem não recebeu mandato democrático para o efeito".
Ainda segundo o mesmo matutino, a Unidade de Missão da Reforma Penal deverá propor, dentro de dois anos, alterações do Código Penal e do Código de Processo Penal, designadamente nos regimes das medidas de coacção, sobretudo da prisão preventiva, e das escutas, procurando atender às preocupações reveladas pela jurisprudência do Tribunal Constitucional. E deverá também sugerir soluções legislativas que, segundo Rui Pereira, responsabilizem "os autores de crimes de violação do segredo de justiça, retirando este ilícito do âmbito de um direito penal simbólico em que, na verdade, se tem inserido".

Protocolo de cooperação para reforçar o combate à fraude e evasão fiscal

Os Ministérios da Justiça e das Finanças assinaram ontem um protocolo de cooperação para reforçar o combate à fraude e evasão fiscal.
Esta iniciativa visa intensificar e agilizar a cooperação entre a Polícia Judiciária, a Direcção Geral dos Impostos e a Direcção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo para fazer frente a um tipo de crime praticado por profissionais organizados.
No ano de 2003 foi assinado um primeiro protocolo envolvendo estas entidades, que agora é melhorado através da constituição de um Grupo Operacional que ficará na Polícia Judiciária, entidade a que compete a respectiva direcção e terá a responsabilidade da programação, constituição e coordenação de equipas mistas, bem como de todas as questões relacionadas com o apoio operacional.
O texto do novo protocolo pode ser lido aqui.

Legislação do Dia (selecção)

  • Lei Constitucional n.º 1/2005. DR 155 SÉRIE I-A de 2005-08-12 – Assembleia da República: Sétima revisão constitucional
  • Portaria n.º 652/2005. DR 155 SÉRIE I-B de 2005-08-12 – Ministério da Justiça: Aprova os custos para exames e perícias médico-legais

quinta-feira, 11 de agosto de 2005

Prazo máximo de duração da prisão preventiva - Anulação de sentença condenatória profe­rida em 1.ª instância

Mesmo à tangente, com dois votos de vencido, a 2.ª Secção do Tribunal Constitucional não julgou inconstitucional a norma constante do artigo 215.º, n.º 1, alínea c), com referência ao n.º 3, do Código de Processo Penal, na interpretação que considera rele­vante, para efeitos de estabelecimento do prazo máximo de duração da prisão preventiva, a sentença condenatória profe­rida em 1.ª instância, mesmo que, em fase de recurso, venha a ser anulada por decisão do Tribunal da Relação (Acórdão n.º 404/2005, de 22/7/2005, relatado pelo Conselheiro Mário Torres).

terça-feira, 9 de agosto de 2005

Tomada de posse

Tomará posse, no próximo dia 11 (quinta-feira), pelas 15:30 horas, no Salão Nobre do Ministério da Justiça, o Coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal, Mestre Rui Carlos Pereira, que o Conselho de Ministros do passado dia 29/7 resolveu criar "com vista à concepção, apoio e coordenação do desenvolvimento das iniciativas de reforma em matéria penal".
A UMRP terá uma "duração prevista de dois anos" e "integra um conselho composto por representantes da Polícia Judiciária, do Centro de Estudos Judiciários, da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, do Instituto de Reinserção Social, do Instituto Nacional de Medicina Legal, do Gabinete de Política Legislativa e Planeamento e do Gabinete para as Relações Internacionais, Europeias e de Cooperação, bem como por um membro do gabinete do Ministro da Justiça". "Podem ainda ser convidados a participar nas reuniões representantes do Conselho Superior de Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público e da Ordem dos Advogados ou ainda professores universitários".
(A notícia não vem no site do MJ).

segunda-feira, 8 de agosto de 2005

Verbo Jurídico Blog

Depois de uma sentida ausência, o Verbo Jurídico Blog retomou a sua actividade com dois posts de leitura imprescindível:
Ataque à independência de julgamento e
Medidas de coacção para fogo posto.

Prisões? Nunca mais!

É o título que falta a este oportuno e esclarecedor post de Vasco Lobo Xavier, no Mar Salgado:
CONCEITOS: Há alguma dificuldade no tratamento de algumas questões às quais se atrelam determinados conceitos. As "férias dos juizes" é uma delas, como o leitor assíduo deste blog já terá reparado. Agora há uma nova, que é a "irresponsabilidade dos juizes".

