Tribunal. Decisão do Presidente da República de
suscitar fiscalização sucessiva não impedirá deputados da oposição de fazer o
mesmo
Confirmando-se a intenção presidencial de só pedir a intervenção do Tribunal Constitucional depois de promulgar o OE 2013, acontecerá então o seguinte: os juizes terão de olhar para o documento por duas vezes, a primeira por iniciativa de Cavaco Silva, a segunda por iniciativa de deputados da oposição. O mais provável é que o PR e os deputados tenham dúvidas sobre matérias diferentes
Constitucional terá de fiscalizar OE duas vezes
Tribunal. Presidente da República deve promulgar documento e pedir fiscalização sucessiva de várias normas. Esquerda mantém intenção de o fazer, mas pede a Cavaco que atue antes
MIGUEL MARUJO
Os juizes do Tribunal Constitucional vão analisar duas vezes o Orçamento do Estado (OE), confirmando-se a notícia de que Cavaco Silva promulgará o texto aprovado pelo PSD e CDS e que pedirá a fiscalização sucessiva de algumas normas. Segundo o Expresso de ontem, o Presidente da República prefere promulgar agora e esclarecer as dúvidas depois. No entendimento do Palácio de Belém (que não confirmou nem desmentiu a informação, como não respondeu ao DN desde sexta-feira), assim não se assustam os mercados, por eventualmente o OE não entrar em vigor a 1 de janeiro de 2013, o Governo terá mais tempo para pensar em alternativas a um possível chumbo e os juizes terão prazo mais alargado do que aquele que é imposto por um pedido de fiscalização preventiva. O facto de Cavaco pedir a fiscalização sucessiva, não impedirá que, à esquerda, deputados avancem com o "seu" pedido. Assim o confirmou o Bloco de Esquerda ao DN, mas também Isabel Moreira (a deputada do PS sublinhou tratar-se de uma "opinião pessoal"). Para os bloquistas, "independentemente de o Presidente da República pedir ou não a fiscalização sucessiva do OE, o Bloco irá fazê-lo contando com as forças políticas que tiverem essa disponibilidade". Jerónimo de Sousa sublinhou ontem, à margem da manifestação da CGTP em Lisboa, citado pela Lusa, que"àluz da Constituição da República, tendo em conta a natureza e os objetivos do Orçamento dp Estado para 2013, o Presidente da República só tinha uma posição de fundo: vetar o Orçamento e recorrer ao Tribunal Constitucional". O secretário-geral do PCP considerou que a possibilidade de Cavaco promulgar o texto "é uma hipótese já recuada". O líder da central sindical, Arménio Carlos, preferiu chamar a atenção para a "trapalhada de todo o tamanho" que poderá ser a promulgação do documento do Governo. "Tudo isto é possível de evitar", antecipou Arménio Carlos.
Também Catarina Martins, coordenadora do BE, reiterou, na mesma ocasião, a necessidade de o Presidente suscitar a fiscalização até quarta, dia em que caduca a possibilidade de o fazer. "Se o Presidente da República tem dúvidas sobre a constitucionalidade, o que deve pedir é a fiscalização preventiva do Orçamento do Estado. É o único que tem esse instrumento." A deputada independente eleita pelo PS disse ao DN que é seu "entendimento" que o facto de Cavaco suscitar a análise do OE "não prejudica os outros pedidos de fiscalização, por estarem várias normas em causa e a justificação [poder] ser diferente. Falando por mim, não muda em nada", defendeu Isabel Moreira.
Já António José Seguro apontou o facto de que "o País tem a ganhar que o Orçamento entre em vigor no dia 1 de janeiro, descontaminado de quaisquer dúvidas sobre a sua constitucionalidade". "Mas este é o tempo do senhor Presidente da República e eu não vou pressionar" Cavaco Silva. "Depois segue-se o tempo dos deputados", disse o líder do PS, citado pela Lusa. "O que importa é saber o que realmente vai fazer o Presidente da República, que normas suscitarão dúvidas", disse uma fonte socialista ao DN.
Pelo Executivo reagiram Miguel Relvas e Aguiar-Branco. Os dois ministros sublinharam que o OE é constitucional. O ministro da Defesa disse que "o Governo está convencido de que o Orçamento é constitucional (...) e respeita tudo o que tem que ver com as regras da democracia e das competências que são exercidas pelos restantes órgãos".
Cavaco pode suscitar dúvidas sobre norma que o atinge diretamente pensões J?residente optou por receber reformas em detrimento de salário. Agora vai ter mais cortes do que se tivesse optado ao contrário As pensões estão entre as normas que suscitam dúvidas constitucionais em Belém. E um ponto que a maioria diz que está entre as que o PR enviará para o TC fiscalizar, se for essa a sua opção. E esta é uma norma que atinge diretamente
Cavaco Silva, que recebe por mês cerca de 10 100 euros de pensões (valores brutos).
O Presidente abdicou do ordenado devido pela sua função, em 2011, por ter sido obrigado a escolher entre esse salário e as duas reformas que acumula (de professor universitário e do Banco de Portugal), por estas serem superiores (141 519,56 euros, segundo a declaração de rendimentos em 2010) ao ordenado da Presidência (138 942,02 euros). Esta opção trará mais cortes a Cavaco, uma vez que os pensionistas serão mais penalizados em sede de IRS, em 2013, do que aqueles que trabalham. Os reformados vão ter de pagar uma "contribuição especial de solidariedade" (CES) sobre as pensões, de 3,5% a partir dos 1350 euros, valor que chega aos 40% no caso de pensões com valores acima dos 7545,96 euros, o que será o caso do Presidente da República. O conselheiro de Estado, Bagão Félix, antigo ministro das Finanças, considerou há pouco tempo esta CES como inconstitucional. "Na minha opinião, indiscutivelmente que é inconstitucional por várias razões. Já começa a ser difícil visualizar toda esta soma de impostos e taxas, numa cascata sem decoro", criticou. Também Eduardo Catroga, antigo ministro das Finanças de Cavaco e conselheiro de Passos Coelho, apontou essa eventual inconstitucionalidade. m.m.
O que é a fiscalização sucessiva de constitucionalidade?
É aquela que ocorre depois da promulgação de um diploma, não suspendendo portanto a sua entrada em vigor.
Que prazos tem o Presidente da República?
Até dia 19 para pedir, caso o queira, a fiscalização preventiva de constitucionalidade. Se quiser promulgar o decreto e só depois acionar a intervenção do TC tem até dia 31.
O TC tem prazos para decidir no caso de fiscalização sucessiva de constitucionalidade?
Não. Mas o Presidente pode pedir-lhe celeridade.
Que normas doOE2013 têm sido mais criticadas, do ponto de vista da sua eventual inconstitucionalidade?
As relativas aos cortes nas pensões, os novos escalões do IRS e os cortes nos subsídios de férias e de Natal, além de alegadas diferenças entre taxação do trabalho e taxação do capital.
O Presidente poderia pedir ao TC uma fiscalização genérica da constitucionalidade do OE 2013?
Não. O Presidente - e quem quer que recorra ao Tribunal - tem de indicar com grande grau de precisão que normas quer ver esclarecidas e porquê. E só essas é que os juizes irão analisar.
O que acontecerá se o TC chumbar normas do Orçamento?
Depende do tipo de decisão. Na relativa ao OE 2012 não foi preciso uma intervenção retificadora do Parlamento porque o TC, embora decretando inconstitucionais as normas cortando os subsídios de férias e de Natal da função pública e dos pensionistas, decretou também suspender os efeitos dessa decisão, só tendo de ser acatada no OE 2013. Mas, se a decisão for "normal" (não autossuspensiva dos seus efeitos), o OE 2013 será devolvido à AR para a norma chumbada ser retificada. Os efeitos que teve até lá terão de ser cancelados.
Quantos deputados são necessários para suscitar uma fiscalização sucessiva de constitucionalidade?
23, ou seja, um décimo dos 230 deputados. O número de atuais "voluntários" é já mais do que suficiente. Toda a oposição deverá apoiar esta iniciativa.
