quarta-feira, 31 de maio de 2006

Casa da Suplicação LXX


Excesso de velocidade – Auto-estrada – Factos da decisão – Limite máximo especial
1 – Se se dá como provado na decisão sancionatória que o arguido conduzia em auto-estrada a 118 km/h quando a velocidade máxima permitida era no local de 80 km, sem identificar qual a origem desse limite espacial de velocidade, e qual a forma de divulgação do mesmo, à luz dos n.ºs 1 e 2 do art. 28.º do C. da Estrada, não se pode concluir que foi violado o limite máximo de velocidade que é, para o veículo em causa, de 120 Km/h em auto-estrada.
2 – E a circunstância de, na folha de suporte das fotografias do veículo estar manuscrita, sem indicação do seu autor, a frase «Soure Zona Obras – 80», não releva, pois que esse apontamento não foi retomado na decisão impugnada, nem sequer no auto de notícia, que foi recebido por aquela decisão.
Ac. Do STJ de 30.03.2006, Proc. n.º 1034/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
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Regime de jovem delinquente – Atenuação especial da pena – Razão de ser da lei – Gravidade do crime cometido
1 – Com a atenuação especial da pena na delinquência jovem, atendendo às vantagens para a reinserção social do jovem condenado daí advindas, pretende-se evitar que uma reacção penal severa, na fase latente da formação da personalidade, possa comprometer definitivamente a socialização do jovem.
2 – Mas deve ter-se igualmente presente a gravidade do crime cometido, patente na medida da pena aplicável, indicada, aliás, pelo legislador como critério a atender também, sem se comprometer acriticamente aquele desiderato.
3 – Haverá que apreciar, em cada caso concreto, a personalidade do jovem, a sua conduta anterior e posterior ao crime, a natureza e modo de execução do crime e os seus motivos determinantes.
Ac. Do STJ de 25.05.2006, Proc. n.º 1717/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
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Omissão de pronúncia – In dúbio pró reo – Qualificação jurídica – Tráfico de menor gravidade – ecstasy – Consumo recreativo – Jovem delinquente – Atenuação especial da pena
1 – Não se verifica omissão de pronúncia quando o Tribunal não aprecia todos os argumentos invocados pela parte em apoio das suas pretensões que vem a conhecer, mas só quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que lhe foram submetidas pelas partes ou de que deve conhecer oficiosamente, entendendo-se por questões os problemas concretos a decidir e não os simples argumentos, opiniões ou doutrinas expendidos pelas partes na defesa das teses em presença
2 – Se o Tribunal recorrido não deu ao documento junto a relevância que o recorrente lhe atribuiu, mas não deixou por isso de conhecer de questão que devesse apreciar, e que aliás o recorrente não identifica, não há omissão de pronúncia.
3 – O princípio in dubio pro reo, constitui um princípio probatório, segundo o qual a dúvida em relação à prova da matéria de facto, tem de ser sempre valorada favoravelmente ao arguido, traduzindo o correspectivo do princípio da culpa em direito penal, a dimensão jurídico-processual do princípio jurídico-material da culpa concreta como suporte axiológico-normativo da pena.
4 – Este princípio não tem quaisquer reflexos ao nível, da interpretação das normas penais. Em caso de dúvida sobre o conteúdo e o alcance das normas penais, o problema deve ser solucionado com recurso às regras de interpretação, entre as quais o princípio do in dubio pro reo não se inclui, urna vez que este tem reflexos exclusivamente ao nível da apreciação da matéria de facto - sejam os pressupostos do preenchimento do tipo de crime, sejam os factos demonstrativos da existência de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa.
5 – Estando em causa a qualificação jurídica de uma determinada conduta, questão de direito que envolve a interpretação das normas que tipicam a conduta em causa, não é licito recorrer ao princípio in dubio pro reo, ou a eventual decorrência substantiva do mesmo, tanto mais quando nenhuma dúvida expressaram as instâncias, nem resulta da matéria de facto provada.
