terça-feira, 5 de outubro de 2004

AS COMISSÕES DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS - NOTAS (III)

(... cont.)

Como exerce o Ministério Público as atribuições previstos no já referido nº 2 do artº 72º da LPCJP?

A lei determina que as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens comuniquem obrigatoriamente ao Ministério Público:

a) situações em que a iniciativa e a legitimidade para intervir não cabe às comissões, mas sim ao Ministério Público:
- quando considerem adequado o encaminhamento para a adopção (artº 68º.a[1]);
- quando se justifiquem a regulação ou a alteração do regime do exercício do poder paternal, a inibição do poder paternal, a instauração da tutela ou a adopção de qualquer outra providência cível (artº 69º);
- quando não sejam prestados ou sejam retirados os consentimentos necessários à sua intervenção, à aplicação da medida ou à sua revisão, ou haja oposição da criança ou do jovem (68º. b) ou de quem tenha a sua guarda ocasional nos casos de impossibilidade de contacto com os pais ou representantes legais (artº 96º.3.);
b) situações cuja análise pelo MP se impõe, embora mantendo-se, em princípio, a competência da comissão para intervir,
b.1. ou com vista à possível adopção dos procedimentos necessários à remoção dos obstáculos à aplicação ou execução das medidas consideradas adequadas pela comissão:
- quando sejam reiteradamente não cumpridos os acordos estabelecidos - artº 68º.b. parte final;
- quando não se obtenha a disponibilidade dos meios necessários para aplicar ou executar a medida que considere adequada, nomeadamente por oposição de um serviço ou de uma instituição - artº 68º.c;
- e quando não tenha sido proferida decisão decorridos seis meses após o conhecimento da situação da criança ou do jovem em perigo - artº 68º.d.).
b.2. ou porque foi aplicada uma medida que a lei considera só poder ter lugar em situações excepcionais:
- quando se determine ou mantenha a separação da criação ou do jovem dos seus pais, representante legal ou das pessoas que tenham a sua guarda de facto - artº 68º.e).
c) os factos que, tendo determinado a situação de perigo, constituam crime (artº 70º);
d) os procedimentos urgentes adoptados nos casos de perigo actual e eminente para a vida ou integridade física da criança ou do jovem, havendo oposição dos detentores do poder paternal ou de quem tenha a guarda de facto (artº 91º).

Assim como é obrigatoriamente remetido ao Ministério Público o relatório anual de actividades de cada comissão, até ao dia 31 de Janeiro do ano seguinte àquele a que respeita (artº 32º).

O Ministério Público, a quem a lei comete o dever especial de “representar as crianças e jovens em perigo”, pode, na sequência daquelas comunicações, se o entender necessário, tomar a iniciativa de requerer a abertura de um processo judicial de promoção dos direitos e de protecção, de iniciar um inquérito criminal, de instaurar procedimento tutelar cível em representação do menor ou usar quaisquer outros meios judiciais adequados, ou mesmo accionar em simultâneo mais do que um destes meios de actuação judiciária – numa perspectiva de tratamento coordenado e harmonioso dos vários níveis em que deve ser defendido o interesse superior da criança ou do jovem. Pode ainda, nos casos em que tal se mostre possível e adequado, tomar iniciativas não processuais susceptíveis de, por exemplo, removerem os obstáculos à actuação ou à execução das medidas decididas pela CPCJ. Assim como pode decidir reunir com a comissão para debater a matéria de uma comunicação e dar o seu parecer sobre o modo como deve ser orientado o tratamento de qualquer caso concreto. Ou, pura e simplesmente, pode entender que não há nenhuma iniciativa a tomar.
Pode ainda requerer a realização de auditoria e inspecção às CPCJ (artº 33º).
Mas, o acompanhamento pelo Ministério Público da actividade das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens deve ficar-se pela análise e tratamento da matéria das comunicações obrigatórias que lhe são feitas?
Penso que o legislador quis, com as referidas comunicações obrigatórias, acautelar o mínimo exigível de acompanhamento e fiscalização da actividade processual das comissões, mas os poderes-obrigações do MP face ao trabalho das CPCJ não só não se confinam à matéria daquelas comunicações obrigatórias, pois tem o dever legal de requerer a apreciação judicial de qualquer decisão da comissão de protecção “quando entenda que as medidas aplicadas são ilegais ou inadequadas para a promoção dos direitos e protecção da criança ou do jovem em perigo” (artº 76º.1.), como não se devem confinar, de resto, a uma atitude reactiva aos casos que considere anómalos nem ao núcleo de competências e à actividade da comissão restrita.
[1] Todos os artigos sem indicação do diploma respeitam à Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo.
cont./...

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