Confirmando-se a intenção presidencial de só pedir a intervenção do Tribunal Constitucional depois de promulgar o OE 2013, acontecerá então o seguinte: os juizes terão de olhar para o documento por duas vezes, a primeira por iniciativa de Cavaco Silva, a segunda por iniciativa de deputados da oposição. O mais provável é que o PR e os deputados tenham dúvidas sobre matérias diferentes
Constitucional terá de fiscalizar OE duas vezes
Tribunal. Presidente da República deve promulgar documento e pedir fiscalização sucessiva de várias normas. Esquerda mantém intenção de o fazer, mas pede a Cavaco que atue antes
MIGUEL MARUJO
Os juizes do Tribunal Constitucional vão analisar duas vezes o Orçamento do Estado (OE), confirmando-se a notícia de que Cavaco Silva promulgará o texto aprovado pelo PSD e CDS e que pedirá a fiscalização sucessiva de algumas normas. Segundo o Expresso de ontem, o Presidente da República prefere promulgar agora e esclarecer as dúvidas depois. No entendimento do Palácio de Belém (que não confirmou nem desmentiu a informação, como não respondeu ao DN desde sexta-feira), assim não se assustam os mercados, por eventualmente o OE não entrar em vigor a 1 de janeiro de 2013, o Governo terá mais tempo para pensar em alternativas a um possível chumbo e os juizes terão prazo mais alargado do que aquele que é imposto por um pedido de fiscalização preventiva. O facto de Cavaco pedir a fiscalização sucessiva, não impedirá que, à esquerda, deputados avancem com o "seu" pedido. Assim o confirmou o Bloco de Esquerda ao DN, mas também Isabel Moreira (a deputada do PS sublinhou tratar-se de uma "opinião pessoal"). Para os bloquistas, "independentemente de o Presidente da República pedir ou não a fiscalização sucessiva do OE, o Bloco irá fazê-lo contando com as forças políticas que tiverem essa disponibilidade". Jerónimo de Sousa sublinhou ontem, à margem da manifestação da CGTP em Lisboa, citado pela Lusa, que"àluz da Constituição da República, tendo em conta a natureza e os objetivos do Orçamento dp Estado para 2013, o Presidente da República só tinha uma posição de fundo: vetar o Orçamento e recorrer ao Tribunal Constitucional". O secretário-geral do PCP considerou que a possibilidade de Cavaco promulgar o texto "é uma hipótese já recuada". O líder da central sindical, Arménio Carlos, preferiu chamar a atenção para a "trapalhada de todo o tamanho" que poderá ser a promulgação do documento do Governo. "Tudo isto é possível de evitar", antecipou Arménio Carlos.
Também Catarina Martins, coordenadora do BE, reiterou, na mesma ocasião, a necessidade de o Presidente suscitar a fiscalização até quarta, dia em que caduca a possibilidade de o fazer. "Se o Presidente da República tem dúvidas sobre a constitucionalidade, o que deve pedir é a fiscalização preventiva do Orçamento do Estado. É o único que tem esse instrumento." A deputada independente eleita pelo PS disse ao DN que é seu "entendimento" que o facto de Cavaco suscitar a análise do OE "não prejudica os outros pedidos de fiscalização, por estarem várias normas em causa e a justificação [poder] ser diferente. Falando por mim, não muda em nada", defendeu Isabel Moreira.
Já António José Seguro apontou o facto de que "o País tem a ganhar que o Orçamento entre em vigor no dia 1 de janeiro, descontaminado de quaisquer dúvidas sobre a sua constitucionalidade". "Mas este é o tempo do senhor Presidente da República e eu não vou pressionar" Cavaco Silva. "Depois segue-se o tempo dos deputados", disse o líder do PS, citado pela Lusa. "O que importa é saber o que realmente vai fazer o Presidente da República, que normas suscitarão dúvidas", disse uma fonte socialista ao DN.