6 – O princípio in dubio pro reo, constitui um princípio probatório, segundo o qual a dúvida em relação à prova da matéria de facto, tem de ser sempre valorada favoravelmente ao arguido, traduzindo o correspectivo do princípio da culpa em direito penal, a dimensão jurídico-processual do princípio jurídico-material da culpa concreta como suporte axiológico-normativo da pena.
7 – Este princípio não tem quaisquer reflexos ao nível, da interpretação das normas penais. Em caso de dúvida sobre o conteúdo e o alcance das normas penais, o problema deve ser solucionado com recurso às regras de interpretação, entre as quais o princípio do in dubio pro reo não se inclui, urna vez que este tem reflexos exclusivamente ao nível da apreciação da matéria de facto - sejam os pressupostos do preenchimento do tipo de crime, sejam os factos demonstrativos da existência de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa.
8 – Estando em causa a qualificação jurídica de uma determinada conduta, questão de direito que envolve a interpretação das normas que tipicam a conduta em causa, não é licito recorrer ao princípio in dubio pro reo, ou a eventual decorrência substantiva do mesmo, tanto mais quando nenhuma dúvida expressaram as instâncias, nem resulta da matéria de facto provada.
9 – O privilegiamento do crime de tráfico de menor gravidade dá-se, não em função da (considerável) diminuição da culpa, mas em homenagem à considerável diminuição da ilicitude da conduta, que se pode espelhar, designadamente:
– Nos meios utilizados;
– Na modalidade ou nas circunstâncias da acção;
– Na qualidade ou na quantidade das plantas, substâncias ou preparações.
Sendo, embora um caso de fronteira com o tráfico simples, deve ser qualificado como tráfico de menor gravidade a venda por duas pessoas jovens de 556 comprimidos de "ecstasy", em cuja composição figura uma substância denominada MDMA, vendidos num ambiente de consumo recreativo «rave party», em quantidades a cada consumidor que não foi possível apurar, e com uma concentração de MDMA, a substância que gera o sancionamento penal, por comprimido que não foi apurada.
10 – A expressão “consumo recreativo de drogas” significa o consumo de substâncias psicoactivas para fins recreativos em locais de diversão nocturna, não sendo os seus consumidores maioritariamente pessoas marginalizadas ou de meios sociais desfavorecidos, mas sim jovens estudantes, ou jovens que exercem uma actividade profissional, e que apresentam uma situação financeira relativamente estável. Este consumo «apesar do relevo atribuído nos meios de comunicação social às mortes causadas por ecstasy» encontra «o principal problema em termos de saúde pública é a possibilidade de distúrbios a longo prazo causados pelo consumo habitual ou excessivo de estimulantes do tipo das anfetaminas como a MDMA», sendo a redução dos riscos do consumo recreativo, nomeadamente os possíveis riscos a longo prazo, um domínio privilegiado de actuação.
11 – A delinquência juvenil, em particular a delinquência de jovens adultos e de jovens na fase de transição para a idade adulta, é um fenómeno social muito próprio das sociedades modernas, urbanas, industrializadas e economicamente desenvolvidas, obrigando, desde logo o legislador, a procurar respostas e reacções que melhor parecem adequar-se à prática por jovens adultos de crimes, que visem um ciclo de vida que corresponde a uma fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório, procurando evitar que uma reacção penal severa, na fase latente da formação da personalidade, possa comprometer definitivamente a socialização do jovem, o que justifica a referência da aplicação do regime do art. 4º do DL n.º 401/82, às vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
12 – Haverá que apreciar, em cada caso concreto, a personalidade do jovem, a sua conduta anterior e posterior ao crime, a natureza e modo de execução do crime e os seus motivos determinantes, radicando o juízo de prognose favorável à sua reinserção, na valoração, em cada caso concreto, da personalidade do jovem, da sua conduta anterior e posterior ao crime, da natureza e do modo de execução do ilícito e dos seus motivos determinantes.
13 – No quadro referido é de atenuar especialmente a pena do jovem de 16 anos, sem antecedentes criminais e inserido familiarmente que comparticipou no referido tráfico.
Ac. Do STJ de 25.05.2006, Proc. n.º 1389/06-5, Relator Cons. Simas Santos

segunda-feira, 29 de maio de 2006

Mudar o Poder Local...


