Figueiredo Dias, professor de Direito Penal, diz que "do
ponto de vista jurídico" não há nenhum problema em investigar sem acesso a
originais. António Martins, presidente da ASJP, defende o contrário
Não comentam casos
concretos, mas estão ambos de acordo com esta ideia: "Em qualquer
investigação, se estamos a apurar a veracidade de um facto, e se esse facto é
atestado por documentos, é óbvio que se deve ter como base os documentos
originais." Quem o diz é António Martins, presidente da Associação
Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP). Rui Rangel, presidente da direcção da
Associação de Juízes pela Cidadania, concorda.
Mas Rangel vai mais longe:
basear um inquérito na análise de fotocópias seria "um procedimento
anormal, estranho" e "contrário a tudo o que se aprende na
faculdade". E acrescenta: "O Ministério Público tem o poder e o dever
de requerer os originais."
Foi em Março de 2007, no
auge da polémica sobre a forma como José Sócrates tinha obtido a licenciatura
em Engenharia Civil pela Universidade Independente, que o procurador-geral da
República encarregou a coordenadora do Departamento Central de Investigação e
Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, de fazer uma espécie de auditoria
jurídica aos documentos que certificavam a passagem daquele aluno de engenheiro
técnico a licenciado.
O processo, que implicava
uma análise do processo escolar do então primeiro-ministro, incluindo os
critérios de equivalências e as provas a que fora sujeito, decorreria
independentemente da investigação dos crimes relacionados com a gestão daquela
universidade privada - e que estão actualmente a ser julgados no Tribunal de
Monsanto.
Meses depois, a 31 de Julho,
o inquérito era arquivado. Num comunicado assinado por Cândida Almeida e pela
procuradora adjunta Carla Dias, explicava-se que, analisados "os elementos
de prova", não se tinha verificado "a prática de crime de
falsificação de documento autêntico, na modalidade de falsidade em
documento", ou de "uso de documento autêntico falso", envolvendo
a obtenção daquele grau académico por parte de Sócrates.
O mesmo texto explicava que
tinham sido realizadas 29 diligências, entre as quais a recolha de documentos
provenientes de várias entidades.
Depois disso, uma cópia do
processo ficou arquivada no Tribunal de Instrução Criminal. E os documentos que
foram analisados no seu âmbito estão na Direcção-Geral do Ensino Superior
(DGES). Ontem, o PÚBLICO consultou a documentação apreendida na Universidade
Independente, e entretanto entregue à DGES, após o arquivamento do processo. E
encontrou fotocópias.
Se para Rui Rangel "é
um dever do Ministério Público (MP) instruir qualquer processo com base em
documentos originais", porque "com fotocópias nunca se consegue
perceber se estamos perante um documento autêntico ou não e documentos
autênticos é que fazem fé em juízo", já o professor catedrático de Direito
Penal, Figueiredo Dias (na foto), não vê qualquer problema. "Do ponto de vista
jurídico não levanta nenhum problema" haver uma investigação com base em
fotocópias, "salvo se houver uma dúvida fundada sobre a
autenticidade" das mesmas.
António Martins tem opinião
distinta. Se o que está a ser investigado pelo MP pode envolver um crime de falsificação,
é ainda mais evidente "que se tem que ir buscar os documentos
originais".A.S./J.A.C.
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