quinta-feira, 14 de março de 2013

MP pede absolvição de activista acusada por desobediência qualificada


A procuradora do caso de Myriam Zaluar, activista acusada de desobediência, pediu, nesta quarta-feira durante o julgamento do caso no Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, a absolvição da arguida, visto que “não parece que haja qualquer acto criminal na sua conduta”.
Em causa está a acção de protesto feita por oito pessoas, a 6 de Março de 2012, junto ao Centro de Emprego e Formação Profissional, de Conde Redondo. O grupo estaria a entregar panfletos do Movimento Sem Emprego (MSE) e pretendia fazer uma inscrição colectiva simbólica no centro de emprego, como forma de demonstrar que há mais desempregados para além dos que constam nos dados oficiais. Myriam Zaluar, jornalista e agora ex-activista do grupo MSE, foi a única pessoa do grupo identificada pela PSP no local, tendo-lhe sido imputado o crime de desobediência qualificada por ter "convocado uma manifestação sem autorização".
Durante o julgamento, a procuradora defendeu a absolvição de Myriam Zaluar, dizendo que "não se verificou uma verdadeira manifestação, mas sim um exercício dos direitos democráticos", frisando não ser necessário o pedido de autorização e que nem o funcionamento normal do trânsito e da instituição, nem a ordem pública foram postos em causa. “Foram sete ou oito pessoas que se reuniram, todas elas a excercer o seu direito de expressão”, afirmou a procuradora, que evocou o artigo 1º do decreto-lei de Agosto de 1974 e o artigo 45º da Constituição (ambos garantem aos cidadãos o direito de se reunirem em locais públicos, de forma pacífica, sem necessidade de autorização, desde que não se verifique uma quebra da lei, moral ou da ordem e tranquilidade públicas).
A procuradora considerou ainda que, perante a situação actual do país e os números referentes ao desemprego, Myriam Zaluar estava a "exercer o direito de informar". “Todas as reivindicações, desde que correctas, deverão ter lugar”, concluiu a procuradora, apelando à juíza encarregue do caso que absolvesse a arguida.
César Baptista, agente da PSP que identificou a arguida, foi chamado a depor enquanto testemunha de acusação. Durante o julgamento, o agente salientou que o grupo envolvido foi “ordeiro e silencioso, sem palavras de ordem” e que teve uma “atitude exemplar e não faltou ao respeito”.
O advogado de Myriam Zaluar, João Araújo, afirmou durante as suas alegações que “a única coisa que distinguia o grupo das outras pessoas que passavam era estarem a distribuir panfletos”. “Afinal de contas, isto é um equívoco, ou, se preferirem, um abuso institucional,” concluiu o advogado, dirigindo-se à juíza e procuradora, relativamente a um caso que considera ser desnecessário.
Já depois do julgamento, Myriam Zaluar afirmou, quanto à acção levada a cabo pelo grupo, "não se tratava de uma manifestação": "E foi isso que respondi ao agente quando ele me abordou", explicou a jornalista, acrescentando que se tratou de "um acto simbólico e nada mais do que isso". A arguida considerou as declarações da procuradora "extraordinárias" e revelou que, antes do julgamento, não tinha conhecimento das normas que esta citou. "Abre uma nova janela, sobretudo neste momento em que quase todos os dias há actos de protesto", disse Myriam relativamente aos contornos dos decretos citados pela procuradora.
A jornalista mostrou-se indignada pela celeridade deste processo, considerando-o um exemplo dos casos "que entopem os tribunais". "Em relação a um caso que é anedótico e que não devia valer cinco minutos do nosso tempo (...) as coisas correram com uma celeridade impressionante", disse, já depois do julgamento. "Premente sim é tratar do desemprego, é fazer-se justiça mas justiça a sério, que seja igual para todos, e em que os verdadeiros criminosos sejam julgados", afirmou Myriam Zaluar.
A sentença deste caso será lida a 5 de Abril, às 15h30.
Público, 14-03-2013

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