Com
o desenrolar da crise política nos exactos moldes em que aconteceu, não há
espaço político para Cavaco Silva fazer outra coisa que não seja aceitar a
proposta que o primeiro-ministro lhe levou. Caso não a aceitasse, seria o
Presidente a ficar responsável em exclusivo pela condução da crise e a assumir
os riscos de soluções alternativas que viesse a encontrar. Ora, o Presidente
não tem nem espaço, nem perfil, para o fazer.
A
partir do momento em que recusou uma primeira proposta de Governo sem Paulo
Portas e impôs condições, entre elas a de que os dois líderes dos dois partidos
da coligação integrassem o executivo, Cavaco Silva passou a ser também
co-responsável pela solução que lhe é apresentada agora. E é de acreditar que
Passos Coelho ontem não tornaria público que Paulo Portas é
vice-primeiro-ministro com pelouros específicos, se não tivesse já sinais
institucionais positivos por parte da Presidência.
Cavaco,
Passos e Portas estão juntos no mesmo barco. E a recusa desta solução seria
vista como uma tentativa de humilhação do primeiro-ministro. Ora, não é sequer
imaginável que Cavaco venha a assumir um comportamento desses, em nenhuma
circunstância.
Por
outro lado, Cavaco não é um político ousado, que corra riscos. Todo o seu
percurso político mostra como é institucional, legalista, conservador. É também
sabido que tem dito, em vários tons e em diversos registos, que considera que
não é necessário eleições e que a maioria parlamentar tem legitimidade
eleitoral para quatro anos. Tem--no feito desde a mensagem de Ano Novo. E tem
argumentado peremptoriamente que os riscos para o país da antecipação de
eleições são, na sua opinião, gravíssimos, pois precipitaria um segundo resgate
financeiro.
Já
quanto à hipótese de que o Presidente viesse a assumir o risco de nomear um
governo de sua iniciativa, ela não existe sequer no quadro constitucional
pós-revisão de 1982. Um governo em Portugal tem de emanar sempre de uma base de
apoio parlamentar.
Mais.
É perante o Parlamento que responde e é a este segundo órgão de soberania que
vai buscar legitimidade. Assim, qualquer governo terá sempre de sair de um
acordo feito pelos partidos na Assembleia, como o que existe hoje entre o PSD e
o CDS.
É
certo que o Presidente poderia promover uma tentativa de acordo alargado, ou
seja, poderia procurar patrocinar um governo em que o PS estivesse presente,
ainda que o secretário-geral, António José Seguro, não se sentasse no Conselho
de Ministros e o executivo fosse integrado apenas por outros nomes do universo
dos socialistas.
Mas
Seguro foi já cristalino ao afirmar que o PS só fala sobre a constituição de
governos depois de se realizarem eleições. E, tanto quanto se sabe, o líder do
PS ainda não recorreu ao mesmo dicionário de português flutuante que tem sido
usado pelo CDS: em que na mesma semana Portas disse que a sua saída era
"irrevogável" e, depois, aceitou ficar, e em que o porta-voz do CDS,
João Almeida, garantiu que "não há recuo".
Público,
7 de Julho de 2013
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