Público
- 20/02/2013 - 00:00
A
imprensa de hoje traz a notícia da substituição da liderança do Departamento
Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), o departamento especial do
Ministério Público que se notabilizou por, com o benefício de um juiz de
instrução privativo, sediado no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC),
investigar "certos e determinados processos". Pedem-me uma opinião.
Aqui fica a do cidadão que também é advogado.
Não reajo com surpresa à notícia. De há muito era esperada uma
mudança de direcção no DCIAP. Imaginei que pudesse ter ocorrido no tempo do dr.
Pinto Monteiro como procurador-geral da República quando a conflitualidade
atingiu o auge e este saiu derrotado no Conselho Superior do Ministério Público
(CSMP) [orgão máximo daquela magistratura, com poderes disciplinares e de
colocação dos procuradores].
As relações da Procuradoria-Geral com os procuradores do
Ministério Público (MP) - que são centenas de magistrados para a maioria dos
quais o Palácio de Palmela é uma realidade distante -, as relações dos vários
Departamentos de Investigação e Acção Penal do país [que concentram os casos
mais graves das grandes comarcas, como Lisboa, Porto, Coimbra, Évora e Aveiro]
com o DCIAP, as relações de cada um com os demais e de todos entre si nunca
foram totalmente pacíficas. O Sindicato dos Magistrados do MP deu bem nota
disso e disso fez, aliás, bandeira.
Mais sucede que o DCIAP vive numa lógica de avocação de
processos, como disse de "certos e determinados" processos. Está
nisso o seu poder, está nisso a sua fraqueza. Há escolhas que não se entendem e
fazem especular sobre o critério. A política, essa, é o domínio da opção.
Quando uma magistratura não leva tudo a eito, mas opta e selecciona quais os
processos que investiga, imiscui-se num campo perigoso, ganhando da política a
fama, mesmo quando não tem o proveito.
Nada sei sobre as razões da saída, vejo na imprensa que surge
envolta num ambiente disciplinar generalizado. A possibilidade de sucessão
tranquila deve ter-se perdido.
A confirmar-se é uma solução que abre um problema.
Conheço a dra. Cândida Almeida desde há muitos anos, a amizade
nunca levou a que não nos enfrentássemos - a ela e aos seus procuradores -
quando disso se tratava. É uma cidadã de causas numa função de casos.
A herança que deixa traduz isso e as contradições do sistema em
que ali viveu.
Dos 12 anos do DCIAP fica vincada a frase, que pertence a Pinto
Monteiro, a dos "mega processos mega-absolvições". E fica a lógica
bizarra de se ter tornado depois o DCIAP uma forma de cobrança coerciva de
impostos pela via penal negociada. Ficam também, diga-se, notáveis iniciativas
de enfrentamento de situações que pareciam inatacáveis. E arquivamentos que não
convenceram.
Quem suceder no cargo tire o DCIAP da ribalta. A ideia do
"Diapão" enquanto "super-DIAP" tem de dar lugar a uma outra
lógica. O MP é uma magistratura unitária.
Na mente de alguns dos seus arquitectos o DCIAP e o TCIC seriam
lados de um triângulo que remataria com a criação de uma Audiência Nacional, à
espanhola, para o julgamento de "certos e determinados processos".
Ficou-se a meio na edificação. O especial ficou-se pelas
particularidades, à mercê das generalizações.
A concretizar-se a saída não é uma época que termina, é uma
outra que tenta começar.
Advogado
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