Pelo Executivo reagiram Miguel Relvas e Aguiar-Branco. Os dois ministros sublinharam que o OE é constitucional. O ministro da Defesa disse que "o Governo está convencido de que o Orçamento é constitucional (...) e respeita tudo o que tem que ver com as regras da democracia e das competências que são exercidas pelos restantes órgãos".
Cavaco pode suscitar dúvidas sobre norma que o atinge diretamente pensões J?residente optou por receber reformas em detrimento de salário. Agora vai ter mais cortes do que se tivesse optado ao contrário As pensões estão entre as normas que suscitam dúvidas constitucionais em Belém. E um ponto que a maioria diz que está entre as que o PR enviará para o TC fiscalizar, se for essa a sua opção. E esta é uma norma que atinge diretamente
Cavaco Silva, que recebe por mês cerca de 10 100 euros de pensões (valores brutos).
O Presidente abdicou do ordenado devido pela sua função, em 2011, por ter sido obrigado a escolher entre esse salário e as duas reformas que acumula (de professor universitário e do Banco de Portugal), por estas serem superiores (141 519,56 euros, segundo a declaração de rendimentos em 2010) ao ordenado da Presidência (138 942,02 euros). Esta opção trará mais cortes a Cavaco, uma vez que os pensionistas serão mais penalizados em sede de IRS, em 2013, do que aqueles que trabalham. Os reformados vão ter de pagar uma "contribuição especial de solidariedade" (CES) sobre as pensões, de 3,5% a partir dos 1350 euros, valor que chega aos 40% no caso de pensões com valores acima dos 7545,96 euros, o que será o caso do Presidente da República. O conselheiro de Estado, Bagão Félix, antigo ministro das Finanças, considerou há pouco tempo esta CES como inconstitucional. "Na minha opinião, indiscutivelmente que é inconstitucional por várias razões. Já começa a ser difícil visualizar toda esta soma de impostos e taxas, numa cascata sem decoro", criticou. Também Eduardo Catroga, antigo ministro das Finanças de Cavaco e conselheiro de Passos Coelho, apontou essa eventual inconstitucionalidade. m.m.
O que é a fiscalização sucessiva de constitucionalidade?
É aquela que ocorre depois da promulgação de um diploma, não suspendendo portanto a sua entrada em vigor.
Que prazos tem o Presidente da República?
Até dia 19 para pedir, caso o queira, a fiscalização preventiva de constitucionalidade. Se quiser promulgar o decreto e só depois acionar a intervenção do TC tem até dia 31.
O TC tem prazos para decidir no caso de fiscalização sucessiva de constitucionalidade?
Não. Mas o Presidente pode pedir-lhe celeridade.
Que normas doOE2013 têm sido mais criticadas, do ponto de vista da sua eventual inconstitucionalidade?
As relativas aos cortes nas pensões, os novos escalões do IRS e os cortes nos subsídios de férias e de Natal, além de alegadas diferenças entre taxação do trabalho e taxação do capital.
O Presidente poderia pedir ao TC uma fiscalização genérica da constitucionalidade do OE 2013?
Não. O Presidente - e quem quer que recorra ao Tribunal - tem de indicar com grande grau de precisão que normas quer ver esclarecidas e porquê. E só essas é que os juizes irão analisar.
O que acontecerá se o TC chumbar normas do Orçamento?
Depende do tipo de decisão. Na relativa ao OE 2012 não foi preciso uma intervenção retificadora do Parlamento porque o TC, embora decretando inconstitucionais as normas cortando os subsídios de férias e de Natal da função pública e dos pensionistas, decretou também suspender os efeitos dessa decisão, só tendo de ser acatada no OE 2013. Mas, se a decisão for "normal" (não autossuspensiva dos seus efeitos), o OE 2013 será devolvido à AR para a norma chumbada ser retificada. Os efeitos que teve até lá terão de ser cancelados.
Quantos deputados são necessários para suscitar uma fiscalização sucessiva de constitucionalidade?
23, ou seja, um décimo dos 230 deputados. O número de atuais "voluntários" é já mais do que suficiente. Toda a oposição deverá apoiar esta iniciativa.
Diário de Notícias, 16-12-2012
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