Passos aceitou
dar mais poder a Portas. Cavaco achou que era beneficiar o infrator. PSD
concorda mas aceitou
ANGELA SILVA e
FILIPE SANTOS COSTA
Ainda não foi
desta que a remodelação profunda do Governo (rostos e orgânica), há muito
reclamada dentro e fora da coligação, se tornou realidade.
Esteve quase.
Passos chegou a acordo com Portas, levou o essencial das mudanças projetadas ao
Presidente da República, mas as exigências adicionais de Cavaco (que achou CDS
a mais) obrigaram-no a deixar o elenco em stand by.
Foi o Governo
“velho” que ontem debateu, no Parlamento, o estado da nação. Mas a remodelação
profunda, se o Governo aguentar o embate presidencial, pode seguir dentro de
momentos.
Dar mais força
ao CDS (que se queixava de ser “dispensável”) sem tirar força ao PSD é a matriz
desenhada pelos líderes dos dois partidos, mas que deixou muitos
sociais-democratas de pé atrás. Primeira conclusão: perdem os independentes,
com as saídas de Vítor Gaspar e Álvaro Santos Pereira, o eterno remodelável.
Em número de
ministros, o equilíbrio de forças dentro da coligação mantinha-se, no desenho
de remodelação que Cavaco travou. O PSD ganhava mais dois ministros, com a
entrada de Jorge Moreira da Silva, o ns 2 do partido, que somaria a Maria Luís
Albuquerque, a nova ministra das Finanças.
E o CDS ganhava
um ministro, com a entrada de António Pires de Lima.
Mas, em
influência, o CDS crescia a olhos vistos, com a ascensão de Paulo Portas a
vice-primeiro-ministro. Passos já tinha proposto este cargo ao líder do CDS,
quando começaram a conversar sobre a substituição de Gaspar (antes do turbilhão
das últimas duas semanas), mas Portas começou por recusar, por achar que era um
título vazio caso não tivesse mais poder na definição das políticas. Para
responder à demissão do MNE e segurar as pontas do Governo, Passos juntou a
esse cargo a coordenação das pastas económicas, as relações com a troika e a
reforma do Estado.
A promoção de
Portas foi a única mudança assumida por Passos no final da reunião conjunta
PSD/CDS, no sábado passado, que selou o compromisso entre os dois partidos para
uma solução de Governo durável até ao fim da legislatura e com listas conjuntas
pelo meio para as eleições europeias.
Uma reunião que
limou as arestas do acordo, mas que decorreu num clima tenso — no início do
encontro, Passos assumiu que ainda iria “demorar bastante tempo” para “passar o
efeito desta crise que nos afetou a todos”.
PSD torce o
nariz
Feito o acordo,
o PSD reagiu com mixed feelings ao reforço de poder de Portas. Por um lado,
torceram o nariz por o líder do CDS ficar com a Economia num novo ciclo em que
esta pasta devia concorrer em pé de igualdade com as Finanças e começar a ter
algumas boas notícias para dar. Por outro, o facto de isso implicar um maior
envolvimento de Portas nas tarefas centrais da governação — com muitas ‘batatas
quentes’ — agradou aos sociais-democratas, que há muito se queixavam por ver o
líder do CDS ‘à solta’.
Inaceitável
para o PSD seria a ascensão de Pires de Lima a ministro de Estado, quando
Portas subia a vice-primeiro-ministro, cenário que os sociais-democratas
consideraram “distorcer” a relação de forças entre os dois partidos. Passos,
garantiu ao Expresso fonte próxima, nunca admitiu ir por aí e Pires de Lima,
garante fonte próxima, nunca fez disso uma questão.
Moedas e Maduro
“à coca”
Perante o
reforço dos poderes do CDS, Passos tratou de acautelar equilíbrios. Embora a
relação com a troika passasse a ser coordenada por Portas, Carlos Moedas, o
secretário de Estado adjunto do PM que preside à Esame (estrutura encarregada
de acompanhar o resgate), ficaria onde está —, ao lado de Passos. Por outro
lado, o controlo que Portas e Pires de Lima passariam a ter sobre a Economia ia
obrigá-los a concertarem-se com Poiares Maduro, a quem Passos entregou a
programação dos fundos do QREN, um pilar financeiro vital para reanimar a
atividade económica.