Vou tentar explicar, desta vez sem recorrer às modalidades desportivas. Em primeiro lugar, atente-se no seguinte: se um juiz errar (grosseiramente, de forma evidente) na sua decisão, a vítima dela é hoje indemnizada, pelo Estado. O juiz será certamente penalizado pelo órgão fiscalizador (logo, não é irresponsável. Aliás, está já estabelecida a situação de dolo. Daí o problema de se utilizarem alguns conceitos para certas situações ou questões), mas não é ele, naturalmente, quem irá sofrer a obrigação de indemnizar monetariamente o lesado. Com isto, a sociedade organizada garante uma coisa essencial: garante que o juiz decide (bem ou mal, já lá iremos) de forma completamente independente, apenas valorando a prova que diante dele se faz. Repito, se errar, o Estado, a sociedade organizada paga a compensação devida, como acontece agora.

O que este governo socialista pretende neste momento é responsabilizar os juizes no caso de erro destes na avaliação da decisão de prisão preventiva. Serão os juizes - e já não a sociedade organizada - a indemnizar, em última análise, presos preventivamente que se venha a verificar terem sido erradamente detidos. Por outras palavras, os juizes apreciarão os casos que se lhes depararem não só tendo em consideração a prova que diante deles se produzir mas também o receio de um dia virem a ser processados e obrigados a pagar por terem decidido mal. Não será só uma questão disciplinar, de má nota; o juiz decidirá com medo do que lhe vier a acontecer no futuro.
Passarão, portanto, a decidir sendo partes interessadas no processo. O resultado é que mais nenhum juiz mandará ninguém para a prisão (Ó-lá-lá, vou-me agora chatear?.... Vem aí uma defesa mais elaborada para o julgamento ou depoimentos diferentes ou alterados ou ainda, justamente, demonstradores - agora! - de que o MP funcionou mal na acusação e eu é que me vou tramar? ? Isso é que era bom!).

Fulano é detido, presente ao juiz, realizam-se as acções necessárias e legais e, segundo todos os critérios, conclui-se que Fulano cumpre as disposições necessárias a uma prisão preventiva por fogo posto (para utilizar um tema actual e incandescente....), de onde resultaram inclusivamente mortes humanas. Pois o juiz irá mandar o suspeito em liberdade com medo de, mais tarde e com mais tempo, se vir a considerar provado que o dito estava noutro país com amigalhaços. Se falo de casos de fogo posto, pensem em casos de pedofilia, vai ser a mesma coisa.

Num país de criminosos, esta medida seria naturalmente aplaudida com entusiasmo.

Num país civilizado, esta atitude do governo socialista seria de imediato rechaçada por todos:
pela população em geral, porque isto afecta negativamente a sua vida e as decisões que lhe dizem respeito;
pela comunidade científica, porque isto afecta aquilo que têm defendido;
pela oposição democrática, porque isto afecta a democracia e a independência dos poderes;
pelos defensores da nossa Constituição, porque isto a afecta indubitavelmente, na mesma medida que impede a independência dos juizes,
por todos, enfim, porque a medida tem a carinha chapada e imberbe da vingança sobre a prisão preventiva que alguns tiveram ou a pressão inadmissível que o Governo quer colocar sobre o poder judicial.

Ora nós gostávamos mais da independência de poderes, ou já não será assim?

PS: voltarei certamente a este assunto.
[...]

Vasco Lobo Xavier, in Mar Salgado

Os juízes e a despesa que dão...