... É o título de um livro a ser lançado amanhã à noite, no Café Majestic, no Porto, da autoria de Paulo Morais, antigo vice-presidente e vereador do Urbanismo da Câmara Municipal do Porto, e de cuja apresentação se encarregará Maria José Morgado.
Em entrevista ao DN de hoje, Paulo Morais, sem papas na língua, fala do financiamento de empreiteiros a "muita gente que anda à volta dos partidos" e assegura que o Ministério Público tem "informação bastante para intervir"...

"Não se descredibilize o sistema judicial”

O Conselheiro Simas Santos alerta que em Portugal “os juizes vivem na clandestinidade”
“O Governo não pode ser um elemento de descredibilização do sistema judicial”, afirmou o conselheiro Simas Santos, anteontem à noite, numa tertúlia promovida no Café Majestic, no Porto, pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP).
O juiz do Supremo Tribunal de Justiça fez aquele desabafo traduzindo o desagrado dos magistrados judiciais e do Ministério Público, perante a ideia lançada pelo Governo de que são “calaceiros” e “só se preocupam com as férias”. “Nos Estados Unidos os juízes são respeitados e dizem a lei, mas aqui os juízes vivem na clandestinidade”.
Preocupado com o facto de o poder executivo propor alterações atrás de alterações “sem discutir o modelo”, Simas Santos acentuou: “Se é o modelo que está mal, então mude-se o modelo, mas não se descredibilize o sistema judicial”.
O conselheiro realçou que a morosidade não é um fenómeno que afecte todos os graus de jurisdição, lembrando que nas relações e no STJ as decisões dos recursos são expeditas. Mas também admitiu a necessidade de os juízes do tribunal dos tribunais redigirem as suas decisões com clareza, para evitarem juízos injustos quanto ao sentido dos acórdãos.
Simas Santos desmentiu com a sua experiência pessoal uma crítica feita pelo presidente do conselho distrital do Porto da Ordem dos Advogados (OA), que preconizou o fim das audiências nos tribunais superiores. “Quando lá vou, alego e passadas duas/três horas, o acórdão é depositado na secretaria”, assegurou Silva Leal. “Já elaborei cerca 600 acórdãos e leio-os na semana seguinte à audiência”, garantiu Simas Santos.
Num aspecto conselheiro e Santos dirigente da OA estiveram em consonância. Silva Leal revelou às dezenas de participantes na tertúlia “Tenho ouvido desembargadores pugnar pelo de fim dos recursos da matéria de facto, o que considero um retrocesso e que, a consumar-se, violaria os direitos de defesa dos cidadãos”. Simas Santos acabaria por subscrever estas preocupações acentuando que “as Relações estão a ter muita dificuldade para apreciar a matéria de facto. Há uma rebeldia”, frisou.
(...)
ANTÓNIO ARNALDO MESQUITA, Público 28Mai2006

domingo, 28 de maio de 2006

Alturas e baixezas


Mais do que a questão da altura do estrado, de que hoje fala Teixeira da Mota no Público, parece é que nos devemos preocupar antes com a da largura das cadeiras…

Magistrados fora do desporto?

Pela sua sempre actual pertinência, transcreve-se, data venia, o artigo de J. M. Meirim no Público de hoje:
1. A recente publicação do nº 32 da conceituada revista jurídica Sub judice, impressivamente dedicado à "Ética judicial", transportou-nos, mais uma vez, para a controversa questão da presença de magistrados no seio de organizações desportivas, em particular federações desportivas e ligas de clubes profissionais.
Nessa revista veio transcrito um acórdão do Plenário do Conselho Superior de Magistratura (CSM), de 17 de Março de 2005, relativo ao dever de ocupação exclusiva e ao exercício de outras actividades não remuneradas.
Mais concretamente, a decisão do CSM, uma vez analisadas as funções exercidas por um magistrado judicial na Comissão Arbitral Paritária - criada pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional e pelo Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol -, entendeu verificada uma infracção disciplinar, aplicando ao magistrado em causa a pena de advertência não registada.
Curiosamente, ou talvez não, o Público recolheu nos últimos oito dias, espaços de diversa natureza, dedicados a esta matéria, incluindo a crónica de Francisco Teixeira da Mota, de domingo passado.

