quinta-feira, 7 de outubro de 2004

AS COMISSÕES DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS - NOTAS (IV)

.../cont.

Aspectos concretos do acompanhamento da actividade das CPCJ pelo MP e a Circular nº 01/2001 da PGR
Em 25 de Janeiro de 2001, o Procurador-Geral da República emitiu uma Circular, com o nº 01/2001, que trata da “Intervenção do Ministério Público nas comissões de Protecção das Crianças e Jovens, ao abrigo do disposto no artigo 72º, nº 2, da Lei nº 147/99, de 01 de Setembro” e transmite quatro grandes orientações:
1ª O Ministério Público deve articular com cada Comissão os termos do acompanhamento da sua actividade, quer no que respeita à periodicidade quer quanto à presença nas reuniões;
2ª A fiscalização da actividade das CPCJ pode realizar-se a qualquer momento, a posteriori, devendo englobar a totalidade do trabalho desenvolvido;
3ª A apreciação da legalidade e do mérito das decisões não se pode limitar à matéria das comunicações obrigatórias;
4ª Deve ser identificado o magistrado interlocutor da cada Comissão.

Esta Circular, que se caracteriza pela maleabilidade das orientações definidas, convidando à sua adaptação a cada situação concreta, transmite, por um lado, uma mensagem de não burocratização da relação entre o MP e as CPCJ (burocratização que não é compatível com esta nem com qualquer outra atribuição do Ministério Público enquadrável naquilo a que se vem chamando a sua função social) e, por outro lado, uma mensagem de colaboração e proximidade.

Gostaria de, sobre a aplicação das orientações desta Circular, sublinhar quatro aspectos que reputo de importantes:
1º - Uma conclusão que não se deve retirar desta Circular é que o acompanhamento pelo Ministério Público da actividade das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens se deve restringir à comissão restrita por ser esta que tem a competência para instruir os processos e para decidir a aplicação e acompanhar e rever as medidas de promoção e protecção.
Os deveres do magistrado interlocutor abarcam igualmente as competências da comissão alargada, com quem deve colaborar no planeamento e mesmo na execução de acções de promoção de direitos e de prevenção das situações de perigo, a quem deve propor iniciativas, transmitir a sua opinião sobre o que entende deverem ser as suas prioridades e em cujas reuniões pode participar por sua iniciativa ou a convite, devendo obrigatoriamente estar presente naquela em que for analisada “a informação semestral relativa aos processos iniciados e ao andamento dos pendentes na comissão restrita”[1];
2º - O acompanhamento da actividade da comissão restrita, por sua vez, passa pela sinalização de situações em que deve haver intervenção, passa igualmente pela presença em reuniões, por sua iniciativa ou a convite, pela participação na ponderação sobre casos concretos, pela consulta regular dos processos, pelo conhecimento da informação semestral que esta tem de prestar à comissão alargada, por um contacto regular com o presidente da CPCJ, com o qual se devem definir os termos do cumprimento do dever de efectuar as comunicações obrigatórias, vias rápidas de contacto e de transmissão de preocupações e, nomeadamente, estabelecer o modo de actuar no caso dos procedimentos urgentes. Mas, nunca o magistrado do Ministério Público interlocutor deve participar nas diligências processuais realizadas pela comissão, tenham em vista a confirmação da situação de perigo, a obtenção dos consentimentos exigidos para a sua intervenção ou a recolha de informação sobre a situação da criança ou do jovem, nem participar nas deliberações da CPCJ – estes são, a meu ver, os limites da colaboração, sob pena de violar a autonomia funcional das comissões e também de não se encontrar em condições de exercer com o exigível distanciamento e imparcialidade as funções de apreciação da legalidade e da adequação das decisões e de fiscalização da actividade processual;
3º - O magistrado interlocutor deve proceder ao acompanhamento da actividade das comissões alargada e restrita numa relação de grande proximidade, o que passa por se conhecer quem é, e ser sempre o mesmo, conforme determina a Circular, por um contacto tendencialmente realizado na sede da comissão; e aconselha, a meu ver, a que nos casos em que a área territorial de intervenção de uma comissão é abrangida pela competência de um Tribunal de Família e Menores sediado num outro concelho e comarca, se pondere se o magistrado interlocutor não deve ser, ainda assim, um magistrado que exerça funções no tribunal de comarca em que está sediada a comissão.
4º - O magistrado interlocutor deve transmitir e debater regularmente com a CPCJ a apreciação que vai fazendo da sua actividade, recomendando a alteração ou a adopção de novos procedimentos, dando-lhe a conhecer os casos em que divergiu das suas decisões e os respectivos fundamentos – numa perspectiva pedagógica e de esclarecimento recíproco.

O acompanhamento próximo da actividade das comissões pelos magistrados do Ministério Público, numa perspectiva não apenas de fiscalização, mas que deve colocar o acento tónico na pedagogia e na colaboração, é ainda essencial para que, na prática, seja cumprido o já referido princípio da subsidariedade.
[1] Artº 18º nº2.g).
cont./...

Rui do Carmo
Procurador da República
no Tribunal de Família e Menores de Coimbra

Sem comentários: