EDITORIAL
Um
Governo abaixo do limiar da vergonha
O
executivo mostrou não ter pudor em penalizar os mais fracos como se
fossem privilegiados
Com
uma leviandade para lá do aceitável, em apenas 24 horas o ministro
da Solidariedade e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, propôs-se
primeiro reduzir em 10% o limite mínimo do subsídio de desemprego
para depois anunciar o recuo do Governo nessa matéria. Pelo caminho,
Mota Soares responsabilizou o PS por ter assinado um memorando com a
troika que previa a retirada de 350 milhões de euros em prestações
sociais. Como se o Governo fosse um paladino dos pobres que tivesse
sido obrigado por um acordo assinado com o PS a fazer estes cortes.
Não parece um discurso muito credível. Desde logo porque, se por um
lado o Governo decidiu recuar no subsídio de desemprego – e nesse
pára-arranca, durante 24 horas cerca de 150 mil beneficiários deste
subsídio ficaram sem saber com o que de facto podiam contar – por
outro nada disse de novo quanto reduções nos valores mínimos do
RSI e do complemento solidário para idosos que foram anunciadas ao
mesmo tempo. O que significa tudo isto? O que toda a gente
compreende: que não houve o menor escrúpulo em passar para os
ombros dos realmente mais desfavorecidos uma nova parcela da
austeridade. Fará sentido recordar aqui um estudo recente, assinado
pelo economista Carlos Farinha Rodrigues, apresentado este mês, no
qual explicava que prestações sociais como o RSI, entre outras,
eram responsáveis por uma redução da desigualdade social em
Portugal até 2009. Pondo em causa esse apoios, o que se está a
fazer é a aumentar deliberadamente as desigualdades e a desfazer o
já de si frágil Estado social que temos. Penalizar os escalões
mais baixos destes apoios sociais é deitar fora os ganhos sociais
que o país demorou anos a conquistar. Condenar os mais fracos a
viver ainda mais abaixo do limiar da pobreza, no auge da tormenta, é
algo que está para lá do limiar da vergonha.
Os
ciganos na Europa e a justiça histórica
Num
tempo em que a pobreza se vai expandindo por via da crise, a mais
pobre das minorias europeias viu ontem ser-lhe feita justiça
histórica: foi inaugurado na Alemanha, no centro de Berlim, o
primeiro Memorial ao Holocausto dos ciganos na II Guerra Mundial.
Enviados para trabalhos forçados pelos nazis, sujeitos a
esterilizações e a extermínio nos campos da morte (pelo menos meio
milhão terão sido mortos), durante muito tempo foram esquecidos. E
agora, que oficialmente já não o são, continuam alvo de
discriminações e de racismo, como é ainda visível por toda a
Europa. Daí que Angela Merkel, no seu discurso de homenagem, tenha
dito: “A homenagem às vítimas pressupõe também uma promessa, a
de proteger uma minoria, um dever de hoje e de amanhã.” Objectivo
que assumiu também como seu: “É dever da Alemanha e da Europa
apoiá-los.” Só que a prática europeia não acompanha tais
palavras. Servirão apenas para aliviar consciências?
Público feira,
25 Outubro 2012
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