quinta-feira, 4 de novembro de 2004

Presidente do Supremo Manifestou Reservas à Nova Directora do CEJ

Por ANTÓNIO ARNALDO MESQUITA, no Público de hoje:

O conselho de gestão do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) deu um parecer favorável, por unanimidade, à nomeação da professora Anabela Rodrigues para directora do CEJ. No entanto, a acta da reunião, que foi dsitribuída pelos magistrados judiciais por iniciativa do Conselho Superior da Magistratura, revela que, apesar do parecer favorável, vários membros do órgão, entre os quais o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, conselheiro Jorge Aragão Seia, e o procurador-geral da República, José Souto Moura, manifestaram a sua surpresa pela escolha de Anabela Rodrigues.

"Corresponderá um professor universitário ao perfil que se espera de um responsável pelo CEJ neste momento?". A pergunta foi feita por Aragão Seia a concluir a leitura de um documento elaborado por si próprio, que também preside ao conselho de gestão do CEJ. Com alguma ironia, Aragão Seia afirmou que "a posse de uma licenciatura em Direito não é condição bastante para que o seu detentor se transforme 'tout court' num magistrado", depois de ter estabelecido um paralelismo com uma escola de equitação. "Se não me levarem a mal e sem pretender ferir susceptibilidades", frisou.

Realçando que numa escola de equitação se ensinam "um leque variado de disciplinas", o presidente do STJ sublinhou que a posse desses conhecimentos "não transforma esse aluno da escola de equitação num cavaleiro". "Para sê-lo", acrescentou, "esse candidato terá de pôr à prova os seus conhecimentos adquiridos, o que terá lugar num picadeiro". E sugeriu: "É preciso que o CEJ direccione a sua formação no sentido de transmitir aos auditores a realidade do mundo judicial (...). E, se complemento há a acrescentar na sua formação académica, ele deverá incidir sobre matérias que incidam sobre a realidade social, matérias abarcadas pelas ciências sociais."

O procurador-geral da República, José Souto Moura, interveio a seguir e, segundo a acta, destacou a "natureza profissionalizante da formação [do CEJ, instituição de que foi docente e director-adjunto], retirando-lhe o aspecto de pós-graduação, ou prolongamento do ensino ministrado nas Universidades". Souto Moura confessou: "Foi portanto com alguma surpresa que recebi a notícia da recente indigitação da sra. profesora Anabela Rodrigues para directora do CEJ."

Baseado no conhecimento "vai para vinte anos" que tem da professora da Faculdade de Direito de Coimbra, na admiração que nutre pela sua "alta craveira intelectual e as suas qualidades de carácter" e no seu testemunho da colaboração de Anabela Rodrigues em iniciativas do CEJ, Souto Moura acentuou: "Entendo que não devo fazer, no momento da sua indigitação, qualquer objecção à respectiva nomeação. Ficando, portanto, a aguardar a definição do rumo que vai imprimir na formação dos magistrados e na gestão da instituição, para o que poderá contar com a minha colaboração franca e leal."

Sete votos sem reservas

Segundo a acta, sete membros do conselho de gestão do CEJ (o bastonário José Miguel Júdice, a procuradora da república Maria Joana Marques Vidal, o deputado Jorge Lacão, os professores Bacelar Gouveia e Miguel Teixeira de Sousa, e os auditores de justiça Cidalina Freitas e Telmo Alves) manifestaram a sua concordância à nomeação de Anabela Rodrigues para directora do CEJ.

O conselheiro Silva Paixão admitiu, por seu turno, que o CEJ poderia ficar "melhor servido se o cargo de director continuasse a ser desempenhado por um magistrado". Silva Paixão anunciou, todavia, que se não opunha à nomeação por duas razões: a lei do CEJ prevê que a instituição possa ser dirigida por um professor universitário e "atendendo ao currículo" de Anabela Rodrigues.

Outro membro do conselho de gestão, Arménio Sottomayor, procurador-geral adjunto e procurador distrital do Porto, explicitou a sua concordância à indigitação "uma vez que é legal".

A reunião terminou com nova intervenção de Aragão Seia, considerando que "o CEJ é uma escola profissionalizante de formação de magistrados", deve ter um magistrado como seu director, "como tem sucedido ininterruptamente há 25 anos". "Vem, por isso, significar a decepção dos magistrados judiciais pelo facto de o sistema ter sido interrompido e a sua preocupação pelo receio da teorização do ensino", disse. Mas, acrescentou, "porque a lei permite a nomeação de um professor universitário como director do CEJ e, no caso concreto, a professora doutora Anabela Rodrigues possui um curículo brilhante, não se pode opor à sua nomeação, dando-lhe o benefício da dúvida", acentuou o presidente do conselho de gestão do CEJ.

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