quarta-feira, 28 de novembro de 2012

E que tal uns meses de ditadura sem… o Tribunal Constitucional


Muitos dizem que o drama português começou a 7 de Setembro, quando Passos Coelho anunciou o aumento da TSU. Mas é bom não esquecer que o que deu origem a este tiro no pé (e no corpo todo) do primeiro-ministro foi o 5 de Julho. Foi a 5 de Julho que o Tribunal Constitucional divulgou o acordão 353/2012 que declarou a inconstitucionalidade do corte dos subsídios de férias e de Natal da Função Pública, reformados e pensionistas (no âmbito do pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade do OE 2012).
Esta peça jurídica foi muito para além do domínio técnico e entrou no campo político, das opções do legislador, extravasando as atribuições do Tribunal Constitucional.
Deste modo, as apreciações feitas no domínio da constitucionalidade pelo acórdão foram prejudicadas na sua solidez pelas de carácter político. O acórdão 353/2012 até aceitou à necessidade de o Governo ter recursos financeiros rápidos para cumprir o memorando com a troika (e deu margem à tese de os trabalhadores da Função Pública terem um estatuto privilegiado em relação ao setor privado) mas o facto é que aconselhou (mandou) o executivo procurar dinheiro noutras fontes, sobretudo do lado da…. despesa. O acórdão refere-se, por exemplo, a “outras proveniências e rubricas do lado da despesa, sobre as quais tanto tem incidido o discurso político e tão omisso ou inexpressivo é a LOE 2012″ (repare-se na palmoada aos políticos).
Também a “reduções de despesa a obter, em termos passíveis de especificação quantificada no OE por específicas reformas nas estruturas do sector público e reengenharia do procedimento público”.
Repare-se no termo “reengenharia”. Terá o Tribunal Constitucional sugerido “avant la lettre” a refundação do memorando de Passos Coelho. É que se o fez, os juízes do Palácio Ratton podiam estar a sugerir o corte de 4 mil milhões de euros nas despesas sociais do Estado…. o corte que hoje ninguém quer. Como ninguém quer o choque fiscal. E muito menos a TSU…
A poucos dias de se saber se Cavaco Silva promulga o OE 2013 ou se pede a fiscalização preventiva da constitucionalidade, convém, de facto, recordar o programa político do Tribunal Constitucional enunciado (como se fosse um contrato eleitoral) no acórdão 353/2012.
O perigo de os juízes do Palácio Ratton voltarem a fazer apreciações políticas em relação à fiscalização do OE 2013 é muito alto.
No acórdão 353/2012 até há uma parte onde dá para fazer já um corta e cola com destino ao texto do próximo acórdão sobre o OE 2013: “não possa ser ignorado que (o corte de subsídios de férias e de Natal na Função Pública, pensionistas e reformados) determina automaticamente uma diminuição da receita do IRS e das contribuições para a Segurança Social e tem efeitos recessivos no consumo interno, com a consequente diminuição generalizada das receitas públicas” (se calhar o TC também inventou o mulltiplador automático antes do próprio Cavaco) É claro que enunciar propostas quando não temos de as executar , como acontece aos juízes do Palácio Ratton, é muito fácil. Daí que quase apeteça ter o desabafo à Manuela Ferreira Leite: uns meses sem o Tribunal Constitucional não seria uma boa medida para meter o país nos eixos?
Expresso OnLine, 28 Novembro 2012

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