A lentidão da justiça, as teias da legislação, a politização da administração. Condenar em tribunal quem falha na governação é praticamente impossível
Os especialistas ouvidos pelo i não deixam dúvidas: o instrumento legal de que dispomos em Portugal só em teoria permite a responsabilização criminal dos políticos. Alberto legal de que dispomos em Portugal só em teoria permite a responsabilização criminal dos políticos. Alberto João Jardim pode dormir descansado. Isto apesar de a lei sobre crimes de responsabilidade de titulares de cargos políticos determinar pena com prisão até um ano ao titular de cargo político a quem, "por dever do seu cargo, incumbe dar cumprimento a normas de execução orçamental e conscientemente as viole". Este poderia ser o utensílio legal para responsabilizar Jardim pela ocultação das dívidas da Madeira. Teoricamente. O problema é que a lei faz depender o crime da prova de que o eleito teria tomado decisões dolosas contra o parecer técnico dos serviços sob a sua responsabilidade. Ora, numa administração excessivamente politizada, os serviços são convidados a fundamentar as decisões políticas e não o contrário.
O juiz-desembargador Rui Rangel lembra o caso do ex-primeiro-ministro da Islândia Geeir Haarde, que está a ser julgado pelo Tribunal Superior de Justiça em Reiquejavique, acusado de negligência grave no quadro do colapso do sistema financeiro do país, em 2008, para dizer que em Portugal nunca seria possível responsabilizar um político por actos praticados durante o exercício de um mandato. A opinião é partilhada por Eduardo Catroga, em declarações à TSF, que gostaria de ver o caso madeirense merecer "um tratamento exemplar do ponto de vista penal", mas reconhece que o quadro da chamada responsabilidade política não está suficientemente desenvolvido no nosso país.
"No nosso país a lei é tímida e confusa", acrescenta Rangel ao i. E porque "os arautos da democracia cega vêm logo defender que quem julga os políticos é o povo no acto eleitoral", diz. O argumento é avançado também por Jorge Bacelar Gouveia, constitucionalista e ex-presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações: "A má governação em si não é crime e só os eleitores podem julgá-la."
Rui Rangel, por seu lado, denuncia uma falha no regime jurídico político, "pois deveria ser possível interromper um mandato eleitoral em situações como a da Madeira e a da Islândia". Estes mecanismos poderiam ser criados pelo parlamento, "mas é o próprio legislador que não quer uma lei clara", acrescenta. Estamos "atrasados em relação a outros países europeus", remata.
Bacelar Gouveia admite que "em termos gerais deve haver um aprofundamento da lei", mas frisa não perceber onde está a consequência nas declarações sobre a Madeira: "Que fez o Tribunal de Contas para inverter a situação? E o TC é um órgão jurídico, decisório ou político, se diz que emitiu recomendações?" Segundo o antigo bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves, Alberto João Jardim pode vir a ser alvo de dois processos, "um de responsabilidade financeira no TC, que poderá determinar a aplicação de uma multa, e um segundo de eventual responsabilidade criminal, pelo crime de violação das normas de execução orçamental, com pena de prisão até um ano".
Lentidão Os desvios de contas da Madeira vão ser investigados pela Procuradoria-Geral da República, mas tal não abalará a governação de Jardim. Numa remota eventualidade de ser condenado, teria de abandonar a presidência, mas o processo pode arrastar-se para além do período da legislatura. Bacelar Gouveia defende que "é muito perigosa, a criminalização das decisões políticas" e considera que "isto é um pouco o que está a acontecer com o Dr. João Jardim", pois "o que falta na Região Autónoma da Madeira como na República é um mecanismo automático que impeça ultrapassar o limite orçamental". O mecanismo é difícil de pôr em acção, pois "teria de haver forma de cruzar informação sobre todos os processos de despesa, somar o total que se dispersa em diferentes áreas". E remata: "Se a República pediu empréstimo ao FMI, porque não pode a República ser o FMI da Madeira?"
O juiz-desembargador Rui Rangel lembra o caso do ex-primeiro-ministro da Islândia Geeir Haarde, que está a ser julgado pelo Tribunal Superior de Justiça em Reiquejavique, acusado de negligência grave no quadro do colapso do sistema financeiro do país, em 2008, para dizer que em Portugal nunca seria possível responsabilizar um político por actos praticados durante o exercício de um mandato. A opinião é partilhada por Eduardo Catroga, em declarações à TSF, que gostaria de ver o caso madeirense merecer "um tratamento exemplar do ponto de vista penal", mas reconhece que o quadro da chamada responsabilidade política não está suficientemente desenvolvido no nosso país.
"No nosso país a lei é tímida e confusa", acrescenta Rangel ao i. E porque "os arautos da democracia cega vêm logo defender que quem julga os políticos é o povo no acto eleitoral", diz. O argumento é avançado também por Jorge Bacelar Gouveia, constitucionalista e ex-presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações: "A má governação em si não é crime e só os eleitores podem julgá-la."
Rui Rangel, por seu lado, denuncia uma falha no regime jurídico político, "pois deveria ser possível interromper um mandato eleitoral em situações como a da Madeira e a da Islândia". Estes mecanismos poderiam ser criados pelo parlamento, "mas é o próprio legislador que não quer uma lei clara", acrescenta. Estamos "atrasados em relação a outros países europeus", remata.
Bacelar Gouveia admite que "em termos gerais deve haver um aprofundamento da lei", mas frisa não perceber onde está a consequência nas declarações sobre a Madeira: "Que fez o Tribunal de Contas para inverter a situação? E o TC é um órgão jurídico, decisório ou político, se diz que emitiu recomendações?" Segundo o antigo bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves, Alberto João Jardim pode vir a ser alvo de dois processos, "um de responsabilidade financeira no TC, que poderá determinar a aplicação de uma multa, e um segundo de eventual responsabilidade criminal, pelo crime de violação das normas de execução orçamental, com pena de prisão até um ano".
Lentidão Os desvios de contas da Madeira vão ser investigados pela Procuradoria-Geral da República, mas tal não abalará a governação de Jardim. Numa remota eventualidade de ser condenado, teria de abandonar a presidência, mas o processo pode arrastar-se para além do período da legislatura. Bacelar Gouveia defende que "é muito perigosa, a criminalização das decisões políticas" e considera que "isto é um pouco o que está a acontecer com o Dr. João Jardim", pois "o que falta na Região Autónoma da Madeira como na República é um mecanismo automático que impeça ultrapassar o limite orçamental". O mecanismo é difícil de pôr em acção, pois "teria de haver forma de cruzar informação sobre todos os processos de despesa, somar o total que se dispersa em diferentes áreas". E remata: "Se a República pediu empréstimo ao FMI, porque não pode a República ser o FMI da Madeira?"
Nelson Pereira
Jornal I, 21 de Setembro de 2011
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