Muitos dizem que o drama português começou a 7 de
Setembro, quando Passos Coelho anunciou o aumento da TSU. Mas é bom não
esquecer que o que deu origem a este tiro no pé (e no corpo todo) do
primeiro-ministro foi o 5 de Julho. Foi a 5 de Julho que o Tribunal
Constitucional divulgou o acordão 353/2012 que declarou a inconstitucionalidade
do corte dos subsídios de férias e de Natal da Função Pública, reformados e
pensionistas (no âmbito do pedido de fiscalização sucessiva da
constitucionalidade do OE 2012).
Esta peça jurídica foi
muito para além do domínio técnico e entrou no campo político, das opções do
legislador, extravasando as atribuições do Tribunal Constitucional.
Deste modo, as
apreciações feitas no domínio da constitucionalidade pelo acórdão foram
prejudicadas na sua solidez pelas de carácter político. O acórdão 353/2012 até
aceitou à necessidade de o Governo ter recursos financeiros rápidos para cumprir
o memorando com a troika (e deu margem à tese de os trabalhadores da Função
Pública terem um estatuto privilegiado em relação ao setor privado) mas o facto
é que aconselhou (mandou) o executivo procurar dinheiro noutras fontes,
sobretudo do lado da…. despesa. O acórdão refere-se, por exemplo, a “outras
proveniências e rubricas do lado da despesa, sobre as quais tanto tem incidido
o discurso político e tão omisso ou inexpressivo é a LOE 2012″ (repare-se na
palmoada aos políticos).
Também a “reduções de
despesa a obter, em termos passíveis de especificação quantificada no OE por
específicas reformas nas estruturas do sector público e reengenharia do
procedimento público”.
Repare-se no termo
“reengenharia”. Terá o Tribunal Constitucional sugerido “avant la lettre” a
refundação do memorando de Passos Coelho. É que se o fez, os juízes do Palácio
Ratton podiam estar a sugerir o corte de 4 mil milhões de euros nas despesas
sociais do Estado…. o corte que hoje ninguém quer. Como ninguém quer o choque
fiscal. E muito menos a TSU…
A poucos dias de se
saber se Cavaco Silva promulga o OE 2013 ou se pede a fiscalização preventiva
da constitucionalidade, convém, de facto, recordar o programa político do
Tribunal Constitucional enunciado (como se fosse um contrato eleitoral) no
acórdão 353/2012.
O perigo de os juízes
do Palácio Ratton voltarem a fazer apreciações políticas em relação à
fiscalização do OE 2013 é muito alto.
No acórdão 353/2012 até
há uma parte onde dá para fazer já um corta e cola com destino ao texto do
próximo acórdão sobre o OE 2013: “não possa ser ignorado que (o corte de
subsídios de férias e de Natal na Função Pública, pensionistas e reformados)
determina automaticamente uma diminuição da receita do IRS e das contribuições
para a Segurança Social e tem efeitos recessivos no consumo interno, com a
consequente diminuição generalizada das receitas públicas” (se calhar o TC
também inventou o mulltiplador automático antes do próprio Cavaco) É claro que
enunciar propostas quando não temos de as executar , como acontece aos juízes
do Palácio Ratton, é muito fácil. Daí que quase apeteça ter o desabafo à
Manuela Ferreira Leite: uns meses sem o Tribunal Constitucional não seria uma
boa medida para meter o país nos eixos?
Expresso OnLine,
28 Novembro 2012
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