2. Não sendo pacífica a resposta a conferir quanto à questão, ela própria dotada de diversas cambiantes, do desempenho, por juizes em exercício de funções, de outras actividades, dê-se sumária notícia dos pilares da decisão do CSM, com naturais precipitações no "mundo do desporto".
Em primeiro lugar, o CSM não "possui credencial", constitucional ou legal, para proibir o exercício de quaisquer actividades que não sejam configuráveis como "funções de natureza profissional".
Não obstante, todos os actos ou omissões praticados por juizes em tais actividades não profissionais estão naturalmente sujeitos ao crivo da sua compatibilidade com a dignidade indispensável ao exercício de funções como juiz, o que vale por dizer, que pode ser accionado - em tais casos - o procedimento disciplinar.
Por outro lado, todo o exercício de actividades "extra-funções", ainda que não proibidas, terá que ser sempre não remunerado.
Em síntese, do próprio CSM, os juizes em exercício podem desempenhar outras actividades, desde que de natureza não profissional e não remuneradas.

3. Temos para nós, há já algum tempo, que a independência, imparcialidade, isenção e objectividade não são património exclusivo dos magistrados, nem em todos eles se encontram presentes.
É fácil antever que nos é relativamente indiferente que os cargos dos "órgãos jurisdicionais" das organizações desportivas, desde logo no futebol, sejam ou não preenchidos por esses funcionários públicos.
O valor dos homens e aquelas qualidades que referimos não são, assim o julgamos, aferidos pelo seu traje profissional.
Correcto é que, magistrados ou não, quem exerça tais funções não deixe turvar o seu juízo pelo colorido clubístico ou pelo "interesse superior da modalidade".

4. Lá pior do que cá.
No Brasil, o Presidente do Conselho Nacional de Justiça, por resolução de 19 de Dezembro de 2005, vedou o exercício "pelos integrantes do Poder Judiciário de funções nos Tribunais de Justiça Desportiva e em suas Comissões Disciplinares".

5. 99 dias após o termo do Congresso e a proposta de lei que vai resolver (?) os problemas do desporto nacional ainda não chegou à Assembleia da República.

quarta-feira, 24 de maio de 2006

Tertúlia do Porto




Na próxima sexta-feira (26 de Maio), às 20 horas, no Café Magestic, no Porto.

L’abolition des châtiments corporels : un impératif pour les droits de l’enfant en Europe (10/05/2006)

Pareceu-me importante, pela actualidade, dar conta desta resenha de uma publicação do Conselho da Europa, acabada de sair.

«On peut s’arrêter mais on ne peut pas revenir en arrière ». C’est ainsi qu’un groupe d’enfants récemment invité par le Conseil de l’Europe pour discuter de l’éducation positive et non violente s’est exprimé au sujet des châtiments corporels. Peu importe que le père ou la mère se sente mal après coup ; certaines blessures ne guérissent jamais. Pour le Conseil de l’Europe, les enfants ne sont pas des personnes en miniature, dont les droits, les sentiments et la dignité humaine seraient réduits en proportion. Ce sont des êtres vulnérables avec des droits à part entière, qui doivent être protégés dans le souci constant de l’intérêt de l’enfant. L’interdiction de tout châtiment corporel – y compris au sein de la famille – dans tous les États membres du Conseil de l’Europe est un objectif majeur de l’organisation, en faveur duquel elle s’engage résolument. Cet engagement repose sur les normes relatives aux droits de la personne humaine consacrées par divers instruments juridiques, dont la Convention des Nations Unies sur les droits de l’enfant (qui a été ratifiée par tous les États membres) ou encore la Charte sociale européenne et la Charte sociale révisée.

