quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Surpresa, críticas e receios pelo futuro da Justiça na saída de Cândida Almeida

Público - FABÍOLA MACIEL 

Afastamento de Cândida Almeida surpreendeu algumas personalidades, mas nem todas. Ex-PGR Pinto Monteiro recusou comentar, apesar das críticas à Justiça
O afastamento de Cândida Almeida da direcção do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) provocou reacções distintas no sector da Justiça. Alguns consideram que o acto é "legítimo", uns preferem olhar para o futuro e outros não querem comentar.
É o caso de Pinto Monteiro. O antigo procurador-geral da República - que reconduziu Cândida Almeida como directora do DCIAP em 2010 - disse ontem não estar "a par do assunto". Minutos depois de ter sido condecorado por Cavaco Silva com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo - tal como o ex-presidente do Tribunal Constitucional, Rui Moura Ramos, e o antigo presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César - convidado pelos jornalistas para comentar, em passo apressado, Pinto Monteiro argumentou estar "de férias da Justiça" e reiterou: "Nem pensar".
O ex-PGR recusou falar sobre a saída de Cândida Almeida, mas aproveitou o discurso de agradecimento para deixar um alerta pouco detalhado: "Parece estar a desenhar-se uma menor transparência na separação de poderes." Uma opinião partilhada por Marinho Pinto que, à saída da cerimónia no Palácio de Belém, em Lisboa, defendeu que "há hoje sinais visíveis por parte do poder político de não conviver adequadamente com instâncias independentes da sociedade e com outros poderes da sociedade". O bastonário da Ordem dos Advogados vê o afastamento da directora do DCIAP como um "acto legítimo" e disse esperar que a decisão não tenha sido tomada por razões políticas.
Sobre a abertura de um inquérito disciplinar a três procuradores do DCIAP, incluindo Cândida Almeida, devido a uma fuga de informação, Marinho Pinto vincou que "as fugas e as violações do segredo de justiça são sobretudo feitas por magistrados e/ou polícias".
Preocupado com o estado da Justiça está também o presidente do Observatório Permanente da Justiça, Boaventura Sousa Santos, que encara a saída como "mais um elemento de perturbação" para o país. Sousa Santos defende que a ocupação do cargo exige "alguma coragem política" e, neste sentido, diz que Cândida Almeida é "uma procuradora de alta qualidade".
Apesar de desconhecer a razão do afastamento e da acção disciplinar aplicada pela procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, Sousa Santos sustenta que "objectivamente tem consequências políticas" e vai mais longe: "É um sinal de deslegitimar, de pôr em causa o trabalho que foi feito até agora". Por sua vez, o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Rui Cardoso, disse não estar surpreendido com o afastamento, já que "há um processo de renovação do Ministério Público que está em curso e que também passa pelo DCIAP, a quem deverá ser exigido outro tipo de resultados".
Quanto à próxima pessoa a ocupar o cargo de direcção, Rui Cardoso defendeu que deve ser alguém que "consiga dar ao DCIAP a organização, dinamismo e eficiência que a anterior directora não conseguiu". Marinho Pinto expressou o desejo de que seja "um magistrado que ponha os objectivos da investigação criminal acima de todos os outros", ou seja, "deve ser um magistrado absolutamente indisponível para obséquios políticos ou perseguições a pessoas". Sousa Santos está na expectativa. "Tenho a impressão de que vamos assistir a mais uma surpresa."

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