quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A política é o domínio da opção

JOSÉ ANTÓNIO BARREIROS 
Público - 20/02/2013 - 00:00
A imprensa de hoje traz a notícia da substituição da liderança do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), o departamento especial do Ministério Público que se notabilizou por, com o benefício de um juiz de instrução privativo, sediado no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), investigar "certos e determinados processos". Pedem-me uma opinião. Aqui fica a do cidadão que também é advogado.
Não reajo com surpresa à notícia. De há muito era esperada uma mudança de direcção no DCIAP. Imaginei que pudesse ter ocorrido no tempo do dr. Pinto Monteiro como procurador-geral da República quando a conflitualidade atingiu o auge e este saiu derrotado no Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) [orgão máximo daquela magistratura, com poderes disciplinares e de colocação dos procuradores].
As relações da Procuradoria-Geral com os procuradores do Ministério Público (MP) - que são centenas de magistrados para a maioria dos quais o Palácio de Palmela é uma realidade distante -, as relações dos vários Departamentos de Investigação e Acção Penal do país [que concentram os casos mais graves das grandes comarcas, como Lisboa, Porto, Coimbra, Évora e Aveiro] com o DCIAP, as relações de cada um com os demais e de todos entre si nunca foram totalmente pacíficas. O Sindicato dos Magistrados do MP deu bem nota disso e disso fez, aliás, bandeira.
Mais sucede que o DCIAP vive numa lógica de avocação de processos, como disse de "certos e determinados" processos. Está nisso o seu poder, está nisso a sua fraqueza. Há escolhas que não se entendem e fazem especular sobre o critério. A política, essa, é o domínio da opção. Quando uma magistratura não leva tudo a eito, mas opta e selecciona quais os processos que investiga, imiscui-se num campo perigoso, ganhando da política a fama, mesmo quando não tem o proveito.
Nada sei sobre as razões da saída, vejo na imprensa que surge envolta num ambiente disciplinar generalizado. A possibilidade de sucessão tranquila deve ter-se perdido.
A confirmar-se é uma solução que abre um problema.
Conheço a dra. Cândida Almeida desde há muitos anos, a amizade nunca levou a que não nos enfrentássemos - a ela e aos seus procuradores - quando disso se tratava. É uma cidadã de causas numa função de casos.
A herança que deixa traduz isso e as contradições do sistema em que ali viveu.
Dos 12 anos do DCIAP fica vincada a frase, que pertence a Pinto Monteiro, a dos "mega processos mega-absolvições". E fica a lógica bizarra de se ter tornado depois o DCIAP uma forma de cobrança coerciva de impostos pela via penal negociada. Ficam também, diga-se, notáveis iniciativas de enfrentamento de situações que pareciam inatacáveis. E arquivamentos que não convenceram.
Quem suceder no cargo tire o DCIAP da ribalta. A ideia do "Diapão" enquanto "super-DIAP" tem de dar lugar a uma outra lógica. O MP é uma magistratura unitária.
Na mente de alguns dos seus arquitectos o DCIAP e o TCIC seriam lados de um triângulo que remataria com a criação de uma Audiência Nacional, à espanhola, para o julgamento de "certos e determinados processos".
Ficou-se a meio na edificação. O especial ficou-se pelas particularidades, à mercê das generalizações.
A concretizar-se a saída não é uma época que termina, é uma outra que tenta começar.
Advogado

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