domingo, 21 de maio de 2006

Constitucionalidade do n.º 3 do artigo 51.º do Estatuto da Aposentação

O Plenário do Tribunal Constitucional, pelo Acórdão n.º 302/2006, de 9 de Maio, relatado pelo Conselheiro Vítor Gomes, decidiu não declarar a inconstitucionalidade da norma do n.º 3 do artigo 51.º do Estatuto da Aposentação, na redacção emergente da Lei nº 1/2004, de 15 de Janeiro.
Segundo essa norma, «sem prejuízo de outros limites aplicáveis, a pensão de aposentação do subscritor sujeito ao regime do contrato individual de trabalho determina-se pela média mensal das remunerações sujeitas a desconto auferidas nos últimos três anos, com exclusão dos subsídios de férias e de Natal ou prestações equivalentes.»
Entendia o Procurador-Geral da República que a mesma violava o princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP.
O Tribunal Constitucional, diferentemente, considerou que «não existe qualquer expectativa dos subscritores digna de tutela pelo Direito que tenha sido intoleravelmente atingida por ter passado a ser relevante para o cálculo da pensão a média das remunerações do último triénio em vez do quantitativo correspondente ao vencimento do cargo pelo qual se verifica a aposentação acrescido da média das demais retribuições do último biénio. Na verdade a pretensa «expectativa» dos subscritores não se baseia em qualquer contribuição que hajam feito, mas tão-só numa noção difusa de manutenção ou cristalização do statu quo do regime da aposentação em todas as suas vertentes – ideia que, no limite, inviabilizaria toda e qualquer intervenção reformadora do legislador neste domínio.
Decisivamente, não pode afirmar-se, sem mais, que os trabalhadores possuam uma expectativa a que o cálculo da pensão de aposentação seja efectuado sempre da mesma maneira ao longo da sua carreira contributiva. Ponto é que as alterações que venham a ser introduzidas não importem, à luz de critérios de proporcionalidade e de razoabilidade, uma lesão de tal forma grave ou profunda na «confiança no sistema» que os trabalhadores depositaram durante a sua carreira contributiva.»

sábado, 20 de maio de 2006

Inconstitucionalidade do art. 465.º do CPP

Pelo Acórdão n.º 301/06, de 9 de Maio, subscrito pelos Juízes Maria Fernanda Palma (relatora), Paulo Mota Pinto, Benjamim Rodrigues, Mário José de Araújo Torres e Rui Manuel Moura Ramos, a 2.ª Secção do Tribunal Constitucional decidiu julgar inconstitucional a norma do artigo 465° do Código de Processo Penal por violação do direito de acesso aos tribunais para o exercício da defesa do condenado, consagrado conjugadamente nos artigos 18º, nº 2, 20° e 32°, da Constituição.
Nos termos do referido artigo 465.º (Legitimidade para novo pedido de revisão), «tendo sido negada a revisão ou mantida a decisão revista, não pode haver nova revisão se a não requerer o procurador-geral da República.»
Concluiu o Tribunal Constitucional que, «não se identificando, […], fundamento suficiente para a solução normativa impugnada e consubstanciando a mesma uma limitação do acesso aos tribunais para o exercício da defesa do condenado, verifica-se que tal limitação é desproporcionada e não suficientemente justificada.»

sexta-feira, 19 de maio de 2006

Acórdão nº 64/2006 do Tribunal Constitucional

Foi hoje publicado no Diário da República o acórdão do Tribunal Constitucional nº 64/2006 em que se decidiu (com seis declarações de voto de vencido) «não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f) do n.o 1 do artigo 400.o do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso interposto apenas pelo arguido para o Supremo Tribunal de Justiça de um acórdão da Relação que, confirmando a decisão da 1.a instância, o tenha condenado numa pena não superior a 8 anos de prisão, pela prática de um crime a que seja aplicável pena superior a esse limite», revogando consequentemente o recorrido acórdão nº 628/2005 do mesmo Tribunal.

