Afastamento
de Cândida Almeida surpreendeu algumas personalidades, mas nem todas. Ex-PGR
Pinto Monteiro recusou comentar, apesar das críticas à Justiça
O afastamento de Cândida Almeida da direcção do Departamento
Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) provocou reacções distintas no
sector da Justiça. Alguns consideram que o acto é "legítimo", uns
preferem olhar para o futuro e outros não querem comentar.
É o caso de Pinto Monteiro. O antigo procurador-geral da
República - que reconduziu Cândida Almeida como directora do DCIAP em 2010 -
disse ontem não estar "a par do assunto". Minutos depois de ter sido
condecorado por Cavaco Silva com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo - tal como o
ex-presidente do Tribunal Constitucional, Rui Moura Ramos, e o antigo
presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César - convidado pelos
jornalistas para comentar, em passo apressado, Pinto Monteiro argumentou estar
"de férias da Justiça" e reiterou: "Nem pensar".
O ex-PGR recusou falar sobre a saída de Cândida Almeida, mas
aproveitou o discurso de agradecimento para deixar um alerta pouco detalhado:
"Parece estar a desenhar-se uma menor transparência na separação de
poderes." Uma opinião partilhada por Marinho Pinto que, à saída da
cerimónia no Palácio de Belém, em Lisboa, defendeu que "há hoje sinais
visíveis por parte do poder político de não conviver adequadamente com
instâncias independentes da sociedade e com outros poderes da sociedade".
O bastonário da Ordem dos Advogados vê o afastamento da directora do DCIAP como
um "acto legítimo" e disse esperar que a decisão não tenha sido
tomada por razões políticas.
Sobre a abertura de um inquérito disciplinar a três procuradores
do DCIAP, incluindo Cândida Almeida, devido a uma fuga de informação, Marinho
Pinto vincou que "as fugas e as violações do segredo de justiça são
sobretudo feitas por magistrados e/ou polícias".
Preocupado com o estado da Justiça está também o presidente do
Observatório Permanente da Justiça, Boaventura Sousa Santos, que encara a saída
como "mais um elemento de perturbação" para o país. Sousa Santos
defende que a ocupação do cargo exige "alguma coragem política" e,
neste sentido, diz que Cândida Almeida é "uma procuradora de alta
qualidade".
Apesar de desconhecer a razão do afastamento e da acção
disciplinar aplicada pela procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal,
Sousa Santos sustenta que "objectivamente tem consequências
políticas" e vai mais longe: "É um sinal de deslegitimar, de pôr em
causa o trabalho que foi feito até agora". Por sua vez, o presidente do
Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Rui Cardoso, disse não estar
surpreendido com o afastamento, já que "há um processo de renovação do
Ministério Público que está em curso e que também passa pelo DCIAP, a quem
deverá ser exigido outro tipo de resultados".
Quanto à próxima pessoa a ocupar o cargo de direcção, Rui
Cardoso defendeu que deve ser alguém que "consiga dar ao DCIAP a
organização, dinamismo e eficiência que a anterior directora não
conseguiu". Marinho Pinto expressou o desejo de que seja "um
magistrado que ponha os objectivos da investigação criminal acima de todos os
outros", ou seja, "deve ser um magistrado absolutamente indisponível
para obséquios políticos ou perseguições a pessoas". Sousa Santos está na
expectativa. "Tenho a impressão de que vamos assistir a mais uma
surpresa."
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