Na orgânica do
Governo, Passos e Portas acertaram acabar com os dois megaministérios —
Agricultura/Ambiente e Economia —, para os tornar geríveis.
A separação das
pastas congregadas nas mãos de Assunção Cristas separaria a Agricultura do
Ambiente, que passaria a ter a Energia (um modelo que sempre foi defendido por
Jorge Moreira da Silva). E a Economia perderia o Emprego para a Segurança
Social.
A DANÇA DAS
PASTAS
Passos Coelho
Pergunta recorrente nos comentários à remodelação que acabou por não o ser (até
agora…) foi que papel terá o PM num Governo em que Portas sai tão reforçado.
Passos vai ser, explicam, “um PM normal”. O Governo pequeno que escolheu fazer,
inicialmente sem ministro da Presidência nem vice-primeiro-ministro, obrigou-o
a coordenar todas as pastas. Agora, com Maduro na coordenação política e Portas
na económica, Passos liberta-se para a verdadeira tarefa de PM: pensar o todo e
fazer política.
Paulo Portas
Seria o grande vencedor da remodelação, em poder, pelo menos. Passos
reconhece-o, finalmente, como n.º 2 do Governo e dá-lhe o acompanhamento das
pastas centrais no resto da legislatura.
Interlocutor da
troika, com poder ‘reforçado na reforma do Estado (antes, só tinha a tarefa de
escrever o guião), central nas políticas económicas (podendo organizar e
dirigir Conselhos de Ministros sectoriais, rodeado dos ministros do CDS). Moeda
de troca: acabaram-se as desculpas. Para o bem e para o mal Portas fica no
epicentro da torre de controlo.
Maria Luís
Albuquerque Esteve na origem da ira de Portas quando Passos a escolheu para
substituir Gaspar e, à primeira oportunidade, mostrou ter mais faro político do
que alguns lhe reconhecem. Na ida a Bruxelas, explicou que vai trabalhar com
Portas “lado a lado”.
O CDS
desdramatizou e achou “óbvio”. Os aplausos do Eurogrupo e do BCE à sua entrada
em cena confirmam: simboliza a continuidade que os credores desejam. Passos
dá-lhe apoio.
António Pires
de Lima Com dois anos de atraso, Passos aceita dar a Economia ao CDS e ao
ministeriável que meio mundo dizia ser a pessoa certa para lugar. O presidente
da Unicer aceitou abdicar da Energia e do Trabalho, mas quer linha direta com o
investimento estrangeiro – ou seja, no novo desenho, a AICEP é central para a
Economia e não ficará nos Negócios Estrangeiros, para onde Portas arrastou a
agência. Resta saber se voltaria para a tutela da Economia ou permaneceria na
mão de Portas. Mas se Cavaco mantiver o Executivo a prazo por um ano
dificilmente Pires de Lima se mantém disponível. Em tão poucos meses não há
milagres.
Jorge Moreira
da Silva Foi convidado por Passos para o arranque do Governo e desconvidado por
causa dos equilíbrios com o CDS. Agora, com o Ambiente separado da Agricultura,
viria para a sua pasta natural, acumulando a Energia, como sempre defendeu.
Nuno Brito Passos
e Portas prefeririam dar o MNE a um diplomata de carreira e Nuno Brito,
embaixador em Washington e ex-colaborador de Durão Barroso, foi um nome sobre a
mesa. Passos não o terá chegado a convidar e houve lóbis a mover-se contra ele.
Mas ainda pode vir.
Assunção
Cristas Perdia meio megaministério (o Ambiente) mas ficava com a metade de que
sempre gostou (a Agricultura). Há uns meses não aceitou esta versão e essa
intransigência pode ter inviabilizado uma remodelação maior mais cedo. Mas
agora, com o Governo em risco e tendo em conta os ganhos acumulados pelo CDS,
não fez questão.
Pedro Mota
Soares Continua na Segurança Social, mas com mais poderes. Fica com a tutela do
Emprego, o que acaba por consagrar o papel que já desempenhava na concertação
social, onde foi muitas vezes o bombeiro de serviço.
Expresso, 13 Julho 2013
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