sexta-feira, 12 de maio de 2006

Manifestação de juízes reprimida no Egipto

Milhares de agentes da polícia de intervenção reprimiram ontem, no Cairo, uma manifestação pacífica de apoio a dois juízes reformistas, que deveriam comparecer perante um conselho disciplinar por questionarem a legalidade das eleições legislativas e presidenciais egípcias de 2005.
Grupos de activistas organizaram protestos no centro da capital, mas os manifestantes foram cercados por contingentes policiais que procederam a numerosas detenções. Vários jornalistas também foram interpelados, referiu a Reuters.
Os manifestantes foram impedidos de se aproximar do tribunal onde deveriam depor os dois juízes, recentemente demitidos após denunciarem irregularidades eleitorais.
Hisham Bastawisi e Mahmud Mekki têm-se destacado na campanha pela reforma do sistema eleitoral e judicial, exigida pelo movimento pró-democracia. Desafiaram o regime ao solicitarem um inquérito sobre as eleições caso os responsáveis pelas fraudes não sejam punidos, e defenderam um sistema judicial independente.
Os dois juízes recusaram entrar na sala de audiências após a sua defesa ter sido impedida de estar presente. "Apenas participarei na audiência quando estiverem reunidas as condições para um julgamento justo [...] e quando as forças de segurança libertarem os detidos que vieram solidarizar-se connosco", afirmou à AFP Hisham Bastawisi.
"Por sua vez, Mahmud Mekki considerou que os acontecimentos de ontem "são a prova de que o poder executivo intervém nos assuntos da justiça e não é independente".

No Público de hoje

Convite

José António Barreiros, Autor e «O Mundo em Gavetas», Editores, têm o grato prazer de anunciar a apresentação pública do livro «Nathalie Sergueiew, uma agente dupla em Lisboa» e de convidar os colaboradores deste blog para o evento.



Sobre o livro (capa, sinopse e biografia do autor e info detalhada sobre dias, horas e locais dos lançamentos), ver o blog O Mundo das Sombras

Sobre o Projecto/Editora "O Mundo em Gavetas", ver o blog Incursões

domingo, 7 de maio de 2006

O Diário de uma República... e Freud

Parece finalmente ter parado o rol de condecorações com que o ex- Presidente da República inundou o papel oficial como Chanceler-mor das Ordens Honoríficas Portuguesas, algumas do ano passado mas agora publicadas para deixar a chancelaria limpa.
Talvez por coincidência (ou por não ter feito uma análise exaustiva) não vi qualquer dessas condecorações atribuídas a magistrados em funções efectivas, judiciais ou de Ministério Público.
Pode essa circunstância ser interpretada como um sinal negativo ou positivo?
Negativo, se pensarmos que neste período em que quase todos criticam a Justiça (leia-se, em particular, magistrados e funcionários,) ninguém se atreveu a colocar qualquer medalha no peito do mais trabalhador, dedicado e excepcional magistrado que por aí ande – e são muitos, felizmente - apartando-os para a uma espécie de cidadela maldita e invisitável.
Positivo, se pensarmos que num momento em que várias intempéries têm desabado sobre eles – merecidas ou não – ficaram imunes a esta leva de medalhas, o que lhes robustece a independência face ao Poder Político.
E nem a observação de Montesquieu de que as condecorações não custam nada ao Estado, serviu de algum anteparo.

Assunto menor – estarão a pensar –, mas revelador, digo eu, de como há actos falhados bem reveladores, isto nos 150 anos do nascimento do pai da psicanálise, Sigmund Freud (1856-1939).

sábado, 6 de maio de 2006

Conferência sobre Políticas e Práticas Penais

Por iniciativa conjunta da Escola de Criminologia e da FDUP, no âmbito do I Ciclo de Conferências em Comemoração dos 10 anos da Faculdade de Direito, terá lugar, no próximo dia 12 de Maio, pelas 15:00 horas, na Faculdade de Direito da Universidade do Porto, a conferência intitulada Políticas e Práticas Penais, que contará com a presença, como palestrantes, do Prof. Pierre Landreville, da Dra. Clara Albino e, como moderador, do Dr. Almeida Costa.

