quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Desembargo do Paço


Declarações para memória futura.
I. A redacção originária do Código de Processo Penal de 1987, em coerência com o modelo acusatório que adoptou, previa no seu artigo 271.º que, em caso de doença grave ou de deslocação para o estrangeiro de uma testemunha, que previsivelmente a pudesse vir a impedir de ser ouvida em julgamento, o juiz de instrução procedesse à sua inquirição no decurso do inquérito para que o seu depoimento pudesse, se necessário, vir a ser tomado em conta no julgamento. 
II. Embora o formalismo estabelecido para esse acto permitisse, em certa medida, o exercício do contraditório, o acto não decorria em condições idênticas àquelas em que teria lugar se realizado na audiência. 
III. Este instituto, na versão originária do Código, desempenhava uma função exclusivamente cautelar visando obter uma prova que poderia ser impossível de produzir na audiência de julgamento. 
IV. A prova assim recolhida apenas poderia ser utilizada, através da leitura do respectivo auto, se tal viesse a ser necessário. 
V . As revisões de 1998 e de 2007 alteraram a natureza meramente cautelar do artigo 271.º do Código de Processo Penal. 
VI. Embora esta finalidade se tenha mantido, as declarações para memória futura passaram a poder ter também lugar para protecção de vítimas de determinados crimes. A partir de 1998, dos crimes sexuais e, a partir de 2007, dos crimes de tráfico de pessoas ou contra a liberdade e autodeterminação sexual. 
VII. Manteve-se, mesmo quanto às vítimas dos indicados crimes, a menção de que as declarações prestadas para memória futura apenas seriam tomadas em conta na audiência se tal fosse necessário, se bem que se tenham restringido os pressupostos da audição dessas testemunhas na audiência através da introdução da exigência suplementar de o respectivo depoimento não pôr em causa a saúde física ou psíquica de quem o devesse prestar. 
VIII. O artigo 28.º, n.º 2, da Lei de Protecção das Testemunhas em Processo Penal, ao estabelecer que, «sempre que possível, deverá ser evitada a repetição da audição da testemunha especialmente vulnerável durante o inquérito, podendo ainda ser requerido o registo nos termos do artigo 271.º do Código de Processo Penal», veio alargar ainda mais o âmbito de aplicação deste preceito. 
IX . Deixou de ter uma mera função cautelar e de proteger as vítimas de certo tipo de crimes, passando a abranger todas as pessoas que se incluam no amplo conceito de testemunha, tal como ele se encontra definido pelo artigo 2.º, alínea a), da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho, e a abarcar qualquer tipo de crime. 
X . A Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, veio, por sua vez, no seu artigo 33.º, prever um regime formalmente autónomo para a prestação de declarações para memória futura das vítimas de violência doméstica, se bem que esse regime em pouco difira do actualmente constante do artigo 271.º do Código de Processo Penal. 
XI. Admitindo o artigo 33.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, que a vítima de violência doméstica possa prestar declarações para memória futura e não se estabelecendo a obrigatoriedade da prática desse acto, importa procurar na lei um critério que permita determinar os casos em que ele deve ter lugar. 
XII. A nosso ver, esse critério há-de resultar de uma ponderação entre o interesse da vítima de não ser inquirida senão na medida do estritamente indispensável à consecução das finalidades do processo e o interesse da comunidade na descoberta da verdade e na realização da justiça. 
XIII. Seja como for, a decisão sobre a tomada de declarações para memória futura não pode ser vista como um meio de evitar ou de propiciar que a vítima exerça o direito que o Código lhe atribui de se recusar a depor. Ela tem esse direito em qualquer momento em que deva depor.
AcRL de 11-01-2012, Proc. 689/11.5PBPDL, Relator: Desembargador Carlos Almeida

Prazo para a interposição de recurso.
I. Para que o recorrente possa gozar da faculdade excepcional de apresentar o recurso no prazo de 30 dias (artº 413º, nº4, do CPP) não basta que declare a intenção de ver reapreciada a prova gravada - é necessário que efectivamente impugne a matéria de facto, dando integral cumprimento ao estatuído nos nºs 3 e 4 do artº412º do CPP. O que justifique a concessão daquele prazo mais alargado, não é a declaração de intenção de se ver reapreciada a prova gravada, mas antes a sua efectiva concretização, patenteada na motivação e conclusões do recurso. 
II. No caso, o recorrente limita-se a aludir às declarações por si prestadas e aos depoimentos “integrais” de determinadas testemunhas, sem cuidar de detalhar as concretas provas que, no seu entendimento, impõem decisão diversa da recorrida, sem indicar as concretas passagens dos depoimentos gravados em que funda a sua impugnação e sem indicar as provas que devem ser renovadas. 
III. Deste modo, não tendo o recorrente cumprido o ónus de especificação relativamente à impugnação da matéria de facto, impõe-se concluir que o recurso não tem por objecto a reapreciação da prova gravada, pelo que não poderá beneficiar do prazo excepcional de 30 dias a que se reporta o artº413º, nº4 do CPP. Assim, tendo o recorrente apresentado o recurso para além do prazo normal de 20 dias, este não pode ser admitido e deve ser rejeitado por intempestivo (artº414º, nº2, do CPP). 
AcRL de 25-01-2012, Proc. 126/09.5PCOER.L1, Relator: Desembargador Rui Gonçalves

Recurso. Conclusões deficientes, extensas, repetem a motivação. Convite aperfeiçoamento. Recorrente não o faz. Rejeição subsequente
I - A lei determina (n. 3, do artº 417º CPP) - quando as conclusões sejam extensas ou repitam a motivação, sem efectuar a súmula respectiva - que o recorrente seja “convidado” a aperfeiçoá-las, sob pena, não o fazendo, de o recurso ser rejeitado. 
II – Termos em que, tendo o recorrente sido notificado expressamente para aqueles efeitos e com tal cominação e não tendo apresentado novas conclusões “aperfeiçoadas”, que satisfaçam as exigências legais, e nada tendo dito ou requerido, é de rejeitar o recurso, por decisão sumária (artºs 412º, n. 1, 417º, n.s 3 e 6, b)e 420º, n. 1, c), todos do CPP).
Despacho de 31-01-2012, Proc. 2844/08.6TDLSB.L1, Relator: Desembargador Francisco Caramelo

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