Permitam-me algumas notas de espanto quanto aos termos da polémica sobre facto de o Governo pretender legislar sobre a responsabilidade civil dos juízes para além dos limites apertados que estão hoje ainda consignados no artigo 5º, n.º 3 do EMJ, onde se diz que «salvo nos casos em que a falta constitua crime, a responsabilidade civil apenas pode ser efectivada mediante acção de regresso do Estado contra o respectivo magistrado, com fundamento em dolo ou culpa grave». O que se conhece quanto a tal matéria é [ridículo!] o que vem nos jornais. Com esse limite, permitam-me três notas. Primeira, o vir a iniciativa divulgada na imprensa assim: «o Governo pretende que o Estado alargue as indemnizações às vítimas de erros judiciais e que os juízes, em casos graves, sejam chamados a comparticipar essa despesa» [sic, DN], como se fosse uma mera questão de intendência financeira o que estivesse em causa. Segunda, haver quem, do lado dos críticos, trate sindicalmente o problema em causa como se estivéssemos a falar da responsabilidade dos «funcionários», e como se o facto de se tratar de «magistrados» não conferisse ao tema a indispensabilidade de um tratamento especial. Terceira, a circunstância de ninguém relevar porque é afinal tão fácil ao poder político agendar todo um corpo de medidas contra os magistrados e lograr sempre a simpatia popular para tudo isso: ontem as férias, hoje a responsabilidade, e ainda haverá quem peça mais! Qualquer dia teremos um PGR não magistrado, se não por unanimidade, pelo menos por aclamação. Viva!
P.S. A propósito de responsabailidade civil de quem decide: quantos ministros já foram directamente responsabilizados pelos actos praticados no exercício das funções e, a atentar no que se lê na imprensa e se ouve no Parlamento, é tudo um cortejo de horrores?

José António Barreiros, Patologia Social

AS PRIORIDADES DA POLÍTICA CRIMINAL

Em face do actual contexto constitucional sobre as funções do Ministério Público (nº1 do artº 219º), entendo que se mostra necessário reforçar a ligação entre o Ministério Público e a Assembleia da República (responsável, em última instância, pela definição da política criminal) e que seria desejável, face à impossibilidade prática de conceder igual prioridade a todas as investigações, que esta definisse, de forma geral, quais as prioridades da investigação criminal, dotando o Ministério Público de legislação e dos meios necessários à fiscalização e inspecção do seu cumprimento pelas polícias - escrevi-o em Setembro de 2004 (cfr. Revista do CEJ nº1).
Posteriormente, o programa do Governo passou a consignar que:
No plano da política criminal, a Assembleia da República, sob iniciativa do Governo, passará a prever periodicamente, de forma geral e abstracta, as prioridades da política de investigação criminal, bem como as responsabilidades de execução dessa política, nomeadamente no que respeita ao Ministério Público, com base num novo quadro legislativo específico de desenvolvimento do artigo 219.º da Constituição.
Prevê-se que o Governo tome a iniciativa no último trimestre deste ano, pelo que urge o debate.
Recentemente, foi publicado O que é a política criminal, porque precisamos dela e como a podemos construir?
(no nº4º do ano 14 da Revista Portuguesa de Ciência Criminal), no qual Paulo Pinto de Albuquerque aborda o tema.
Concordo parcialmente com ele quando afirma que "a política criminal deste país é definida de um de dois modos (...): ou é definida de um modo atomístico, por cada magistrado do Ministério Público no isolamento do seu gabinete, ou é definida em casos pontuais superiormente pelo Procurador-Geral da República através de directivas sem legitimidade democrática directa". Pois omitiu um terceiro modo: a gestão incontrolável da investigação e dos meios a ela afectos pelas polícias, que dependem hierarquicamente do executivo.
Concordo quando diz que "depois de definida pelos órgãos de soberania, a política criminal deve ser executada de modo uniforme pelos magistrados do Ministério Público, constituindo a subordinação hierárquica dos magistrados do Ministério Público e a subordinação funcional dos órgãos de polícia ao Ministério Público os meios legais de garantir a execução uniforme da política criminal". E sublinho a imprescindibilidade da garantia dos mecanismos legais e meios de efectiva capacidade de direcção e fiscalização pelo Ministério Público da actividade funcional dos órgãos de polícia criminal, que tem vindo a ser fragilizada por sucessivas alterações legais e pelo desinvestimento.
Mas discordo completamente quanto à resposta que dá à pergunta "Que objecto deve ter a política criminal repressiva?":
"O âmbito destas directivas genéricas da AR deve incluir as seguintes matérias: os critérios de distinção entre os casos em que é o Ministério Público que dirige directamente o inquérito e em que delega essa competência em polícias, os critérios de determinação da urgência de processos, os critérios de determinação concreta do tribunal competente nos termos do artigo 16º nº3 do Código de Processo Penal, os critérios de selecção das medidas coactivas mais gravosas, os critérios de diversão no tratamento da qualidade participada (isto é, em que casos o Ministério Pùblico deve promover soluções extrajudiciais e, designadamente, em que tipos de crimes semi-públicos e particulares deve o Ministério Público promover esse tipo de soluções e em que tipos de crimes deve o Ministério Público promover a suspensão provisória do processo), o critério da escolha das formas processuais alternativas do processo e os critérios de escolha e individualização das penas (isto é, a definição de uma política de recurso criminal pelo Ministério Pùblico de decisões judiciais que profiram penas que superem os limites considerados nas directivas genéricas)".
Este elenco reduz a questão praticamente à esfera adjectiva e pretende colocar a Assembleia da República a aprovar uma espécie de regulamento da aplicação pelo Ministério Público do Código de Processo Penal, que "o procurador-geral da República converte[ria] em circulares internas". Teríamos, assim, permito-me o dichote, que cada magistrado do Ministério Público passaria a vir acompanhado do adequado "livro de instruções".
Não é isto o que diz o programa do Governo, que fala da definição, "de forma geral e abstracta, [d]as prioridades da política de investigação criminal". Portanto, espera-se um debate substantivo, necessariamente aberto pela sua importância à sociedade, que conduza à definição dos principais alvos da política criminal, à luz dos valores constitucionais, da análise da criminalidade e dos principais desafios da sociedade de hoje, e à objectivação dos meios imprencindíveis à sua boa execução.
Ao Ministério Público, enquanto responsável por esta execução, respeitado o seu estatuto de autonomia, cabe o "dever de prestar contas à comunidade".