A análise da evolução da criminalidade e das políticas criminais constitui actualmente uma das áreas privilegiadas da investigação criminológica.

A crescente preocupação com a segurança nas sociedades democráticas, as mutações socio-económicas e a consequente interpelação do papel do Estado têm sido alguns dos elementos invocados na interpretação das transformações operadas na produção e na aplicação das normas penais e, em geral, nas políticas de prevenção e de repressão da criminalidade.

A análise comparativa e crítica destas tendências a nível nacional e internacional, e em especial a abordagem das práticas penais e das alternativas à pena de prisão, constitui o objecto central da conferência.

quinta-feira, 4 de maio de 2006

Espionagem

O penso que ainda também colaborador deste blogue Dr. José António Barreiros, vai lançar um livro de espionagem intitulado «Nathalie Sergueiew, uma agente dupla em Lisboa», publicado pela nóvel e promissora editora "O Mundo em Gavetas".

«Não se trata de um romance histórico, mas de um relato histórico que se lê como um romance. No caso, é a biografia de uma russa, nascida em São Petersburgo, que viveu em Paris, viajou pelo mundo, trabalhou para a causa aliada e morreu na América com 38 anos de idade. O livro abre com a sua deslocação a Lisboa, em Março de 1944, para contactos com a espionagem alemã local.»

O lançamento terá lugar, em Lisboa, no próximo dia 16 de Maio, às 18:30, no Salão Nobre da Ordem dos Advogados, Largo de São Domingos, 14, 1º em Lisboa, e, no Porto, a 17 de Maio, também pelas 18.30, no Clube Literário do Porto, R. da Alfândega, nº 22.

Quem anuncia o evento é, nada mais nada menos, que um Carteiro, mas já havia um prenúncio neste outro Mundo das Sombras.

Julgo que todos estaremos convidados para o grande acontecimento.

Justiça em França, como entre nós

Na leitura dos jornais franceses de ontem sobreleva o affaire Clearstream, em que o Primeiro-Ministro Dominique de Villepin está sob os olhares de dois juízes de instrução, Henri Pons e Jean-Marie d’Huy, que procedem a inquérito por “denúncia caluniosa” contra altas personalidades. Tal denúncia caluniosa tem a ver com a inclusão, numa lista, de detentores de contas no estrangeiro, que pelo menos quanto ao Ministro do Interior, Nicola Sarkozy, possível candidato à sucessão de Chirac, se mostrou ser falsa tal lista. Imputa-se a Villepin, o que este desmente, ter dado instruções aos serviços secretos para uma investigação dirigida, que prejudicaria Sarkozy.
Mas o que me chamou a atenção, para lá da aparente serenidade dos magistrados incumbidos do inquérito, confrontados porventura com a necessidade de ouvir o próprio Primeiro-Ministro, que diz não se demitir, foi a discussão que se trava sobre a detenção provisória, o mapa judiciário e a justiça de menores, afinal temas semelhantes a alguns que entre nós também se debatem.
Destaco o da detenção provisória, equivalente à nossa prisão preventiva, muito falada após o “fiasco Outreau”. Diz-se ser necessário acabar com a detenção provisória como meio de pressão sobre o suspeito e há quem preconize uma audiência pública e colegial (até com a presença de jurados) e mais garantias para o suspeito, antes de a determinar.
Outro ponto que vejo objecto de grande cuidado é o dos magistrados perante a comunicação social. Deve terminar-se – diz-se - com o mutismo a que estes se têm votado, especialmente quando em face dos advogados de defesa. Há estágios de formação para magistrados a quem se confiam as relações com a imprensa, procurando afastar um certo sentimento irracional de desconfiança e restabelecer o equilíbrio com a defesa.
Também entre nós será tempo para levar este último ponto mais a sério, pois todos sabemos que a batalha pela Justiça se vence com o bom desempenho do trabalho de cada magistrado e de outros “operadores”, melhor tecnologia, leis justas e práticas, mas hoje também com um relacionamento sadio e “profissional” com a comunicação social para esconjurar os miasmas que perduram. E não me refiro a “assessores de imprensa”, mas a magistrados para a imprensa.

