terça-feira, 23 de abril de 2013

Uma tese inovadora e profícua II

Informação Por António Cluny, publicado em 23 Abr 2013 - 01:00
bandeira de portugalTemos de aprender a ultrapassar um certo reformismo modernaço,falsamente tecnocrático
1. Assolados pela tragédia que varre o país, quedamo-nos, muitas vezes, sem ânimo para continuar a pensar e promover medidas simples que, sem custos adicionais, podem ajudar a vida dos outros, mesmo antes de termos conseguido contornar, de novo, o cabo da Boa Esperança.
Temos, todavia, todos de ter a capacidade e a calma para ir imaginando agora as medidas concretas que poderão constituir a base de uma alternativa global à via-sacra - que não queremos - mas que nos obrigam a percorrer.
Muitas delas, apesar de estarem ao nosso alcance, só não são assumidas, desde já, devido ao marasmo instalado e ao peso das mesmas opções ideológicas e dos mesmos interesses que produziram a catástrofe.
Elas existem de facto, podem ser concretizadas com ou sem troika e, se assumidas com empenho democrático, contribuirão, decerto, para ir edificando uma alternativa credível ao actual estado das coisas.
2. A tese de João Paulo Dias sobre as actuais possibilidades de o MP português, com os meios de que dispõe, concorrer para uma melhor, mais eficaz e económica justiça constitui um bom exemplo do que acabo de afirmar.
Verificado, por exemplo, o menor reconhecimento que alguns dos chamados “meios alternativos” de justiça conseguiram entre os cidadãos e constatada, além disso, a utilização perversa que, em alguns casos, deles é feita, será porventura a hora de, sem delongas, reactivar todas as possibilidades oferecidas por uma instituição instalada e com a experiência do MP.
O próprio Conselho da Europa, de início tão reticente, realçou, recentemente, a importância das outras funções que o MP pode desenvolver e que não o limitam ao exercício da acção penal.
Não se preconiza, é óbvio, um retorno a métodos artesanais, ultrapassados e burocráticos, de resolução dos problemas dos cidadãos e que os reconduzam, prioritária e recorrentemente, a soluções contenciosas.
Antes, acreditamos - no esteio de JP Dias - que, por exemplo, o já tradicional e reconhecido serviço de atendimento dos cidadãos do MP pode contribuir, se pensado e actualizado com técnicas modernas, para, precisamente, diminuir a litigância e aumentar a eficiência e a confiança no sistema de justiça, sem por isso diminuir os direitos de cidadania.
Embora na reforma do mapa judiciário esta questão não tenha sido directamente abordada, nada impede, porém, que a PGR e as procuradorias distritais tomem a iniciativa e estabeleçam protocolos com as autarquias, cujos tribunais venham a ser encerrados, para aí manter um regular e próximo serviço de atendimento dos cidadãos, mesmo que em regime ambulatório.
Naturalmente, tal serviço pode e deve ser hoje alvo de uma aprendizagem e de uma qualificação funcional que, além de o optimizar, gratifique e mobilize profissionalmente os magistrados encarregados de tal tarefa.
O que não se entende em caso algum, e menos ainda nas actuais circunstâncias, é o desperdício funcional e financeiro das potencialidades - não onerosas - que o MP pode oferecer ao país.
Temos de aprender a ultrapassar um certo “reformismo modernaço”, falsamente tecnocrático - mas, na verdade, apenas ideológico e interesseiramente determinado - que conduziu ao esbanjamento e, ao mesmo tempo, a uma menor qualidade nos serviços de apoio e acesso à justiça.
Uma verdadeira reforma do Estado pode e deve passar por aí: por utilizar todas as potencialidades já instaladas antes de contratar outras novas, mais caras e nunca anteriormente testadas.
Jurista e presidente da MEDEL

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