Conselho Consultivo da PGR

Parecer n.º 54/2002 (Parecer comp.). DR 151 SÉRIE II de 2005-08-08
Deficiente das Forças Armadas - Polícia Judiciária - Acidente em serviço - Risco agravado - Manutenção da ordem pública - Investigação criminal - Perigo concreto - Incapacidade geral de ganho.
1.ª Constitui actividade com risco agravado enquadrável no n.º 4 do artigo 2.º, com referência ao n.º 2 do artigo 1.º, ambos do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, ex vi do n.º 1 do artigo 89.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, a desenvolvida por agente da Polícia Judiciária que, integrado numa brigada e no exercício de funções de investigação criminal, participa na realização, em local hostil à acção policial, de diligência tendente à localização e detenção de suspeito da prática de crime de homicídio consumado e que, num contexto de fuga desse indivíduo e de outros a ele ligados, persegue e detém um dos fugitivos, sendo então atingido por tiros de arma caçadeira de canos serrados disparados por familiar desse detido presente no local.
2.ª O acidente de que foi vítima o requerente, Carlos da Conceição Baptista, inspector da Polícia Judiciária, em 27 de Abril de 1989, no lugar de Touguinha, Vila do Conde, que lhe determinou uma incapacidade geral de ganho de 68%, ocorreu no condicionalismo referido na conclusão anterior.
Este parecer foi votado na sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de 3 de Fevereiro de 2005.
José Adriano Machado Souto de Moura - Mário António Mendes Serrano (relator) - Maria Fernanda dos Santos Maçãs - Manuel Joaquim de Oliveira Pinto Hespanhol - Maria de Fátima da Graça Carvalho - Manuel Pereira Augusto de Matos - Paulo Armínio de Oliveira e Sá - Alberto Esteves Remédio - João Manuel da Silva Miguel - Almiro Simões Rodrigues.
(Este parecer foi homologado por despacho do Ministro da Justiça de 29 de Abril de 2005.)


