segunda-feira, 15 de julho de 2013

Indignidade

Por MARINHO E PINTO Bastonário da Ordem dos Advogados

A propósito de uma participação disciplinar feita pelo Ministério da Justiça contra um advogado por uma (inexistente) irregularidade no âmbito do apoio judiciário, um membro do atualCon- Superior (CS) da Ordem dos Advogados acusou-me, numa decisão por si subscrita, de falsidades que, claramente, o tomam indigno das funções que exerce no supremo órgão jurisdicional da OA.

Escreveu ele que eu recusara "qualquer colaboração institucional na despistagem das situações anómalas verificadas na auditoria" ao sistema de apoio judiciário e que a opção da ministra de "comunicar publicamente a decisão de remeter as 'anomalias' para o Ministério Público" se devera à "falta de colaboração da Ordem dos Advogados". Sublinhou ainda que a ministra e o bastonário "perderam ambos a oportunidade de mostrarem que estão à altura das responsabilidades para que foram eleitos" e afirmou que "foram os advogados portugueses difamados pelo Governo de Portugal e a Ordem dos Advogados nada fez para o impedir, para além das manifestações públicas de tipo panfletário e da fulanização do discurso".

O que espanta nesta prosa insidiosa é o facto de nada ter a ver com o assunto sobre o qual o membro do CS foi chamado a decidir: uma participação disciplinar (assente numa queixa-crime) em que ao advogado visado eram imputados factos totalmente falsos, ou seja, de "ter feito constar ter tido intervenção em cinco sessões de julgamento" no âmbito de um determinado processo, o que não teria sido confirmado pela auditoria do MJ. Sucede que o MP arquivou liminarmente o caso e nem sequer constituiu o advogado em causa como arguido, pois imediatamente comprovou que ele, não só tinha estado presente nas cinco sessões do referido julgamento, como, inclusivamente, tinha comparecido a uma sexta sessão que não chegara a realizar-se por falta do juiz.

Depois, é o facto de o membro do CS falsear a realidade, acusando o bastonário de recusar qualquer colaboração institucional com o MJ e atribuindo a essa suposta recusa a causa da campanha de calúnias que o Governo lançou publicamente sobre os advogados que prestam serviço no sistema de acesso ao direito. Importa frisar que a OA e em particular eu próprio desde o início nos dispusemos a colaborar na realização da auditoria pretendida pelo MJ para apurar eventuais irregularidades e punir os seus autores, mas que nos recusámos a participar no enxovalho público dos advogados como pretendia (e fez) o MJ ao propalar, ainda antes da auditoria, que mais de um terço dos advogados do apoio judiciário cometia fraudes.

Denunciámos e combatemos essa estratégia caluniadora do MJ apoiada com inusitada perfídia por alguns setores da OA que apoiavam a ministra - primeiro publicamente (aplausos no Congresso dos Advogados quando ela atacou o bastonário e fugiu atabalhoadamente) e depois às escondidas (reuniões conspirativas no MJ com alguns dirigentes da OA). Agora, fracassada rotundamente a estratégia do MJ (e dos seus apoiantes dentro da OA) de isolar o bastonário e o Conselho Geral da OA para destruir o sistema de apoio judiciário, tentam misturar as coisas dizendo que "ambos" são os responsáveis pelos males feitos à advocacia pela ministra.

É preciso dizer com clareza que, ao contrário da infâmia lançada por este membro do CS, foi a oposição determinada da Direção da Ordem, nomeadamente minha e da 1ª vice-presidente do CG, dra. Elina Fraga, à estratégia do MJ e dos seus aliados dentro da OA que impediu a destruição do sistema de apoio judiciário e a subordinação da advocacia portuguesa, enquanto profissão Liberal e independente, aos interesses das grandes empresas de advogados de Lisboa e do Porto.

Sempre defendi que a OA só faz sentido se for capaz de exercer um efetivo poder disciplinar sobre os seus membros. Mas para isso são necessários órgãos jurisdicionais constituídos por pessoas com qualidades éticas acima da média para poderem julgar outros colegas, nomeadamente, grandeza de caráter e isenção na sua atuação, e não por advogados mesquinhos, que utilizem essas funções para agredirem outros órgãos da OA e, sobretudo, para bolçarem nas suas decisões as frustrações e os rancores que os corroem por dentro.

Jornal Notícias15­-07-­2013

Sem comentários: