quinta-feira, 5 de julho de 2012

Um colossal erro de casting

O painel de avaliação semestral dos membros do Governo que o nosso JN lançou com a colaboração dos seus cronistas vale o que vale. Na minha modesta opinião (ainda por cima também em causa própria) vale como um barómetro que mede a pressão vinda de vários quadrantes. O que já não é nada mau.
Da sua esquerda para a sua direita, medem-se as sensibilidades que, por acaso, normalmente desfilam da direita para a esquerda, tendo em conta o alinhamento mais ou menos conhecido dos cronistas que o integram.
Quem o tem acompanhado sabe que a média geral do Governo, que começou perto do Bom, tem vindo a cair paulatinamente e embora ainda permaneça positiva na última edição de junho, já começa a resvalar para zonas perigosas.
Curiosamente, a avaliação de Passos Coelho não tem divergido muito da média da avaliação feita ao seu Governo, ainda que nos primeiros tempos andasse um pouco acima.
Isto pode querer dizer que o famoso estado de graça de que habitualmente todos os governos gozam nos primeiros tempos de vida pode estar por um fio.
Também valem o que valem, mas há sinais que se têm feito ouvir. Já não é o "Love is in the air" que se ouve.
Depois da pateada a Cavaco, também há fotos de um ministro em apuros na Covilhã (em que nem a tática de Passos Coelho de enfrentar o pessoal em fúria resultou).
Mesmo para quem ainda defende que o Governo depressa será capaz de recuperar a sua graça, alguns dos seus membros já não me parece que tenham recuperação possível.
Uma das coisas interessantes que tenho vindo a analisar são os casos dos ministros que os meus colegas mais esquerdistas têm pontuado melhor e, ao contrário, os casos dos titulares do Governo que a parte "direita" do painel menos tem beneficiado na hora da atribuição dos pontos.
Como esta crónica não é nenhuma tese de mestrado... deixo-vos hoje e aqui os meus considerandos em relação à ministra da Justiça, que depois de várias ameaças nos meses anteriores não conseguiu escapar de uma negativa em junho.
Um ano foi quanto bastou para todos percebermos o monumental, mesmo colossal, erro de casting cometido pelo primeiro-ministro.
Os mais atentos já tinham reparado na sua arrogância quando teve o seu primeiro palco digno desse nome, num programa da SIC com Miguel Sousa Tavares, de que já me escapa o nome.
Nessa altura era uma mulher bonita, dava os primeiros passos na televisão e numa certa vida pública e... enfim, tinha que tentar estar ao nível do seu contendor. Digo com isto que podia ser só defesa, timidez ou estratégia.
Agora no Governo, à frente da pasta mais polémica de todas, que não falta por aí quem diga, da direita à esquerda, que a Justiça é o maior cancro do país, já não pode ser nada disso.
Pedia-se, pede-se alguém que perceba da matéria, que tenha boas ideias e muita coragem para as aplicar, mas também muita paciência, capacidade e humildade para as explicar. A um povo que não confunde arrogância com autoridade.
Paula Teixeira da Cruz tem sido tudo menos isso.
Não foi capaz de consensualizar uma única medida, que me recorde. Tem o desplante de arrastar pela praça pública um confronto praticamente pessoal com o bastonário da Ordem dos Advogados. Emite opiniões avulsas e controversas sobre o procurador-geral da República, cuja designação não lhe compete.
Ao invés, não lhe ouvimos uma palavra prática sobre a eterna questão da lentidão da Justiça. Mas o pior e o que a torna no tal colossal erro de casting é a sua atitude diária. A sua falta de jeito para a função, o tom ríspido e agressivo que põe em tudo o que diz. A altivez com que anuncia cada corte que decide, sem uma palavra de solidariedade para os atingidos.
Em política não chega ter razão. A força da razão só vence a razão da força quando esta última perde a razão de ser. Vergada por uma boa explicação ou derrotada por um bom sorriso.
Manuel Serrão
Jornal de Notícias de 04-07-2012

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