Parecer n.º 66/2004. DR 151 SÉRIE II de 2005-08-08
Parecer n.º 66/2004. - Direito à carreira - Cargo dirigente - Contagem de tempo de serviço - Categoria - Reclassificação - Aplicação da lei no tempo.
1.ª O direito à carreira dos funcionários nomeados como dirigentes integra, no domínio de vigência do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, na redacção conferida pelo Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, as seguintes faculdades: (a) candidatura aos concursos de acesso que forem abertos na sua carreira de origem, durante a pendência da respectiva comissão de serviço; (b) provimento em categoria superior à que possuíam à data da nomeação para dirigente, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado nestas funções, agrupados de harmonia com os módulos de promoção na carreira e em escalão a determinar, nos termos do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro; (c) regresso ao lugar de origem, findo o exercício de funções dirigentes, caso não estejam em condições de beneficiar do disposto na alínea anterior.
2.ª Em 24 de Julho de 1995, ao cessar a comissão de serviço como directora de serviços de Administração e Pessoal da Universidade da Madeira, que iniciara em 1 de Janeiro de 1994 com a categoria de chefe de repartição, a interessada perfazia 1 ano, 6 meses e 23 dias de exercício continuado de funções dirigentes, período insuficiente para preencher o módulo de tempo de progressão na categoria de chefe de repartição;
3.ª Por recurso à aplicação analógica da norma constante do n.º 5 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 323/89, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 34/93, ocorrendo mudança de carreira durante o exercício do cargo dirigente, para efeitos do cômputo do tempo de serviço referido na alínea a) do n.º 2 do artigo 18.º citado, releva apenas o prestado em funções dirigentes a partir da data de provimento na nova categoria, que é o provimento determinante.
4.ª Em conformidade, sendo a interessada reclassificada na categoria de técnica superior de 1.ª classe, com efeitos reportados a 1 de Janeiro de 1998, quando cessou a comissão de serviço como directora de serviços Administrativos do Laboratório Regional de Engenharia Civil, em 31 de Julho de 1998, contava 6 meses e 30 dias de exercício continuado de funções dirigentes a partir da data de provimento na nova categoria de técnica superior de 1.ª classe, período insuficiente para preencher o módulo de tempo necessário à promoção nessa carreira.
5.ª O artigo 21.º do Decreto Legislativo Regional n.º 23/99/M, de 26 de Agosto, reporta-se apenas aos chefes de repartição que, à data da sua entrada em vigor, não tivessem sido reclassificados na categoria de técnico superior de 1.ª classe, pelo que a situação jurídico-profissional em causa não se insere no âmbito de aplicação material daquela norma.
6.ª No período compreendido entre 18 de Setembro de 1998 e a presente data, a interessada exerceu funções dirigentes sem qualquer interrupção, o que configura uma situação de trato sucessivo, que se prolongará até à cessação da comissão de serviço iniciada em 23 de Outubro de 2002, relevando para efeitos da efectivação do direito de acesso na carreira reconhecido no n.º 2 do artigo 29.º do estatuto do pessoal dirigente, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, a totalidade do tempo de serviço prestado, o que corresponde, nesta data, a seis anos, sete meses e três dias de exercício continuado naquelas funções dirigentes.
7.ª Deste modo, em 18 de Setembro de 2001, completou-se o módulo de tempo de três anos necessário para a promoção à categoria de técnica superior principal [alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro], tendo sido preenchidos, em 18 de Setembro de 2004, os dois módulos de três anos necessários para a promoção à categoria de assessora [alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro].
8.ª Ora, esse tempo de serviço em funções dirigentes não é suficiente para operar o provimento da interessada na categoria de assessora principal, porquanto ainda não perfez o intervalo de tempo de serviço exigido para aquele efeito, correspondente à soma de três módulos de três anos [alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro], pelo que, nesta data, não reúne os requisitos legais para provimento na categoria mais elevada da carreira técnica superior.
9.ª O despacho que posicionou a interessada na categoria de técnica superior principal, com efeitos a partir de 1 de Agosto de 1998, enferma do vício de violação de lei, que gera invalidade, na modalidade de anulabilidade, nos termos do regime estabelecido nos artigos 135.º a 137.º do Código do Procedimento Administrativo, não podendo, porém, ser revogado com fundamento em ilegalidade, nos termos do artigo 141.º do mesmo Código, face ao decurso dos prazos de impugnação.
Este parecer foi votado na sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de 21 de Abril de 2005.
José Adriano Machado Souto de Moura - Manuel Joaquim de Oliveira Pinto Hespanhol (relator) - Maria de Fátima da Graça Carvalho - Manuel Pereira Augusto de Matos - José António Barreto Nunes - Paulo Armínio de Oliveira e Sá - Alberto Esteves Remédio - João Manuel da Silva Miguel - Mário António Mendes Serrano - Maria Fernando dos Santos Maçãs.
(Este parecer foi homologado por despacho do Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira de 13 de Junho de 2005.)

