quinta-feira, 14 de junho de 2012

A culpa dos pais

A proposta de aplicação de coimas aos pais de alunos que faltem à escola recordou-me uma norma do Código Civil pouco conhecida. 
Trata-se do artigo 488º, segundo o qual se presume inimputável (não responde por factos danosos) quem tiver menos de 7 anos. Em geral, as pessoas conhecem a importância de outros marcos: aos 16 anos é possível casar, celebrar contrato de trabalho ou sofrer uma pena e aos 18 alcança-se a maioridade e a capacidade eleitoral. Mas o que significa esta imputabilidade civil, que se pode atingir aos 7 anos ou até antes?
A partir dos 7 anos considera-se que uma criança tem, em regra, capacidade para compreender que não deve partir um vidro, por exemplo, cabendo-lhe assumir certas consequências. Não é possível aplicar--lhe uma pena, mas ela tem dever de indemnizar no caso de ser titular de quaisquer bens. É claro, porém, que a responsabilidade civil não basta para defender a sociedade da prática de crimes. Quem cometer crimes com menos de 16 anos é passível de medidas previstas na Lei Tutelar Educativa, incluindo o internamento em regime fechado.
E se uma criança partir um vidro com 5 ou 6 anos? Respondem os pais (ou tutores) pelos danos causados, desde que tenham violado os deveres de educação e guarda da criança. Caso contrário, o Direito encara a destruição do vidro como resultado de um evento fortuito. Por outro lado, os pais de crianças com mais de 7 anos não ficam isentos de responsabilidades. A responsabilidade parental, a que se chamava outrora poder paternal, continua a obrigá-los a indemnizar por danos causados pelos filhos, no caso de violarem os seus deveres próprios.
A proposta apresentada em sede de disciplina escolar é congruente com o regime da lei civil? Não devemos desresponsabilizar as crianças. Os 7 anos estão associados ao início da escolaridade e os alunos devem ser sancionados disciplinarmente pelas suas faltas, no seu próprio interesse. Aos pais só poderão ser aplicadas coimas quando violarem os seus deveres, inerentes à responsabilidade parental. De contrário, cairíamos na responsabilidade objectiva – que, para além de injusta e ineficaz, está excluída do âmbito do Direito de Mera Ordenação Social.

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