quarta-feira, 3 de maio de 2006

A propósito de um blog de defensores públicos

Retornando à questão dos defensores públicos, um dos mitos alimentados é que profissionais organizados e integrados num departamento autónomo, objecto de selecção transparente e formação profissional, não terão o profissionalismo e empenho de profissionais liberais custeados pelo Estado, sem que este sindique o seu desempenho.
O Ninth Circuit Blog de defensores públicos que exercem funções nesse tribunal federal, para além de proporcionar uma interessante panorâmica da justiça penal nos EUA, é revelador de muita da mistificação que se levanta contra a defesa pública.

segunda-feira, 1 de maio de 2006

A nova agenda dos juízes


«(...) Temos mais de trinta anos de democracia e verdadeiramente não podemos reclamar a autoria de nenhuma reforma fundamental do sistema de justiça. Donde decorre, que, aos olhos dos nossos concidadãos, sejamos vistos como cúmplices e interessados no seu evidente mau funcionamento. O que, por não ser verdade, precisa de ser mudado. A representação sindical dos juízes, que começou por fazer todo o sentido na época histórica em que surgiu, e que teve a sua importância na preservação dos valores da independência (incluindo também o aspecto relevante das condições materiais para o exercício da função), perdeu há muito, do meu ponto de vista, sentido estratégico e utilidade prática.
Mas a verdade é que essa aposta persistiu fazendo o seu caminho, baseada na ilusão de que por essa via os juízes conseguiriam obter melhores condições para exercer a sua função e, assim, por reflexo, exercê-la melhor. Ilusão que se desfez, quando, esgotadas todas as possibilidades do discurso voluntarista e reivindicativo, no fim desse caminho, os juízes perceberam que não há lá nada e que essa via não tem saída. Donde, está bom de ver, para avançar agora, vai ser preciso voltar um pouco atrás e começar de novo.
Precisam os juízes, pois, colectivamente, de uma nova agenda política.Afirmar em primeiro lugar, sempre, a cultura da exigência. Em todos os aspectos organizativos, funcionais e de comportamento, os juízes têm de ser os primeiros a exigir de si próprios um desempenho situado num patamar de excelência e de encontrar forma de isolar aqueles (...) que, não querendo corresponder a tais expectativas, degradam a imagem e prestígio da justiça. Depois, não menos importante, intervenção cívica e visibilidade social.
A funcionalização burocrática, que esconde os juízes na sombra dos gabinetes, atrás dos processos, é contrária a uma justiça capaz de afirmar os valores da cidadania e dos direitos humanos. Também, ainda, uma aposta clara e prioritária na eficiência dos tribunais. Do lado das reformas, com abertura, disponibilidade e interesse, e não contra toda a mudança - esse conservadorismo tão típico dos tribunais. Tomando a dianteira de avançar com propostas de solução dos estrangulamentos do sistema, de forma positiva e construtiva. Não por razões estratégicas de melhoria da imagem social dos juízes. Mas porque essa é a nossa responsabilidade.
E, finalmente, talvez o mais importante: respeito e dignidade. O relacionamento dos juízes com os governantes, num espaço comum que é o da organização política do Estado, deve basear-se sempre, mutuamente, em padrões de grande respeito institucional e correcção formal e substancial. Valores que condicionam directamente a imagem e prestígio dos tribunais. Por isso, importa colocar esse diálogo institucional num patamar de normalidade e desdramatização. Com memória, mas sem ressentimentos inúteis e inconsequentes.É a afirmação desta agenda própria, que não se detenha a todo o passo no ruído das questões da actualidade político-mediática (...), que poderá ganhar para os juízes a confiança dos seus concidadãos»

Manuel Henrique Ramos Soares,
novo Secretário-Geral da Associação de Juízes,
Quinta-feira, Abril 27, 2006
http://dizpositivo.blogspot.com/