Tribunal Constitucional

  • Acórdão n.º 309/2005 – DR 151 SÉRIE II de 2005-08-08: Não julga inconstitucional a norma do artigo 62.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril (na redacção emergente do Decreto-Lei n.º 315/98, de 20 de Outubro).
  • Acórdão n.º 310/2005 – DR 151 SÉRIE II de 2005-08-08: Não julga inconstitucional a norma contida no artigo 772.º, n.º 2, do CPC, na parte em que refere não poder ser interposto recurso de revisão se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, quando esteja em causa o caso julgado formado por uma sentença homologatória de partilha, num inventário para separação de meações, que tenha corrido à revelia do requerente da revisão e este alegue a falta ou nulidade da citação para esse inventário, nos termos do artigo 771.º, n.º 1, alínea f), do CPC.
  • Acórdão n.º 311/2005 – DR 151 SÉRIE II de 2005-08-08: Nega provimento a recurso em que se suscita a inconstitucionalidade da norma do artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, que aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, na redacção anterior à da Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, "na parte em que exige um período mínimo de cinco anos de experiência profissional para admissão ao concurso nela previsto".
  • Acórdão n.º 312/2005 – DR 151 SÉRIE II de 2005-08-08: Interpreta as normas do n.º 1 do artigo 411.º e do n.º 5 do artigo 333.º do Código de Processo Penal no sentido de que o prazo para a interposição de recurso da decisão condenatória do arguido ausente se conta a partir da notificação pessoal e não a partir do depósito na secretaria, independentemente dos motivos que determinaram tal ausência e se os mesmos são, ou não, justificáveis.

GARANTIR LE PLURALISME ET L'INDÉPENDANCE DE LA PRESSE QUOTIDIENNE POUR ASSURER SON AVENIR

Na lettre d’info n° 25 du 2 août 2005 do Conseil économique et social francês merece destaque o Avis du Conseil économique et social sur le rapport présenté par M. Michel Muller au nom de la section du cadre de vie, intitulado GARANTIR LE PLURALISME ET L'INDÉPENDANCE DE LA PRESSE QUOTIDIENNE POUR ASSURER SON AVENIR.
Trata-se de um documento com 262 páginas onde, para além de uma análise da actualidade da imprensa quotidiana, são disponibilizados importantes elementos estatísticos, históricos e técnicos.

domingo, 7 de agosto de 2005

Parecer da Ordem dos Advogados...

... acerca do projecto de diploma sobre o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas. Pode ser lido aqui.
O projecto, esse, ainda não está acessível ao comum dos mortais...

Perdidos e achados

Mão amiga, sob o título «Um ministro desengraçado que caiu em graça...», deixou esta palração na caixa de correio:

«Alberto Costa, o ministro da Justiça, continua a sua luta para conferir confiança e respeitabilidade ao sistema judicial. Em relação ao Ministério Público, quer equilibrar a autonomia de que esta magistratura goza (e bem) com princípios rigorosos de hierarquia e de responsabilidade. No que diz respeito aos juízes, quer pôr um ponto final na total irresponsabilidade destes pelas suas sentenças.
É o primeiro ministro em 30 anos de democracia que não hesita, que não tem medo, perante o poder letal das corporações da justiça. Mesmo que perca, e é possível que perca, o País ficará a dever-lhe actos de coragem e de distinto serviço público. Suceda o que suceder, Alberto Costa entrou na história»
Luís Miguel Viana, Diário de Notícias, 07Jul05

(posteriormente actualizado)

