Garcia Pereira vai patrocinar queixa sobre RTP ao Ministério Público
Jurista
avisou que, se mais ninguém avançar, ele próprio apresentará uma queixa no MP
para que se investigue, fora da RTP, o caso das imagens. Nuno Santos fala hoje
sobre a suspensão e o processo disciplinar
O
advogado António Garcia Pereira ofereceu-se e a Comissão de Trabalhadores
aceitou. O órgão representativo dos trabalhadores do grupo de TV e rádio
públicas vai apresentar uma queixa ao Ministério Público (MP) para que o caso
do acesso, pela PSP, às imagens dos confrontos do dia da greve geral seja
"investigado fora da RTP". "Não aceitamos este linchamento do
ex-director de Informação e queremos que o caso seja investigado a fundo por
uma entidade fora da RTP e independente", afirmou ao PÚBLICO Camilo
Azevedo, um dos representantes da Comissão de Trabalhadores (CT).
A CT
organizou ontem à tarde na RTP o debate Caso
Brutosgate: Perspectivas Jurídicas e Deontológicas para analisar a
polémica das imagens em bruto captadas pelos repórteres da RTP e que a PSP
visualizou, sem mandado judicial, a 15 de Novembro, nas instalações da TV
pública. O debate foi acompanhado por cerca de três dezenas de trabalhadores,
boa parte deles jornalistas e câmaras, e até pelo administrador Beato Teixeira.
"Estou
disponível para, com a CT, qualquer pessoa daqui ou o Sindicato dos
Jornalistas, patrocinar uma ou várias queixas que visem colocar o MP a
investigar as várias e sucessivas violações da lei", disponibilizou-se
Garcia Pereira. E "se mais ninguém o fizer, tenciono eu próprio apresentar
queixa", garantiu, acusando o MP de "dormir tranquilamente" por,
quase um mês depois, ainda não ter reagido. Em causa estão crimes públicos,
como é a entrada do serviço secreto de informações da PSP na RTP da maneira que
o fez. Só podia entrar com mandado judicial, acompanhada por um juiz e um
representante do Sindicato dos Jornalistas. Além disso, há violação do dever e
do direito do sigilo profissional. Tudo isto "abre um sério precedente"
e "configura não apenas uma ilegalidade mas mesmo um crime".
Como
não foi pedida autorização à Comissão Nacional de Protecção de Dados para
filmar a manifestação, a PSP precisava de arranjar provas
"certificadas" e que fossem aceites em tribunal - daí o pedido de
gravação com o logotipo da RTP. Guilherme da Fonseca, juiz jubilado do Tribunal
Constitucional, considera que "essa gravação não vale nada. E pior do que
isso: é ilegítima, é ilegal e é passível de procedimento criminal".
Garcia
Pereira não se coibiu de deixar fortes críticas à actuação da equipa de Alberto
da Ponte. E classificou mesmo Luís Marinho como "emissário político de
Relvas na RTP". Realçando ter tido desavenças com Nuno Santos sobre a
cobertura da campanha eleitoral, Garcia Pereira tomou, no entanto, o seu
partido. "Quando uma administração decide desnomear toda a gente que tem
determinados cargos para limpar e depois fazer regressar quem interessa...
cheira a esturro." O jurista argumentou que se foram usados os mesmos
argumentos para toda a direcção de Informação, estes deveriam ser extensíveis
ao director-geral de Conteúdos, mas afinal não afectaram Luís Marinho.
A
avaliar pela descrição de jornalistas e repórteres de imagem, o sistema de
arquivo temporário onde as imagens captadas pelas câmaras da RTP são guardadas
é muito vulnerável. Quando uma equipa chega da rua, "despeja" as
imagens para um banco central de imagens e estas ficam disponíveis para
jornalistas e técnicos. Tendo em conta que a RTP funciona como host broadcaster para a Eurovisão, pode
até acontecer que imagens dos confrontos que não passaram na TV pública tenham
sido vistas noutros países. O processo de acesso às imagens tem um registo
muito informal. Não há sequer condicionalismos de acesso. O que levou alguns
profissionais a aventar a possibilidade de passar a existir um controlo
informático. "Isto vai exigir que estejamos infinitamente mais atentos e
exigir dos nossos responsáveis directos que tenham atitude e protecção dos seus
jornalistas que neste caso não aconteceu", afirmava uma jornalista.
Recordando
que o acesso da polícia a imagens da RTP já ocorreu no passado, a jornalista
Diana Andringa contou que foi envolvida num caso desses, quando nos anos 1980 a
PJ acedeu a imagens de reportagens suas sobre a polémica da Dona Branca. Otília
Leitão, vice-presidente do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas -
órgão que também está a analisar o caso -, realçou que a protecção do Estatuto
do Jornalista alargou a protecção das fontes a documentos como cassetes e
blocos de notas e que "falta regulamentar" a excepção ao sigilo
profissional consignada no Código de Processo Penal em situações de segurança
do Estado e crimes graves. "O jornalismo não é só a lei, mas um conjunto
de práticas de cultura profissional", avisou.
Depois
de ter prometido falar na sexta-feira passada, o ex-director de Informação Nuno
Santos dá hoje ao fim da manhã uma conferência de imprensa para falar sobre a
sua suspensão e processo disciplinar.
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