PGR solicita que se apure alegados pagamentos ao ex-primeiro-ministro. Tribunal detectou “fortes indícios” de corrupção
O procurador-geral da República (PGR), Pinto Monteiro, enviou recentemente ao Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) todos os elementos de que dispunha no âmbito do caso Freeport e solicitou que se apure a eventual intervenção do ex-primeiro-ministro José Sócrates.
“O procurador-geral da República já remeteu à directora do DCIAP, Cândida Almeida, os elementos em poder da Procuradoria-Geral da República – cópia do acórdão do Tribunal Colectivo do Montijo e um CD contendo a gravação áudio da prova testemunhal produzida em julgamento”, disse ontem ao PÚBLICO a PGR. Ao que o PÚBLICO apurou, Pinto Monteiro resolveu diligenciar a situação junto do DCIAP, apesar da certidão extraída pelo Tribunal do Montijo ainda não ter chegado a esse departamento. O procurador, que cessa funções em Outubro, contactou o DCIAP, no final de Julho, logo após a decisão do processo ser tornada pública. Na sua decisão terá pesado o período de férias judiciais que se aproximava e que poderia atrasar mais o processo “que não foi considerado urgente”, explicou fonte judicial.
O PÚBLICO tentou, sem sucesso, contactar a directora do DCIAP. No final de Julho, os juízes do Tribunal do Montijo absolveram os dois arguidos no processo, Charles Smith e Manuel Pedro, do crime de extorsão, mas ordenaram a extracção de uma certidão para que sejam apurados “todos os factos” relativos à eventual intervenção de José Sócrates no caso e a existência de alegados pagamentos ao então ministro do Ambiente. Os juízes consideram que resultaram do julgamento “fortes indícios” de suspeitas de corrupção no Ministério do Ambiente e na administração pública à data do licenciamento do outlet de Alcochete. Para essa convicção contribuíram os depoimentos de três testemunhas consideradas credíveis e que referiram em tribunal que o antigo primeiroministro recebeu pagamentos em dinheiro para viabilizar o projecto. Os juízes decidiram então extrair uma certidão autónoma para que esses alegados pagamentos sejam apurados e Sócrates “se possa defender”.
Defender o nome
O colectivo de juízes recordou, durante a leitura do acórdão, que o antigo chefe de governo poderá assim defender o seu nome, após nunca ter sido ouvido em qualquer momento, quer na fase de inquérito, quer durante o julgamento como testemunha. O processo Freeport teve origem em alegadas ilegalidades na alteração da Zona de Protecção Especial do Estuário do Tejo (ZPET) para a construção do centro comercial.
No final do julgamento, Charles Smith e Manuel Pedro resolveram prestar declarações. Manuel Pedro admitiu ter ocorrido uma reunião, em Janeiro de 2001, com o então ministro do Ambiente, José Sócrates, marcada pelo presidente da Câmara de Alcochete, na época, o socialista José Dias Inocêncio. O encontro terá juntado o autarca, o ministro, o secretário de Estado do Ambiente, Rui Gonçalves, Garry Russel, director comercial do Freeport, Jonathan Rawnsely, administrador do Freeport, e Fernanda Vara Castor, na altura funcionária da Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território.
Já no decorrer do julgamento, Augusto Ferreira do Amaral, advogado e amigo de Manuel Pedro, disse que o arguido lhe tinha referido que o então ministro do Ambiente, José Sócrates, tinha exigido 2,5 milhões de euros para viabilizar o complexo comercial.
O advogado de Sócrates, Daniel Proença de Carvalho, rejeitou de imediato a tese. Ontem, questionado pelo PÚBLICO, o causídico não quis comentar a solicitação de Pinto Monteiro ao DCIAP. Contudo, em Julho, logo após a decisão do tribunal, Proença de Carvalho considerou “lamentável” que um tribunal retome as suspeitas “com base em depoimentos fantasistas e puramente caluniosos”.
Público (sábado, 22 Setembro 2012)
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