sábado, 6 de agosto de 2005

Fim-de-semana impressionista




Claude Monet, Impression, soleil levant (1873), Musée Marmottan, Paris, France

Claude Debussy, Prélude à l'après-midi d'un faune, poema sinfónico, 1894

sexta-feira, 5 de agosto de 2005

Tribunal Constitucional

  • Acórdão n.º 303/2005 – DR 150 SÉRIE II de 2005-08-05: Nega provimento a recurso em que se suscita a inconstitucionalidade da norma do artigo 255.º, alínea a), do Código Penal, na interpretação dada na decisão recorrida, no sentido de que constitui documento a declaração corporizada em escrito, original ou mera reprodução mecânica, inteligível para a generalidade das pessoas ou para um certo círculo de pessoas, que permita reconhecer o emitente, podendo a mesma não ser idónea em abstracto para provar facto juridicamente relevante, desde que alguém lhe possa erroneamente atribuir esse valor probatório em concreto, por violação dos artigos 2.º, 29.º, n.º 1, 202.º, n.º 1, 203.º e 204.º, todos da Constituição, e da interpretação conjugada das normas dos artigos 30.º, n.º 1, 217.º, n.º 1, e 256.º, n.º 1, do Código Penal, feita no mesmo aresto no sentido em que permite a punição em concurso efectivo pelos crimes de burla e falsificação de documentos desde que esta tenha sido o artifício concretamente utilizado, por violação dos artigos 2.º, 29.º, n.º 5, 202.º, n.º 1, 203.º e 204.º, todos da Constituição.
  • Acórdão n.º 304/2005 – DR 150 SÉRIE II de 2005-08-05: Julga inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.os 2 e 3), com referência aos n.os 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição, a norma do n.º 1 do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição do recurso com referência a que se apresenta arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço ao tribunal superior.
  • Acórdão n.º 306/2005 – DR 150 SÉRIE II de 2005-08-05: Julga inconstitucional, por violação do princípio da dignidade humana, contido no princípio do Estado de direito, com referência aos n.os 1 e 3 do artigo 63.º da Constituição, a norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 189.º da OTM, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de Outubro, interpretada no sentido de permitir a dedução, para satisfação de prestação alimentar a filho menor, de uma parcela da pensão social de invalidez do progenitor, que prive este do rendimento necessário para satisfazer as suas necessidades essenciais.

quinta-feira, 4 de agosto de 2005

Tribunal Constitucional

  • Acórdão n.º 233/2005 – DR 149 SÉRIE II de 2005-08-04: Não julga inconstitucionais as normas do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, e do artigo 3.º do Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, na parte em que fazem depender a atribuição do direito ao subsídio por morte do beneficiário da segurança social a quem com ele convivia em união de facto da obtenção de sentença judicial que lhe reconheça o direito a alimentos da herança do falecido nos termos do n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil ou, no caso de não ser reconhecido tal direito, com fundamento na inexistência ou insuficiência de bens da herança, do reconhecimento judicial da qualidade de titular daquela prestação, obtido mediante acção declarativa proposta contra a instituição de segurança social competente para a atribuição da mesma prestação.
  • Acórdão n.º 234/2005 – DR 149 SÉRIE II de 2005-08-04: Não julga inconstitucionais as normas do artigo 34.º, n.os 2 e 3, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.
  • Acórdão n.º 238/2005 – DR 149 SÉRIE II de 2005-08-04: Indefere reclamação para a conferência de decisão sumária no sentido de que não podia conhecer-se do objecto do recurso em causa, ou seja, de que o Supremo Tribunal de Justiça não aplicou a norma constante do artigo 400.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, na interpretação cuja constitucionalidade foi questionada pelo recorrente.

Curtas do dia

  1. A dupla A. A. Mesquita e Tânia Laranja assinam hoje, no Público, uma notícia segundo a qual Ferro Rodrigues suscitou o incidente de recusa das duas procuradoras adjuntas Paula Soares e Cristina Faleiro, titulares do processo resultante de uma queixa por denúncia caluniosa, depoimento falso e difamação, por si apresentada contra sete testemunhas do processo da Casa Pia. O ex-líder do PS põe em xeque a imparcialidade daquelas magistradas, por elas terem integrado a equipa liderada pelo procurador da República João Guerra que deu credibilidade aos depoimentos daqueles antigos e actuais alunos da Casa Pia, que são arguidos no inquérito. Mais um (a)braço de ferro.


  2. Na mesma notícia vem referido ainda, a martelo, que Souto Moura tem na sua secretária um requerimento de sete jornalistas do Jornal de Notícias que põem em causa a imparcialidade do procurador-geral adjunto Domingos Sá.


  3. O Rui do Carmo, nosso prezado contribuinte, autonomiza-se na blogosfera com o interessantíssimo Mar Inquieto. No passado 31 de Julho escreveu, por exemplo, esta:
    AO GATO E AO RATO
    O Presidente da República, ao que parece, decidiu definitivamente não ceder às insistentes pressões para demitir o Procurador-Geral da República. O primeiro indigitado substituto, Rui Pereira, já foi, entretanto, nomeado para coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal. Souto de Moura expõe discretamente no seu gabinete uma caricatura do “gato constipado” que lhe foi oferecida em Macau, ladeada pela célebre frase de Deng Xiaoping - “não importa se o gato é branco ou preto, o que importa é que apanhe ratos”
    .
    Força, Rui do Carmo, e Felicidades!